NOTA AOS VEÍCULOS DE IMPRENSA
Os estudantes mobilizados da Universidade Estadual Paulista (Unesp) informam que a suspensão de 60 dias dada aos 95 estudantes da Unesp por ocasião da ocupação da reitoria em 2013 foi mantida pelo órgão colegiado máximo da universidade, o Conselho Universitário, em sessão onde ocorreram os seguintes eventos:
1. À defesa, que apresentou o recurso dos estudantes, foram dados meros 5 minutos de fala inicial. Ainda que houvesse a argumentação de que a defesa é sempre a última a falar em qualquer julgamento, pois é necessário que se ouça primeiro as acusações para que se possa defender, a reitora em exercício, Profa. Dra. Marilza Vieira Cunha Rudge, manteve a decisão de que a fala fosse inicial e subtraiu dos 5 minutos da fala o tempo de arguição em defesa de que esta fosse final.
2. Ao final da fala, o microfone, por ordem da reitora em exercício, foi arrancado da mão de um dos advogados de defesa e estes foram truculentamente encaminhados à saída da sala do Conselho Universitário.
3. A avaliação e julgamento do recurso aconteceram sem que nenhum dos acusados ou seus defensores estivessem presentes, de forma que não houve direito de arguição de defesa durante a sessão.
4. Após a saída dos advogados, o parecerista do processo falou por exatos 9 minutos, a reitora falou, contra os estudantes, por aproximadamente 15 minutos, assim se sucedeu a arguição de várias pessoas envolvidas na acusação, sem critério de tempo de fala.
5. A votação aconteceu depois de farta exibição de provas da acusação onde foram mostrados todos os danos ao patrimônio da Unesp. As evidências apresentadas pela defesa dos estudantes, que comprovam que a autoria dos danos é da Polícia Militar, foram omitidas.
6. Dois dos estudantes suspensos não ocuparam o prédio, o parecerista e o conselho ignoraram este pormenor que estava destacado em um recurso separado. Estes estudantes, no processo, são dois dos 12 acusados de “exercer liderança”, e não estão arrolados no BO da reintegração.
Esta última instância dentro da Universidade é perfeitamente coerente com todo o decorrer do processo no qual:
– Os estudantes foram impedidos de apresentar testemunhas.
– Aproximadamente 2/3 dos estudantes respondeu à sindicância, não presencialmente, mas por carta precatória.
– Os estudantes são acusados de infringir artigos e incisos do regimento, mas não são apresentados os fatos que infringem estes artigos e incisos para que os estudantes possam se defender.
– O parecer é incapaz de individualizar condutas e dizer qual estudante, supostamente, fez o quê, aplicando pena idêntica a todos.
– A pena aplicada é desproporcional e ilegal uma vez que 60 dias de suspensão levam a reprovação imediata em cursos semestrais e anuais, sendo, na prática, suspensão equivalente a um semestre ou ano. Aproximadamente 30 alunos, por causa das reprovações, perderão bolsa de caráter alimentar sem a qual ficarão impossibilitados de concluir o curso. A reprovação e o corte de bolsas não existem no regimento da Unesp como punições cabíveis.
– A comissão sindicante, que supostamente apura os fatos e sugere as punições, deveria ser constituída de maneira absolutamente imparcial, mas é tendenciosamente constituída por professores próximos ao gabinete do reitor, incluindo ex-chefe de gabinete da reitoria.
– A condução do processo tinha via persecutória, gastando vultosa quantidade de dinheiro público não para apurar fatos, mas sim para fazer perguntas sobre a organização política dos estudantes, como por exemplo, “Você atuou como interlocutor dos estudantes em qualquer uma das conversas havidas com a administração?” ou “Como você soube que haveria uma manifestação na reitoria naquele dia?”. Os doze primeiros estudantes a serem citados e ouvidos recebem, inclusive, acusação de exercer liderança política.
O processo, por sua vez, é coerente com o regimento da instituição, cujos artigos relacionados ao disciplinamento estudantil são inconstitucionais e foram escritos durante a ditadura militar, de acordo com o AI-5, de maneira que, dentre as acusações que suspendem estes estudantes, está a de “promover manifestações e propaganda de caráter político-partidário, racial ou religioso” e a de “afixar cartazes fora dos locais a eles destinados” (art. 161 do Regimento Geral da Unesp).
Em defesa dos estudantes existe um sem número de manifestos, dentre os quais se destacam:
– Moção de apoio de algumas congregações (órgão colegiado máximo de uma unidade), inclusive de uma congregação de outra universidade, a Unicamp. [Anexos 1 e 2: duas destas moções]
– Manifesto assinado por 20 juristas. [Anexo 3]
– Abaixo-assinado com mais de 3.500 assinaturas. [tinyurl.com/revogacao]
Depois da série de episódios pontuados no início deste documento, ficou claro à comunidade da Unesp, pela atitude da reitora, que o processo não se sustenta e só pode ser julgado procedente em um contexto autoritário e antidemocrático. São Paulo, 14 de dezembro de 2014
Assinam esta nota
Estudantes em luta pela ampla democracia e justiça nesta Universidade
Acréscimo: relação de datas
16/julho/2013 Ocupação da reitoria
17/julho/2013 Reintegração de posse (madrugada)
novembro/2013 Instauração de processo de sindicância
23/outubro/2014 Publicação no Diário Oficial das punições aplicadas aos estudantes
11/dezembro/2014 Sessão do Conselho Universitário que tratou de recurso dos estudantes, quando aconteceram as barbáries relatadas
ANEXO 1
ANEXO 3
PUNIÇÃO NA UNESP
Uma sindicância inconstitucional e viciada para punir os que lutam.
