Por Daniel Caribé
Com a aproximação das eleições, a cada dia fica mais frágil a tese – defendida por muitos setores à esquerda e à direita – de que a candidatura de Bolsonaro se desidrataria naturalmente até outubro. Por mais que as pesquisas eleitorais sejam pouco confiáveis nesse momento, o candidato em questão vem mostrando força e, hoje, indiscutivelmente é uma alternativa para boa parte dos eleitores, muitos entre eles oriundos da classe trabalhadora.
Uma parte dentre aqueles que apostaram na tese da desidratação acreditava que três principais elementos ajudariam a devolver a Bolsonaro o papel insignificante que sempre teve: 1) o pouco tempo de TV e os escassos recursos para a campanha, ambos oriundos da sua pequena capacidade de aliança com outros partidos; 2) outros candidatos capturariam facilmente o eleitorado dele e; 3) o candidato não suportaria os debates e entrevistas, devido ao seu pouco preparo intelectual.
Se pouco podemos avaliar da validade do primeiro ponto, pois os candidatos ainda não começaram a campanha na TV aberta, já sabemos de antemão que – e a exemplo do que se passou nos EUA e outros países – as redes sociais e, principalmente, as plataformas de compartilhamento de conteúdos (a exemplo do Youtube) exercerão um papel inédito na escolha do futuro presidente. Isso significa que inevitavelmente o horário eleitoral terá um peso menor do que outrora. E, por mais que tenha sido inaugurada uma campanha contra as fake news e demais práticas criminosas nas redes sociais, pouco podemos fazer contra as ações do exército de aficionados que retroalimentam as bolhas de afinidade criadas pelos algoritmos nos espaços virtuais privados. O isolamento de Bolsonaro frente aos demais partidos políticos e a sua distância das maiores fontes de financiamentos para as campanhas eleitorais não são condições desprezíveis, porém não são suficientes para colocar o candidato na lona. Ao contrário, tal situação pode ser astutamente usada a favor do próprio candidato ao se colocar “contra o sistema”, o candidato “contra tudo e contra todos”.
Agora há uma grande expectativa de que Ciro Gomes capture os votos de Bolsonaro, pois parece ser a muitos setores ainda mais macho e mostraria nos debates não apenas estar mais tecnicamente preparado para governar o país, mas também o faria de forma mais autoritária e severa contra os corruptos e demais perturbadores da ordem e do crescimento econômico. E, no mais, nos debates eleitorais televisionados, Ciro Gomes comeria o fígado de Bolsonaro, uma espécie de luta do século, um MMA de paletó e bravatas. Essa posição não deixa de ser fundada em um certo cinismo, pois entre os males, o menor, ou antes um autoritarismo democrático do que um protofascista. Mas a verdade é que muitos – mesmo entre os de esquerda – anseiam por uma resposta autoritária à crise político-econômica do país, nem que para isso seja preciso pintar Ciro Gomes de centro-esquerda ou de gestor eficiente. A existência de Bolsonaro, para boa parte dos defensores de Ciro Gomes, só afaga a consciência dos que migraram de posição, algo tão comum nos últimos anos e, pasmem!, nos períodos de ascensão dos fascismos.
Sobre o ponto 3 que sustenta a tese de desidratação de Bolsonaro, a esquerda (mas não só ela) acompanhou com um certo desespero o primeiro teste: a entrevista no programa Roda Viva exibida na última segunda-feira (30/07/2018). Para muitos seria ali o início da derrocada do candidato, a sua desmoralização perante todo o país e a evidenciação do seu descontrole e despreparo para assumir a função que deseja. Mas o tiro saiu pela culatra e não me será estranho que nos próximos dias surja alguma pesquisa comprovando mais um crescimento do candidato. Bolsonaro sobreviveu à desastrosa sabatina.
O programa Roda Viva montou uma bancada recheada de jornalistas representantes dos grandes jornais e revistas do país, os mesmos que sustentaram o impeachment de Dilma e as demais ações contrárias ao PT. Ficou evidente que a direita representada pelo PSDB tinha interesse de comer o fígado de Bolsonaro tanto quanto a esquerda. Foi, sem dúvida, a bancada mais qualificada a entrevistar um dos candidatos a próximo presidente, entre eles Manuela (PCdoB), Boulos (PSOL) e Alckmin (PSDB). Bolsonaro teve pela frente questões embaraçosas, mas que já são exaustivamente respondidas por ele em suas redes sociais e que ajudaram assim a formar em torno de si um exército de aficionados. A direita representada na bancada – ou o PSDB, pois no momento eleitoral faz pouca diferença – estranhamente apostou nas questões identitárias – que tomaram conta da esquerda – para atacar o candidato e, tal como os seus rivais eleitorais, falhou.
O Roda Viva deu a Bolsonaro um novo palanque e foi lá que ele fez o mesmo de sempre sem ter que responder por aquilo que não pode ou não sabe. Se a intenção dos gestores do programa era destruir o candidato, erraram o alvo em muito. E se nos debates que se aproximam e nas demais entrevistas o candidato terá que enfrentar o mesmo tipo de abordagem ou se uma abordagem mais “macro” (com questões sobre economia, finanças, reformas etc.) reverterá o quadro, em breve saberemos, porém hoje aguardamos de forma ainda menos confiante. O que importa agora é que para os temas “micro”, Bolsonaro conseguiu se fincar na trincheira oposta à da esquerda identitária (gênero e raça, principalmente), e é o único a defender uma “proposta” de combate à violência urbana sem meias palavras. Começou a entrar água na tese da desidratação.
