Essa aproximação sem intimidade nos deixa sempre em maus lençóis: perturba-me a invasão do espaço criado pela minha individualidade burguesa. Por Arthur

Leia a primeira carta de Helo a Arthur aqui.

Ouro Preto, 08 de abril de 2016

Querida Helo,

Não há dúvida de que o teatro é o melhor lugar da face da terra. Vivo com ele momentos singulares. Sim, é assim que vivo. Do mesmo modo que a nossa luta se inclina ao desfrute hipócrita, a hipocrisia – entendida como atriz – principia em mim a paixão.

Não te disse certa vez de uma moça que se interessou e tinha acabado de entrar no coletivo? Pedi notícias dela há pouco. Me disseram que tinha se tornado uma grande atriz. Semana passada a encontrei por acaso indo para o Espaço.

Puxei conversa e ela me contou a sua história, que me impressionou grandemente. Em pouco tempo estávamos laçados e inclinados um ao outro.

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São revezes do desejo que lancinante se transforma num piscar em paixão. Perguntei, então, o que iria fazer no Espaço ao que ela respondeu prontamente: “levarei esse figurino para o ensaio de nossa nova tentativa!”.

Não me compreendi: estava um pouco agastado pelos desencontros amorosos; os amores descartáveis; durante oito anos, vivi criando personagens devassas, não havia tréguas; agora, meu desejo parecia refluir, talvez estivesse mofando, sem critério; cedi à atração da moça.

Que podia dizer a ela? Tampouco me interessava falar dos últimos acontecimentos políticos. Desci a rua com Carla e parei frente ao restaurante convidando-a para entrar. Para me manter atraente, apesar da surpresa pela tácita aceitação do convite, seriam necessárias umas duas doses de gim.

Com ele eu haveria de esquecer, esquecer absolutamente o que se passa nesse mundo enfadonho: com minha botina descorada e a camisa empolada, não tinha, em verdade, nenhum atrativo a não ser a fala.

Meus companheiros me aceitavam tal como eu era. Mas Carla era uma atriz de destaque, onde a vaidade cuida de todo o resto, e com certeza já havia notado meu desleixo perplexo. “Eu nunca sou desleixado!”, pensei.

Certamente, o sorriso de Carla foi o que me atraiu. Ela então se aproximou demasiadamente, o que detesto. Essa aproximação sem intimidade nos deixa sempre em maus lençóis: perturba-me a invasão do espaço criado pela minha individualidade burguesa.

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“Que vai tomar?”, perguntou ela, “Uma cerveja?”.

“Vá, pode ser uma Skol? Ah! E um gim por favor!”, disse ao garçom.

O restaurante estava repleto de estudantes e moças mal vestidas. A fumaça, os corpos suados, o sabor enraizado de gim, me levaram rapidamente à lona. Senti-me feliz por estar com aquela formosa e inteligente moça.

Carla passara dois anos na Itália, o país do vinho e da sensualidade, o país onde as paredes guardam as marcas dos tempos luminosos em que se acreditava que a arte poderia nos emancipar. Interroguei-a avidamente.

Ela respondia com tranquilidade, enquanto eu tomava minha segunda dose de gim. Pedimos duas porções – batatas e picanha – e sem escrúpulos comi com gosto inebriado pelo sorriso de Carla e pela sua simplicidade angelical.

Por sua vez, Carla me fazia falar: era difícil responder suas perguntas, tão diretas. Se eu tentava reencontrar beleza no meu cotidiano (como alimentar minha cachorra, o odor do pão de queijo no forno, o silêncio sendo interrompido por minha companheira), ela me interrompia como se isso a incomodasse.

Ouvia tudo com atenção, sentia-se que as palavras a penetravam profundamente e que algumas trivialidades do meu cotidiano a feriam. Mas era preciso que eu não mentisse, não era justo usar o ardil da mentira só para tê-la gemendo em meu colo.

Pedia-me informações práticas: como se fazia para entrar no mestrado, quais eram os processos? Reclamava também dos tratos que os artistas sofrem no Brasil. Apliquei-me em responder suas questões e compartilhar de suas angústias e críticas.

Tudo sem êxito: tudo fora pior, é assim que se dá com uma alma artística: primeiro, a torrente de reclamações para em seguida o enternecimento depressivo sobre a própria condição.

5650Como falar de arte? As palavras soavam patéticas e bêbadas na minha boca, muito divertidas para o problema levantado pela bela atriz. Por nada no mundo eu queria que esse assunto descambasse para o posicionamento político.

Todavia, lá onde negamos o assunto é onde ele parece mais doce. Eu compreendia que Carla se aborrecesse com minha resistência para assuntos sérios e sua paz que se devolve com um copo de gim, sem nos devolver o sentido de viver.

Agora, precisava de calor, de corpo: tinha vontade, falar de outra coisa qualquer. Carla acabava de se lançar, sem ser provocada, numa polêmica com alguns estudantes que estavam na mesa em frente e elevou o tom de voz para que fosse ouvida.

Eu só desejava que ela encerrasse logo o assunto. Nada mais enfadonho do que discutir os descompassos da crise política ou se o PT tem ou não culpa pelos golpes que está sofrendo da extrema-direita.

