Armada com algumas câmaras [câmeras] Kodak Zi8, seis telemóveis [celulares] Wildfire HTC, energia e competência em formação de jornalistas populares, a Small World News está a trabalhar para dar a conhecer ao mundo notícias sobre a Líbia. Por Melissa Ulbricht, MobileActive.org

A Small World News [Notícias do Pequeno Mundo, ou Pequenas Notícias do Mundo] está no terreno em Benghazi treinando líbios na captação e montagem de reportagens em vídeo acerca do que acontece nessa conturbada região. Ao mesmo tempo, a equipa também faz reportagens que a mídia dominante do sistema não consegue fazer. O MobileActive.org conversou a noite passada, por chat, com Brian Conley, fundador da Small World News, para ele nos contar como estão a correr as coisas. Ficámos a saber que a captação e a partilha de matérias da Líbia tem tanto a ver com tecnologia como com o estabelecimento de relações de confiança e de contactos com os jornalistas que estão no terreno.

A Small World News e a Alive.in

A Small World News é uma produtora de documentários e novos suportes de comunicação que fornece instrumentos aos jornalistas e aos cidadãos de todo o mundo para contarem histórias sobre as suas próprias vidas. Já havíamos falado da Small World News que, no passado, ajudou uma agência noticiosa independente do Afeganistão a integrar os telemóveis [celulares] e as SMS nos seus serviços noticiosos.

f_libiaswn04No âmbito do seu trabalho na Líbia, a Small World News capta reportagens áudio de pessoas que estão no terreno, que depois são transmitidas para um amplo público internacional. Isso é feito através do Speak2Tweet, um projecto conjunto Google-Twitter e SayNow, que permite a uma pessoa enviar mensagens tweet ligando por telefone para um número e deixando mensagens faladas [“voice mail”].

Conley e a sua equipa reconheceram a possibilidade que dá o Speak2Tweet de contornar os cortes da comunicação via internet, e sabiam que isso poderia ser potenciado com a tradução dos conteúdos para inglês, atingindo assim um público mais vasto. Neste preciso momento, na Líbia, qualquer pessoa pode enviar um tweet deixando uma mensagem de voz num número internacional (+16504194196, +390662207294, e +442033184514) e o serviço enviará automaticamente a mensagem para o Twitter usando o “hashtag” [referência] #libya e #feb17.

Conley e a sua equipa estão, também, a treinar pessoas em Banghazi para publicarem esses conteúdos no [site] Alive.in/libya. A empresa criou muitos outros sites Alive.in, como o Alive.in/egypt, o Alive.in/bahrain e o Alive.in/iraq. Os sites são “orientados pela necessidade premente que têm os movimentos democráticos de comunicarem a realidade dos acontecimentos activamente escondidos pelos governos autoritários e pelos médias [mídia] estatais”, declara a Small World.

AUTONOMIZAR A INFORMAÇÃO POPULAR DIRECTA
Desde o dia 11 de Março, a Small World News [Notícias do Pequeno Mundo] tem estado em Benghazi, Líbia, com o generoso apoio da Access [accessnow.org] na divulgação do Alive.in/Libya a partir do terreno. Temos estado a trabalhar intensamente para treinar uma equipa de videojornalistas populares, recrutados entre a juventude local. No curto espaço de uma semana, demos aos participantes uma formação básica em produção [de] vídeo e conseguimos ultrapassar as limitações tecnológicas impostas pela actual crise na Líbia, abrindo um canal de comunicação popular com a comunidade internacional, que esperamos possa alargar-se nos próximos dias.
Esta nossa iniciativa teve como motivação de base uma grande curiosidade acerca da natureza dessa juventude que está a redesenhar o rosto no Médio-Oriente sob a bandeira dos valores universais da liberdade, da dignidade e da autodeterminação. O que viemos encontrar parece bom demais para ser verdade. E, à luz da nossa experiência até aqui, nos parece ser bem real.
Nas deslocações que fizemos a regiões assoladas por conflitos violentos, sempre conseguimos encontrar bons amigos que desafiam os nossos estranhos e nocivos preconceitos acerca das pessoas que vivem nas zonas “perigosas” do mundo. A Líbia não é excepção. Os nossos interlocutores são médicos, engenheiros, professores, trabalhadores do comércio e técnicos informáticos cujas vidas mudaram radicalmente em poucas semanas.
O espírito cívico libertado pela revolução de 17 de Fevereiro é algo que testemunhamos com humildade. A espontaneidade da sublevação foi de par com os subsequentes esforços de auto-organização que devolveram a muita gente o sentimento de serem donos do seu país. Nos cidadãos normais, lançou um desejo, há muito tempo frustrado, de corrigirem a impressão geral que o mundo possa ter deles e que resulta de se verem associados, há muito tempo, ao regime de Muammar Khadafi. Muitos deles exprimem, agora, o desejo de mostrar ao mundo o que consideram ser o seu verdadeiro rosto.
O nosso objectivo é facilitar a concretização deste desejo de auto-expressão através da organização de uma equipa de produção; facultar-lhes o uso de instrumentos de comunicação baratos, leves e versáteis; desenvolver um método eficaz de enviar conteúdos para a internet, com os condicionalismos locais; e criar uma plataforma na internet, com as suas armas de comunicação comunitária, para os dar a conhecer em todo o mundo.
Louis Abelman, da SmallWorldNews.tv, original aqui. Tradução do Passa Palavra.

