Se, no contexto da Revolução de 1952, a centralidade do proletariado mineiro foi indiscutível, hoje em dia a morfologia do trabalho é outra. É  fato que o operário de fábrica ainda responde por parcela significativa da classe trabalhadora boliviana, mas a precarização das relações laborais e a informalidade têm colocado outra grande e majoritária parcela de trabalhadores em condições desfavoráveis para se organizar. Por Bruno Miranda

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Outubro de 2003

Em território boliviano houve ao menos sete importantes insurreições na última década, abordando a gestão dos recursos naturais [1]. Entre elas, vale destacar o conflito que convencionalmente se denomina “Guerra do Gás”, em setembro e outubro de 2003, e a “Segunda Guerra da Água”, durante os meses de maio e junho de 2005, ambas na cidade de El Alto.

Nessa cidade, o contexto urbano reúne migrantes do campo – que levam consigo tradições comunitárias no cultivo da terra e em sua vida política cotidiana – e ex-mineiros despedidos – que carregam a experiência de mais de 30 anos de participação decisória nos assuntos do Estado (1952-1985). A convivência entre esses setores, além dos migrantes de La Paz, universitários e uma intelectualidade aymara que vem se formando desde finais dos anos 60, se refletiu numa articulação multitudinária em 2003 e 2005. Nessas lutas, nas quais o sindicalismo operário e camponês convive com a lógica comunitária andina [2], a organização de vizinhos à margem dos partidos políticos burgueses bolivianos deu como resultado mobilizações que derrubaram dois presidentes consecutivos.

Ainda que estivessem presentes centrais sindicais operárias, entre elas a própria Central Obrera Boliviana, na luta contra a exportação de gás para a Califórnia via Chile e na luta contra a cobrança abusiva pelo uso da água, as protagonistas foram as centenas de Juntas de Vizinhos de El Alto, que articularam todas as demais organizações em luta, vindas inclusive de outras regiões do país. Embora tenham um caráter barrial [de bairro], essas são Juntas de trabalhadores subproletarizados em última instância, sejam comerciantes, vendedores ambulantes (gremiais), prestadores de serviços, ex-mineiros ou migrantes camponeses-comunários.

Breve história de  El Alto

Cidade de El Alto
Cidade de El Alto

Do campo para a cidade, trajetória que percorrem milhares de migrantes na Bolívia todos os dias, o destino quase sempre é a cidade de El Alto, no altiplano [planalto] boliviano. A 4000 metros de altitude e com uma população de mais de 1 milhão de habitantes (segundo cifras não oficiais), El Alto tem recebido migrantes desde a década de 80, precisamente 1985, quando o governo de Paz Estenssoro promoveu a “relocalização” [3] dos mineiros pelo decreto 21060 [4], fragmentou a classe trabalhadora e fez com que a referência de luta passasse então pelos cocaleiros [plantadores de coca] dos vales de Cochabamba para desembocar, no século XXI, nos trabalhadores de El Alto organizados em Juntas de Vizinhos.

Tupak Katari
Tupak Katari

El Alto possui uma história de luta que não é recente. Em 1781, em resistência aos impostos espanhóis, o líder aymara Tupak Katari e sua companheira Bartolina Sisa formaram exércitos indígenas cercando a cidade de La Paz, nos períodos de março a julho e de agosto a outubro do mesmo ano. O objetivo final era a expulsão dos espanhóis através do bloqueio de alimentos, pela fome. Ao final, Tupak Katari foi condenado à morte e esquartejado por quatro cavalos em praça pública. Sua figura tornou-se então referência de luta não somente para os camponeses aymara-quéchua, mas para o próprio movimento operário e o proletariado urbano de ascendência indígena, incluindo aí uma pequena parcela de mestiços e brancos.

Mais de um século depois, em 1899, durante a chamada Guerra Federal, sob liderança do aymara Pablo Zárate Willka, as tropas constitucionalistas do então presidente Fernández Alonzo foram impedidas de passar por El Alto rumo a La Paz. A intenção era proteger os liberais para que legislassem a favor das terras originárias, o que de fato não sucedeu. Os indígenas então se organizaram de forma independente e chegaram a decretar um novo governo indígena, emitindo decretos para destruição, saqueio e incêndio de propriedades privadas e a eliminação física da elite branca e mestiça.

Novamente, em 1952, quando da Revolução Nacional, El Alto converteu-se em espaço para o controle de entrada e saída das tropas militares vindas das minas e das Forças Aéreas, que localizam-se ainda hoje na cidade. Foi o cenário onde a Revolução se consolidou.