“Sabe o que é pior”, disse-me ela, com voz estridente, “é que todo mundo, inclusive parte dos estudantes, parece aprovar. Por outro lado, ver Irene e as pessoas do Espaço marchando com a Frente envergonha qualquer um que lute pelo socialismo!”.

“Irene não vai para os atos em apoio ao governo”, disse eu, para acalmá-la, “Busca criar um movimento independente para os tempos que virão!”.

“Ela me disse. Mas, deixou bem claro que não pretende trabalhar contra a Frente. Ao lado deles, não contra eles!”, disse Carla com tristeza na voz.

“Não acha que precisamos ganhar a partida contra a direita raivosa e, se a esquerda dividir-se, nós não perderemos?”

“A esquerda!”, ironizou Carla, com um gesto autoritário, “Já perdemos moço. Não quero me aprofundar nesse assunto, mesmo porque aqueles garotos começam a olhar com raiva para gente!”.

“Tudo isso porque ouviu o debate deles?”, ironizei ao que ela retrucou:

“Tudo isso porque não suporto mais essas questões!”.

Encomendou mais uma garrafa de cerveja. Não, naquele momento eu não tinha vontade de dormir com ela, nem com mais ninguém; minha libido se achava desviada, há muito tempo, na produção de meu futuro famoso livro.

Por que gozo lhe perturbaria? Aliás, no momento em que um sorriso embriagado se faz, a concretização do sexo parece improvável. Muitas vezes eu me admirara de que Thiago se entregasse tão facilmente a desconhecidas.

Entre meu corpo solitário e a moça linda que bebia solitariamente na minha frente parecia não haver a menor ligação. Imaginá-la nua em meus braços era tão improvável como supor que nós poderíamos ganhar algo na entediante luta entre “coxinhas” e “petralhas”.

“É absurdo que essa noite se finde sem nada acontecer, tudo passa. É melhor ser esquecida do que ser lembrada com dor. Se amanhã morremos deixaremos quantas oportunidades passarem hoje?”, me interrogou Carla com olhar de gato.

Sua imperiosa fala me certificava de que, afinal de contas, eu não era um rapaz de se jogar fora. Tornava-me lógico acreditar que eu era, a despeito de todas proibições por uma vida ascética, desejável, pois ela me desejava.

Thiago sustentava a hipótese de que não havia diferenças substanciais entre o crime e o pecado, ambos são teologicamente sustentados por nossa consciência de culpa; talvez estivesse certo.

6052Se eu desabotoasse essa consciência culpada, que aconteceria? E, se não me livrasse dessa consciência, me livraria um dia? “Minha vida é muito louca”, eu me dizia isso em pensamentos; mas contra todos os pensamentos a volúpia retomava minha libido. “Então… temos que resolver isso, se essa noite for esquecida que tenha pelo menos uma lembrança para se esquecer”, disse-lhe bruscamente, sem me atentar.

“Oprê! Que bela resposta!”, disse ela com animação e sensualidade mordiscando a beirada do copo. Pegou em minhas mãos que prontamente cederam e alisou-as com displicência.

“Gostaria de uma água. Receio que bebi demais”.

“Um italiano pediria a saideira”, disse ela sorrindo, “Mas tem razão, é horrível perder de vez o senso. Está ficando tarde e seria bom você ir dormir em minha casa, já que com essa escuridão a estrada para os sítios está um breu!”.

Pediu a água e a conta e seguiu-se um silêncio sorridente e embriagado. Eu resolvi ir até onde aquele delírio levaria, em grande parte devido a ter simpatizado com ela, devido a esse precário elo que oscilava entre eu, a beleza e agudez de raciocínio da atriz.

“Vamos para minha casa!”, ordenou logo que a conta foi paga e que a garrafa de água foi esvaziada. Novamente, Vanessa dormiria sem mim. Mas, esse pensamento passou, pois as estradas até o sitio realmente eram cansativas e, porque não, perigosas.

A casa era colonial, como tudo nessa cidade, e estava cheia de figurinos espalhados, coberta de roupas e livros. Sobre um sofá descansava um cartaz de alguma apresentação cênica já inexistente.

Primeiro observei tudo com calma, estava tímido embora excitado. Ela se aproximou e me agarrou, senti sobre meus lábios uma boca agridoce satisfeita. Sim, era possível que sua mocidade se dobrasse aos meus parcos encantos.

Alguma coisa me acontecia: um sentimento de vingança. Fechei os olhos, penetrei numa reflexão nauseante tão pesada como a realidade: “a juventude de Carla me presta homenagens”, pensei. Ouvi sua voz:

“Parece que o rapaz está tímido? Não te farei mal. Vou te comer, mas não farei você perder a salvação!”.

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Eu não podia fugir. Meu corpo de saída não reagiu, estava desacostumado. Ela me guiou para seu quarto, agarrei-me a ela como se fosse minha última esperança. Suas mãos abriram minha camisa, acariciavam minha barriga, e eu me abandonei aos seus toques.

Empurrou-me na cama com doce violência e se lançou em cima de mim. Por instantes, caía horizontalmente no meu abismo. Ia entre um beijo e outro esquecendo qualquer fio de racionalidade.

