Sob tensão e ameaças, acontece amanhã (09/03) a primeira audiência sobre o assassinato de Josenildo dos Santos (Morro da Coroa)
No dia 02/04/2009, uma violenta ação do 1o BPM no Morro da Coroa (Catumbi), levou à morte de 6 pessoas, inclusive o eletricista e lanterneiro Josenildo dos Santos (veja aqui), de 42 anos. Todas mortes foram registradas pelos policiais como “autos de resistência”, e todos foram acusados de ser traficantes, inclusive Josenildo, conhecido como Téo, trabalhador conhecido e querido em toda a comunidade.
Segundo testemunhas, no dia da chacina, após uma incursão mais cedo, alguns policiais permaneceriam escondidos e encapuzados, à espera de encontrar traficantes, num beco da favela que levava a um bar. Os policiais impediram a circulação dos moradores, e, numa clara ação de emboscada, atiraram indiscrimidamente na direção de vários jovens, mesmo sem ter havido confronto, segundo moradores. Josenildo, que passava neste momento, foi parado e levou um tiro em um de seus joelhos. Tentou, em vão, identificar-se dizendo que acabar de voltar do trabalho, e chegou a levantar as mãos para mostrar que estava sujo do trabalho na horta comunitária. Neste instante, já no chão, os policiais o executaram com um tiro na cabeça. As marcas de tiros no local atestaram não só a inexistência de confronto como os tiros de execução em direção ao solo. Ao que parece, a morte de Josenildo foi sido motivada pelo fato de que, ao descer para ir ao tal bar, testemunhou os policiais matando as outras pessoas.
O fato gerou grande mobilização de seus parentes e amigos, o que levou à denúncia de 4 PMs (Vagner Barbosa Santana, Carlos Eduardo Virgínio dos Santos, Jubson Alencar Cruz Souza e Leonardo José de Jesus Gomes) por homicídio. Essa vitória da família de Josenildo e da comunidade parece ter irritado os policiais do 1o BPM e levado-os atentarem uma represália (veja aqui). No dia 08/02/2010, dois parentes de Josenildo, um primo e uma irmã, Maristela Aparecida dos Santos, foram diretamente ameaçados pelos policiais, durante uma incursão que também levou à morte de dois jovens.
O primo, quando se encontrava próximo à casa de Maristela, foi abordado por um PM que apontou uma arma para seu rosto e perguntou se ele era parente de Josenildo. Quando ele respondeu que sim, o policial falou para que ele fosse embora dali se não “poderia tomar um tiro na cara”.
Maristela estava em casa pouco antes das 17h quando ouviu pancadas violentas na porta. Ao abri-la viu vários PMs fardados, com a identificação oculta, que entraram na casa revirando tudo e forçando portas, dizendo que “procuravam bandidos”. Depois de saírem de sua casa continuaram a aterrorizar o beco com ofensas e abordagens grosseiras, e passaram a tentar arrombar a casa de seu vizinho, Vitor de Oliveira Reis. Como a porta era resistente, quebraram um dos painéis dela e pelo buraco começaram a apontar os fuzis e ameaçar jogar uma granada. Vitor, muito assustado, aproximou-se da porta e foi puxado com violência para fora. Espancando-o e acusando-o de ser traficante, os policiais levaram-no para outra casa. Neste momento, Maristela, da janela, interveio preocupada com o que fariam com o rapaz, e um PM a xingou e apontou a arma para ela. Maristela conseguiu reconhecer que um dos policiais que participava dessas ações de agressão e intimidação havia participado da morte de seu irmão em 2009.
A violência da “operação” de 08/02 (mais de um morador afirmou que os dois jovens mortos ainda estavam vivos ainda que baleados, mas foram arrastados pelas escadarias da favela pelos policiais durante muito tempo), a ação de intimidação e ameaça no beco onde fica a casa da mãe e irmãos de Josenildo, e a atitude conivente dos policiais civis (da 6a DP e da CGU), que deveriam cumprir seu papel e registrar a queixa, mas criaram uma série de dificuldades, preocupam os parentes de Josenildo e os moradores da Coroa, ainda mais diante da audiência de amanhã.
Essa primeira audiência deveria ter acontecido no dia 17/11/2009, mas foi adiada porque testemunhas de defesa (dos policiais) não apareceram. Todas as testemunhas arroladas pela acusação (MP) estavam na comunidade por ocasião do homicídio, mas a defesa dos policiais só apresentou como “testemunhas” o coronel comandante do 1oBPM (do qual fazem parte os policiais acusados, e que na ocasião da chacina se apressou a dizer que “todos mortos eram bandidos”), dois delegados e dois peritos (não nomeados), dos quais só o primeiro estava presente. Como mais uma indicação de que este caso tem repercutido no meio policial e gerado insatisfação, estava presente à audiência o conhecido deputado Flávio Bolsonaro, que busca seu eleitorado entre militares e policiais, e que defende abertamente extermínio e tortura como métodos.
Por isso é muito importante a presença e a solidariedade de militantes sociais e de direitos humanos e da imprensa na audiência de amanhã. Vamos apoiar os familiares de Josenildo e moradores da Coroa em sua corajosa luta por justiça, contra a arbitrariedade e a covardia.