Somos contra ou a favor dos Black Blocs?

Somos educados desde cedo a enxergar o mundo como algo chapado, achatado, como uma moeda. Tudo teria apenas dois lados: “bom ou ruim”, “bem e mal’, “a favor ou contra”. Longe de qualquer relativismo, em geral as coisas são bem mais complicadas que isso: elas possuem características diversas, e por vezes conflitantes; elas se situam em um dado contexto, elas emergem de algum lugar e num certo momento, elas mudam com o tempo e com as diferentes localidades, e assim por diante.

Com a nova afirmação dos Black Bloc – que há anos tiveram um papel destacado nos movimentos antiglobalização -, e com a radicalização dos protestos de rua nas últimas semanas, surgiu uma nova onda de espanto e de respostas rápidas e fáceis: “são vândalos”, “são a vanguarda da revolução”; “fazem o jogo da direita”; “tem que quebrar tudo mesmo”.

A gente confessa que não conhece o modo como se organizam ou deixam de se organizar os Black Blocs. E sabemos que esse nome passou a rotular os mais diversos grupos, acabando com qualquer possibilidade de uma compreensão unitária. Podemos falar aqui apenas de questões táticas: com a multiplicação das manifestações de rua, e com a brutal repressão policial e midiática que se acirra desde junho em diversas cidades do país, surgiram táticas de enfrentamento, de autodefesa e de ataque às forças do Estado e aos símbolos do capital, como bancos e redes de TV. Táticas essas que se alimentam da revolta, sobretudo de jovens, contra as diversas formas de opressão e de exploração que movem o capitalismo.

Da nossa parte, na condição de um pequeno movimento popular autônomo, podemos simplesmente dizer que hoje essas táticas não nos servem. Tendo como objetivo o fortalecimento da classe trabalhadora contra esse sistema podre, que nos escraviza, nossos esforços se concentram na construção de experiências auto-organizativas duradouras, nos territórios onde agimos, e que passam pela luta direta, pela criação de laços de solidariedade de caráter classista, pelo combate ao clientelismo e ao populismo, pelo combate às hierarquias, ao individualismo, e assim por diante. Dessa perspectiva, o êxito e a radicalidade dessas tentativas se medem pela capacidade de multiplicar, desdobrar e aprofundar essas experiências.  Diferentemente do que acontece no centro da cidade, aqui o enfrentamento direto e imediato às forças policiais, por exemplo, nesse momento só nos enfraqueceria, pois as condições para isso não estão colocadas. Isso não quer dizer que num futuro próximo o conhecimento acumulado pelos Black Blocks e outros grupos não possa ser de grande importância em nossa caminhada.

Até mesmo porque o tempo está fechando, e se existem importantes potenciais na cultura de luta que tem se fortalecido nos últimos meses, também existe uma chance muito grande de tudo ir por água abaixo na base da porrada, da bala de borracha, das prisões, das perseguições, e do fortalecimento do terrorismo de Estado. Já são muitos os militantes presos, acusados de formação de quadrilha e coisa que o valha, somando-se aos milhares de outros presos políticos que lotam os presídios em todo o país, já que o processo de encarceramento em massa, que só se acelera, além de um negócio lucrativo, é sim uma estratégia política deliberada de contenção da classe trabalhadora e de afirmação da propriedade privada. Desse modo, todo preso é um preso político.

De todo modo, e assim chegamos finalmente ao ponto: pensando as organizações populares como um todo, estamos em frangalhos, e sem um esforço tremendo em sentido contrário, corremos um sério risco de sermos esmagados. Esperamos que os Black Blocks, e que todos os que os apoiam, e todos os que são contrários a eles estejam encarando esse quadro com a seriedade necessária. Do contrário, estamos todos lascados…

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