Afoito fiquei, fitei a placa, estrada, espinho, mais placas, JESUS VOLTARÁ, vertigem. Por Alberto Sartorelli

Andando por vias petroladas no Norte de Minas – ou talvez no Sul da Bahia –, linha reta a sempre, distas léguas sem alma viva, espinhoso terreno. Primeiro foi ver uma placa, não as raras de estrada, mas diversa placa. JESUS VOLTARÁ. Ora, donde provém a absoluta certeza do retorno do Messias? Raro no espaço, povo sofrido, completo de fé, de fato. Mas como tanta certeza? Nem o Santo Tomás de Aquino, que tanto sabia, afirmava a volta do Cristo assim garantida, necessária. Ainda mais aquela gente, que não tinha como certo nem que ia dar feijão naquela terra, sabia? Instigou-me aquela certeza tão certa quanto as matemáticas. Afoito fiquei, fitei a placa, estrada, espinho, mais placas, JESUS VOLTARÁ, vertigem.

Foi então que começou a cair água do céu, eu que não estranharia esse fenômeno. A estrada perigou, foi-se vagaroso, e foi no vagar que eu vi. JESUS É A ÁGUA VIVA. Evangelho de São João, lembrei logo. Não podia ser isso só, depois pensei. Olhei o espinhaço, com água até onde se via. Limpava a poeira das folhas, parecia. O verde expandia rápido demasiado. Pois bem… quiçá… era a volta do Messias! E ninguém ousava perguntar a razão dos anos de abandono; todos sabiam a parábola do pródigo, ensinada pelo Cristo mesmo; como o pródigo, ele voltou, e a gente só queria saber de louvar!

Tolo de quem diz ao sertanejo que a chuva atrapalha o passeio. É aí que aparece o sertano ciso, temido. O estrangeiro sente mesquinharia de si e abaixa a cabeça. E aí o estranho entende o porquê das pessoas todas acreditarem em Deus.

Sempre que Jesus volta, a caatinga verdeja, o sertanejo esboça um sorrir. Como regra natural. E a cada ausência, novas profecias versando da volta dele. Porque a água dos rios é vista entrando em terra nefasta, latifúndio chamam. Agora a água que cai do céu, essa nem tem como não ser, é de todo mundo. É a água santa.

Eu sei que não sou Deus, mas quando o sanfoneiro – o maior! – perguntou ao Nosso Senhor o porquê de tamanha judiação, não percebeu ou cegou, essa pergunta tem resposta clara e sem rodeios, pra quem quiser ver. Até eu que sou estrangeiro, vi. Diz a lenda que, ao passar pela esfinge sertânica, um jagunço de coronel disse que a resposta era A SECA; erraria, e seria engolido. Eu, que não sou Deus, acertei. É O LATIFÚNDIO! E assim como na tragédia ancestral, o perigo de fato começa depois da resposta acertada.

E eu, que não sou sertanejo, estranho tudo, precisaria de uma casca! Sem gibão no espinhaço todo, não é possível nem estar. Vou-me embora do sertão cascudo, vou sisudo, sabendo. No décimo nono dia do primeiro mês do duomilésimo décimo sexto ano de Nosso Senhor, conforme a promessa, Jesus voltou, e eu vi. Pode vir mais mil vezes.

Sobre o autor
Alberto Sartorelli (Itapira-SP, 1994) é estudante de filosofia e escritor.

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