Perdendo totalmente seu papel de salvador, Temer – o homem surgido das cinzas de Dilma – foi colocado numa encruzilhada. Por Marcelo Mazzoni e Eduardo Facirolli

A Páscoa já passou, vimos por todas as cidades do Brasil encenações do martírio, morte e ressurreição de Cristo. O Brasil é um país cristão, logo possui este tipo de cultura cristã. Mas, a ideia do sacrifício não é uma novidade de Cristo, já no Gênesis (21) Abraão aceita dar seu próprio filho Isaque em holocausto por respeito e temor a seu Deus.

Contudo, um novo “Judas” foi feito hoje (17/05), Temer, que expia hoje todos os pecados de todos os brasileiros. Temer, o homem que se martirizou para que as reformas não parem de jeito nenhum.

Um leitor poderia nos perguntar: mas, como? e por que isto?

Temer subiu ao poder para cumprir com seu sagrado compromisso de destruição de todos os direitos trabalhistas (previdência, CLT, e o congelamento dos gastos), globalmente chamado de “Reformas”. Seu compromisso sagrado, firmado no momento em surgiu das cinzas do governo Dilma, fez-se para acalmar os espíritos do mercado e do grande empresariado brasileiro e mundial, Temer é a encarnação destes interesses.

Mas o inesperado ocorreu, o homem comum, o trabalhador brasileiro, despertou de seu sono e viu que estava a pagar por um pecado que não cometera, ou seja, que a crise, novamente, cairia só sobre seus ombros. Que as elites econômicas e políticas uniam-se não para garantir o lucro e seus enormes privilégios, e contrariamente ao que diziam, esta união dos de cima era justamente para manter as coisas como são: “o rico gasta, o pobre paga”, ou mesmo, “o rico rouba, o pobre é preso”, “o pobre trabalha, o rico acumula”. Um sistema de injustiça bem articulado, que só pune os de baixo e privilegia os de cima. A ação mais derradeira da revolta dos de baixo foi a Greve Geral do dia 28 de Abril – um pecado tal que mudaria tudo.

Perdendo totalmente seu papel de salvador, Temer – o homem surgido das cinzas de Dilma – foi colocado numa encruzilhada. Como poderia servir à sua classe, a seu compromisso sagrado se já não conseguiria ser mais o homem das reformas. Agora, sobrava para o indivíduo Temer somente duas opções:

1) Fugir e romper com seu papel histórico de “reformador”, isto é, de homem que destruiria os direitos trabalhistas e “salvaria sua classe”;

2) Ou novamente tomaria o papel de homem santo, só que agora em sentido inverso.

Agora seria o Judas que desviaria toda a atenção da população para si mesmo, para que esqueçam das reformas ao martirizarem seu corpo e sua alma.

Entendendo que Temer não rompeu com seu papel de reformador, ele agora se coloca no centro de uma torrente de ódio contra si próprio, de tal modo, que hoje não é só o maior propagandeador do “Fora, Temer”, como garantirá que o ódio contra si próprio seja o adubo do “novo”, pois o espectro que ronda a política mundial, é daquele que se autoproclama gestor, que como Moisés que abriu o Mar Vermelho, vai abrir, o país às modernas formas contratuais da gestão trabalhista, ou seja, traduzindo isso para nós trabalhadores: o “empresário-não-político” que terminará a precarização das condições de trabalho, menos direitos e mais deveres, aumento do contingente de mão de obra ociosa para momentos onde a produção exija mais, e assim, o trabalhador ficará eternamente vendendo sua força de trabalho apenas para sobreviver. Fará política, como Macron na França, Macri na Argentina e o peso pesado Trump na América do Norte, será belo e sorridente, falará em seus sermões, que todos podemos ter o reino do céu, falará que basta trabalhar muito com meia hora de almoço (ou menos), que só é pobre quem não se esforça.

A questão é que Temer não agiu por si, não se lançou no fogo, foi lançado. Uma parte das elites, vocalizados pela Rede Globo, percebendo que 1º) a popularidade do presidente não ia nada bem; 2ª) o problema de sua ilegitimidade jogava contra seu papel de reformador; 3º) as ruas começavam a ganhar força, tudo isto junto poderia atrapalhar as reformas, teve de usar, portanto, da velha máxima “a força do inimigo contra ele mesmo”. Seria, portanto, fazer com que as ruas exijam algo que possam ganhar e com isto perder. O “Fora, Temer” (diretas já, constituinte), servirá agora para que as classes populares derrubem este presidente ilegítimo e legitimem algum presidente que deverá levar as reformas até o fim, só, que, com um adendo, será legitimado pelas ruas e pelas urnas.

Contudo, ainda não sabemos qual foi o tamanho do impacto do dia vinte e oito, sabemos somente que ele ajudou a mudar o jogo, ou mesmo o efeito da suposta vitória de Lula sobre Moro. Criaram um touro de ouro, uma fogueira para espiar os pecados, chamada “Fora, Temer”. Há um outro problema que está sendo ressuscitado: a classe média e sua luta “contra a corrupção”. Essa grande mobilização midiática tem também, como uma das principais preocupações, a ressurreição desta força política, para disputar as ruas com os trabalhadores e suas vanguardas, e no pior dos cenários, usar os trabalhadores para que derrotem a si mesmos.

O “Fora, Temer”, portanto, é a pauta que a burguesia pegou para si, que Temer por não renunciar fará com que seja universalizado. Cabe para nós, pensadores críticos e trabalhadores, não esquecer que o problema central é que caiam todas as reformas, não só seu defensor.

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