O conteúdo dos sites é uma escolha dos materiais disponíveis a partir da internet e também da construção de uma rede de pessoas “com banda estreita [de internet] e fortes barreiras a uma informação de confiança.” A Small World News está agora em Benghazi para fazer isso mesmo: “organizar e treinar uma equipa de jovens líbios locais que querem produzir vídeos sobre o que está a acontecer, e informar o mundo”, diz Conley.

O que a Small World News está a fazer em Benghazi

No começo, Conley e a sua equipa estavam apenas a traduzir as mensagens à medida que iam chegando via Speak2Tweet, e a tentar puxar vídeos interessantes da internet, traduzindo-os e legendando-os quando necessário. Mas a organização conseguiu financiamento seguro para uma viagem à Líbia e agora está em Benghazi a treinar jornalistas populares individuais autóctones. “Fomos convidados por líbios a treinar pessoas locais na captação de vídeos e na produção dos seus próprios conteúdos”, disse Conley.

A Small World News chegou na sexta-feira [11 de Março] com várias câmaras [câmeras] Kodak Zi8 e seis telemóveis Wildfire HTC. Encontrou líbios que queriam aprender como produzir e partilhar conteúdos com facilidade. “Fizemos contactos pessoais e tudo foi construído a partir daí”, disse Conley.

De facto acabaram por se haver com demasiada gente interessada. “Começámos a apalpar o terreno, tentando perceber a quem é que poderíamos dar formação, até que ficámos com demasiada gente para formar,” disse Conley. “Não temos equipamento suficiente para tanta gente.”

Aconteceu um grupo de formandos ter-se constituído praticamente por acaso. Conley estava a trabalhar num centro de jornalismo onde a sua equipa começara por se basear e, quando surgiu um problema logístico, telefonou a um contacto pessoal. Mas deu-se o caso de se tratar de outra pessoa com o mesmo nome. Conley apresentou-se e explicou o propósito da sua estadia em Benghazi. “Ficámos a conversar, e essa pessoa acabou por dizer que ele e os seus amigos gostariam de realizar alguma documentação em vídeo acerca do que estava a acontecer na Líbia”, disse Conley. “Veio mesmo a calhar, porque se tratava de um grupo de pessoas que já se conheciam, que queriam fazer esse tipo de trabalho, e que estavam à procura de quem os orientasse. Foi mágico.”

A Small World News tem agora uma equipa de uma dúzia de homens e mulheres, entre os 16 e os 30 anos de idade, que estão a aprender como produzir conteúdos em vídeo.

Objectivo: construir um canal eficaz para os conteúdos

O objectivo, disse Conley, é construir um canal eficaz e sustentável para os conteúdos produzidos por cidadãos acerca da vida quotidiana na Líbia, capaz de atingir um público mais amplo. A Small World News espera que se chegue à criação de um site local, mas por agora o conteúdo do site Alive.in/libya “visa atingir directamente a comunidade internacional e, em geral, o público de todo o mundo.”

f_libiaswn02“Basicamente,” disse Conley, “é um lugar para dar aos líbios um meio de falarem directamente para o mundo.”

A Small World News também está a usar o Alive.in/libya para puxar conteúdos das redes sociais e partilhar conteúdos locais. No futuro, vai considerar a possibilidade de os indivíduos, por si mesmos, poderem dar a conhecer as suas próprias reportagens, seja por meio de uma “hashtag” específica, ou subindo-as para uma “dropbox” [caixa de depósito] pública. “Quando voltar a haver internet, acho que muito mais gente poderá publicar os seus conteúdos,” disse Conley.

Então como é que a Small World News consegue captar conteúdos com uma internet e umas comunicações móveis tão pouco fiáveis na região? Conley responde: “Basta sabermos com quem falar.” Meio a brincar, disse que “estamos em condições de conseguir essa conexão falando com alguém que conheça o primo de alguém.” A Small World News também dispõe da opção de cópia de segurança via satélite, à qual ainda não teve de recorrer.

