Por Grouxo

Vocês estão errados.

A culpa do nosso isolamento e da nossa impotência não é dos saraus e das cirandas. Não é do feminismo e de uma defesa séria e consequente dos direitos da mulher, não é da defesa dos direitos da população LGBT, não é da defesa (precária) da liberdade sexual e de maior flexibilidade nas regras de comportamento. A culpa não é do combate consequente ao racismo. A culpa não é das exposições de arte ruim que foram atacadas injustamente como “pregação imoral” e “pedofilia”. A culpa não é de haver uma defesa intransigente dos direitos humanos de criminosos e apenados e uma crítica coerente dos abusos e da própria prática policial. Não faz o menor sentido abrir mão dessas pautas e desse discurso, na medida em que ele é consequente.

O problema é que muitos de nós acreditaram que por estarmos “no poder” – nas secretarias de governo, nos departamentos universitários, na coordenação de programas de pós e de pesquisa, no contato com boa parte da imprensa tradicional – e por não haver contradição séria na esfera pública, que a batalha já estava ganha. A verdade é que boa parte de nós passou a se considerar superior aos demais porque estávamos mais próximos do poder, porque éramos “mainstream”. Porque os dissidentes podiam ser calados no grito e constrangidos. Porque boa parte de nós, em suma, assumiu uma mentalidade de patrão e chefe em relação aos nossos colegas de classe mais conservadores. Deixamos de ir para o embate honesto. Passamos a ganhar no grito e no constrangimento. Bastava acumular posições de poder e forçar todo mundo a ter que ficar sob a asa de algum patrão (ou padrão) “de esquerda”.

Perdemos o costume de conversar na humilde, se construir como referência de confiabilidade entre nossos pares. Arriscar uma iniciativa no local de trabalho em defesa daquela estagiária ou terceirizada que tá sendo assediada, do colega que foi humilhado por ter “cabelo ruim”, de defender o aluno trans que é humilhado todo dia na escola, de fazer da nossa vida cotidiana um campo de batalha em defesa da prática da solidariedade entre trabalhadores e trabalhadoras, independente da sua identidade e condição.

E se não há a perspectiva da solidariedade, só resta aos que ficaram de fora se juntar aos patrões que concordam com eles. E descobrimos agora que os patrões de direita estão sobrando. São muito mais numerosos. Estão muito mais bem enraizados. Não adianta mais se esconder sob a asa do chefe de esquerda. A gente tem que voltar a aprender a combater os patrões de direita e a sua influência sobre os nossos colegas. Reconquistar a nossa confiança coletiva. Redescobrir a solidariedade.

Vai ser um trabalho árduo. Mas é perfeitamente possível.

Original aqui 

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