Com beijos ofegantes abriu-me o cinto e expus a sua curiosidade um membro ainda indiferente. Sua boca excitou meu abdômen, arrastou-se sobre minha barriga e desceu até meu pau.

Fechei os olhos à pressa. Me ocultei inteiramente na sensação prazerosa que ela arrancava de meu corpo: um prazer solitário, um pouco vazio e narcísico. No centro de meu corpo um membro se erguia com suas mil funções.

Ela olhou para mim. Com um sorriso escandaloso, seu olhar me animou ainda mais. Com autoridade, subitamente veio até mim, me beijou e enfiou meu pau em sua buceta que já estava caudalosa.

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Sentia-a deslizar em mim. Carla, imediatamente, começou a proferir palavras desconexas. Meu olhar estava completamente vazio, eu seria incapaz de embarcar em seu gozo? Ela se calou por um instante e disse:

“Você não está gostando? Vamos lá, relaxe e se abandone!”, dizia sacolejando freneticamente em cima de mim. “Diga que está bom, diga!”.

Fiz-lhe a vontade. Adivinhava que aquele enredo sujo a fazia delirar e, preocupado com sua diversão, passei a lhe elogiar e dizer o quanto era gostoso comê-la. “Você gosta disso? Hein? Bate na minha bunda!”.

Quando sua respiração se tornou mais forte, escorreguei para os fundos de minha alma e contemplei a beleza do sexo. Era duro arrancar-me daquela sensação, que se colava fortemente ao objetivo do orgasmo.

Duas mônadas indiferentes. Nosso sexo se expressava como a mais original trivialidade do mundo burguês. Um antagonismo dependente cujo fim do prazer depende sempre mais do Eu que do Outro, o meu gozar era o reflexo narcísico do meu eu.

Virei-a de quatro e batendo em sua bunda gozamos abruptamente. O torpor gerado pela bebida e pelo sexo nos tomou. Adormecemos como crianças embebidas pela brincadeira. Essa noite subsiste no meu coração, inacabada, absurda e sem salvação.

No outro dia, nos despedimos com ternura e Carla solicitou a minha retomada urgente com o teatro, pois o coletivo quer fazer Navalha na Carne de Plinio Marcos. Quero retomar o teatro, com certo frio na barriga, pois não quero despertar ou me despertar para a paixão.

Helo, gostei de saber das novidades e de verdade fiquei feliz que manifestasse saudades de mim. Nossa amizade transcende quase tudo que conheço em termos de vivencia. Existência. E digo a verdade.

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Com relações tão coisificadas no entorno, a nossa relação se afigura como simulacro de verdade perdida, e creio que nosso segredo, – o segredo que nos alimenta a alma – está na dimensão de um outro tempo.

Parece-me que com a paixão conseguimos interromper aparentemente a sangria do tempo capitalista e, igualmente parece-me que nos revolvemos em outra dimensão, com outra direção, retomando o tempo novamente para nós. Veja como a sua relação com Carol se desenvolve.

Com a paixão é como se voltássemos para um tempo sacro e digo isso ao pé da letra. O significado de sacro se relaciona com os eventos sagrados ou profanos que tinham formas pré-capitalista. Existe na paixão uma outra dimensão espaço-temporal.

Dimensão onde resolve-se a questão do sentimento, que mais tem de instintivo do que de racional. Sabemos que no capitalismo o tempo é uma forma de dominação social que nasce como parte fundamental da mesma abstração engendrada pelo capital.

Em nossa sociedade o tempo se torna uma categoria autônoma e nós, meros mortais, não temos mais como controlá-lo, pois, ele está nas mãos do deus capital. É claro que existe um tempo concreto onde a história se efetiva, mas também temos um tempo abstrato onde as “revoluções” no interior do capital são efetivadas para transformar tudo e nada mudar.

O tempo abstrato é um tempo que reduz nossa existência numa uniformidade continua e homogênea. Tempo que se torna uma variável independente e que arrasta todas as relações sociais para seu interior e se mantém, a despeito delas, independente.

O que não nos é permitido perceber é que essa forma de tempo se relaciona como a própria organização do tempo social.

Há um filme interessante que esqueci o nome – talvez, já tenhas assistido – em que dois amigos compram duas motos – Harley Davidson – e decidem viajar os EUA inteiro.

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Numa das imagens um deles estende o relógio e proclama sua liberdade ao quebrá-lo. Nada mais parvo. Não é o relógio que inicia o tempo abstrato é exatamente o contrário: o tempo abstrato funda o relógio.

Dessa forma, podemos aprender algo com essa parábola feita em alguma agência de publicidade; quebrar ou não o relógio, ou mesmo tentar manter formas de sociabilidade fora do capital, estando sobre a égide da produção e reprodução capitalista, é frívolo.

O tempo ganha contornos de controle e dominação social na transição que há entre uma divisão eclesiástica para outra secular totalmente atrelada ao surgimento da velha burguesia urbana.

No entanto, não se pode reduzir sua origem à passagem da vida rural para urbana, ou melhor dizendo, não se pode determinar sua fundamentação por meio de categorias puramente sociológicas.

