Por Thiago Cazarim

Professores-colegas da rede federal [de ensino]: continuem dando aulas normalmente, incluindo debates de gênero, de crítica do capitalismo, de defesa dos direitos humanos e do meio ambiente etc., independente do ministro da educação anunciado pelo Bolsonaro. Por alguns motivos muito simples, que vou enumerar porque eu acho que listas tendem a ser bem didáticas e eficazes para dissipar certos ânimos:

1) o Escola Sem Partido é ilegal. Ele não vai vingar juridicamente. Ele vai vingar de formas muito mais indiretas institucionalmente: corte de repasses diretos da União, interferências nos editais do PNLD, nas nomeações para cargos (incluindo reitores), no recuo em matéria de políticas afirmativas. Socialmente já vingou, transformando educadores em criminosos e inimigos públicos. É um desastre realmente, mas isso é bem diferente de proibir de falar. Em muitos aspectos é muito pior que a censura explícita pra ser bem realista — mas não é a mesma coisa e exige de nós recusar o pânico como únicos afeto e script de ação possíveis;

2) nossa situação é infinitamente melhor que a de professores das redes públicas e privada, que vivem um processo de contratação muito mais precário que o nosso e estão muito mais sujeitos a ingerências diretas de gestores e de pais de estudantes. Mas isso mostra coisas igualmente relevantes:

a) docentes da rede federal têm certo “privilégio” perante os demais docentes: laboral, intelectual, de autonomia institucional. Usar essa posição para manter os debates críticos funcionando (o que exige abandonar a postura do pânico) é importante para manter a própria possibilidade de haver esses debates nas demais redes de ensino;

b) o “privilégio” do docente da rede federal vem muito de sua estabilidade funcional, mas também do regime de trabalho em geral, incluindo os salários e carga horária em sala de aula. Então tá na hora de nós pensarmos que temos uma responsabilidade enorme em convencer a sociedade de que os professores merecem dignidade, e não video shootings de alunos e pais que querem “causar” nos demonizando e assediando. Inclusive na hora de fazermos nossas greves e mobilizações sazonais que só reafirmam, no fim das contas, nossa agenda salarial. Pessoalmente, estamos fartos dessas greves “monopautas” que não constroem solidariedade trabalhista. E chega também desses sindicatos “setoriais” que criam hierarquias estúpidas entre docentes e técnico-administrativos (que muitos docentes acham lícito chamar de “funcionários” ou de “servidores”, como se docente não fosse servidor);

c) as redes privada e públicas estão mais sujeitas a ingerências em parte porque são muito mais permeáveis que a federal. Tá na hora de repensar seriamente os limites que separam autonomia institucional e isolamento social. O que exige, além da recusa do pânico como destino inexorável, uma autocrítica profunda do tipo de educação que ofertamos;

3) os senhores dominam os escravizados pelo medo, não só pela força. Como a força do governo Bolsonaro é difusa, embora seja potencialmente muito eficaz, ela depende do medo para funcionar. Quem aceita o medo como destino escolhe servir ao inimigo.

Beijos.

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