Moção de apoio a Cesare Battisti

A gestão “em luta!” do Diretório Central dos estudantes da Unifesp DCE – Unifesp, manifesta seu apoio ao pedido de Refúgio Político ao CONARE, em que é requerente CESARE BATTISTI. Para melhor justificar as razões que levam este colegiado a compreender que esta é a posição que melhor se alinha com os preceitos do Direito Internacional Público e com os atos multilaterais de Direitos Humanos, faz-se necessário resgatar as circunstâncias histórico-políticas das quais emergiu este caso reconhecidamente complexo: 

1. No contexto bipolar da Guerra Fria, Cesare Battisti, então com menos de 20 anos de idade, engajou-se na década de 70 na militância política da esquerda Italiana; 

2. É reconhecido como fato histórico que o Estado Italiano exercia um papel persecutório a militantes de esquerda. Francesco Cossiga, ex-Ministro do Interior e Ex-Primeiro Ministro da Itália, durante esse período, foi ferrenho opositor das esquerdas. Décadas depois, Cossiga provocaria “a hostilidade do establisment político e da OTAN ao tornar pública a existência da Operação Gladio e seu papel nessa organização(…)”. 

3. “Foi apurado que os serviços secretos norte-americanos e da OTAN realizaram atividades terroristas “sob falsa bandeira”, causando numerosas vítimas entre a população civil. O objetivo era culpar os grupos de esquerda pelos atos de terror, a fim de incitar a opinião pública contra os comunistas e assim justificar medidas de exceção, por parte do Estado.” Era a implantação da “Estratégia da tensão”. Nesse contexto, de 1969 a 1984, ocorreram diversos atentados na Itália incluídos na estratégia da tensão; 

4. Foram editados vários instrumentos normativos de exceção: a Lei Reale, que dá poderes à polícia para que efetue buscas, e a prisão sem mandado judicial apenas por suspeição; a Lei Cossiga, que ampliou para 11 anos a prisão preventiva em casos de subversão, e a criação do programa de arrependimento que conferia impunidade àqueles que “confessassem” e, na prática, incriminassem as pessoas que o Estado Italiano indicasse como culpados; o artigo 270 bis, do Código Penal Italiano que possibilita a acusação de pessoas por participação em movimentos subversivos sem que o Estado necessite provar o alegado; 

5. Neste contexto de excepcionalidade política e jurídica, Cesare Battisti foi preso em 1979 e condenado a uma pena de 12 anos e 10 meses, por participação em ações subversivas e contrárias à ordem do Estado. Não lhe foi imputado nenhum homicídio ou ação terrorista, e em sua sentença foi considerado um militante cujas atividades não redundaram em mortes ou em qualquer ato terrorista. Em 1981, Battisti fugiu da prisão. Esteve na França e fugiu para o México onde passou a viver como escritor e editor de uma revista; 

6. Em 1982, Pietro Mutti, fundador do PAC (Proletários Armados para o Comunismo), utiliza-se dos benefícios da Lei dos Arrependidos para imputar a Cesare Battisti a responsabilidade pelas atividades do grupo; 

7. A partir da Doutrina Mitterrand, que garantia o asilo e a não extradição de perseguidos políticos, Battisti solicitou e obteve asilo na França. Lá constituiu família e continuou a escrever e a denunciar as ações perpetradas pela extrema-direita da Itália, durante os anos de chumbo. A Itália solicitou à França a extradição de Cesare Battisti. O pedido foi denegado; 

8. Já com cidadania francesa, Cesare Battisti teve novo pedido de extradição feito pelo governo de Silvio Berlusconi, sob o argumento de que havia sido condenado à prisão perpétua na Itália e à revelia, por homicídios que teria praticado quando integrava o grupo de ações armadas; 

9.
A imprensa Italiana noticiou que o Governo Francês teria trocado a extradição dos refugiados políticos italianos pelo voto da Itália no Tratado Constitucional Europeu, pela autorização de que a TGV operasse no trecho Lyon-Turim e pela aquisição de Airbus pela Itália. 

10. O segundo pedido de extradição foi deferido e, com receio de vir a ser morto nas prisões italianas, Cesare Battisti fugiu para o Brasil. 

11. Atualmente responde a Processo de Extradição junto ao STF.

Compreende-se que o pedido de extradição de CESARE BATTISTI rompe com todo o garantismo penal. 

A Legislação Brasileira é clara quando normatiza a extradição, tal qual o faz no Estatuto do Estrangeiro (Lei nº 6.815/80), artigo 77, incisos III e VII, in verbis: 

“Não se concederá a extradição quando: 
(…) 
III – O Brasil for competente, segundo suas leis, para julgar o crime imputado ao extraditando; 
(…) 
VII – o fato constituir crime político”;(O grifo é nosso) 

A Carta Magna Brasileira veda a extradição motivada por crimes políticos e estatui que, neste país não haverá penas de morte ou de caráter perpétuo (art. 5º, XLVII). Tal reciprocidade não se encontra no Tratado de Extradição estabelecido entre as Repúblicas do Brasil e da Itália e objeto do Decreto nº 863, de 09 de Julho de 1993. 

Recentemente, o posicionamento do então Ministro da Justiça, Clemente Mastella, comprova a pretensão da Itália em manter em cárcere perpétuo o escritor Cesare Battisti. A confirmação é publica e consta da edição de 11/10/2007, às 19h32min, do jornal eletrônico il Giornale.it. Nele, Mastella explica que sua afirmação às autoridades brasileiras de que Battisti não seria penalizado com pena perpétua tratava-se, em verdade, de um estratagema para garantir a extradição do mesmo. A matéria noticia que o Ministro Italiano asseverou que Cesare não receberia nenhum benefício penitenciário. 

Os crimes contra a humanidade, terrorismo e tortura, sábia e prudentemente têm sido julgados pelo Tribunal Penal Internacional. Justifica-se tal prudência capitaneada pelo Direito Internacional Público, face aos conflitos entre as forças internas dos países. 

Desse modo, entendemos que, em razão do tempo e do contexto histórico em que o senhor CESARE BATTISTI se encontrava, não se justifica mais a tentativa de lhe imputar prisão perpétua e, possivelmente, risco de morte dentro de cárceres italianos, sob o pretexto de se fazer justiça ou possível reparação social, histórica e moral naquele País, até porquê a princípio foi julgado e condenado por crime de subversão e não de terrorismo ou homicídio. A acusação posterior de homicídio adveio após sua fuga para o México e a utilização das benesses da Lei dos Arrependidos por Pedro Mutti, ex-chefe da organização na qual Battisti militara. 

Assim, a gestão “em luta!” do Diretório Central de estudantes da Universidade Federal de São Paulo – DCE – Unifesp, confia na avaliação prudente, serena e racional do CONARE, composto de pessoas públicas com larga experiência em questões dessa natureza. Sem dúvida, saberão agir à revelia das paixões ideológicas e subjetivas latentes no pedido de extradição, bem como possíveis interesses políticos de ocasião, e decidirá sob o manto dos preceitos constitucionais, dos princípios e tratados internacionais dos direitos humanos e da racionalidade jurídica.

Diretório Central dos Estudantes
Universidade Federal de São Paulo

Gestão “Em luta” 2010/11

 

Rua Pedro de Toledo, 840
Tel.: 5576-4253

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