Na urgência dos últimos acontecimentos, pouco sobra além de agir em defesa dos companheiros e companheiras em luta. Por Paíque

Em uma das últimas áreas de cerrado nativo do Distrito Federal (DF) setores massivos do capital imobiliário estão construindo um bairro de altíssima renda, chamado Setor Noroeste. O projeto, antigo, remonta a uma distorção do documento Brasília Revisitada, em que o planejador Lúcio Costa cogita a construção do bairro “caso haja necessidade”. Algumas tentativas anteriores de erguer este empreendimento foram barradas, até que na gestão passada do governo do DF os então representantes da especulação imobiliária, Paulo Octávio e José Roberto Arruda, colocaram a construção do bairro como empreendimento prioritário do governo.

santuarioObviamente a construção do Setor Noroeste não responde a qualquer necessidade ou demanda, dado que o bairro terá o metro quadrado mais caro do país – estimado em 10 mil reais. Talvez responda ao avanço de grandes especuladoras imobiliárias em ampliar sua área de atuação rumo ao DF; talvez aos interesses vinculados às reformas urbanas do capital montadas para a Copa do Mundo de 2014. Vestindo-se sobre a roupagem de bairro verde, esta área destruirá uma das últimas reservas de cerrado nativo do DF, a última da área central da cidade.

Para além disso, há uma comunidade indígena que há mais de 40 anos ocupa o local. É a comunidade multiétnica Santuário dos Pajés, que exige demarcação de uma área de 50 hectares no local. Esta demanda entra em conflito direto com os interesses das empreiteiras locais, e desde então montou-se o conflito que pode ser bem compreendido no filme “Sagrada Terra Especulada – A luta contra o setor noroeste” (2011, 70 min.), produzido pelo Centro de Mídia Independente há alguns meses e premiado no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro no começo de outubro. [veja o vídeo abaixo]

Além disso, o Laudo Antropológico da área, encomendado pela Funai, ficou pronto. Nele reconhece-se que a área é tradicional e recomenda-se que o processo de demarcação seja iniciado. A direção da Funai, porém, afirma publicamente que o estudo é fraco e em seguida some sem pronunciar-se sobre a demarcação ou encaminhar o laudo para os órgãos legais.

Desde então algumas questões acirraram ainda mais o conflito. A Emplavi, empresa especialmente interessada em retirar a comunidade indígena do local, contrata como advogado o ex-presidente da Terracap na gestão Paulo Octávio-Arruda, Antonio Gomes. A atual gestão do GDF – Agnelo Queirós e Tadeu Filipelli – mantém-se publicamente calada e dá algum suporte às ações da empreiteira. Esta invade área sob júdice – em processo de demarcação – e inicia a construção irregular de um prédio. As mobilizações se acirram, como pode ser visto aqui e aqui.

Um grupo amplo de apoiadores/as do Santuário dos Pajés se organiza e passa a empreender ações diretas simultâneas em defesa da demarcação dos 50 hectares reivindicados. A Emplavi realiza manobras legais, avança em decisões jurídicas e recomeça a construção. O movimento radicaliza suas ações e no dia 12 de outubro reocupa a área, destruindo as construções já realizadas.

paje-na-estrada-aberta_foto-de-jose-martinsNa manhã do dia 13, a Construtora Brasal, em solidariedade à Emplavi, invadiu uma área a menos de 100 metros do núcleo do Santuário dos Pajés. A segurança privada da empresa, junto com a polícia, realiza um conjunto de agressões muito mais violentas. Até o momento, os relatos que recebemos são de dezenas de pessoas feridas, um apoiador com um corte na cabeça, um indígena que foi espancado até ser rendido preso e um apoiador que foi desmaiado também sob detenção. A construtora passou com o trator nas estradas de acesso ao Santuário dos Pajés, de forma que não se pode chegar de carro ao local – somente com caminhadas de cerca de dois quilômetros na terra. Há rumores de barreiras de seguranças impedindo a entrada no local.

Esta luta não começou há algumas semanas nem encerrar-se-á em alguns meses. Ela envolve uma série de questões tanto sobre o tipo de organização, militância, relação com as comunidades tradicionais, quanto enganos de governos construídos por partidos situados na esquerda, lutas contra a especulação imobiliária e uma série de outros temas a noticiar/apoiar/refletir. Mas, na urgência dos últimos acontecimentos, pouco sobra além de agir – talvez um pouco desesperadamente – em defesa dos companheiros e companheiras em luta.

Sagrada Terra Especulada – A luta contra o setor noroeste


1 COMENTÁRIO

  1. Leiam a Ação Civil Pública impretada pelo MPF para defender o Santuário dos Pajés, trans um bom histórico das vastas irregularidades do processo de licenciamento do Setor Noroeste, que fez com que o Estado colocasse empresas contra os Indígenas, antes de resolver a questão da ocupação tradicional da Terra.

    http://brasil.indymedia.org/media/2009/11//459308.pdf

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