Por Passa Palavra
Invisíveis.
Invisíveis, a não ser que faltem! Invisíveis, a não ser que não trabalhem!
Invisíveis aos doutores acadêmicos e aos seus aspirantes!
Invisíveis para os que sonham com o tipo ideal de sujeito histórico da revolução!
Invisíveis para os que se deslumbram apenas com o novo-novíssimo sujeito-plural!
Invisíveis, não para os que fazem dinheiro com a exploração do seu trabalho.
Numa Universidade com orçamento estimado em R$1,3 bilhão para 2010, a denúncia da situação de trabalho dos “terceirizados” é sintomática de como a Cidade Universitária reproduz as práticas da real Cidade Capitalista, inclusive, há papel para todos e todas, até mesmo uma nova classe dominante professoral.
Já relatamos anteriormente como grupos de estudantes, que ainda que tenham um mundo sempre mais generoso para eles, buscam fazer com que o saber não esteja a serviço do poder, ao procurarem na prática ampliar as suas ações na Universidade para os movimentos sociais e setores populares da classe trabalhadora. Ver Aqui.
Com este espírito, esquizofrênico para muitos e consciente para outros, estes estudantes foram conversar com os invisíveis trabalhadores terceirizados e organizaram um ato em defesa dos direitos destes funcionários que ocupam uma das posições mais baixas na pirâmide da exploração. Cartazes foram fixados, panfletos distribuídos, conversas e olhares trocados, denúncias verbalizadas e, com a ajuda do MST da região, alimentos foram doados. Cada trabalhador terceirizado recebeu uma sacola de alimentos da Reforma Agrária, contendo feijão guandu, mandioca, batata, urucum e especiarias.
As denúncias tiveram que sair da boca dos estudantes, pois os funcionários sofreriam repressões caso se pronunciassem abertamente.
Uma faixa expressava bem qual a situação destes trabalhadores:
“Lutamos pelo direito de ficar doente sem perder a cesta básica”
Pois, caso o trabalhador falte duas vezes no mês, ainda que com justificativa médica, ele perde o direito da cesta básica de R$ 51,00. “Moço qual a compra no supermercado que você faz com R$ 51,00?”, foi uma das perguntas em um dos relatos em áudio que podem ser conferidos mais abaixo.
Salário mensal de R$ 460,00 para trabalhar das 7 da matina até às 5 da tarde. Quando são pagos pelas horas extras, recebem R$ 2,00. Outros chegam a receber R$ 48,00 pela folga trabalhada (quando se vende o que seria o seu dia de folga), o detalhe é que a empresa não paga a condução [o transporte].
Estas e outras denúncias talvez não representem tanto a situação vivida por estes trabalhadores quanto o relato de uma estudante:
“Quando entreguei o panfleto para uma funcionária terceirizada, os olhos dela encheram-se de lágrimas. Ela me olhou e disse: “Nunca ninguém na Unicamp havia me dado um panfleto sequer”.
Escute abaixo alguns depoimentos:
Áudio 1:
Áudio 2:
Áudio 3:
Ilustração em destaque: por Miséria. Fotografias: por Passa Palavra (exceto a pichação).
Galera,
Fui hoje de manha conversar com os terceirizados pra ver o que eles tinham achado do Ato e descobri que um gerente da Centro chamado Percival apareceu durante o Ato e começou a listar as faxineiras que estavam participando pra dar advertência. Resultado: várias delas levaram a advertência e uma (Cris) foi SUSPENSA por três dias…
Elas disseram que o tal Percival fica todos os dias no escritório da Centro que tem aqui na Unicamp. Fica lá perto do DGA.
Temos que fazer alguma coisa meio URGENTE, tipo ocupar o escritório, fazer um reboliço lá na frente ou sequestrar o tal Percival…rs
Sugestões???????
