Favela de Acari sofre com desrespeito e violência policial e se mobiliza pelos Direitos Humanos

As “operações” policiais do 9o BPM, Delegacia de Combate às Drogas (Decod), Delegacia de Repressão a Armas e Explosivos (Drae), da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), entre outras, têm sido praticamente diárias e muito violentas há cerca de um mês. O desrespeito e as ofensas que normalmente acompanham as operações policiais em favelas tem atingido níveis absurdos em Acari. Sempre com o pretexto de “combate ao tráfico de drogas” e, mais particularmente, de “evitar uma guerra entre o tráfico de Acari e da Pedreira”, as operações tem servido muito mais, na verdade, para um aumento das extorsões cometidas por policiais, através de seqüestros, ameaças, agressões e execuções. Essa ação irresponsável e corrupta, como não podia deixar de ser, atinge a comunidade como um todo, pois se multiplicam os casos de invasões de domicílios (em muitas delas, após a saída dos policiais das casas, moradores verificaram o sumiço ou destruição de eletrodomésticos e outros bens), tiroteios em horários de entrada e saída das crianças da escola, etc.

Essas e outras foram as denúncias apresentadas por moradoras e moradores em reunião na comunidade realizada no dia 25/11. Além da Associação de Moradores do Amarelinho e organizações locais, estavam presentes a Rede, a Justiça Global, o DDH, o Cebraspo, o MNU(Movimento Negro Unificado), o MPF (Movimento Popular de Favelas) e a Comissão de Direitos Humanos da Alerj. Após reunirem-se na Sociedade São Dimas/Pastoral Penal, o grupo caminhou por parte da favela ouvindo novas denúncias de morador(e)s e foi até a creche Zilka Salaberry, onde se reuniu com a diretora, professoras, funcionárias, e mais a Associação de Moradores do Parque Acari/Vila Rica. Aí fomos informados do constante perigo a que estão submetidas as crianças, pais e mães e trabalhadoras das creches e escolas da comunidade, devido às operações policiais.

Dois dias antes, em 23/11, durante mais uma operação policial, policiais militares postaram-se na laje de uma casa em frente à creche, num objetivo claro de emboscada, e por volta das 16:40h, horário em que as crianças estavam saindo, efetuaram vários disparos, supostamente em direção a um “bandido”, causando pânico e terror. Esse tipo de ação, sem levar em conta a segurança das crianças e trabalhadoras, tem sido muito comum e tem tornado quase impossível o funcionamento da creche.

Entre as ações irregulares visando extorsão, foi relatado o caso do “seqüestro relâmpago” de uma moradora pela viatura número 520918 do 9o BPM no dia 12/11. A jovem fora aprisionada por policiais desde 9h, e a viatura vinha circulando pela comunidade com ela quase todo o dia. Na ocasião, a Rede e outras organizações foram contactadas, denunciaram o fato ao comando da PM, e a moradora foi libertada por volta das 18h.

Quanto às execuções sumárias, um caso evidente foi o assassinato do jovem Jorge Erê, participante do tráfico de drogas na favela, que no dia 06/11 foi surpreendido por policiais civis e se rendeu. Segundo testemunhas mesmo rendido foi baleado na perna, apresentado à imprensa e colocado na ambulância da polícia ainda com vida. Pouco depois a polícia informou que ele não resistira aos ferimentos e morrera no hospital. O laudo cadavérico indicou duas perfurações por arma de fogo no peito e na barriga, que Jorge aparentemente não tinha quando foi levado pela ambulância. Durante o enterro do jovem, no dia seguinte, moradores relataram ter verificado claros sinais de agressão no rosto de Jorge, inclusive uma ferida profunda no lado esquerdo.

As invasões de domicílio durante operações policiais são diárias e no dia 23/11 atingiram a casa de José Luís Faria da Silva, pai de Maicon (morto aos dois anos e meio em 1996 durante operação do 9o BPM) e militante da Rede. Aparentemente isso aconteceu enquanto José tinha saído da comunidade para participar da manifestação no Morro do Gambá, no Lins, em memória dos sete anos do assassinato de Hanry Silva Gomes de Siqueira por policiais militares. Em 31/03/2009 a casa de José Luís também foi arrombada e invadida, enquanto ele estava fora participando de manifestação em lembrança da Chacina da Baixada. Penha, ex-esposa de José Luís e mãe de Maicon, também teve sua casa revistada por policiais no dia 22/11 (neste caso não houve arrombamento). A casa de José Luís é decorada com grafites e mosaicos, e é facilmente identificável. Não é possível que policiais a tenham invadido sem que soubessem de quem era. Portanto é legítimo desconfiarmos que as operações da polícia também tem servido para intimidações e ameaças indiretas a militantes de direitos humanos da comunidade, como José Luís, Vanderlei da Cunha (Deley de Acari), e outros.

O grupo que visitou a comunidade no dia 25/11experimentou diretamente um pouco do terror a que a comunidade vem sendo submetida diariamente, quando deixou a creche após a reunião. Dois helicópteros da Polícia Civil faziam sobrevôos a baixíssima altitude sobre as ruas da favela, fazendo muito barulho e com as metralhadoras e fuzis bem visíveis a todos e apontados para baixo. Tal ação dos helicópteros aparentemente não tinha nenhum propósito específico. Parte do grupo, que se dirigiu até a casa de José Luís para registrar os sinais da invasão de 23/11, pode ver um grupo de policiais civis em um carro branco não oficial abordando moradores.

A visita do grupo e a reunião com a comunidade apontou uma série de medidas e mobilizações de emergência visando refrear a violência das operações policiais. Além das denúncias e encaminhamentos de casos específicos, propôs-se uma manifestação pública no dia 05/12 (em frente ao Hospital de Acari), uma visita da Anistia Internacional à comunidade no mesmo dia, e uma reunião com órgãos oficiais ligados à defesa dos direitos humanos (Subprocuradoria de Direitos Humanos do Ministério Público, Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria Pública e Comissão de Direitos Humanos da Alerj) na própria comunidade para denúncias coletivas.

Mas sabemos que isso é parte de uma luta muito maior, contra este Estado genocida que pratica um extermínio diário da população pobre e negra no Brasil. Somente a organização e a luta popular, em primeiro lugar das próprias comunidades atingidas por essa violência do Estado, poderá mudar de fato essa terrível realidade em que vivemos.

Todas as propostas serão aprofundadas e encaminhadas em nova reunião na comunidade que acontecerá hoje, 30/11, às 17h na Associação de Moradores do Parque Acari/Vila Rica, que fica na Rua Piracambu, 171.

Obs: Vejam mais fotos aqui.

Rede contra a Violência

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