Vitor é uma figura decisiva do Movimento Punk de SP e fundador da banda Invasores de Cérebros. Por Acácio Augusto

Nota prévia: o clip musical e este breve texto registram uma homenagem pelo falecimento de Vitor Simone, vulgo Zorro, no dia 19 de julho de 2016. Vitor é uma figura decisiva do Movimento Punk de São Paulo, fundador das Bandas M19, de 1982, e da Invasores de Cérebros, 1987-2016.

Zorro_2Vitor era conhecido como Zorro. Eu mesmo, que cheguei a conhecê-lo sem travar propriamente uma amizade, não recordava seu nome de batismo. Mas sua marca é outra, empunhando o contrabaixo com uma arma, disparava sua verve punk ao lado dos parceiros de barulho Ariel Invasor, Popó e Cuga, que fazem o som rápido, cru e acidamente revoltado dos Invasores de Cérebros. Uma das bandas de punk rock mais honestas do planeta.

Zorro era um poeta das ruas, contava a crueza da existência numa cidade nada amigável como São Paulo. Já trazia isso da lendária M19, banda que leva o nome do grupo de guerrilheiros urbanos colombianos dos anos 1970. Sabia o que era a Porra de Vida, gritava contra a violência da Rato Patrulha, conhecia a Guerra nas Ruas, na qual “a polícia também só faz parte de mais uma tribo sanguinária e assassina. Fardados, armados e motorizados, possuem licença para matar”. Cantava as injustiças e as violências do Estado e do capitalismo com conhecimento de causa, de quem as sentiu na pele. Como muitos dos jovens que encontraram (e encontram) no punk rock seu grito de revolta contra esse mundo podre, contra essa porra vida! Sentimento que o acompanhou até o fim, na recente reunião dos Invasores de Cérebros à sua melhor formação, descrita acima.

A lenda do Zorro, aquele de máscara e espadinha, é uma criação do espetáculo dos quadrinhos e depois hollywoodiano; coisa dos EUA, terra das celebridades. Este Zorro, não é o aristocrata compadecido pela injustiça dos fracos, nada tem de herói. O Zorro que se vai é um infame, que era da “cidade de São Paulo, aonde o punk é pra valer”. Cidade na qual morreu, mas deixou sua marca, entre amigos, camaradas de luta, fãs e quem mais teve ou terá a sensibilidade para seus escritos de poeta das ruas, da noite, das inúmeras violências e injustiças que jovens como ele continuam sofrendo nessa cidade hostil àqueles que se revoltam. Marca que imprimiu em suas letras e esparsos textos para fanzines lidos por um seleto e restrito grupo de malucos inconformados e desobedientes.

Ele partiu muito jovem. Como disse certa vez Roberto Bolaño sobre a morte, “cedo ou tarde a distinta dama chega, o problema é que às vezes não é uma dama, muito menos distinta, senão é, como disse Nicanor Parra em um poema, uma puta ardente, que é algo que faz o mais corajoso bater os dentes”. Ela chegou cedo para Zorro, que a terra lhe seja leve, camarada!

Zorro_e_ArielSaiba que sua música e sua atitude invadiu o cérebro de muita gente, sem máscaras, com a crueza própria do punk rock. Atingiu pessoas de verdade, que não se curvam diante dos poderosos e não se calam diante das desigualdades. Se as celebridades atraem a atenção de muitas pessoas por pouco tempo, os poetas infames como Zorro atingem poucas por toda uma existência. Talvez ele tenha morrido sem se dar conta disso: que sua música transformou a existência de muita gente que até hoje não se acomodou e segue inconformada e desobediente, ao som grave de um contrabaixo potente de punk rock, num amplificador Giannini valvulado. Ou talvez soubesse. Os que ainda estão por aqui, mais dia menos dia encontrarão com essa puta ardente, e seguramente sabem disso. Eu também sei, porque fui atingindo de forma certeira, tive meu cérebro invadido.

Se o homem partiu, ficou a marca de um outro Zorro.

2 COMENTÁRIOS

  1. Conheci o Zorro no final da década de 70, no Salão Construção, voltei a velo no começo desde ano, passados mais de 30 anos o tempo que passou transformou o menino violento revoltado com o mundo em um homem mais consciente e experiente, foi se o homem ficou as suas músicas que na verdade são hinos de uma revolução de consciência contra a exploração dos ingênuos para enriquecimento dos espertos, cabe a nós para o bem dos nossos filhos a carregar essa bandeira.

  2. Esse cara era original meu cunhado me deixou com três pedras preciosas, ele e minha irmã sem palavras para descrever. Saudades do casal, dói no coração pois perde-los foi duro mais deixaram histórias de vida. E muitos amigos irmãos saudosos. Não sei nada da vida artística dele mais como família. Era o cara ele e minha irmã esposa. Dele Cláudia eram só coração pela família morriam e matavam. Agradeço a homenagem. Aqui feita.

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