Condenação dos responsáveis pela Chacina da Baixada

Na madrugada de quarta-feira (16/09) terminou o julgamento dos policiais militares Júlio César Amaral de Paula, Marcos Siqueira Costa e Ivonei de Souza, os últimos acusados de participação na Chacina da Baixada que restavam a ser julgados. Amaral e Siqueira foram condenados por 29 homicídios qualificados, uma tentativa de homicídio e formação de quadrilha, recebendo penas de 480 e 542 anos de prisão, respectivamente, sem direito a recorrer em liberdade. Embora a grande imprensa, nos dias anteriores ao início do julgamento, tenham chamado os acusados de “ex-policiais”, por conta de um suposto afastamento da corporação, a juíza Elizabeth Machado Louro, titular da 4ª Vara Criminal e presidente do Tribunal do Júri de Nova Iguaçu, incluiu a perda de cargo público dos dois condenados na sentença, por entender que o afastamento da PM havia sido comunicado de forma imprópria e vaga à Justiça pela polícia. A assessoria de imprensa do TJ/RJ comentou da seguinte maneira a sentença proferida pela juíza:

«Segundo ela, os crimes foram bárbaros e a ousadia demonstrada pelos réus, escudada na sua condição de PMs, trouxe-lhes a expectativa de impunidade. Ela decretou a perda do cargo público dos condenados».

«Cuidou-se, nesta ação penal, de apurar crimes que, por seus bárbaros contornos, chocaram, não só a população dos municípios que deles foram palco, senão também a sociedade brasileira como um todo. De si mesmas, as circunstâncias em que se perpetraram as condutas criminosas contra as vidas de dezenas de inocentes, aleatória e inapelavelmente escolhidos entre populares que se espalhavam pelos mais diversos logradouros públicos entre os municípios de Nova Iguaçu e Queimados, revelam nos agentes invulgar audácia e temibilidade, a indicarem devam as referidas condutas merecermaior reprovabilidade social», afirmou a magistrada na sentença.

A juíza Elizabeth Louro disse ainda que «a chacina causou pânico, terror e desesperança na população local, principalmente porque os crimes foram praticados por aqueles que, por ocuparem o cargo de policial militar, deveriam estar comprometidos com a garantia da ordem e com a proteção da vida».

O terceiro acusado, o cabo Ivonei, apesar de ter vários antecedentes e indícios de participação em grupo de extermínio na Baixada, teve sua absolvição pedida pelo, próprio MP, por não terem se produzido provas que o ligassem ao restante do grupo, formado por Amaral, Siqueira, e outros três já condenados, os policiais Carvalho, Felipe e Fabiano, além do sargento Gilmar Simão, que foi beneficiado pela delação premiado mas acabou assassinado.

Aliás, ao longo do julgamento (que começou na segunda, 14/09) ficamos sabendo de vários casos de assassinatos, atentados e desaparecimentos durante o decorrer das investigações e do processo, envolvendo pessoas ligadas ao caso. Testemunhas de acusação e de defesa e os próprios acusados, como o PM Siqueira, que contou ter sido esfaqueado e quase morto na prisão por seus ex-colegas Carvalho e Felipe. Uma testemunha chave, que reconheceu a maioria dos acusados quando saíam do lava-jato em Queimados onde foram assassinadas várias vítimas, foi incluída no Programa de Proteção às Testemunhas mas o abandonou (como fazem grande parte das testemunhas incluídas no Provita, tamanha é a precariedade desse programa, como foi mais uma vez denunciado recentemente depois do assassinato de testemunhas contra paramilitares da favela do Barbante – Campo Grande, Zona Oeste do Rio). Essa testemunha encontra-se totalmente desaparecida, não se sabe se morreu ou se resolveu cuidar de sua segurança por conta própria, sumindo de circulação.

A grande imprensa esteve presente apenas na segunda-feira, e ausentou-se completamente durante o restante do julgamento, inclusive no final e na ocasião da sentença. Deixaram de registrar, portanto, as manifestações de júbilo e agradecimento dos familiares e amigos das vítimas, que permaneceram firmemente até o fim, e foram elogiados pela própria juíza Elizabeth Louro na saída do Fórum, que disse que eles deram a todos uma verdadeira lição de cidadania. Também não registraram a tensa saída do comboio de automóveis que levaram os familiares, amigos, promotores e juíza na silenciosa madrugada da Baixada Fluminense, prova concreta de que a condenação dos envolvidos na Chacina, embora muito importante na luta por justiça das vítimas da violência do Estado, não significa o fim do medo e da insegurança diante das quadrilhas armadas de policiais que há décadas aterrorizam a Baixada Fluminense.

Além dos familiares de Nova Iguaçu e especialmente de Queimados, estiveram presentes e solidários familiares de vítimas de vários outros casos do Rio: Acari (1990 e 1996), Vigário Geral, Candelária, Via Show, Guadalupe, Coroa. Muito importante e significativo, demonstrando que a luta das vítimas do Estado consolida-se como um movimento nacional, foi a presença das associações Amparo (de Santos) e Amparar (de São Paulo). No primeiro dia também esteve presente a Asfap da Bahia. Até o final e junto aos familiares, também estiveram militantes da Rede, do Tribunal Popular (SP), do DDH e do CDH de Nova Iguaçu. Tais presenças representaram bem a mobilização social que se manteve durante estes mais de quatro anos e que foi fundamental para o andamento das investigações e dos julgamentos.

Em breve publicaremos em nosso site entrevistas sobre o significado dos julgamentos na luta contra os grupos de extermínio na Baixada e em todo o Brasil.

Vejam fotos das faixas expostas no Fórum por familiares e movimentos no site da Rede .

Rede contra a Violência.

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