Nos tempos recentes, a cidade serve como espaço de referência das lutas dos trabalhadores na Bolívia, assim como tinha sido a luta mineira décadas antes em outros espaços. Conhecida como o “Quartel dos Pobres”, El Alto é comparada ao acampamento mineiro Siglo XX, ao norte de Potosí, de onde irradiavam as teses e orientações políticas que eram seguidas pelo proletariado no contexto da Revolução de 1952 [5].

A cidade de El Alto torna-se oficialmente um município, independente de La Paz, somente em 26 de setembro de 1988. É geopoliticamente estratégica não somente porque é a principal porta de entrada e saída de La Paz – que está literalmente num buraco no meio dos Andes -, mas porque também conduz ao Altiplano Norte – onde se encontram as cidades das comunidades campesinas mais combativas da Bolívia como Achacachi, Warisata, Sorata, Huarina e Copacabana – e ao Altiplano Sul – onde se encontram Caracollo e o centro mineiro de Oruro. Também serve de passagem à região amazônica do departamento de La Paz, Beni e Pando.

Segundo o Censo de Población y Vivienda de 2001, El Alto possui 649.958 habitantes, 28% da população do departamento [estado] de La Paz. Mas, como relembra Ramírez (2005b), no dia do censo inúmeras famílias voltaram às suas terras de origem para se registrar. Para outros, a população, em 2000, já rompia a marca de 1 milhão de habitantes [6].

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Cidade de El Alto

Diante de tamanho crescimento populacional, é considerada como a primeira grande cidade indígena do continente. De outro lado, Duran Chuquimia [7] apresenta alguns dados sobre as condições de habitação da população altenha em geral. Conforme seu informe, 77% das casas são feitas de adobe e o tijolo está presente somente em 22% de suas paredes, a maioria sem reboque [reboco]; 47,9% têm piso de cimento, 28,1% de madeira e 21,8% de terra; 60% das habitações não têm proprietário regularizado; 46% das casas ainda carecem de saneamento básico e de escoamento das águas das chuvas, que em determinado período do ano são torrenciais. Em 2005, El Alto registrou 66,8% de sua população na faixa da pobreza em áreas urbanas. Na área rural do município, a taxa era de 98,9%. Dessa população, 17,1% vivia em condições de indigência.

Um dado importante que se reflete no cenário sócio-político é que 85% das habitações são autoconstruídas, incluindo o calçamento das ruas e o entorno dos bairros. Isso potencializa o sentimento de pertencimento ao bairro, que cada trabalhador altenho expressa nos momentos de enfrentamento e protesto. É uma cidade em permanente construção.

O mundo do trabalhador altenho

Consequentemente, cresce o setor informal: oito em cada dez empregos são gerados nesse setor na Bolívia dos últimos tempos. Na cidade de El Alto, o setor familiar, ou seja, os comércios, micro e pequenas empresas nas quais trabalham membros da mesma família, cresceu 1120% entre 1989 e 1995 [8].

Os trabalhadores altenhos se concentram predominantemente no comércio e na manufatura. O comércio, seguido da indústria, é o setor no qual se expande vertiginosamente o trabalho informal. Ao mesmo tempo, El Alto é a segunda cidade industrial do país em cifras absolutas, depois de Santa Cruz de la Sierra, segundo o Censo de 2001.

Adotando metodologia distinta, Rojas e Rossell [9] apontam que, enquanto em 1992 64% dos altenhos trabalhavam no setor informal (familiar e/ou empresarial) [10], no ano 2000 a taxa subiu para 69%: a principal unidade reprodutora de capital na cidade de El Alto é a família.

Trabalho familiar
Trabalho familiar

Ainda que esses trabalhadores possam administrar seu tempo de trabalho com mais autonomia, a realização de capital se dá por meio da auto-exploração ou extração de mais-valia no próprio âmbito familiar. Dessa maneira, os contratos de trabalho abusivos e geração de mais-valia familiar são encobertos por relações de parentesco ou entre compadres.

No contexto atual, depois das demissões dos anos 80 e da descentralização fabril, os trabalhadores a domicílio e de pequenas oficinas se mantêm ainda submetidos à dinâmica produtiva da grande indústria, pois em não poucos casos essas oficinas produzem com vistas a atender sua demanda. Formas de trabalho não totalmente capitalistas, como em associações, trabalhos familiares e/ou comunitários não são eliminadas: são subsumidas e tornadas parte da valorização geral de capital.