O tempo se torna constante e uniforme precisamente quando uma forma social totalizadora passa a existir e o reduz a uma abstração que tudo governa. Tristes tempos já dizia a velha canção.

É preciso dizer que o tempo, tal como conhecemos hoje, está intimamente ligado as relações sociais produzidas pela forma-mercadoria.

Por que será que o dia começa a noite? Isto é, como se originou a hora zero? Ora, isso nada mais é que a inclusão e dominação efetivada por um tempo abstrato independente de nossa percepção sobre o nascer do dia.

Essa abstração do tempo relacionada a nova estrutura engendrada pela produção capitalista expressa evidentemente uma forma de domínio.

Naturalmente, a paixão rompe pouco ou nada com essa estrutura, mas quando somos por ela tomados, ludibriamos o tempo dominador e obtuso por algum tempo. Há algo de rebeldia e revolta na paixão. Demonstrada pelo meu gozo com Carla e o teu com Carol.

Não ria. Falei demais. Mas, essa discussão sobre a invenção do tempo, trago comigo desde que paquerava Bergson ainda na graduação.

Tu sabes que é o tempo de trabalho que, transformado numa norma temporal, nos submete e se sobrepõe as nossas próprias ações e vontades, Bergson “não sabia” (Risos – duvido que não).

Afora alguns problemas, não se pode esquecer que foi Bergson – depois de Hegel naturalmente – que percebeu que o decurso do tempo é o elemento que afronta a subjetividade por estar totalmente descolado dela.

Mais tarde o genial jovem Lukács irá retomar esse problema, como ficou expresso na minha dissertação, quando weberianamente ele se lembra da segunda natureza. Hegel é mais belo e sofisticado, sabe que é no tempo que se expressa o Espírito.

Ademais, com o avanço técnico o tempo se torna independente inclusive de todas as atividades e se subtrai a grandeza do valor criado pelo capital.

Por isso, o dispêndio do trabalho agora passa a ser medido por uma variável independente, qual seja: o tempo abstrato. Está tudo em Marx e pasmém… os caras não viram até pouco tempo.

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A cada novo nível de produtividade se modifica e se determina um novo nível básico de produção e se redefine o tempo abstrato com uma dinâmica revolucionária permanente no interior do modo de produção. Por isso, a produtividade modifica e determina a nova relação do tempo abstrato.

Essa determinação nova não pode ser expressa abstratamente, pois parte de uma concretude e desenvolvimento causados pela própria produtividade que impulsiona o movimento cumulativo do saber, isto é, do desenvolvimento técnico.

Nesse último está o tempo concreto que impulsiona o desenvolvimento histórico. Há entre tempo abstrato e tempo concreto uma dialética cuja Aufhebung (superação) impõe um desenvolvimento direcional e cumulativo.

Espero que não tenha dormido ainda, mas é preciso ainda lembrar que na produção capitalista temos uma forma de medida temporal abstrata efetivada pelo dispêndio de trabalho cuja medida temporal abstrata permanece constante, mas que oculta um conteúdo social que se modifica e está em constante movimento. Com efeito, a medida temporal é e não é constante.

A hora de trabalho social permanece constante como medida da criação do valor que será realizado futuramente como valor-de-troca.

Entretanto, em termos concretos, a medida temporal dessa hora de trabalho social muda conforme o incremento da produtividade.

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O tempo de trabalho socialmente necessário para produção da mercadoria diminui com o aumento da produtividade. Por isso, a produtividade – entendida como tempo concreto – redefine o tempo abstrato.

Trabalho concreto/abstrato e tempo concreto/abstrato formam, portanto, os pares reciprocamente antagônicos que moldam o destino histórico dos miseráveis seres que são governados pelo capitalismo (nós).

O que se tem aí, é a nítida concepção deixada por Marx de que, na interação do trabalho concreto e o abstrato, há uma característica fundamental em que o capital expressa uma forma de tempo concreto que expressa o movimento do tempo abstrato.

É somente acabando com essa forma de produção que o tempo deixará de ser alheio aos nossos interesses porque em sua forma atual ele é autônomo e segue o percurso da sociedade dominada pelo capital.

Alguns grandes literatos deram conta dessa questão, por exemplo, como podemos pensar a categoria da durée bergsoniana em relação a Proust? Tudo se torna mais essencial e substancial por meio da memória.

Nossos momentos nos escapam no tempo presente para, já no passado, serem lembrados com nostalgia e emoção. Por exemplo, a primeira vez que te beijei: guardo teu cheiro, teu gosto de cerveja e fumo nos lábios.

É tudo tão substancial. O agora do presente, como dizia Hegel, é a verdade do passado e a verdade do futuro. Por isso, o agora é o ser do tempo.

Nesse momento morro de saudades tuas e meu tesão só aumenta sabendo que no feriado desse mês visitará a tia Claudia. Naturalmente te procurarei e transaremos palavras conversando sobre corpos.

Vejo até que andas caprichando na escrita, adorei o relato da Carol e cuidado com as impertinências do mundo acadêmico e com as seitas que fatalmente entramos para descobrir que a vida não tem sentido algum.

