Tribunal-Iraque: 3ª Audiência Portuguesa “8 Anos Depois”
Programa
– Abertura da sessão
– Apresentação do grupo de jurados
– Intervenção inicial: Iraque. 8 anos depois, por Eduardo Maia Costa, jurista
– Depoimento: A situação das mulheres e das crianças no Iraque ocupado, por Haifa Zangana, escritora e activista iraquiana
– Deliberação do grupo de jurados
Jurados (membros confirmados)
Ana Benavente (ex-SE Educação, ex-deputada)
Ana Gaspar (professora, Sindicato Professores Grande Lisboa)
Diana Andringa (jornalista)
Eduarda Dionísio (professora)
Fernanda Mestrinho (jurista, jornalista, Associação Portuguesa de Mulheres Juristas)
Helena Carrilho (advogada, CGTP)
Isabel do Carmo (médica)
João Loff Barreto (advogado)
José Gonçalves da Costa (juiz)
Judite Almeida (professora, Sindicato Professores Norte)
Maria José Morgado (jurista, Procuradora-Geral Adjunta)
Natacha Amaro (Movimento Democrático de Mulheres)
Regina Marques (Movimento Democrático de Mulheres)
Susana Sousa Dias (cineasta)
Extractos do depoimento de Haifa Zangana
Num passado recente as mulheres iraquianas eram das mais emancipadas da região, com um elevado nível de educação e presentes em todas as esferas da vida profissional, onde desempenharam um papel activo e contribuíram para o progresso da sociedade. Hoje, estão empurradas para um canto, apertadas entre o esforço de sobreviver à destruição provocada pela guerra e as políticas feudais e sectárias (em nome da religião) promovidas pela classe política instalada no poder desde 2003.
Um fenómeno novo no Iraque é o casamento temporário. Um homem casa com uma mulher na presença de uma figura religiosa e especifica por quanto tempo vai durar o casamento, podendo ir desde algumas horas até muitos anos. É um contrato a termo, onde um homem paga a uma mulher um pequeno dote. A maioria das mulheres que aceitam casamentos temporários fazem-no apenas por necessidades materiais. Esta prática é vista como uma forma de prostituição religiosa.
O deputado Mohamed al Dainy declarou, em 2007, que houve 190 queixas feitas por mulheres contra as forças de segurança e de defesa iraquianas por agressões sexuais. Nenhum procedimento adequado foi seguido para punir os agressores e evitar que tais crimes sejam repetidos. Este número é apenas a ponta de um iceberg.
Um relatório da UNICEF de Abril 2008 indicou que 1500 crianças estavam sob custódia das forças oficiais iraquianas e dos EUA. Em alguns casos, são mantidas presas no mesmo espaço dos adultos, expondo-as a mais riscos de agressão e abuso. Relatórios dos meios de comunicação sobre a prisão para crianças de Al Karkh revelam uma longa lista de maus tratos, abusos e violações.
Testemunhos de tortura relatados pela AI ao longo de anos incluem violação e ameaça de violação, espancamentos com cordas e mangueiras, choques eléctricos, suspensão pelos membros, perfuração do corpo com berbequins, asfixia com sacos e plástico, e quebra de membros.
Os ocupantes culpam os “insurgentes” da morte de civis, especialmente mulheres e crianças. Mas um estudo recente de investigadores britânicos e suíços, com dados fornecidos pelo grupo de direitos humanos Iraq Body Count, descobriu que, de Março 2003 a Março 2008, a maior parte das mortes de mulheres e de crianças, entre os civis mortos por certos tipos de armas, foi provocada pelas “forças da coligação”, em particular por ataques aéreos das forças de ocupação.
Em 2006/7 crianças de Bagdad e dos arredores tinham de passar sobre cadáveres no caminho para a escola. Viram corpos serem comidos por cães vadios. Recolheres obrigatórios repentinos e explosões de violência afectam as crianças, que têm de viver passando de um grande trauma para o seguinte. Muitas crianças têm de suportar o abandono da casa, a separação dos seus amigos e do meio que lhes é familiar para enfrentarem um futuro incerto como ‘refugiados’ sem rendimentos ou apoio adequado.
Calcula-se que 43% dos iraquianos vivem numa pobreza abjecta. As crianças são nestes casos postas a trabalhar em vez de irem à escola, outras tornam-se pedintes nos locais públicos e nos mercados. Estas crianças trabalham longas horas e não têm nenhuma protecção contra a exploração e os abusos. Nenhuma protecção contra a exposição a doenças sociais como a prostituição infantil e o uso de drogas. Este problema particular é especialmente agudo para as crianças ‘refugiadas’ nos países vizinhos do Iraque.