Por Victor Silva

Desde domingo, 4 de julho, vem se espalhando pela cidade do Rio de Janeiro uma paralisação e mobilização dos entregadores de aplicativo da empresa IFood no Rio de Janeiro. A mobilização começou no Park Shopping, em Campo Grande, imenso bairro popular da Zona Oeste da cidade, sendo pautada por duas questões: uma nacional e outra local.

A nacional é a reinvindicação do código de confirmação na hora da entrega, que preveniria o entregador contra clientes que falsamente acusam o entregador de extraviar o pedido. Essa reinvindicação também foi feita na paralisação de 4 de julho que aconteceu em Goiânia (GO), Campo Grande (GO) e Curitiba (PR) no mesmo dia.

No entanto, a paralisação foi mais forte e contou com uma grande motociata no fim da tarde em Campo Grande, porque havia uma nova reinvidicação local devido a uma nova política da iFood: a política dos sub-praças de Operadores Logísticos (OL). Essa política concentrou, de acordo com entregadores da região, 80% das entregas nos entregadores da categoria OL vinculados a uma região específica dentro de uma praça específica na cidade. Isso fez com que os entregadores que são da categoria Nuvem (sem vínculo de horário ou região geográfica estabelecida) ficassem fora da prioridade de entregas e tivessem seu rendimento extremamente reduzido. A prioridade ficou apenas para os entregadores OL.

Esse tratamento desigual e injusto causou uma reação imediata entre os entregadores que se massificou inicialmente na região de Campo Grande. A paralisação seguiu no Park Shopping e continua até hoje, completando o quarto dia de paralisação nessa quarta feira. “Seguiremos até a iFood nos dar uma resposta”, conta um entregador que pediu anonimato e que está no piquete no Park Shopping. Até agora, a iFood não se manifestou.

Desde terça feira, outras regiões do Rio de Janeiro, inspiradas pela manifestação do Park Shopping, estão paralisando também. Foram registradas paralisações na Zona Norte do Rio de Janeiro em Madureira, Cascadura, Irajá, Vila da Penha e Largo do Bicão. A reinvidicação de todas elas é a mesma: pelo fim do sub-praça da OL. A tendência do movimento é de se expandir e crescer, mesmo com as dificuldades de falta de estrutura e organização claras.

Reproduzo abaixo uma entrevista com um dos participantes do Breque em Campo Grande, contando como vem sendo a experiência de paralisação. A entrevista foi editada para garantir a segurança e o anonimato do entregador.

Por que foi organizado o movimento?

Foi organizado por nós mediante a entrada da modalidade sub-praça aqui em Campo Grande. A iFood tem as modalidades nuvem, ao qual fazemos parte e OL (operador logístico)… Esses OLs têm preferência por ter vínculo com a iFood, e os entregadores das OLs se beneficiam disso… E nós, nuvens, estamos fazendo cada vez menos entregas devido a essa situação, e a modalidade sub-praça aumenta ainda mais essa disparidade…

Como vem sendo a paralisação?

Pacífica e ordeira…

Os motoboys aderiram?

A princípio só os nuvens estão no movimento, muitos poucos entregadores OLs aderiram ao movimento…

A IFood deu alguma resposta?

Até agora nada. O que a gente reinvindica é igualdade de condições. Todos têm as mesmas responsabilidades, todos estão sujeitos aos mesmos riscos e perigos. Estamos sujeitos a acidentes, assaltos, doenças e tudo. Todas as categorias correm os mesmos riscos; por que um grupo específico merece prioridades?

Como vocês sabem que começou esse sistema? A iFood fez um comunicado oficial?

Como sempre, nunca somos contactados para nada. Sempre jogam as coisas e a gente tem de engolir. A gente fica sabendo, pois temos uma certa experiência, trabalhamos em vários bairros por sermos nuvens. Existem lugares que isso acontecia, a gente fazia um comparativo e concluíamos que tinha algo diferente. A nossa quantidade de entregas diminuindo, entregadores uniformizados passando por nós com entregas, mais e mais, e nós parados… E tem também as conversas de rua, né… Os próprios entregadores das OLs deixam escapar. Tem muita coisa errada.

O que diferencia o OL do nuvem?

Nuvens trabalham em qualquer bairro, não temos vínculo com a iFood e nem com terceirizadas… OLs são empresas vinculadas à IFood que oferecem mão de obra. Esse vínculo dá preferência aos entregadores contratados pelas OLs. E não satisfeitas, as OLs ainda tem a modalidade sub-praça. Sub-praça é assim: cada empresa toma conta de um determinado local… Então, fica praticamente preferência em cima de preferência.

Vocês têm um fundo de greve ou uma campanha de solidariedade?

Não temos apoio nenhum. Se falarmos em sindicalizar, ou recorrer ao sindicato atual, poucos vão concordar. Como eu disse: somos muito poucos e quase invisíveis. Quem está fazendo o movimento é o seguinte: alguns são amigos e outros apenas compartilham da mesma indignação; mas somos todos motoboys.

As imagens que ilustram este artigo foram enviadas pelos próprios motoboys em luta e remetem, na ordem em que foram introduzidas no artigo, às mobilizações ocorrendo em Campo Grande, Madureira e Cascadura.

3 COMENTÁRIOS

  1. Muito bom essa matéria. Bom ficamos sabendo que esta acontecendo em outro estado

  2. Os trabalhadores dos Apps explodiram a noção da sociologia sobre o “precariado” a um novo patamar de exploração pelo capital. Já nem temos mais conceitos para essas formas de exploração onde o antigo Feitor é um mero Algoritmo.

  3. Azedo, o artigo fala justamente dos entregadores do regime OL, para quem o feitor não é um mero algoritmo, mas um chefe de carne e osso, que te cobra presença no horário definido, te constrange a não paralisar em greve, ameaça grevistas com milícias, etc etc.

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