Durante uma aula de Epistemologia numa cidade da região Norte do Brasil, alguns na turma se indignam com as falas do professor contra a possibilidade de haver qualquer objetividade do conhecimento. O professor ainda diz que quem pensa diferente disso está sob efeito de uma terrível ideologia eurocêntrica. Em meio às críticas da turma surgem críticas ao negacionismo da ciência e nomes como Canguilhem, Bachelard, Feyerabend e Lecourt, deixando o professor desconcertado e resmungando que o tema da aula estava sendo desviado. No intervalo, em um café com dois estudantes dessa turma, seus orientandos, logo, mais tranquilo e se sentindo entre seguidores, o professor desabafou: Bachelard? Feyerabend? Isso não serve para eles. Passa Palavra
Chaui já está psicografando uma edição – revista e ampliada, com a enésima autocrítica de Lukàcs – de A Destruição da Razão.
Enfim, os irracionalistas aprenderão com quantos among se faz um between…
Especificamente sobre Paul Feyerabend, me pergunto se ele serve para a alguma coisa que não seja o anticientificismo critpofascista. Feyerabend foi membro da Juventude Hitlerista e tornou-se oficial nazi durante a II Guerra. O seu “anarquismo metodológico” seria melhor entendido à luz desses fatos…
Li em algum lugar, não me lembro aonde que, enquanto Heidegger se empenhava para se tornar o “filósofo do nazismo” e Feyerabend lutava no front, o Círculo de Viena era perseguido e destruído pelos nazistas, tendo Moritz Schlick sido assassinado em 1936 por um ex-aluno nazista, 2 anos antes do Anschluss em Viena. Agora, esses ‘filósofos” fulguram entre os “heróis” do antipositivismo. Em sua autobiografia, que tem um título bastante sugestivo se pensarmos em termos historiográficos (“Matando o Tempo”), Feyerabend mantém sempre um tom “blasé” ao falar de suas peripécias enquanto soldado, e depois oficial nazi. São passagens que deveriam causar indignação em qualquer um, especialmente quando ele afirma (e ele o faz diversas vezes) que não sentia nada, inclusive nenhuma motivação ideológica, chegando ao cúmulo de se gabar de nunca ter se enquadrado em nenhuma “ideologia”. Afinal, “era demasiado relutante a ser leal a algo”. No entanto, apenas em nome de uma delas ele lutou. Cito aqui uma passagem deste tipo:
“Naquela época, pensei em ingressar na SS. Por quê? Porque um homem da SS parecia melhor, falava melhor e andava melhor do que os mortais comuns. A razão foi a estética, não a ideologia. Uma forte corrente erótica oculta me impulsionava enquanto eu discutia o assunto com outros soldados. Muitas vezes esqueci de me proteger durante o combate. A razão não era a bravura – sou um grande covarde e me assusto facilmente – mas a excitação: chamas no horizonte, disparos, vozes confusas, ataques de aviões no ar e tanques no solo: era como um cenário e eu atuava de acordo. Numa dessas ocasiões ganhei a cruz de ferro, noutra três balas: uma na cara, outra na mão direita e a terceira na coluna” (Traduzi do espanhol de uma versão digital).
Aos ingênuos e aos revisionistas da história, o impulso estético parece neutralizar a convicção política. E é essa ideia que o próprio autor quer nos passar. Ele, um pensador cultuado nos anos 1970 por uma juventude com ideais libertários, mas com um passado nazista, filho de um nazista que “lia o Mein Kampf em voz alta para toda a família”, como ele faz questão de relatar. No entanto, se João Bernardo está certo em afirmar que o fascismo era uma estética antes de ser uma política, não teria sido Feyerabend um nazi “hors-concours”?