No último dia 25 de janeiro, 80 manifestantes, entre moradores do Jardim Pantanal e participantes da Rede de Luta Contra o Aumento, protestaram contra as violações do poder público na cidade de São Paulo. Por Passa Palavra

contra-tarifa-e-inundacao_destO dia 25 de janeiro foi marcado por muitas festas na cidade de São Paulo, que estranhamente apaga seu passado ao destruir um sítio arqueológico para apressar as obras do Metrô mas tem muito orgulho de fazer eventos turísticos em comemoração aos seus 456 anos. Dentre as dezenas de atividades comemorativas estava a entrega da medalha 25 de Janeiro, criada pelo prefeito Gilberto Kassab, que com ela homenageou o presidente Lula e o governador José Serra. Mas a Rede de Luta Contra o Aumento e os moradores do Jardim Pantanal resolveram fazer uma aparição surpresa, lembrando o poder público que não há muito o que comemorar.

Este ato resgata a experiência de 2006, quando as mobilizações contra o aumento da tarifa de ônibus perseguiram durante um mês o então desconhecido prefeito, que terminou por descontar sua raiva em um senhor, o chamando de vagabundo.

contra-tarifa-e-inundacao_2Com muitos apitos, batucada, cartazes e narizes de palhaço, a Rede de Luta Contra o Aumento chegou em frente  à prefeitura por volta das 11h30, portando cartazes como “Ônibus caros, ruas alagadas”, “Exclusão: um presente para São Paulo” e “Quer sair de casa? Vá de Barco”. Lá encontraram famílias do Jardim Pantanal que protestavam contra as enchentes propositalmente provocadas na zona leste de São Paulo, exigindo moradia digna ao invés do mísero auxílio de 300 reais mensais oferecido pela prefeitura. E ali naquele momento, de forma não exatamente planejada, construiu-se uma unidade na luta urbana, ao ritmo do funk: “Dança Kassab, dança até o chão. / Aqui é o povo unido contra o aumento e a inundação”.

contra-tarifa-e-inundacao_3Este pequeno escracho [1] colocou em prática as tentativas de luta conjunta na cidade, uma vez que a remoção de famílias, os alagamentos e o aumento da tarifa estão ligados a um mesmo projeto de cidade: uma cidade excludente, voltada apenas para os ricos e para a circulação de mercadorias.

Aliás, Kassab deixou bem claro qual a sua visão de cidade ao fazer a seguinte declaração enquanto sobrevoava a parte já construída do “maior Parque Linear do mundo”, em recente entrevista ao jornal Metro: “antes aqui não tinha nada, era só favela”. Para o prefeito, já que não tem nada, tudo bem inundar para não estragar as tão propagandeadas obras de ampliação da marginal e construir o já citado parque em cima das casas. Vale também negar o acesso das famílias aos diagnósticos médicos que atestam que seus filhos e filhas doentes estão com leptospirose devido a exposição às águas extremamente sujas das enchentes.

contra-tarifa-e-inundacao_4Porém, Kassab esquece (?) que as pessoas se revoltam, como mostram as manifestações contra as enchentes no outro extremo da cidade, o fechamento de vias no dia 26 pela manhã no Jardim Pantanal e as constantes manifestações contra o aumento da tarifa.

Cabe agora pensar em outras articulações e criar atos e mobilizações conjuntas, pois é nas lutas que se constrói coletivamente. Passa Palavra

Nota:

[1] No Brasil, chamamos de escracho pequenos protestos que se organizam na forma de aparições surpresa de manifestantes em atividades públicas com a presença de autoridades oficiais, com o intuito de “estragar a festa oficial” chamando atenção da população e da mídia presente.

Fotos: Renan Miguita, Larissa Nunes e Passa Palavra.

2 COMENTÁRIOS

  1. A cidade causa estranheza ao apagar o passado, mas também o presente. Ainda que o auxílio fosse suficiente para reaver materialmente o que as pessoas perderam no Jd. Pantanal – o que está longe de ser, a memória dessas pessoas foi ferida. Cada armário, colchão e cadeira ali fazia parte da história dessas pessoas e toda a memória da cidade deve ser tratada de maneira digna. Estamos cada vez mais afogados em medalhas e monumentos que mais nos fazem esquecer do que lembrar.

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