Resta saber se nós estudantes continuaremos submissos e a reboque dos docentes até em momentos de mobilização ou se teremos a capacidade de nos organizarmos e darmos o devido apoio, mas um apoio que não seja unilateral. Por Karina

A movimentação sobre uma possível greve unificada de docentes e servidoras e servidores federais já se iniciou, sendo o indicativo para a primeira quinzena de maio. Nesse cenário é fundamental pensarmos a nossa atuação enquanto estudantes, tanto para não ficarmos passivas e passivos diante da situação quanto para não ficarmos a reboque dos técnicos, técnicas e, principalmente, docentes. Resgatar a experiência de 2012 é fundamental para não repetirmos os mesmos erros. Para isto, resgatarei a experiência na UFG [Universidade Federal de Goiás], mas que creio que seja semelhante à de outras cidades.

UFG 2012Tal como em 2012, o sindicato que hoje tem a representação legal dos docentes da UFG é a ADUFG [Associação dos Docentes da UFG], que por sua vez é federada ao PROIFES [Federação de Sindicatos de Professores de Instituições Federais de Ensino Superior]. À época, houve uma conturbada assembleia em que a direção do sindicato diante de forte pressão de docentes e estudantes abandonou a mesa da assembleia, finalizando a mesma sob o pretexto de que estes estudantes e docentes estavam tumultuando-a e, portanto, inviabilizando-a. Contudo, os docentes prosseguiram mesmo sem a direção do sindicato e a contragosto desta deflagaram a greve. O sindicato buscou por todos os meios deslegitimar tal decisão, declarando a greve ilegal, mas não adiantou, esta prosseguiu com forte adesão dos docentes. Hoje o sindicato já se adiantou na desmobilização, chegando ao absurdo de deliberar por meio de procuração a formação de um sindicato estadual, dentre outros absurdos que podem ser conferidos aqui, então, possivelmente, caso a UFG entre em greve, tal como em 2012, será só por meio de uma forte mobilização e atropelo do sindicato.

Por sua vez, a greve de servidoras e servidores federais já faz parte de um roteiro. Ano após ano entram em greve, mas dada a intensa burocratização do sindicato, estas acabam sendo inócuas, contando com pouca mobilização, limitando suas ações a manifestações e reuniões em Brasília com pouca ou nenhuma aproximação com estudantes, docentes e população. Contudo, em meio a uma greve conjunta, ao menos em 2012, servidoras e servidores se mobilizam mais do que em suas greves anuais, sendo a categoria que mais se mobilizou, diferentemente dos docentes, cujas mobilizações podiam ser contado nos dedos.

Em meio a isto tudo, nós estudantes tentávamos nos encontrar e fazer algo para fortalecer o movimento estudantil e contribuir para as reivindicações da greve. Numa assembleia convocada pelo Diretório Central dos Estudantes (DCE), alguns dias antes da dos docentes, deflagramos uma greve estudantil. O movimento estudantil aqui é tão precário que em um universo de mais de 20.000 estudantes, uma assembleia que conta com 300 pessoas é vista como uma assembleia vitoriosa e é legítima. Pois bem, iniciamos a greve, mas sem pautas e sem perspectivas de mobilização. A verdade é que entramos em greve porque os docentes entrariam. Não tínhamos força política nenhuma para prosseguir e nem perspectivas de aumento de mobilização. Até porque, pela ausência de reivindicação, esta greve não tinha sentido nenhum, mas saímos da assembleia satisfeitas e satisfeitos pela suposta radicalidade estudantil e autonomia frente aos docentes. Após isto, pressionamos para que houvesse a deflagração da greve, formamos um comando estudantil, o DCE tentou atrapalhar a já fraca mobilização; participamos de atos, fizemos uma ocupação na faculdade de direito e, por fim, acabou tendo um racha que culminou na formação de outro grupo chamado OCUPA-UFG. Nacionalmente houve uma lastimável e interminável assembleia estudantil no Rio de Janeiro, com disputas da ANEL [Assembleia Nacional dos Estudantes Livre] e UNE [União Nacional dos Estudantes], que resultou em um comando estudantil em Brasília, mas que, dada a ausência de uma base e de pautas concretas, acabou sendo inócuo.

greve_universidades_956x500Após 3 meses a greve acabou. Voltamos à normalidade. O “professor é meu amigo, mexeu com ele mexeu comigo” se esvaiu. Via de regra, os docentes não se mobilizam quando mexem com nós estudantes, até porque geralmente são estes mesmo que “mexem” conosco. Ao que parece, esta amizade não é tão sólida e nem se solidifica após uma greve, pois, passado esta, voltam a exercer controle sobre nós e a decidirem os rumos da universidade, e nós continuamos sem qualquer poder nas instâncias deliberativas da universidade e mesmo na sala de aula. A propósito, a solidariedade entre docentes e estudantes acaba quando entra-se na sala.

