Aos que sofrem com a repressão:

Hoje (11 de outubro) o Estado realizou uma das maiores ofensivas contra as lutas que explodem no Rio de Janeiro. Não é necessário o esforço de recontar os fatos, mas acho importante ressaltar alguns deles para que possamos entender o que está se passando e como reagir. Dezessete mandatos foram expedidos contra militantes de organizações combativas e libertárias. Computadores, pendrives, câmeras, CDs e DVDs foram apreendidos. Além disso veio à tona o fato de que uma militante teve seu sigilo telefônico quebrado no dia 4 de julho, ou seja, há muito que são registradas as suas ligações.

O que isso significa? Que não era paranoia os comentários dos que acreditavam poder estarem sendo gravados em junho, o Estado está sim rastreando nossas movimentações e isso ultrapassa em muito nossa impressão de privacidade e sigilo. Uma ação coordenada pela Interpol articula a investigação dos manifestantes do Rio de Janeiro com a de outras cidades do Brasil e do mundo. É um esforço claro de construir a imagem de uma organização criminosa que facilmente irá caber nas leis antiterrorismo e de Segurança Nacional que começam a serem mobilizadas para criminalizar os manifestantes. Estratégias já utilizadas por outros países chegam finalmente ao Brasil: vale a pena analisar o que está acontecendo no Chile, na França, no México, no Uruguai, na Espanha e em muitos outros lugares. Se modelos são repetidos, cabe a nós conhecê-los para nos protegermos.

Para não correr o risco de me alongar, vamos à contra-ofensiva. É possível se proteger dessas ações? Essa resposta ninguém tem, mas algumas experiências podemos trocar:

– Com relação à segurança na internet e nas nossas comunicações, recomendo uma lista de alternativas para nossos usos habituais. Ela é fruto de um esforço contra o esquema de controle dos EUA conhecido como PRISM. É uma lista auto-explicativa e qualquer dúvida é só recorrer aos fóruns e a buscas que não é muito difícil de solucionar: https://prism-break.org/. É preciso usar outros servidores de e-mail, outros mecanismos de busca e de comunicação instantânea.

– Se estão recolhendo nossos computadores, cabe torná-los difícil de serem analisados. Isso é possível a partir da criptografia do disco rígido. Com um sistema operacional como o Debian isso é possível de ser feito na própria instalação sem precisar entender nada de criptografia. A polícia vai ter muito trabalho para abri-lo: http://www.debian.org/. Mas lembrando que se você deixar os arquivos no pendrive sem proteção, isso não vai adiantar muito.

– Com relação a escutas telefônicas o problema é maior. A melhor solução é utilizar o velho orelhão se for falar algo muito comprometedor, mas é possível também arrumar outros chips para despistar o controle. É bom lembrar que alguns aparelhos continuam gravando mesmo quando desligados, então o melhor é não deixar os celulares perto de reuniões. Sobre o Facebook o melhor é sair. Mas se for usar, vale usar alguns artifícios para esconder o IP: como o VPN (https://help.riseup.net/pt/pt-vpn). O TOR (https://www.torproject.org/) geralmente é bloqueado pelo Facebook, mas é uma ótima opção para qualquer outro site. As prisões dos administradores da página do BlackBloc provam que um IP falso não adianta nada no Facebook.

– Para além da internet e dos computadores, é necessário introduzir mais seriamente no Brasil uma discussão sobre cultura de segurança. Cuidado com o que você diz e para quem você diz. Sempre seremos vigiados e sempre haverão infiltrados, mas cabe a nós não fornecer provas que nos incriminem. Uma boa introdução para a discussão é um texto do Crimethinc: http://pt.protopia.at/wiki/Cultura_de_Seguran%C3%A7a

Essas “dicas” não são manuais infalíveis. São meros apontamentos para continuarmos nos capacitando para a resistência. Se estamos dispostos a viver a luta pela emancipação não devemos nos expor gratuitamente. Essa é uma opção de vida e portanto não adianta um currículo de prisões, mas uma construção que não seja interrompida pelas grades do Estado.

O principal já foi dito, mas gostaria de dizer uma palavras finais sobre visibilidade e invisibilidade. Essa é uma discussão central na nossa ação política porque dialoga com os problemas da mobilização, da segurança e das alianças. Sugiro que levemos mais a sério a opção de nos organizarmos nas sombras para que melhor possamos evitar o controle. Assim que nos tornamos visíveis, a ampola da repressão começa a contar: nosso tempo para a próxima ofensiva diminui. É preciso retardar isso, pelo menos até a hora em que sejamos capazes de fazer o golpe certeiro.

Nenhum passo atrás!

Escritor

 

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