Por Roque

dsc02140A greve na Universidade de São Paulo neste ano de 2009 era um fato inevitável. Há alguns anos a política do PSDB-DEM, principalmente nas últimas gestões, vem colocando em prática o princípio, que remonta à velha oligarquia paulista, segundo o qual movimento social deve ser tratado como “caso de polícia”. Em 2007, o governo Serra baixou um decreto que feria gravemente o direito constitucional da autonomia universitária. Diante da reação de estudantes, funcionários e professores, do movimento de greve e da Ocupação da reitoria da USP, Serra teve que recuar mas não se deu por vencido. Agora o governo anuncia um corte de 20% por meio de isenção do ICMS, imposto que é vinculado à verba das universidades estaduais e escolas e faculdades técnicas, talvez para auxiliar os capitalistas na crise, além de demissões em massa e do programa Univesp (resposta ao Pro-Uni do governo federal, porém, em “termos virtuais”: uma espécie de “orkut” do ensino superior que servirá de plataforma política na campanha presidencial de Serra e do PSDB/DEM). No âmbito da Universidade de São Paulo, desde do ano passado, vem ocorrendo um claro processo de desmonte do sindicato, o Sintusp – Sindicato dos Trabalhadores da USP – com inúmeros processos contra estudantes e funcionários que culminou com a demissão de um dos mais atuantes diretores do Sintusp, o Brandão, bem como com a retirada de espaços estudantis. Neste quadro, dentro do pacote de demissão de mais de 5 mil funcionários, foram de início revogados alguns concursos já homologados: ou seja, pessoas que pagaram a inscrição, estudaram, fizeram a prova etc., perderam seu emprego do dia para a noite. Assim, a mobilização já se fazia sentir desde o começo do ano letivo e uma série de pautas foram levantadas [reivindicações foram formuladas], como, além do sempre justo e legítimo reajuste salarial (de 17%), também a garantia do emprego para os 5.214 contratados pós-1988; readmissão do funcionário Claudionor Brandão; incorporação dos atuais funcionários e professores da EEL/USP ao quadro de servidores da USP; reestruturação da carreira dos funcionários das três universidades preservando critérios isonômicos; etc.

100_2550-1Paralelamente, no dia 23 de abril, uma assembléia de estudantes da USP, com mais de 400 presentes, decidiu por unanimidade ocupar o Diretório Central dos Estudantes (DCE) [Associação de Estudantes] e seu espaço de vivência. Havia três anos que o DCE tinha sido fechado sob o pretexto de uma reforma [obras] que, como se verificou, não passava de uma simples maquiagem, e, no início deste ano, a reitoria notificou que o espaço passaria a seu controle administrativo, acabando com a autonomia política e financeira dos estudantes sobre este importante espaço do histórico movimento estudantil. No dia 5 de maio é deflagrada a greve dos funcionários. A partir daí, começa uma longa disputa no movimento estudantil que veio atrasando enormemente uma mobilização estudantil em apoio à greve: de um lado, grupos de independentes, PCO [Partido da Causa Operária] e MNN [Movimento Negação da Negação] exigiam a imediata adesão à greve dos funcionários; de outro, o PSTU [Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado], PSOL [Partido Socialismo e Liberdade], PT [Partido dos Trabalhadores] e PC do B [Partido Comunista do Brasil] alertavam que era preciso antes discutir mais o assunto, o que acarretava sempre em indicativo de greve nas assembléias gerais. Os professores também se mostravam reticentes em apoiar a greve e esta parecia fadada cada vez a uma luta única e solitária dos funcionários. No dia 25 de maio, num ato em frente à reitoria, com funcionários e estudantes das três universidades estaduais [USP, Unicamp e UNESP], ocorreu uma “ocupação relâmpago” do prédio da reitoria. Em assembléia realizada ali mesmo, a mencionada divisão do movimento estudantil se fez sentir, e os companheiros da atual gestão [direcção] do DCE “Nada será como antes” (PSTU) e o PSOL aprovaram sua proposta de “construir a greve nos cursos e a imediata desocupação da reitoria”, apesar do descompasso de quase um mês em relação a greve em andamento dos funcionários.