É certo que a solidariedade com servidores e docentes federais é uma solidariedade de classe e uma luta contra a precarização das universidades federais travada pelo governo do PT [Partido dos Trabalhadores] em benefício das universidades privadas. Contudo, isto não justifica darmos um apoio cego e de mão única. Se direitos são inegociáveis, se reivindicações não devem ser cessadas mesmo diante de cortes de verbas e anunciada crise, é justamente em meio a esse cenário, que conta com uma intensa mobilização na universidade, que devemos intensificar nossa luta e reivindicações.

Contudo, o cenário não se mostra favorável. Se à época o DCE era composto por setores governistas – PT e PCdoB –, hoje é composto pela JCA (Juventude Comunista Avançando), que possui relação estreita com docentes e a própria direção do ANDES [Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior]. Ou seja, há poucas perspectivas de conflitos com o movimento docente por parte destes. Além disso, este DCE vem caracterizando-se por uma intensa atuação em distintos setores, o que, intencionalmente ou não, acaba por deslegitimar ações autônomas. Não suficiente, o movimento estudantil autônomo mostra-se completamente debilitado, dando sopros de vida somente diante de ameaças iminentes como a padronização da carga horária e morrendo logo em seguida, e depois volta a aparecer travando intermináveis e infrutíferas brigas com o DCE e, ao invés de construir alternativas ao mesmo, morremos na crítica. Assim, ainda que as possibilidades de reivindicações sejam muitas e vão da esfera local à federal – tais como aumento do repasse de verba para assistência estudantil, democracia nas instâncias deliberativas da universidade, construção de centros de convivência, segurança nos campus, dentre outras possibilidades – a mobilização mostra-se como um grande desafio.

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Para além das reivindicações, com uma greve na universidade abre-se possibilidades de construirmos novas relações no espaço universitário e talvez até um novo espaço universitário. Com a ausência da obrigatoriedade de se estar nas aulas, resta-nos tempo livre e cria-se toda uma gama de possibilidades diante disto. Debates acerca da realidade universitária e fora dos seus muros, criação de espaços de convivência, apropriação dos espaços, construção de relação e projetos com moradoras e moradores próximos da universidade, grupos de estudos autogestionados, eventos culturais, festas, enfim, possibilidades de aprendizado e criação não restritas à passiva sala de aula, possibilidades de organização não burocráticas e hierarquizadas e, por fim, possibilidades de socialização horizontais e não marcadas pelo cansaço e correria do cotidiano. Com a greve, ao menos por um tempo, passamos a ter certa autonomia na universidade e possibilidades de construções no aqui e agora o futuro libertário que tanto almejamos.

Resta saber se nós estudantes continuaremos submissos e a reboque dos docentes até em momentos de mobilização ou se teremos a capacidade de nos organizarmos e darmos o devido apoio, mas um apoio que não seja unilateral e, assim, nos opormos a precarização da universidade, da condição de trabalho e de cortes de direitos trabalhistas, como também enfrentarmos a burocracia e pautarmos uma universidade mais democrática, em que tenhamos papel ativo nos seus rumos e nos nossos próprios estudos. E se nós, enquanto militantes autônomos, ficaremos a reboque dos DCEs e sua burocracia e centralização ou se conseguiremos atuar para além da crítica e construir uma saída autogestionária para o fatídico movimento estudantil.

2 COMENTÁRIOS

  1. Ponto comum no Movimento Estudantil é a angústia de estudantes “autônomos” que, por não estarem organizados, não conseguem apontar respostas efetivas para o movimento e recaem à eterna negativa.

    Cito o trecho do recente texto publicado no passa palavra: “Não suficiente, o movimento estudantil autônomo mostra-se completamente debilitado, dando sopros de vida somente diante de ameaças iminentes como a padronização da carga horária e morrendo logo em seguida, e depois volta a aparecer travando intermináveis e infrutíferas brigas com o DCE e, ao invés de construir alternativas ao mesmo, morremos na crítica. ”

    Cada vez mais a prática tem mostrado que a construção do Rizoma (https://rizoma.milharal.org) foi a coisa mais acertada que poderíamos ter feito para a atuação libertária no movimento estudantil da USP. Que a experiência que temos acumulada no Rizoma possa ser compartilhada com os compas de todos os lugares, para que seja superado esse vício de sempre querer reinventar a roda partindo do zero.

    (o acordo com o texto não é total, mas serve de disparador para o ponto da necessidade de organização).

    Avante compas!
    Organize-se e lute!

  2. eu acho que o passe livre devia ser liberado para facilitar a vida dos alunos

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