Por NotiLibertas
Longe dos hipócritas festejos do bicentenário do mau governo mexicano, milhares de homens e mulheres de mais de 17 Estados da república, e observadores de 5 países, incluindo diversas organizações, colectivos, grupos e indivíduos, realizaram a Sexta Assembleia Nacional dos Afectados Ambientais na comunidade de La Magdalena Ocotlán, Oaxaca, nos dias 11 e 12 de Setembro de 2010.
Durante esses dois dias pudemos partilhar a informação dos diferentes problemas ambientais que põem em risco o futuro do nosso ecossistema e da nossa sociedade; todos eles resultantes da avareza capitalista, da corrupção e do desprezo governamental pelas reclamações do povo, e da sua total complacência para com os projectos neoliberais de grandes empresas transnacionais. Ouvimos de viva voz os prejuízos sofridos por milhares de comunidades que resistem e constroem alternativas para esses males.
Entre os participantes estiveram os comuneros de Guerrero, que se opõem à barragem da Parota, assim como de outras regiões, os opositores à barragem de El Zapotillo de Temacapulín, e os opositores à barragem de La Yesca, em Jalisco, onde a CFE (Comissão Federal de Electricidade), sem dar ouvidos às reclamações, está a promover a construção de mais barragens, que desalojam comunidades camponesas e culturas ancestrais, modificam o curso dos rios causando terríveis inundações e secas, sofridas por muitos povos devido ao uso irresponsável dos recursos hídricos.
Também participaram afectados pela indústria mineira, na sua maioria proveniente de capitais canadianos e estadunidenses, que degradou e saqueou a terra na sua ambição capitalista, que vieram com as suas máquinas e covas no terreno, assim como a sua mortal mineração a céu aberto. Como a que atingiu o cerro de San Pedro em San Luís Potosi, apesar de ter sido declarada ilegal graças aos esforços de homens e mulheres corajosos que denunciaram essa prática sinistra, mas útil para um sistema político totalmente corrompido que deixou a empresa operar. O mesmo acontece com a mineração a céu aberto em San José del Progreso que contamina a água e cujos povoadores foram vítimas da sua repressão. Com mais de 2 mil concessões para minas a céu aberto, o governo mexicano ignora o dano que isso representa para milhares de comunidades, no que diz respeito à sua água, ao seu ar e à sua terra, afectando o futuro dos nossos filhos.
Participaram os afectados pelas petrolíferas como em Veracruz e Campeche, afectados pelo corte ilegal de árvores tolerado pelos governos locais e federais, como acontece na floresta de Michoacán. A estes juntam-se afectados da enorme Cidade do México, como os afectados pela construção de rodovias para ricos como a Super Via Poniente, assim como a construção urbanizadora dos poucos lugares rurais da cidade e de um dos seus mais importantes centros de recarga de aquíferos, hoje em perigo devido à cobiça e à corrupção das autoridades. E segue uma longa lista de agredidos por estas mesmas causas.
Além dos conflitos com as minas, houve grupos de pessoas que falaram de mundos novos possíveis com pequenos gérmenes que crescem nas suas comunidades. Assim, um camponês membro do comité pela defesa da água declarou que o seu trabalho era “fazer nascer a água na sua comunidade semeando árvores e criando zonas húmidas, recolhendo e filtrando as chuvas”, isto depois de o governo os ter ameaçado de os deixar sem água para continuarem a semear, com novas taxas para a criação de poços a preços exagerados. Ouvimos colonos que lutam contra lixeiras tóxicas, incineradoras de produtos venenosos, que procuram alternativas para a preservação e a defesa dos rios, lagos e mares. Por exemplo, um grupo de jovens biotécnicos, que se propõem manter e promover as sementes nativas não-transgénicas dos nossos povos perante a biopirataria e a ameaça dos grupos agro-industriais como a Monsanto, dizem preservar a essência dos cuidados com as sementes das nossas culturas ancestrais.