Tem ainda algo engraçado: um fato inusitado me ocorreu tentando desconverter um menininho que entrou no PS[1]. Veja só com apenas 16 anos e sendo estragado por uma seita, absoluta tristeza.

Disse-lhe que não sirvo a partido e sim a revolução. Palavras fortes para despertar no coração do jovenzinho a ponta aguda e intransigente da dúvida. Somos sem dúvida grandes personagens esperando Godot.

Quando comecei a desconcertá-lo com minhas questões e provocações, ele decidiu me enfrentar e colocou a ditadura do proletariado como questão de salvação de seu centralismo demo(buro)crático. Eu já estava meio bêbado, mas levei a prosa adiante.

E isso tem em comum uma outra coisa que você não entendeu e que me mandou como proposta de discussão na carta anterior: Wilhelm Meister ou BildüngsRoman. Infelizmente não posso te enviar nada agora, mas ainda estou matutando na ideia e te respondo na próxima carta.
Morro de saudades.

Um enorme beijo de teu Arthur

Nota
[1] O autor da carta resolveu ocultar o partido do jovenzinho.

As imagens que ilustram esta carta são de Tom Poulton.

27 COMENTÁRIOS

  1. Só uma palavra, estou zonza até agora tentando compreender tudo que li. De sexo à Marx, de filosofia à pornochanchada, literatura bêbada e angustiada. Está nascendo um novo.

  2. “Há um filme interessante que esqueci o nome – talvez, já tenhas assistido – em que dois amigos compram duas motos – Harley Davidson – e decidem viajar os EUA inteiro.”
    Se o “filme interessante” for Easy Rider (1969) – em Pindorama, reintitulado Sem Destino -, caberia registrar o seu final, que emblematiza a banalização da violência: madeinusa, como a torta de maçã…

  3. Arthur
    A redefinição do tempo abstrato efetivada pela produtividade leva para um beco estreito, mas de dupla via. Primeiro a redefinição do tempo de produção da mercadoria (tempo concreto) diminui o valor de troca da mesma donde surge o preço. Segundo, há uma aumento proporcional do número de horas trabalhadas tendo em vista que a queda do valor de troca impõe um ritmo produtivo diferente que precisa aumentar quantitativamente e que, fatalmente, recairá nas costas do trabalhador, também de maneira dupla, aumento da carga horária e diminuição do valor de mão de obra.
    Tudo bem! entendido essa lógica e colocada ela agora nos tempos de precarização, ou melhor, dos tempos atuais vê-se o porquê trabalha-se mais e pior, mesmo havendo um excesso de riqueza e um desenvolvimento técnico sem precedentes.
    O tempo é deveras fundamental na produção capitalista! Boa sacada… Boa carta!

  4. Cena 1:

    – “Vá, pode ser uma Skol? Ah! E um gim por favor!”, disse fulano da mesa 4.

    Mesa 16: mais uma Bohemia!

    Garçom: Sim, chefia!

    Mesa 07: uma caipirinha de saquê e uma dose de uísque!

    Garçom: Sim, patrão!

    Mesa 23: Porra Garçom! Pedi uma porção de salame já faz meia hora!

    Garçom: Oh, meu comandante! Tá saindo agorinha!

    Tempo: meia-noite… uma hora… duas horas… três horas, o atendimento termina… mas não a jornada: limpa mesa, guarda mesa, limpa chão, limpa banheiro… e no banheiro alagado de mijo, lê-se na parede escrito com merda: abaixo o capitalismo, viva a revolução!… limpa o abaixo o capitalismo e, enfim, termina a jornada do garçom.

    O garçom vai para o ponto. A madrugada é fria, sempre fria. São duas horas até em casa. Quando chegar, sua mulher já terá ido para o trabalho e os filhos para a escola. Os ônibus começam a circular às cinco. São quatro da manhã.

    Cena 2:

    São quatro da manhã. O motorista do ônibus pula da cama assustado. Perdeu a hora. Desce correndo o morrinho da história de milhões de brasileiros sem sexo, sem raça, sem cor. Quase chega atrasado. Começa a circular às cinco da manhã.

    Motorista: cobrador, você viu essa? Os playboy da USP agora querem transporte a noite toda. Diz que é pra ter cultura…

    Cobrador: É? E são eles que vão ficar a madrugada toda trabalhando nos busão? Queria ver quanto tempo eles iam querer cultura se tivessem que trabalhar todo dia, oito, nove, dez horas…

    O garçom, em pé no ônibus já lotado, que a tudo ouvia diz:

    – E ainda escrevem com merda: abaixo o capitalismo, viva a revolução!

    E… corta!

  5. MAIS&MELHORES CENAS DELETADAS
    Embora (ou talvez por…) ‘deletadas’, as cenas são literariamente deleitáveis. Já o epistolário pseudoerótico&sadomasô é mera chulice, além(?) de permissivo, catártico e recuperador.

  6. o corte do diretor acima só tem um problema. A cena do bar se passa em Ouro Preto. Que esse diretor pense que os motoristas de ônibus de Ouro Preto discutam, em uma cena de realismo terceiro-mundista, o que querem os playboys da USP me parece retratar mais a fantasia de certos estudantes da USP do que o que possa ocorrer na vida de um trabalhador de Ouro Preto.

