Dirigia. Adiante, uma blitz: mais ou menos umas cinco viaturas e o dobro de policiais. Sinalizaram que parasse. Parou. Aproximam-se, então, umas vinte crianças, todas vestidas com o uniforme de uma escola particular da cidade; vestem, ainda, por cima do uniforme escolar, aqueles coletes verdes florescentes da Polícia Militar. Uma das crianças se aproxima, acompanhada por um policial e uma moça que carrega uma máquina fotográfica (provavelmente uma professora), e lhe entrega um daqueles saquinhos de lixo para carros. “É pra não jogar lixo na rua”, diz, sorridente, a criança. Agradeceu e sorriu de volta… Que mais poderia fazer? No saquinho está escrito: “Blitz educativa! Para um trânsito melhor!” Dentro dele: 1) um adesivo, em que está estampada a foto de uma viatura, com destaque para o número do celular da mesma, indicando ainda o batalhão e o quadrante da viatura. Nos cantos, marcas de patrocinadores (empresas da região: uma drogaria, um bar etc.); 2) um folheto com “dicas para evitar o roubo de seu veículo”; 3) um outro folheto, que diz: “seja um colaborador da segurança pública da sua comunidade”. Na primeira página do folheto, diz: “Não seja uma vítima fácil. Seja um fiscal da lei.” Além de outras coisas, o folheto ensina o “cidadão” a observar “pessoas em atitude suspeita” e, em seguida, a ligar para a polícia (as últimas páginas do folheto apresentam, ainda, uma lista de “telefones úteis”: de outras viaturas de outros batalhões, dos bombeiros, do SAMU etc.). A moça com a máquina fotográfica na mão, também sorridente, diz para a criança: “Fica perto do moço pra gente tirar uma foto!” Respondeu: “Não, não! Prefiro não tirar a foto!” Diante da frustração, da moça e da criança, seguiu viagem. Passa Palavra
FISCAL DO SER
“Em 1945, Heidegger enviou a Sartre uma carta, na qual pontificava: ‘Trata-se de apreender em sua maior seriedade o instante presente do mundo, de conduzi-lo à palavra sem levar em conta o espírito de partido, as correntes, a moda e os debates de escola – a fim de que se desperte enfim a experiência decisiva na qual possamos aprender com que profundidade abissal a riqueza do ser se abriga no nada essencial’. (…) Estaria Heidegger louco? Não, que eu saiba”. Philippe Sollers – La Guerre du Goût (Paris, Gallimard, 1996) p. 17
Rubronegros curiosos, perguntamos: qual terá sido, se houve, a resposta de Sartre ao [ex(?)-]nazista Heidegger?