Nas escolas públicas, a situação não é diferente. Há toda uma gama de professoras que se sentem madames e acham que os funcionários são serviçais para serví-las: não lavam seus pratos, seus copos, seus garfos, querem que a água esteja no local e hora adequado, que o café e etc. Há tempos eu me dei conta de uma situação humilhante mas que foi naturalizada: os funcionários das escolas, exceto os de escritório, não possuem nenhuma sala própria. Eles trabalham o dia todo e não possuem local para guardar suas coisas, comer, se reunir, descansar. Geralmente, o que fazem é se amontoarem nas saletas onde se guarda vassouras, materiais de limpeza e etc. Humilhante e diz muito do que é a categoria o fato de ninguém notar ou se importar com isto.
É, as cidades universistárias estão dentro da sociedade capitalista e contribuem com a sua reprodução. O caso dos trabalhadores terceirados evidencia muito bem isso. É a realidade de todas a universidades estatais do brasil. O que as burocracias sindicais fazem a respeito? Ou melhor, vale a pena ($) “representar” aqueles que nem poderiam (por diversos fatores) contribuir com o imposto sindical? Não podemos esperar nada da burguesia nem da burocracia, mas sim dos indivíduos conscientes da situação da classe trabalhadora, e da própria classe…
Todo apoio à mobilização na UNICAMP!!
Para quem ainda não leu a respeito, no fim da década de 90 um pesquisador da USP tornou-se gari da cidade universitária de São Paulo por anos. Esse trabalho teve como resultado a sua tese de mestrado a respeito dos trabalhadores invisíveis. O link abaixo trás uma entrevista com o autor do trabalho.
http://www.responsabilidadesocial.com/article/article_view.php?id=233
Existe o livro publicado sobre este trabalho do Fernando Braga da Costa chamado “Homens invisíveis : relatos de uma humilhaçao social”, publicado pela editora globo.
Outro livro foda que um professor me passou na graduação e que me marcou bastante é da Simone Weil “A condição operária e outros estudos sobre a opressão”, publicado pela paz e terra.
Quem quizer conferir um quadrinho do coletivo Miséria sobre as retaliações, aqui está http://miseriahq.blogspot.com/2010/09/universidade-de-merda.html
Tereza,
Já inserimos o desenho no artigo. Obrigado!
Uma boa coisa que a esquerda estudantil poderia fazer, em vez de ficar em disputas teóricas, sectárias e por aparelhos, é ajudar esses trabalhadores a se organizarem e reivindicarem melhores salários e condições de trabalho nas universidades.
Tantos encontros estudantis que acontecem a todo momento poderiam servir ao mesmo para se organizar isso nacionalmente. Poderia ser uma forma de expor a condição dos trabalhadores terceirizados de uma forma geral.
O mais incrível é que a Diretora do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp disse que não podia fazer nada, justamente por ser uma empresa terceirizada, pois fugia da sua jurisdição. A Reitoria idem. Esses são ótimos exemplos da pilhagem da Universidade Pública levado à cabo pela “reestruturação produtiva”. As empresas terceirizadas, as Fundações, etc. são território privado. Além de demonstrar o total desdém de representantes das “Ciências Humanas” com trabalhadores sendo ultra-explorados debaixo do seu nariz (mas fora da sua “jurisdição”). O trabalho se tornou apenas uma “categoria sociológica” e, de preferência, que não seja o “meu” trabalho, mas o do “outro”…
Iraldo: que frase!
“trabalhadores sendo ultra-explorados debaixo do seu nariz (mas fora da sua “jurisdição”)”. É a síntese da heterogestão, e de como esta interessa para certas classes e setores da sociedade, em detrimento de outras/outros.
Segue os links do vídeo sobre a campanha contra a terceirização e a precarização do trabalho na Unicamp
Parte I http://www.youtube.com/watch?v=aUIseqL8J5A
Parte II http://www.youtube.com/watch?v=KHdNrDVKc3A&feature=related
As entrevistas sumiram!
Passa Palavra,
Não consigo ouvir o áudio nem ver as fotos…
Será problema do meu navegador??