Os efeitos do Decreto 21060 e suas implicações teórico-políticas

Recentemente muito se tem discutido no meio intelectual e militante da Bolívia sobre a atual configuração do proletariado urbano. Se, no contexto da Revolução de 1952, a centralidade do proletariado mineiro foi indiscutível, hoje em dia, depois das demissões forçadas da classe mineira a partir de 1985, a morfologia do trabalho certamente é outra. Da mesma forma, se é fato que o operário de fábrica ainda responde por parcela significativa da classe trabalhadora boliviana, seria desonesto negar que a precarização das relações laborais e a informalidade têm colocado outra grande e majoritária parcela de trabalhadores em condições desfavoráveis para se organizar.

Além das demissões massivas, a reestruturação mineira na Bolívia implicou a relocalização de cerca de 4000 mineiros de empresas privadas e outros 60.000 distribuídos no que restou da empresa estatal COMIBOL e em mais de 500 cooperativas e minas menores dispersas por todo o território [11].

Concordamos com Antunes [12] quando recusa a aceitar a substituição do trabalho pela ciência ou da produção de valores pela comunicação: no mundo contemporâneo existe cada vez mais articulação entre o trabalho produtivo e o improdutivo, entre atividades fabris e informais ou do setor de serviços.

Outubro de 2003
Outubro de 2003

O que há de novo, portanto, é a combinação de processos produtivos em grande escala com outros processos menores e mais flexíveis. Assim, os trabalhadores por conta própria, comerciantes, vendedores ambulantes e artesãos em geral, sem estar subsumidos diretamente ao grande empresário capitalista, contribuem com a realização de valor na medida em que participam da compra e venda de mercadorias contrabandeadas e as vendem abaixo do preço às classes trabalhadoras em geral, reduzindo o valor de uso da própria força de trabalho. Trata-se de um fenômeno internacional que se explica pelo crescimento numérico de um tipo de trabalhador assalariado carente de organização e fragmentado.

No entanto, a redução numérica do operário fabril não deve levar-nos a engrossar a fila dos que defendem a tese das sociedades pós-industriais, pois o setor de serviços e informal, em geral, é dependente da produção industrial em grande escala e da sua possibilidade ou não de valorizar o valor.

A nova morfologia do mundo do trabalho altenho também está presente em outros centros urbanos da América Latina: São Paulo, Rio de Janeiro, Buenos Aires, Santiago, no Cone Sul, Lima, Quito, Bogotá ou Caracas, nos Andes, também têm sofrido o impacto neoliberal. Entender a dinâmica de apropriação de mais-valia do capitalismo contemporâneo regional implica aprofundar o debate sobre a informalidade. Em se tratando do altiplano [planalto] boliviano, a radicalidade de seus trabalhadores mesclada com a condição indígena oprimida, seja aymara ou quéchua, nos chama a atenção por suas potencialidades históricas.

Perspectivas futuras

Além do chão de fábrica e local de trabalho, na Bolívia está claro que a apropriação de excedente ocorre por meio de modalidades macro, como a privatização dos recursos naturais, que em última instância obstaculiza a redistribuição de ingresso [rendimento] [13]. Assumindo que essas mobilizações se referem à expropriação macro do excedente, protagonizada, diga-se de passagem, por consórcios transnacionais, são inaugurados novos elementos em comum que justificam a articulação política entre lutas de caráter comunitário e o sindicalismo operário.

Outubro de 2003
Outubro de 2003

Por outro lado, ainda que enfrentem o Estado e o capital transnacional e tenham servido de respaldo político e social ao primeiro mandato de Evo Morales/MAS, esses movimentos multitudinários não conseguem forçar o cumprimento da “Agenda de Outubro” [14]. Da ascensão do MAS ao Palacio Quemado em 2006 aos dias atuais, as principais organizações que se mobilizaram nos anos anteriores têm estado aguardando as decisões governamentais.

O partido do governo estrategicamente tem negociado com a Central Obrera Boliviana, Central Obrera Regional de El Alto, Federación de Juntas Vecinales-El Alto, Federación de Gremiales, além de contar desde o início de sua primeira campanha com o apoio da Confederación Nacional de Mujeres Campesinas Indígenas Originarias de Bolivia Bartolina Sisa, apoio parcial da poderosa Confederación Sindical Unica de Trabajadores Campesinos de Bolivia e dos sindicatos cocaleiros da região do Chapare. Ao mesmo tempo, negocia [negoceia] com setores empresariais de latifundiários, como o Comité Cívico de Santa Cruz e organizações juvenis fascistóides, como é o caso da sangrenta Unión Juvenil Cruceñista. Em outras palavras, o MAS tem funcionado como uma máquina niveladora de asfalto, promovendo alianças em busca da unidade nacional.