Neste ínterim, por um incrível erro de cálculo ou falta de tato político (que define a truculência dos governos Alckmin-Serra-Kassab), a reitoria solicitou à justiça na quarta-feira, dia 27, a reintegração de posse do prédio da reitoria, bloqueado por piquetes. No dia 1 de junho, segunda-feira, um efetivo de 98 policiais da Força Tática e do policiamento de área armados com submetralhadoras e escudos invadiu o campus para reprimir as atividades dos funcionários. Tal fato acendeu o estopim [deflagrou] para a greve dos três setores da universidade: funcionários, alunos e professores. Nas plenárias de alguns cursos, as falas [intervenções] iam no sentido de que a ação policial ia contra a constitucionalidade e a autonomia universitária, o que era uma redução. Na assembléia dos estudantes do curso de História, que reuniu 150 estudantes, todos foram unânimes pela greve. Na quinta-feira (dia 2), em assembléia geral dos estudantes, com mais de mil presentes, foi aprovada a greve imediata com os seguintes eixos: “fora PM [Polícia Militar] do campus! fora reitora, diretas já! e abaixo a Univesp!”

dsc02388-1Os professores também aderiram à greve. Barricadas foram colocadas nos corredores do prédio da História e Geografia. Uma estudante tentou chamar a PM para desobstruir as barricadas, porque, segundo ela, atentavam contra o seu direito de “ir e vir”. Na sexta-feira, em plenária departamental do curso de Geografia, muito se discutiu, por meio de falas indignadas, sobre as barricadas e a repressão da PM no campus, mas pouco se disse sobre as reivindicações legítimas da pauta dos funcionários. Por isso, a avaliação que faço da greve é que, embora haja de fato um ponto positivo na adesão dos três setores à greve, agravado pela intervenção policial, por outro, de fundo, a estrutura de classes determina o processo, pois há um desvio no sentido de apenas defender a legalidade burguesa enquanto que por trás das questões formais, concretamente, os trabalhadores já vêm sofrendo sistematicamente perseguições e represálias de todos os tipos, perdas de direitos mais elementares e suas reivindicações passam no geral despercebidas pela comunidade universitária; infelizmente, eles (funcionários) já estão sitiados há muito tempo!

Fotos: Picasa uspsitiada

6 COMENTÁRIOS

  1. Agora a Polícia sentou porrada nos estudantes. Se isso não se chama fascismo, eu não sei o que isso é!

  2. Pode parecer preciptada minhas palavras, pois de fato pouco sei sobre os acontecimentos da USP vs PM,vs Reitoria, vs neoliberalismo(capitalismo e sua roupagem atual)de Serra e cia. Mas de uma coisa em particular assino em baixo: quando há um “desviu no sentido” da luta, isto é, quando nos atemos a defender apenas os interesse estritamente estudantis e não vislumbramos além de seus limites, não nos debruçamos,portanto,nas razões de classe, o que temos no fim é um “latido de cão covarde”!

  3. É a volta da república velha, onde questões sociais eram caso de polícia!
    Cabe lembrar que agora é o setor da classe trabalhadora que ainda está inserido no mercado de trabalho com empregos formais e direitos, que está apanhando. Os miseráveis das favelas já conhecem o amargo sabor do cacetete da polícia há muito tempo….

  4. se a repressão baixou na usp imagine então o que “eles” fazem nas favelas, com os trabalhadores informais, sem terra, sem teto etc. a repressão chegou no primeiro mundo do Brasil….. mas não foi essa política que levou Sarkosy à presidência? qualquer semelhança não é mera coincidência!

  5. Penso que essas greves são reinvidicações egoístas de grupos preocupados apenas com seu meio. Se fossem realmente construcionais estes grevistas estariam fazendo passeatas em Brasília para tentar mudar o Brasil como um todo e não apenas a sua classe.Aqui em casa estamos desempregados, eu e meu marido; voces que estão trabalhando e estudando de graça enquanto nós pagamos seus salários e seus estudos deveriam colocar a mão na consciencia e fazer o melhor possível para mudar o país nessa grande crise que atravessamos através da oportunidades que voces tem de estudarem em uma universidade. Porque voces não saem daí e colocam a disposição seus lugares para que outras pessoas possam ocupá-lo? Penso que não estão amarrados aí não é mesmo? Quando não estamos satisfeitos devemos encontrar um outro lugar para estar; vivemos num país que nos permite ir e vir. Porque voces não se utilizam desta oportunidade? O momento é para união em prol de uma melhoria para todos e não mais, apenas, uma melhora para alguns através de lutas de classes, muitas vezes, fracas e corrompidas.

  6. Karina
    Você fala que tudo mudaria com passeatas em Brasília, só que o poder da burocracia academica e do Serra encontra-se aqui.
    Segundo, voce diz a favor de movimentos, mas contra luta de classes, o que é altamente contraditório, pois você e seu marido, estão desempregados porque são proletários, trabalhadores, e portanto, assim como nós, sofrem as consequências do que é imposto pela classe dominante. Ou seja, se você quer mudanças para o país, só com luta de classes.
    E temos liberdade de ir e vir? Acabamos de descobrir que não, que o cassetete é um limitador e tanto. Então, em defesa de você, seu marido, irmãos nossos trabalhadores que estão em dificuldade, te convoco a pensar nisso, que só com luta isso muda, e que essa luta também é de vocês. Não façam o jogo da classe dominante, responsável pela má situação de vocês. Estamos juntos no mesmo Barco!

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