Confraria da Negritude

23 de Setembro de 2010

Os membros da Confraria da Negritude, um projecto de cidadania independente contra o racismo na Ilha, advertiram o sindicato único, Central de Trabalhadores de Cuba (CTC, controlado pelo governo), sobre a possibilidade de a discriminação existente no país determinar a sorte de muitos trabalhadores negros no processo de despedimentos massivos que se está a iniciar.

Numa carta dirigida ao Secretariado Nacional da CTC, o engenheiro Norberto Mesa Carbonell e os investigadores e escritores de temas raciais Tato Quiñones e Tomás Fernández Robaina, porta-vozes da Confraria, afirmaram que o projecto se irá manter “alerta” para eventuais injustiças e apelaram a “cada trabalhadora e cada trabalhador que durante este processo de redução dos efectivos possam ser vítimas da acção discriminatória de cariz racista, para que não a aceitem passivamente e estejam dispostos a lutar apropriadamente em defesa do seu melhor direito laboral”.

A Confraria assinalou que uma das esferas em que “mais nitidamente” se mostra a acção do racismo em Cuba é a laboral.

Mencionou estudos realizados por investigadores oficialistas “que demonstram as dificuldades que encontram as pessoas não brancas para acederem aos postos de trabalho que têm vantagens extra-salariais, que implicam algum tipo de privilégio”.

“Esta situação torna-se evidente para quem quer que faça uma observação apropriada entre os trabalhadores e as trabalhadoras de centros (…) tais como hoteis para o turismo internacional, lojas em que se capta moeda estrangeira, empresas de capital misto, grandes empresas cubanas, entidades onde se viaja para o estrangeiro, certas instituições culturais e académicas, etc.”, enumerou a Confraria.

É dada como exemplo uma restruturação do pessoal feita no Hotel Habana Libre em 1994, que qualifica de “limpeza étnica”, sem dar mais detalhes. Esse facto deixou claro que “para as pessoas não brancas é muito mais difícil manterem-se nos empregos que têm privilégios após terem conseguido ter acesso aos mesmos”, afirmou o projecto.

“Pode-se afirmar que, durante os últimos dois decénios, as manifestações de discriminação racial estiveram claramente presentes no campo laboral, com uma forte incidência na vida social cubana. Isso aconteceu aos olhos e com conhecimento da maioria dos cubanos, sem que tal situação tenha recebido a merecida condenação e o enfrentamento apropriado por parte da Central de Trabalhadores de Cuba”, denunciou a Confraria.

Quanto ao processo que se inicia, e que deve levar ao despedimento de 500.000 trabalhadores estatais em seis meses, citou palavras do general Raúl Castro que, em discurso perante a Assembleia Nacional Popular no passado dia 1 de agosto, disse que “a estrita observância do princípio de idoneidade demonstrada na hora de determinar que mais tem direito a ocupar um posto deve contribuir para evitar qualquer manifestação de favoritismo, assim como de discriminação de género ou de outro tipo, as quais devem ser enfrentadas com toda a firmeza”.

Para os porta-vozes da Confraria, tais palavras “refletem” o “convencimento cabal” do governante “das injustiças que podem acompanhar este processo”, que consideram “indispensável para propiciar a sua descolagem económica”.

O general não se referiu directamente à discriminação pela raça “mas, sabendo do alto nível que tem o preconceito racial entre os cubanos, é de prever que a intencionalidade racial vai mostrar as suas orelhas peludas, indefectivelmente”, advertiram.

Por outro lado, recordaram à CTC o seu Pronunciamento do passado 13 de setembro, no qual o sindicato único disse estar comprometido com “a mais estrita observância e aplicação do princípio de idoneidade demonstrada na hora de determinar que mais tem direito a ocupar um posto, assim como a transparência em tudo o que tiver de ser feito”.

É um compromisso de cujo cumprimento “a CTC e os sindicatos não podem vangloriar-se (…) até agora”, criticaram os activistas. “Referimo-nos ao enfrentamento apropriado das manifestações de discriminação racial na esfera laboral, de forma pública e explícita (…) Poderão fazê-lo de facto se não mudarem a sua visão ingénua, subordinada à orientação de que ‘em Cuba não existe discriminação racial’?”, perguntaram, e instaram a CTC a cumprir o prometido.

Segundo os seus membros, a Confraria da Negritude é “um projecto de cidadania de activismo social (…) que tem, entre os seus propósitos, a promoção da reflexão e o debate em torno da existência da discriminação racial” na “sociedade socialista” da Ilha.

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