As últimas eleições no passado 06 de dezembro também são expressão do argumento anterior: no departamento (estado) de La Paz, no qual a cidade de El Alto tem sido o principal bastião do MAS, Evo Morales obteve 78% dos votos, contra apenas 11% de seu opositor Manfred Reyes Villa. Em termos gerais, obteve 63% dos votos, 25 dos 36 membros do Senado e 85 dos 130 deputados. Serão outros cinco anos, durante os quais se pode prever certa estabilidade com vistas à governabilidade masista.

O que está visível até o momento é que o comunitarismo e a autonomia das mobilizações de 2003 e 2005 instrumentalizam a crítica das esquerdas desses países, em sua forma prática, à democracia parlamentar e ao capitalismo democrático. Desvendam a máscara da acumulação de capital e da democracia eleitoreira como parte de uma estrutura de poder cooptada pelo capital.

Por outro lado, ao desvendá-la, essas mobilizações são contraditoriamente impossibilitadas de expandir-se em espaços urbanos maiores e por tempos prolongados. As classes burguesas permitem o assembleísmo, as relações cara-a-cara, o uso alternativo do tempo e o controle de autoridades somente em pequena escala e enquanto não as afrontem. Já nos momentos ordinários, o Estado volta a exercer o domínio político-jurídico-militar sobre as relações sociais.

Notas

[1] As insurreições começaram em 2000, com a “Guerra da Água” em Cochabamba, seguida pelos bloqueios camponeses-comunários de abril e setembro do mesmo ano, e outro em junho de 2001.

[2] A lógica andina gira ao redor do ayllu, matriz organizacional dos povos andinos. Na essência da autonomia e da base comunitária existe um complexo e variável sistema de eleição de autoridades em democracia direta, acompanhado de um sistema de justiça comunitária.

[3] Eufemismo utilizado para designar a demissão massiva de mineiros.

[4] Foram cerca de 32 mil os mineiros despedidos com o pretexto de relocalização promovido pelo decreto 21060 de 1985 durante o governo de Paz Estenssoro, no qual Gonzalo Sánchez de Lozada era Ministro do Planejamento. A entrada no período neoliberal, além de desestruturar os sindicatos mineiros, produziu a eliminação de subvenções estatais, a livre contratação, a proliferação do trabalho informal familiar, a privatização das principais empresas estatais bolivianas e a reforma do sistema de pensões, aumento do contrabando e o enfraquecimento e perda de capacidade de mobilização dos trabalhadores. São esses mesmos desempregados que anos depois vêm a fortalecer os movimentos sociais altenhos.

[5] Huanuni, ao norte do departamento de Oruro, é outro espaço histórico na luta do proletariado mineiro. Foi o centro de onde surgiu em 1944 a FSTMB, outro eixo operário da Revolução de 1952 e das décadas seguintes.

[6] Um dos autores que afirma o rompimento da marca de 1 milhão de habitantes é Jhonny R. Fernández. Mais informações em Fernández, Jhonny R., En las manos de la ciudad de El Alto. Centro de reporteros populares, 1993.

[7] CHUQUIMIA, Jaime Duran (org.), El acceso a la vivienda y el desarrollo en la cuidad de El Alto, Proyecto n. 12, Informe final, 19 jun. 2006.

[8] FEJUVE – DISTRITO 4, Protesta Alteña, Prensa vecinal, n. 11, nov. 2006.

[9] ROSSELL, Pablo; ROJAS, Bruno. Destino incierto. Esperanzas e realidades laborales de la juventud alteña. La Paz: Cedla, jan. 2002.

[10] As definições de ‘setor formal’ e ‘setor informal’ utilizadas pelos autores são as seguintes:
i) o setor empresarial, no qual a propriedade dos meios de produção é privada, onde existem relações salariais e uma clara divisão entre proprietários do capital e trabalho;
ii) o setor estatal, que tem as mesmas características, exceto que a propriedade dos meios de produção é estatal;
iii) o setor semiempresarial, no qual a propriedade dos meios de produção é privada, existem parcialmente relações salariais, mas não uma diferenciação clara entre proprietários do capital e do trabalho, já que o titular da unidade econômica (e seus familiares) participa ativamente no processo produtivo;
iv) o setor familiar, no qual o titular da unidade econômica participa do processo produtivo e emprega trabalhadores familiares não remunerados;
v) o setor doméstico, que agrupa as trabalhadoras domésticas.
Assim, o setor formal está constituído pelo setor estatal e o empresarial. Já o setor informal está constituído pelos setores semiempresarial e familiar; foi optado não incluir o setor doméstico no setor informal porque não agrupa unidades econômicas.

