Por Rede Extremo Sul
Muitas vezes ficamos pensando sobre o que seria de fato a concretização de um Poder Popular, ou seja, a inauguração de uma forma política fundamentada em outros preceitos organizativos, preceitos que colocassem o povo oprimido e explorado como protagonista de sua própria história, que devolvessem àquelas pessoas habituadas a andarem de cabeça baixa o orgulho e a possibilidade de deliberarem sobre a sua vida e a da sua coletividade. Ficamos, assim, imaginando como seria o processo de dissolução do atual regime político e econômico que, cada vez mais, afasta as pessoas das principais e mais importantes decisões, que aprofunda as desigualdades entre elas, ao invés de saná-las, e agrava o quadro de miséria e injustiça, enquanto promete superá-las.
Ao sonharmos com isso, provavelmente, passam pelas nossas cabeças aqueles momentos mais gloriosos das lutas sociais: Quilombo dos Palmares, Comuna de Paris, Revolução Russa, Revolução Espanhola, Maio de 68, Greves do ABC, Luta contra o Apartheid, etc. São milhares de pessoas no campo ou nas ruas que, sem hesitar, levantam-se contra a opressão, proferem palavras de ordem estrondosas, fazem declarações comoventes enquanto miram com firmeza o novo mundo que se aproxima!
No entanto, toda essa memória entusiasmada das lutas não deixará de ser mero conjunto de imagens sem vida, enclausuradas nos livros de história, se não for capaz de se ligar ao nosso presente, ao nosso cotidiano. E é sabido por qualquer pessoa sensata que não vivemos mais estes tempos áureos em que a transformação radical e completa da realidade se colocava como horizonte imediato e palpável. Isso significa que só nos é possível reatar os vínculos entre presente e passado, e assumir as responsabilidades sobre o nosso futuro, quando conseguimos traduzir essas alegorias em gestos concretos do nosso dia-a-dia. É essa a grande celebração que temos sempre de fazer, é disso que trata a construção do Poder Popular. Na situação em que estamos, de nada adianta idealizar grandiosos movimentos revolucionários, projetarmos grandes viradas de mesa, se não tomamos as atitudes que estão efetivamente ao nosso alcance.
Nesse sentido, é de grande validade toda e qualquer iniciativa coletiva que reavive nas pessoas comuns o salutar hábito de não tolerar abusos de poder, toda experiência que exercite a cultura de ação política sem intermediários, que dê às comunidades o poder de decidirem sobre si mesmas.
Por isso, é digna de registro a luta dos pais, mães, alunos, professores e outros funcionários da Escola Estadual Joaquim Álvares Cruz, localizada no bairro de Parelheiros, Zona Sul de São Paulo. Ante as arbitrariedades cometidas pela então direção escolar, que chegou a permitir que um aluno fosse interrogado por um policial em uma sala de aula a portas fechadas, a comunidade se organizou, juntou forças e conseguiu depor a gestora autoritária. Eis aí uma singela, porém real, demonstração do que pode ser o Poder Popular no contexto de uma comunidade escolar.
Muitos casos de autoritarismo e violência nas escolas têm sido vivenciados e relatados nas comunidades da periferia da Zona Sul, e os efeitos dessa opressão podem permanecer e se tornarem mais fortes se continuarem isolados e silenciados. Ao contrário, se as indignações contra o conservadorismo crescente na sociedade se unirem e esses casos forem trazidos para o plano da experiência política e coletiva de resistência, certamente poderão ser inibidos e combatidos.
O vídeo abaixo pretende ser um convite à participação de todos na recém-lançada Campanha contra a opressão e o autoritarismo nas escolas, uma pequena e localizada iniciativa que pretende reunir pessoas e grupos que fazem do espaço escolar, tão importante no território, mais uma trincheira da luta anti-sistêmica e da construção organizativa popular.
Mais informações, acesse
Rede de Comunidades do Extremo Sul de São Paulo-SP
Campanha Contra a Opressão e o Autoritarismo nas Escolas
Contato: [email protected]
É isso aí. Destes “fatos” cotidianos de opressão algumas pessoas que se opõe a isto se organiza e se conscientiza da realidade que o circunda. Surge então uma oportunidade de debate sobre a situação do local, do país e do mundo. Como eu disse é um debate que se abre. O resultado dependerá da conjuntura local, e pode ser tanto o início de um processo de conscientização de alguns indivíduos (que durará a vida, virarão militantes) ou também com um movimento pra eleger um vereadorzinho que fará sua carreira em cima deste episódio, um oportunismo básico.
Mas independente dos resultados futuros possíveis, a ação em si e a organização que decorre dela é muito bonita, e mostra que as coisas podem sim ser diferentes, reabre a possibilidade da utopia!