    Sem dúvidas, flâneuar entre as paixões físicas e intelectuais de estudantes dá melhor resultado do que montar um cena mal feita à la partido comunista dos anos 70 sobre o que pensam os trabalhadores verdadeiros a respeito da ultra-esquerda pequeno-burguesa.

  7. Na boa, não sei como o Passa Palavra é capaz de publicar algo tão pequeno burguês assim… é de admirar que um coletivo preocupado com as lutas e em apoiá-las se deixe invadir por uma estetização da vida pequeno burguesa dos centros universitários. Parece até que deixou de gostar dos pobres trabalhadores que não tem sua vida sob os holofotes da sociedade do espetáculo tão bem representada nas cenas deletadas pela pena de um sujeito preocupado com estes (risos)…

  8. Cineasta inverossímil,

    Primeiro, Ouro Preto sobrevive graças a UFOP (Universidade Federal de Ouro Preto) e ao turismo. Sua economia é basicamente ligada ao setor de “serviços” com uma base estritamente familiar, em que os garçons são inclusive os pequenos proprietários dos pequenos restaurantes e bares.
    Na virada do século XX quando a cidade deixou de ser a capital do Estado de Minas Gerais a cidade sofreu um processo de evasão tremendo ficando nela um corpo majoritariamente estudantil e pessoas que não tinham como ir para Belo Horizonte.
    Esses grupos ocuparam assim os casarões do antigo ciclo do ouro. Ouro Preto teria se tornado a Detroit brasileira não fosse a resistência desses pequenos grupos que permaneceram na cidade.

    Segundo, isso denota o total centralismo paulistano e o mecanicismo da análise que ao se achar preparado para se contrapor a carta cria as aberrações panfletárias dignas daquela mulher que insistia em escrever e mandar seus livros para Marx. Inclusive admirando e idealizando o tal proletariado. Até que o barbudo encheu os pacovas e respondeu sem muita cortesia “Sua obra é horripilante!” teria dito o comunista de casaca (Engels).
    Por isso, concordo com Lucas

    Terceiro, quanto filisteismo! Um dia aqui assistindo provocações da Cultura vi uma cena em que perguntaram para uma mulher na rua: O que você acha de romance? A senhora distinta e burguesa respondeu igual um comentário que vi nessas cartas: “É SÉRIO QUE ESSA CHATICE SEM FIM TEM A VER COM AMOR?”

  9. Cartilhaestetica & comoescreverumlivropolicitamentecorretoedextremaesquerda

    E Viva o realismo socialista de ulisses e seus asseclas!
    Viva!

  10. MEUS ASSECLAS
    Don Camungo, Cordame de Notrecunda e Caboracelhota são uma bizarríssima tríade o[m]nipaneroticarruaceira e abominam o politicamente correto. Ademais, saudavelmente ignoram querelas merrecas de marrecos: troskos stalinos maoguevaretas e outros epígonos tardobolcheviques do marxismo.
    Entre metacomentar o chulo ou rebarbá-lo,
    Don Camungo, Cordame de Notrecunda e Caboracelhota optam por chulear o rebarbativo. Até o vômito – férvido, justo e certeiro – na cara dos oportunistas pornocratas.
    Zaratustra dixit: “Se queres seguir-me, segue-te”.

  11. Onde o ouro é branco, o diamente, é vermelho e o sonho, é de valsa.
    Onde o ouro é preto, o diamante é branco? e o sonho, é sertanejo universitário? Kraft, kraft, kraft… decifra-me ou te devoro! (ou decifro-te e me devoras?)

    Se a botina é descorada e a camisa empolada, “meu carro é vermelho e não uso espelho prá me pentear. Botinha sem meia, só na areia eu sei trabalhar”…

    Se há cartilha estética (e politicamente correta e “radical”) da extrema esquerda, há, por dedução lógica, cartilha estética (e politicamente correta e “articuladora”) de centro esquerda, que em seu âmago carrega a “ARTICULAÇÃO”(com golpe ou não), afinal, “articular é preciso, radicalizar não é preciso”…

    Assim, na toada desta cartilha de centro esquerda, seria mais correto nomear as tendências “a la partido comunista dos anos 70” de “retrô”. Olha que moderno e politicamente correto: “marxistas retrô”! Benditas sejam as gerações atuais que se livraram da maldição do diabólico Marx: “Os homens fazem a sua própria história, mas não a fazem segundo a sua livre vontade; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado. A tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos”.

    Em tempo de caças às bruxas, as “adjetivações” raramente se dirigem aos verdadeiros radicais (no sentido que os comentários sugerem, não no sentido etimológico da palavra, de ir à raiz), e o capital fica assim ileso (prática comum dos multiculturalistas).

    A radicalidade (violência) reside, na realidade – e cada vez mais cruel – no capitalismo. Numa simples cerveja tomada em Ouro Preto, São Paulo, Nova Yorque ou Paris, há muito mais “radicalidade” (violência) por gota do que a “radicalidade” de milhares de palavras dos “aqui” denominados radicais de esquerda. A AMBEV, a Kraft, são alguns dos vários exemplos possíveis. Isso sem contar as milhares de vidas de imigrantes que morrem afogadas e assassinadas. As milhares de vítimas causadas por todo tipo de guerras militares e civis, etc.