Possibilidade única de reportagem a partir das linhas da frente

Além de treinar líbios na produção de reportagens em vídeo, a Small World News teve a oportunidade de captar reportagens extraordinárias a partir da porta oriental da cidade de Ajdabiyah. “Neste preciso momento estamos a transmitir para as redes mediáticas porque estamos, agora, a recolher uma reportagem que, temos a certeza, mais ninguém está a fazer,” disse Conley. Podem ver-se vários vídeos acabados de publicar no site Alive.in/libya.

Porquê? Porque muitos jornalistas profissionais estão a ser impedidos de se dirigirem às linhas da frente, disse Conley. Os locais têm muitas vezes a possibilidade de chegar mais perto e de captar material bruto de reportagem. “Uma série de meios de comunicação foram-se embora, e muitos mais estão agora em vias de ir,” disse Conley. “Diz-se que as pessoas vão embora sobretudo porque não conseguem ter acesso, e estão a gastar imenso dinheiro para se manterem aqui.”

f_libiaswn05O que, naturalmente, levanta a questão da segurança. Sobre as suas deslocações em Benghazi na sexta-feira, Conley disse que “era perfeitamente seguro”. Não teve problemas nenhuns e estava tudo calmo o tempo todo.

Mas “o problema mais importante é que há muita confusão sobre quem é jornalista credenciado. As pessoas têm medo quando veem líbios a filmar vídeos porque há muita paranóia com a possibilidade de haver elementos leais a Khadafi e infiltrados,” disse Conley. “Há que ter muitas cautelas, sobretudo depois do assassinato recente de um jornalista da Al-Jazira.”

É óbvio que existe um problema de confiança e de estresse. “Assegurar que toda a gente se sinta segura e determinar como levar a oposição a perceber que nós estamos aqui para ajudar e, também, que estamos aqui convidados,” disse Conley. “É uma situação muito fluida. Sendo mais ou menos segura fisicamente, há muita tensão no ar, muito estresse”, referiu.

Também tivemos desafios técnicos. Primeiro, a conta do equipamento de satélite da nossa equipa não tinha sido activada, e Conley descobriu que esse pagamento nunca havia sido feito. Demorou alguns dias a conseguir pô-la a funcionar, mas quando falámos com ele a situação já tinha sido testada e estava tudo a funcionar.

Apesar dos desafios inerentes ao trabalho a partir da Líbia, a Small World News tem tido êxitos consideráveis. À cabeça, o ter conseguido publicar muitos vídeos no site Alive.in/libya – quase 500 Mb. “Conseguimos subir 20 ou 30 clips,” disse Conley, e ainda estamos a traduzir alguns conteúdos. A equipa tem a colaboração dos mesmos tradutores que a ajudaram no Egipto. (Ver aqui mais informação sobre o que fizeram no Egipto). Na legendagem está de momento a ser usado o Universal Subtitles, sobretudo porque a internet continua muito lenta.

Tecnologia dos telemóveis [celulares]

“Para as comunicações, os telemóveis [celulares] não se revelaram assim tão úteis,” disse Conley. Ele e o seu colega começaram por trazer seis telefones Wildfire HTC, mas não conseguiram ligar três deles. As mensagens de texto estão “totalmente desactivadas” na região, as redes “vão e vêm” e não há serviço GPRS [transmissão de dados mais rápida, por pacotes]. Mas as pessoas, especialmente os jornalistas, têm usado o Nokia E72, ou equivalente, para captar as reportagens.

Actualização: Na terça-feira [15 de Março] Conley contou que todas as redes móveis tinham ido abaixo. Antes tinham sinal, mas as chamadas não passavam. Agora não há sinal nenhum.

Conley sublinha o papel importante dos telemóveis [celulares] na recolha e na partilha de vídeos, sobretudo por meio do bluetooth. “É o modo que mais temos usado para visionar os vídeos feitos por locais,” disse. “Os telemóveis [celulares] têm, neste momento, um papel muito importante na produção e na distribuição de materiais, e não apenas em termos de comunicação.” De momento, a comunicação no terreno parece ser mais conseguida pessoa-a-pessoa e através do treino individual.

Artigo original (em inglês) aqui. Tradução do Passa Palavra.

1 COMENTÁRIO

  1. fizemos uma oficina vountária em ocupas no rio de 4 dias, cobrindo com os participantes da oficina no 3 dia, o ato, a entrada e o despejo da ocupação guerreiros urbanos no centro do rio que foi duramente reprimida pela pm.
    As cameras captaram tudo e corremos pra editar o material que salvou os 7 detidos de serem indicidos, pois a cobertura possibilitou a exposição da truculência da pm.. confiram ai

    http://cinestesicos.wordpress.com/2010/12/15/video-da-desocupacao-no-rio/

    http://cinestesicos.wordpress.com/2010/12/20/videos-do-despejo-da-ocupacao-guerreiros-urbanos/

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