No Diário Oficial do Estado de São Paulo de 23/10/2014 foi publicado despacho do Reitor da Unesp, Júlio Cezar Durigan, de 20/10/2014, onde decreta a aplicação a 95 estudantes da Universidade de pena de 60 dias de suspensão de todas as suas atividades acadêmicas, inclusive com a perda de bolsas e auxílios.
O decreto acata o relatório final da Comissão de Sindicância instaurada em 2/10/2013, com o objetivo de averiguar a ocupação estudantil ocorrida no prédio da Reitoria da Unesp durante a greve de servidores técnico-administrativos, docentes e estudantes em 2013.
A REVOGAÇÃO DAS PUNIÇÕES É IMPERATIVA PARA RESTAURAR AS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS E AS RELAÇÕES DEMOCRÁTICAS.
A punição dos estudantes foram embasadas nos artigos 161 e 162 do Regimento Geral da Unesp elaborado no período da ditadura militar e que afrontam os ditames democráticos da Constituição de 1988 ao proibir a liberdade de manifestação e expressão.
Também atenta contra constituição ao decretar a punição coletiva sem garantir o direito a individualização da pena, em uma clara expressão do caráter político da medida adotada. No recurso apresentado pelos estudantes pedindo a revogação das punições os mesmos denuncia que:
“A maioria dos estudantes, porém, foi notificada a prestar depoimento por carta precatória expedida aos Diretores das Unidades Universitárias junto às quais os discentes estão matriculados. No curso do procedimento foram ouvidas apenas testemunhas da acusação, pois a comissão sindicante negou-se a ouvir testemunhas de defesa, muito embora tenha sido apresentado tempestivamente rol de testemunhas de defesa.
Foi anexado aos autos pela defesa DVD’s contendo imagens gravadas no momento da ação da tropa de choque da polícia militar no interior do prédio da reitoria, comprovando a responsabilidade da polícia pela quebra da porta de vidro do segundo andar bem como pela destruição de diversos móveis, que foram atirados ao meio da rua por membros da polícia militar.”
Diante de tais fatos, nós abaixo assinados, viemos presentar o nosso repúdio à atitude tomada pela Reitoria da Unesp a qual atenta contra o Direito Democrático em base a uma sindicância com vícios processuais gritantes. A condenação dos estudantes configura-se em mais um ato de criminalização das lutas sociais que vem tomado corpo no Brasil. Nesse sentido, solicitamos à Reitoria e ao seu Conselho Universitário, que revejam a sua posição e revogue imediatamente as punições, restabelecendo o diálogo democrático com o movimento estudantil e restaurando as garantias constitucionais na Unesp.
Juiz Dr. Marcus Orione – professor livre-docente da Faculdade de Direito da USP
Juiz Dr. Jorge Luiz Souto Maior – professor livre-docente da Faculdade de Direito da USP
Dr. Aderson Bussinger Carvalho – Conselheiro e Vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB do Rio de Janeiro.
Dr. Danilo Uler Corregliano, mestre pela Faculdade de Direito da USP e Diretor do Sindicato dos Advogados de São Paulo
Dr. Thiago Barison de Oliveira, doutor em Direito do Trabalho e Segurança Social pela USP, advogado trabalhista e previdenciário, diretor do Sindicato dos Advogados de São Paulo.
Dr. Pablo Biondi – Mestre em direitos humanos da Faculdade de Direito da USP
Dr. Thiago Arcanjo Calheiros de Melo, mestre em direito e funcionário público.
Dr. Jonnas Marques de Vasconcelos, mestrando em direitos humanos da Faculdade de Direito da USP.
Dr. Tairo Batista Esperança, advogado e mestrando em direitos humanos da Faculdade de Direito da USP
Dra. Eliane Lúcia Ferreira – Coordenadora do Dp. Jurídico do Sindicato dos Metroviários de São Paulo
Dra. Regiane de Moura Macedo – Advogada do Sindicato dos Metroviários de São Paulo
Dr. Cesar Rodolfo Sasso Dignelli – Advogado do Sindicato dos Trabalhadores da Judiciário Federal do Estado de São Paulo
Dra. Ana Lúcia Marchiori – Diretora Executiva do Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo
Dr. Américo Astuto Rocha Gomes, advogado – Coordenador da Fundação Sundermann
Dr. Carlos Miranda Oliveira de Jesus – Advogado.
Dr. Antônio Donizete Ferreira – Advogado do Corpo Jurídico da CSP- Conlutas
Dra. Juliana Leme Faleiros – Advogada
Dra. Irene Maestro Sarrión dos Santos Guimarães – Advogada dos Movimentos Populares de Moradia
Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo
Grupo de Estudos da Faculdade de Direito da USP – Direitos Humanos, Centralidade do Trabalho e Marxismo