    Quanto aos trabalhadores de verdade, a verdade destes paracem ser patrimônio de alguns, por certo também trabalhadores e sujeitos às condições imposta à maioria da classe trabalhadora. Motoristas de ônibus e cobradores, como os da Transcooper na Vila Zilda (além de garçons, faxineiros, pedreiros, etc) que residem em bairros como Filhos da Terra, Jova Rural, Jardim Felicidade (em São Paulo, mas também como em tantas outras grandes cidades), etc, discutindo política são FICÇÃO e que a própria “FICÇÃO” aqui trazida ambicionava o status de peça ou qualquer outra coisa que não um breve comentário singelo e irônico…

    Portanto…

    Viva todo o irrealismo socialista (ou capitalista) e seus asseclas!
    Viva!

  12. adjetivações deixam o capitalismo ileso? quê?
    tô sentindo uma dificuldade de alguns comentadores do site em se expressar. A moda agora é rocambolizar de forma ulíssica para garantir que ninguém entenda “realmente” o que se quis dizer?

    A única coisa que acho que entendi do comentário acima foi o disparate de achar que fazer a crítica das expressões estéticas da esquerda nacionalista seria o mesmo que livrar-se de Marx. É isso mesmo?

  13. E SE EU TIVER QUE DESENHAR?
    A)íon xucro que se preza não faz pós-doutorado
    B)nem a menor questão de ser entendido
    C)tampouco rocamboliza clinâmen imitando salto quântico
    D)tao dadaísta, ele até simula um pósitron althusseriano
    E)mas não calemburiza com sua enciclopédica ignorância
    A técnica é maiêutica; o método, dialético.
    Cada qual manduque, engula, digira e – se conseguir – cague o saber que pensa ter produzido ou (indebitamente?) apropriado.
    “Chacun son tour d’être mangé.” [Alfred Jarry – Ubu Roi]

  14. Óh! Pobre Ulisses! Querem fazer de ti um Jesus (te cuida para não morreres dependurado numa cruz!)

    E, de nós, Pedro, querendo nos fazer negar-te três vezes!

    Que nós, os pagões (por eles chamados cristãos ou ulissianos), façamos a vontade deles, assim na Terra, como nos Céus:

    – Nego-te Ulisses! Nego-te Ulisses! Nego-te Ulisses!

    E vamos ouvir os galos cantar a aurora de um novo dia, enquanto nos cozinham na panela de pressão, “pois as pessoas na sala de jantar, são ocupadas em nascer… e morrer…

  15. Ai sim! ai eu gostei… esses últimos trabalhadores são os desejos inconfessáveis de todos os trabalhadores do mundo inteiro! Viva a preguiça e abaixo a teologia protestante do trabalho!!!

  16. F)olhas
    G)rassam verdejantes
    H)abitando arvoredos seculares. Até que, finalmente sozinhas, perfazem um silencioso voo dançarino até o chão. Como se dissessem cummig’é assim:

    1(a

    le
    af
    fa

    11

    s)
    one
    1

    iness

    J)á com os homens a coisa é distinta. A dança é em vida, com o
    K)KKpital ditando o ritmo. Mas espere aí. É um pássaro? Um avião? Não! É ele! o odiado anônimo mais antônimo dos diabos! O injuriado atônito mais antenado dentre os jurados!
    L)isses lisses vem aí olê olê.. ó lá ele se preparando mais uma vez pra pousar na sopa de
    M)ulhomens & homulheres comportados e melindrosos, pudorados esperançosos, pegajosos, até que sem querer querendo ialá
    N)a garganta dos vamps fica entalado, que nem navalhei-me deus, é o fim do nosso amor, que nem navalhei-me deus dos desgraçados, dizei-me vós o que esperar diante de
    O)rnitorraquíticos de experiência e sapiência, de onde tirar pá, ciência?
    P)ronco final?
    Q)uerela das querelas, acender velas, das mais belas, aos que temem a trama e cantam a chama e tremem o leme (sempre destros) e lambem a cama e fecham o hímen e sentem a sana e somem na lama, não sem antes:

    R)icochatearnos tanto, até
    S)oul of pigs
    T)UDOMINAR! o admirável ScheißWelt fervido a 1984 graus Fahren hell it’s

    R)icochatealos tanto, até
    S)inistr[a]mente
    T)UDOMIN AR! Comunidade humana universal.

