Vítor Gomes Bento, 8 anos, baleado ontem na cabeça no Morro dos Macacos.
Os protestos contra a UPP não são o problema.
Eles apontam o caminho para as soluções.
Ontem à noite, mais um episódio que expõe a falência de um projeto de “segurança pública” que já nasceu falido. Durante uma ação dos policiais da UPP do Morro dos Macacos, em Vila Isabel, supostamente em confronto com traficantes armados, Vítor Gomes Bento, de 8 anos, foi atingido na cabeça por munição letal, pouco depois de ter saído da escola. Vitor foi socorrido por moradores e levado ao Hospital do Andaraí, onde teve ser submetido a uma cirurgia de mais de 5 horas. Seu estado ainda é grave.
Revoltados com mais esse episódio absurdo em uma favela dita “pacificada”, moradores começaram a protestar dentro e fora da comunidade. A UPP, reforçada pelo BPChoque, Bope e Grupamento Aéreo e Marítimo (GAM), sitiou a favela e começou a reprimir os moradores rebelados. Foram usadas armas letais e não letais.
Mesmo a grande imprensa, que geralmente limita-se a reproduzir a versão da polícia, teve que registrar os abusos e violências da repressão ao protesto. Mais três crianças também deram entrada no Hospital do Andaraí, com sinais de intoxicação por gás de pimenta. Uma outra criança deu entrada com escoriações. O Extra reproduziu o depoimento da diarista Luciene Cosme da Silva, cujos netos, Andrey, de 1 ano, e Wallace, de 3, desmaiaram devido às bombas da PM:
“Eu estava com meus netos dentro de casa , na Rua Armando de Albuquerque, quando começaram a jogar bombas e gás de pimenta. As crianças passaram muito mal e desmaiaram. Fiquei desesperada. A minha sobrinha de 14 anos, Yasmin, foi quem me ajudou a carregar as crianças. Moro no morro há 36 anos e nunca vi isso acontecer. Estão jogando gás e está entrando na nossa casa. É um absurdo o que esses policiais fizeram”.
Antes da UPP, claro, ações policiais também levavam a mortes de moradores, inclusive crianças, no Morro dos Macacos. Lembramos do caso da pequena Alana Ezequiel, 11 anos, assassinada em março de 2007, por exemplo, em caso que repercutiu nacionalmente, inclusive porque aconteceu pouco depois da morte brutal do pequeno João Hélio durante um assalto (fevereiro de 2007). Contudo, se muita gente ainda se lembra e se revolta com o caso de João Hélio, quem ainda fala de Alana, menina negra moradora de favela?
Mas agora, além das mortes por “balas perdidas” continuarem, os moradores ainda têm que ver suas crianças vitimadas pela brutalidade da repressão policial aos protestos cada vez mais freqüentes nas comunidades contra a violência e a opressão da ocupação militar das UPPs. Hoje, praticamente não passa uma semana sem um grande protesto numa comunidade ocupada por UPP, principalmente por parte da juventude, quem mais sofre com as humilhações e as abordagens. Ao invés de ficar inventando histórias sobre uma “ação orquestrada do tráfico”, os governos e a classe média racista e preconceituosa deveriam perceber que as revoltas sempre acontecem depois de um fato absurdo como foi o tiro que atingiu Vitor ontem.
Para nós, os protestos não são o problema. Eles apontam o caminho para as soluções.
A foto é do Jornal A Nova Democracia.