[11] GARCÍA LINERA, Álvaro. Reproletarización. Nueva clase obrera y desarrollo del capital industrial en Bolivia (1952-1998). El caso de La Paz y El Alto. La Paz: Muela del Diablo Editores, 1999.

[12] ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho? Ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. São Paulo: Cortez, 2001.

[13] VÁRIOS. Democratizaciones plebeyas. La Paz: Muela del Diablo Editores, 2002.

[14] Tal agenda incluía como principais demandas: a nacionalização completa das plantas [fábricas] de gás, renuncia do então presidente Gonzalo Sánchez de Lozada, repúdio à ALCA, autonomia da Universidade Pública de El Alto e melhores condições para o trabalhador do campo.

Fotos próprias, cedidas por Mario Duran e extraídas de CONDE, Julio Mamani. Octubre, memorias de dignidad y masacre. El Alto: CEADL; APA, 2006.

2 COMENTÁRIOS

  1. Olá,

    Excelente sistematização e análise do complexo processo social boliviano.

    No entanto, considero que existem outros a serem melhor detalhados sobre o caso de El Alto – mesmo sabendo que essas questões não eram parte necessária da intenção do autor desse artigo.

    Até então, não li nada que explicasse melhor essa experiência aqui descrita (com riqueza de detalhes e enfoque histórico crítico e heterodoxo) do que o livro de Raúl Zibechi – Dispersar el poder: Los movimientos como poderes antiestatales.

    Para saber um pouco mais do livro:

    http://www.nodo50.org/tintalimonediciones/spip.php?article22

    Dentre as várias questões desenvolvidas por Raul Zibechi, a própria idéia de “dispersar o poder” (ou seja, uma outra forma de se aproximar e analisar as mobilizações sociais – para além do enfoque que privilegia a unidade daas estruturas e organizações, e não o cotidiano e as relações sociais das comunidades), além do capítulo que estabelece a relativa e necessária distinção entre a “justiça comunitária” e a “justiça de El Alto”, podem ser consideradas contribuições fundamentais para a compreensão do que se passa não só nessa localidade específica de El Alto, mas sim num contexto mais amplo de lutas populares da Bolívia nas ultimas três décadas.

    Fica a sugestão e o convite de que sua contribuição continue por essas, ou outras, vias.

    Abraços – e parabéns pelo escrito.

  2. Olá Xavier,

    Estou de acordo, o livro de Zibechi é um dos mais completos e mais detalhados para buscar entender o pano de fundo das últimas lutas sociais em El Alto. Tensiona as potencialidades da vivência em comunidade – e aí está a maior inspiração de seu trabalho – e ressalta o caráter dispersador, dissipador dos movimentos, capaz de confundir o Estado no que ele tem de essencial: a centralidade. Talvez neste ponto Zibechi dê demasiada atenção à fluidez das lutas sociais e, quando menos espera, é afetado por certo autonomismo pós-industrial.

    Recomendo outro livro, de Raquel Gutiérrez, sobre o ciclo rebelde boliviano: “Los ritmos del Pachakuti. Levantamiento y movilización en Bolivia (2000-2005)”. Também de enfoque heterodoxo, nos oferece uma crítica à institucionalização da luta que, em última instância, impediu os avanços de insubordinação e autonomia em âmbitos maiores que o local, barrial.

    Neste meu artigo, dou prioridade não às lutas sociais em si, mas à El Alto dos dias ordinários, onde o mundo do trabalho volta a ganhar seu espaço e onde as relações sociais comunitárias são a cada momento subsumidas pelo capital e pelo Estado. O altenho continua sendo guerreiro, já não com a pepita de dinamite na mão, mas trabalhando em dois ou três lugares distintos por dia (no comércio, na oficina doméstica, etc) para manter a família que acaba de migrar do campo. É um enfoque que pouco se tem visto sobre El Alto ou Bolívia, pois muito se tem analisado sobre os momentos extraordinários de enfrentamento direto. É certo que a lógica comunitária continua no dia-a-dia comum, no bairro e nas próprias organizações, mas já não com as cores que nos pintaram durante a “moda literária” sobre El Alto/Bolívia.

    Grande abraço,
    Bruno

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