  17. COADJUVANDO PABLO

    Welt(mensch)gemeinschaft é o telos da guerra social

    Xronos aion kairos : Ungleichzeitigkeit (Ernst Bloch)

    Y por supuesto potência (instituinte) X poder (instituído) hic&nunc

    Zeroworker singulariza a autopraxis histórica do proletariado

  18. bem…
    se é que há, volto a tentar dialogar com interlocutores do século XXI (não me levem a mal, é linda toda essa escoliografia que ajudará os cyberfilólogos do futuro a entenderem melhor as minorias revolucionárias de nosso tempo).
    O link quebrado do meu último comentário era da foto que se ve aqui (espero que não se quebre também):
    http://www.audiofagia.com.br/blog/passeata-contra-a-guitarra-eletrica/

    Nada mais queria que trazer um pouco de exemplo histórico para o debate estético, para dar um pouquinho mais de conteúdo já que o diretor frustrado kraftiano acima parece partir da aplicação canhestra de um esquema tipo “bololô marxista-radical”, desses que podem ser aplicados a qualquer coisa que se imagine em qualquer debate.
    No caso, era uma tal “Frente Única da Música Popular Brasileira”, tentando defender o que eles pensavam ser as “cenas deletadas” da indústria cultural internacional.
    O tipo de crítica, se se pode chamar assim, destes infelizes comentadores me faz pensar nos petistas de hoje, injuriando os militantes dos pequenos partidos de esquerda tal como antes os esquerdistas dos “partidões” faziam com o pequeno e “sectário” PT dos anos 80. Somos realmente um povo de memória curta, os brasileiros!

  19. O BOI REBARBOU
    Símbolos dos quatro evangelistas: anjo (Mateus); leão (Marcos); boi (Lucas); águia (João). Os quatro símbolos teriam sido descritos e escoliografados a partir da visão da Glória de Deus…
    O bou rebarboi. Freeboi.

  20. “(…) Esta arquelogia do saber faz-se olhando para a parte de baixo das páginas, para as notas de rodapé, e também entre as linhas, destacando o que é afirmado no corpo do texto e esquecido nas conclusões. Em matéria de ideologia o silêncio é uma parte do discurso — para a visão crítica é a componente fundamental — por isso quanto mais exactamente se definir o lugar do silêncio, tanto mais gritante ele será e mais o abafarão numa pletora de palavras” (João Bernardo – Labirintos do fascismo).

    Talvez, as cartas de Helo à Arthur e de Arthur à Helo, escritas a duas (ou sabe-se lá a quantas outras – isso se não forem “mono-escritas”) mãos, guardam silêncios que, embora, gritem, ficam esquecidos nas conclusões…

    “Você gosta disso? Hein? Bate na minha bunda!”.

    ( Um tapinha não dói. Um tapinha não dói. Um tapinha não dói, só um tapinha…)

    Enquanto o Tigrão (revolucionário e revolucionariamente) ruge, se o cachorro late, vira sabão a lavar os “WCs” dos bares da vida por aí… e não se fala mais nisso (se os evangélicos têm o “fala que te escuto”, os multiculturalistas têm o “fala que te escracho”, amém…?!).

    Dia desses no prédio de sociologia da USP um “post” afixado num dos murais dizia mais ou menos assim, que um rapaz era machista porque se recusava manter relações sexuais com uma (ou um) transexual pois preferia mulher (biologicamente falando). Segundo o “post” o machismo se caracterizava pois a sexualidade, por ser opção, tornava a (ou o) transexual também uma mulher.

    Noutro dia, na mesma USP, vi dois cartazes, um na porta do banheiro masculino que dizia mais ou menos assim: para uso de homens, gays, trans masculino. Na porta do feminino estava assim: para uso de mulheres, lésbicas e trans femininas.

    Se para bom entendedor meias palavras bastam, palavras inteiras não deixam dúvidas… E aí é que reside o X da questão: a guitarra “eletrificou-se” não apenas pela força da cultura, mas, acima de tudo, pela força da eletricidade. Os conflitos de geração têm sua gênese nas transformações ocorridas nos meios de produção, não nas transformações supostamente ideológicas. E a Light, agradece…

  21. não sei se é pela verve de criticar o multiculturalismo, mas existem diversos problemas nesse marxismo bololô.

    1. Conflitos de geração? Elis Regina tinha 22 anos na época da Passeata mencionada. Gilberto Gil tinha 25.
    2. Quer falar de eletricidade?
    a) A música eletroacústica já vinha se desenvolvendo no Brasil desde os ano 50, você consegue explicar com A+B marxista o porque que a Passeata foi contra a guitarra elétrica na música popular e não contra a composição de vanguarda?
    b) Pense um mínimo em música. A eletricidade nos meios de produção e circulação de mercadorias artísticas musicais começou com a rádio, passou para a produção de discos e para as demais tecnologias de gravação. A guitarra elétrica é apenas um novo timbre. Ou será que a flauta transversal e o piano de cauda não passarão de arcaismos?

    Mas voltemos ao ponto inicial. Se tudo tem gênese nas transformações ocorridas nos meios de produção, a arte consciente deve ser inteiramente dedicada a “mostrar as cenas deletadas”? Quê seria isso, um tipo de jornalismo investigativo com floreios estéticos para capturar a atenção? Para depois acusar os desinteressados de “alienados” e “pequeno-burgueses”?

  22. REMEMBERING ARISTÓTELES
    Então, o dilema: reduzir a cultura aos meios de produção ou reduzi-los a ela?
    Mas as duas unilateralidades, posto que contraditórias, são identicamente falsas. Ou seja, cada uma das duas teria sua contraverdade – como diferença específica? – na outra.

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