NÃO SAIREMOS DAS RUAS!

CONTRA A CRIMINALIZAÇÃO DOS PROTESTOS!

2014-03-10

NÃO SAIREMOS DAS RUAS!
CONTRA A CRIMINALIZAÇÃO DOS PROTESTOS!
CONTRA O AI-5 DA COPA E AS MEDIDAS REPRESSIVAS CONTRA OS MOVIMENTOS POPULARES!
CONTRA A VIOLÊNCIA DE ESTADO NAS FAVELAS E NAS RUAS!

O falecimento, no dia 10/02, do cinegrafista Santiago Ilídio Andrade, da TV Bandeirantes, foi uma tragédia lamentável que entristeceu a todos, jornalistas, manifestantes, defensores dos Direitos Humanos, etc. As circunstâncias do acidente que causou sua morte ainda estão cercadas de dúvidas e demandam muitos esclarecimentos, principalmente tendo em vista o estranho comportamento do advogado que se apresentou como defensor dos dois acusados, o Sr. Jonas Tadeu Nunes, que já teve sua conduta questionada por vários advogados e juristas.

Seja como for, temos certeza que EM NENHUMA HIPÓTESE o acidente e a morte de Santiago podem caracterizar alguma atitude sistemática de agressão a jornalistas por parte dos manifestantes que, desde junho do ano passado, têm tomado as ruas do país em luta por justiça, direitos e igualdade. Por outro lado, não vimos por parte do Estado (incluindo os governos federal, estaduais e municipais) e dos grandes monopólios da imprensa o mesmo empenho em lamentar e cobrar elucidação sobre as diversas vítimas, inclusive fatais (um número incerto que pode passar de uma dezena, vejam por exemplo a linha do tempo), da brutal repressão policial aos protestos. Em relação aos profissionais da imprensa, aliás, o que é INEGÁVEL e COMPROVADO é a truculência e a perseguição policial, que voltou a se repetir em toda sua amplitude no protesto do último dia 22/02 em São Paulo, onde jornalistas foram espancados e presos mesmo depois de se identificarem. Segundo a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), contando esses últimos, chegam a 57 os casos de agressões e detenções de repórteres, fotógrafos e cinegrafistas cometidos por policiais militares desde junho de 2013, somente em São Paulo. Dessas ocorrências, a maioria – 56% – foi deliberada, ou seja, o jornalista identificou-se como tal e mesmo assim foi agredido ou detido.

É, na verdade, repugnante que, longe de se entristecerem, magnatas da imprensa, empresários, políticos, juristas e militares reacionários tenham intimamente se alegrado com a morte de Santiago, e visto nesta tragédia a oportunidade para endurecer ainda mais a legislação e as medidas repressivas contra os protestos, visando não só a realização lucrativa da Copa do Mundo, mas sobretudo a destruição do movimento popular nas ruas, que depois de tantos anos de desmoralização, recobra a vontade e a coragem de desafiar o poder destes senhores, os únicos beneficiários da ordem social perversa, racista, desigual e opressiva que ainda impera no Brasil.

Além do PL 499/2013, a chamada “Lei Anti-Terrorismo”, várias leis já foram promulgadas e projetos de lei estão em tramitação alterando a definição de crimes (para torná-los mais abrangentes e com penas mais severas), criando novos crimes (como “terrorismo” e “atentado contra o sistema de transporte rodoviário”) e alterando o código de processo penal no sentido de facilitar ainda mais detenções, prisões e condenações por crimes que, de um modo ou de outro possam ser associados aos protestos e aos manifestantes. Trata-se, sem dúvida nenhuma, do mais abrangente endurecimento da legislação penal com objetivos políticos desde o início da chamada “transição da ditadura à democracia”, em meados dos anos 80 do século passado. E é muito simbólico e preocupante que isso aconteça às vésperas do 50o aniversário do golpe militar de 31/03/1964!

Nós da Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência, que acompanhamos há cerca de 10 anos a violência estatal sistemática e as verdadeiras atrocidades cometidas pelo Estado contra o povo negro, pobre, favelado e periférico do Brasil, nunca tivemos ilusão sobre o caráter “democrático e de direito” deste Estado. Não conseguimos ver democracia e direitos numa realidade dominada por chacinas, torturas, desaparecimentos forçados, execuções sumárias, encarceramento em massa, e impunidade dos agentes do Estado que cometem tantos crimes e violações. Por isso sempre colocamos que a mudança desta situação não virá das instituições, por mais que tenhamos valorosos aliados dentro delas, e sim da organização e da mobilização do povo.

Portanto, não tivemos nenhuma dúvida em apoiar e participar dos protestos e das manifestações desde que elas começaram no meio do ano passado. Para além de suas justas motivações gerais, melhores serviços públicos e condições de vida para a população, logo se tornaram protestos também contra a violenta repressão policial aos manifestantes. Isso permitiu a ligação das manifestações de junho e posteriores com toda a luta que há décadas as favelas e periferias travam contra a violência de Estado, muito mais assassina e brutal, que sofrem.

Somos solidários as manifestações e defendemos o direito dos manifestantes agredidos resistirem à arbitrariedade e à violência policial. Como muitos filósofos e juristas do mundo, apoiamos o DIREITO DE RESISTÊNCIA dos povos contra o Estado de exceção permanente que se constrói a partir da exacerbação da ideologia da “segurança pública”, que permite violações crescentes em todo o mundo. Como sempre afirmamos TERRORISTA É ESTEESTADO, que comete tantas violações e ainda é o principal responsável pela existência de redes de crime organizado. Como afirmou recentemente Hélio Luz, chefe da Polícia Civil no Rio entre 1995 e 1997, em entrevista ao Jornal Extra: “Uma coisa é fato: só existe crime no Rio de Janeiro com o consentimento da polícia. Ninguém pratica crime nessa cidade sem o acerto com o policial”.

Pensamos que, na sua prática de resistência ao arbítrio e à violência estatal, os movimentos populares devem seguir os exemplos de lutadores de justas rebeliões do passado, como o marinheiro João Cândido, líder da Revolta da Chibata em 1910, que mesmo anos depois de preso e condenado afirmava: “Eu sempre tive a vida exposta, sempre fui contra a violência. Assumi o comando da revolução com as condições tais de poupar vidas”.

No entanto, discordamos das afirmações que passaram a tratar como equivalentes a resistência às agressões e a brutalidade policial, infelizmente endossadas inclusive por personalidades e organizações identificadas com a defesa dos direitos humanos. Para nós, não há comparação entre a violência atroz, sistemática e indiscriminada do Estado, e a resistência popular, mesmo aquela mais ativa e direta. Não nos confundimos e sabemos perfeitamente de que lado estamos.

Por isso conclamamos todos a lutarem contra as medidas, previstas ou em curso, no sentido de criminalizarem os protestos e os movimentos populares. Mas, acima de tudo, conclamamos todas e todos a PERMANECERMOS NAS RUAS NO MANIFESTANDO seja de acordo com leis democráticas, seja contra leis arbitrárias que abrem caminho para novos fascismos. Os protestos do ano passado acenderam uma forte chama de esperança que tem iluminado quem luta por justiça e liberdade no Brasil. Não deixaremos que essa chama seja apagada!

Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência
Março de 2014

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