A estes somam-se as ideias das cada vez mais numerosas iniciativas em torno da defesa do milho e da cultura orgânica.
Não nos chegaram só vozes de denúncia. No âmbito da assembleia chegaram alternativas e propostas, em muitas das quais se está já trabalhando, para solucionar as problemáticas ambientais sem ficar à espera de que as soluções nos cheguem dos altos funcionários. Pelo contrário, as pessoas tomaram as suas vidas nas mãos e constroem um mundo novo, detendo o velho monstro e a sua voracidade e construindo novas perspectivas, de maneira comunitária e dando um alto grau de importância à defesa e aos cuidados com os recursos naturais. Ouvimos como os povos falam de defender as gerações futuras, povos que estão a defender a mãe natureza, o ar, a terra e a água contra os venenos que lançaram as condutas e as chaminés das grandes empresas. Assim avançam, procurando instâncias e alianças internacionais para, na solidariedade, encontrarem a força necessária para vencerem nas suas porfias [desafios].
A Assembleia Nacional dos Afectados Ambientais desenvolveu-se muito nos seus dois curtos anos de vida e, apesar do pouco tempo, cresceu e manteve-se. As pessoas organizam-se de forma horizontal, mantêm os seus processos de maneira autónoma mas sem deixarem de lado os laços de solidariedade. Procuram consensos a partir das suas enriquecedoras práticas de aplicação de meios e de alternativas, e assim construíram esta ponte de comunidades que estão resistindo ao novo embate colonialista depredador.
Os seus princípios são: o apoio mútuo, o respeito incondicional, a prioridade dada ao interesse da comunidade por sobre o das empresas e o do poder, a assembleia geral como órgão máximo de decisão, a não-delegação em líderes ou direcções mas sim a coordenação colectiva e aberta dos seus delegados designados pelas comunidades, “não lutar por dinheiro porque divide as comunidades”, assim como a auto-capacitação e a auto-informação.
Na base deste esquema, após dois dias de diálogo, acordaram: a realização de uma grande manifestação no último dia de Novembro para depois seguir para Cancún, onde se juntarão a milhares de manifestantes de outros Estados e países na primeira semana de Dezembro, para se manifestarem contra a reunião da COP 16 [16ª “Conferência das Partes”, das Nações Unidas, para avaliação da aplicação do Protocolo de Kioto sobre as alterações climáticas] onde o capitalismo e os governos corruptos negoceiam e decidem o saque dos recursos naturais e humanos sob a máscara de um falso interesse pelos efeitos do aquecimento global, um protesto que se segue ao já realizado em Copenhaga no ano passado.
Com a participação na agenda da Via Campesina Internacional e outros esforços mais, organizam-se caravanas internacionalistas que partirão de diversos Estados, para posteriormente se juntarem à mega-manifestação global na Cidade do México e partirem com as demais caravanas rumo à cidade de Cancún, onde denunciarão o governo mexicano como um ecocida ao serviço do capitalismo, que violou sistematicamente disposições ambientais de forma autoritária e antidemocrática.
Outro acordo importante foi a apresentação do Tribunal Permanente dos Povos, um tribunal de opinião de carácter não-governamental que serviu para a procura da verdade em casos relevantes a nível mundial de crimes de lesa-humanidade, o qual condenou guerras e genocídios, e que reúne personalidades “de alto nível moral e intelectual” e que agora se vai entregar à tarefa de julgar um governo pelos danos que causou ao meio ambiente e a todas as suas populações.
A sétima Assembleia realizar-se-á nas terras comunais de Guerrero, que sofrem com a tentativa de construção da barragem La Parota, na sequência da realização de assembleias regionais. Foram ratificados os seus delegados e canais de comunicação, e ampliado o número dos seus integrantes com as novas lutas de afectados ambientais.
Publicado (em castelhano) por NotiLibertas aqui. Tradução do Passa Palavra.
Fotos do NotiLibertas.