2012-06-11
Na última quinta-feira 07/06, em pleno feriado de Corpus Christi, o mecânico Jackson Lessa dos Santos, 20 anos, saiu da obra onde ajudava seu pai, na favela do Fogueteiro (Catumbi), passou na casa da irmã, Jacqueline, para levar o sobrinho à sua casa, onde o esperava a esposa e seus três filhos. Por volta das 15h, dirigia-se para um bar, onde se encontravam várias crianças, para comprar biscoitos, quando foi surpreendido pelo aparecimento de seis policiais militares vindo do Beco da Raia, já atirando.
Jackson foi atingido nas costas e cercado pelos PMs. Segundo diversas testemunhas, implorou para que o deixassem viver, mas os policiais o executaram com diversos tiros no rosto. A violência da execução foi tamanha que um membro da Rede contra a Violência, irmão de Josenildo dos Santos, assassinado por policiais em 2009, localizou pedaços da arcada dentária de Jackson no local da execução, o que indica que seu crânio foi praticamente estraçalhado a tiros.
A irmã de Jackson tentaram ainda socorrê-lo mas foi agredida pelos policiais, que arrastaram o corpo como se fosse um animal, infringindo ainda por cima todas as recomendações de não alteração do local para execução de perícia técnica. O corpo foi colocado numa viatura e levado para o Hospital Sousa Aguiar, embora já fosse evidentemente um cadáver. Esse tipo de ação visa normalmente justificar a remoção do corpo sob pretexto de “socorro” às vítimas, e conta infelizmente com a conivência de funcionários dos hospitais que aceitam dar entrada em cadáveres.
Todas as testemunhas negam que houve troca de tiros e a irmã de Jackson, Jacqueline, e outras testemunhas, afirmaram que os PMs rasgaram o documento do mecânico e ainda colocaram uma arma em suas mãos e efetuaram pelo menos um tiro. Como normalmente faz a PM em favelas para encobrir seus crimes cometidos contra trabalhadores pobres e negros, a Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Coroa/Fallet/Fogueteiro divulgou uma nota alegando que houve confronto durante uma operação e que com Jackson foram encontradas armas e drogas. Como os parentes imediatamente procuraram a imprensa e denunciaram a execução, a PM foi obrigada a recolher armas dos policiais para a perícia, mas só o fizeram para dois PMs, enquanto pelo menos seis participaram da ação. Segundo as testemunhas, entre estes PMs está um policial conhecido como “Espinha”, conhecido como matador por atirar imprudentemente nas operações policiais, sem nenhum cuidado pela presença de pessoas, inclusive crianças. Policiais civis só chegaram ao local para realizar uma “perícia” cerca de três horas após o fato.
Parentes e amigos de Jackson, muito revoltados, enterraram seu corpo no sábado 09/06, após sua mãe, Edileide, conseguir liberá-lo no IML. Membros da Rede contra a Violência estiveram presentes e já organizaram o encaminhamento dos parentes e testemunhas ao Ministério Público e à Defensoria Pública para formalizar a denúncia de assassinato.
A brutal execução de Jackson acontece quase exatamente um ano depois do primeiro caso de execução sumária numa favela ocupada por UPP, o assassinato de André de Lima Cardoso Ferreira no Pavão-Pavãozinho em 12/06/2011, caso também acompanhado pela Rede, que levou à denúncia por homicídio de dois PMs (a primeira audiência judicial do processo será no próximo dia 16/07). Desde então, as denúncias de graves abusos cometidos por pinicais das UPPs, inclusive violência sexual contra moradoras das comunidades e roubos. Existem inclusive relatos de outras execuções, não denunciadas porque teriam sido de pessoas realmente ligadas ao tráfico de drogas, feitos por moradores, acusando policiais da mesma UPP do Fogueteiro e da UPP vizinha do Morro da Mineira. A Rede tem denunciado sistematicamente violações no Pavão-Pavãozinho-Cantagalo, e as denúncias são tantas que já estão sendo feitas freqüentemente pela grande imprensa mesmo.
Esses fatos desmentem completamente a alegação oficial, do governo estadual e em especial da Secretaria de Segurança Pública, de que os policiais das UPPs receberam um treinamento diferenciado e que não repetem os métodos brutais e corruptos que sempre caracterizaram a atuação das Polícias Militar e Civil nas favelas e periferias do Rio de Janeiro. Embora não se possa afirmar que todos os policiais das UPPs estejam envolvidos nesses atos e violações, é fato inegável que subsistem violentas quadrilhas que aterrorizam os moradores nos “plantões do terror”, e a situação tende a se agravar com a implantação das UPPs em outras regiões fora do eixo Centro-Zona Sul-Tijuca, onde pelo menos as denúncias são mais fáceis de serem realizadas junto à imprensa, a órgãos do poder público e organizações defensoras dos Direitos Humanos.