Mas a verdade é que essa torcida pela desidratação de Bolsonaro demonstra também a incapacidade da esquerda de entender e disputar a onda conservadora que toma o país desde quando as mobilizações por mais direitos sociais, contra a falta de perspectivas e contra a precarização da vida de boa parte dos trabalhadores foram varridas das ruas pela repressão e retomadas logo a seguir por pautas conservadoras e moralistas. Por isso pouco sabemos sobre os motivos que levam as pessoas a apostarem cada vez mais em soluções do tipo Bolsonaro, muito menos quem são elas.
Um dos grandes erros cometidos atualmente é a redução de todo esse público aos garotos da masculinidade atacada pela “onda feminista” ou sendo eles representantes da “branquitude” preterida pelas conquistas dos movimentos negros. Se é verdade que são eles a sustentarem o debate nas redes sociais causando histeria, por outro lado esses garotos e suas ações servem para esconder uma adesão a Bolsonaro muito mais ampla. Ora, esses garotos são a resposta conservadora ao movimento identitário, mostram uma imensa e ambígua revolta, pois o seu fundamento é a manutenção da ordem. No que pesem todas as críticas aos movimentos identitários, muitos deles não tão distantes assim das práticas autoritárias e lacradoras também em moda entre os apoiadores de Bolsonaro, o embate contra esses garotos se dá por outro eixo e pouco passa pela conversão deles em movimentos classistas, como sonhamos fazer um dia com os identitários. A não ser, é claro, que se leve a sério a aposta de apresentar novas lideranças com comportamentos idênticos, porém com propostas diferentes, a exemplo das esperanças depositadas na captura dos votos de Bolsonaro por Ciro Gomes. Mas cabe aqui perguntar o motivo que faz cada dia mais jovens aderirem suas revoltas a pessoas, organizações e instituições conservadoras, alimentando um profundo desprezo pela esquerda, ao invés de aderirem aos projetos realmente revolucionários e emancipatórios, inclusive aqueles que no lugar de isolá-los em sua masculinidade ameaçada, convoque-os para superá-la em definitivo.
Mas esses garotos estão muito longe de formarem o grosso dos prováveis eleitores do candidato, que para alcançarem a tamanho destaque vêm contando com trabalhadores das mais diversas origens, o que ficou muito evidente nas manifestações de apoio que recebeu de inúmeros caminhoneiros grevistas em 2018. São esses e outros tantos que formam um contingente quase sempre silencioso de apoiadores, porém bastante atento. Eles não são necessariamente fascistas, como precipitadamente muitos acusam ao descartá-los dos debates políticos, em um impulso de superioridade moral e sectarismo. Vivem esses trabalhadores, como todos nós afinal, em alguma esquina de encontro entre as diversas práticas e ideologias possíveis, contraditórias entre si, mas em constante tensão e à espera daquelas que, com mais clareza, apontem para uma vida melhor, isso quando não são eles próprios a elaborarem as novas soluções.
Os ataques de Bolsonaro às conquistas dos movimentos identitários, mesmo a falsificação histórica (ou desconhecimento mesmo) que ele não se envergonha de bravejar, nada disso me parece ter uma repercussão tão grande quanto a sua defesa da implementação de um Estado de (ainda mais) Exceção no país em resposta à crise urbana – que aparece na forma de violência generalizada. Bolsonaro é o único candidato a apresentar “soluções” ao problema, sejam elas viáveis ou não, sejam eficientes ou não. Castração química, encarceramento em massa, pena de morte, extermínios promovidos pelo exército e pela polícia, armamento da população, transformação das favelas em verdadeiros guetos etc. são propostas que ganham a adesão entre os trabalhadores mais pobres, mas principalmente entre a classe média, sem que seja oferecido um contraponto.
Parece-me que passa por aí o embate contra o crescimento do fascismo no país: pela elaboração de propostas concretas de superação das crises urbana e política, ao invés de um convencimento tête-à-tête dos garotos (e garotas) que encontraram em Bolsonaro a voz em defesa do direito de serem cretinos. Porém esse conjunto de propostas deve levar em consideração que estamos em um momento no qual a revolta (pela ordem ou contra a ordem, a depender dos vencedores do jogo) está no ar, abrindo espaço para a elaboração de propostas tão radicais quanto as de Bolsonaro, porém ideologicamente opostas. A tese da desidratação pode ou não estar certa e em breve saberemos. Mas a derrota eleitoral de Bolsonaro só atrasa em alguns meses o crescimento dessa onda conservadora. Ou, pior: abre espaço para o surgimento de alguém realmente preparado para conduzir os trabalhadores à extrema-direita.
Muito boa análise, Daniel.
Não é necessário entender muito de política para saber a tática do eleitor julgado por fascista pela extrema esquerda. O ódio e memes nas redes sociais não faz mais do que popularizar ainda mais o candidato, e abrir passagem para novos discursos em televisão onde o mesmo terá o privilégio de se esquivar e acentuar que o seu mandado será de tiro, porrada e bomba.
Parabenizo o autor pelo texto.
Agora, mais próximos das eleições, parece concretizado que a candidatura não desidratou. Ao contrário, cresceu.
Para o PT, a disputa contra o “coiso” no segundo turno é tudo o que o partido queria para tentar salvar seu projeto de poder, pois poderá focar seu discurso no antagonismo democracia x barbárie e assim, esperam, conseguir superar o antipetismo galopante. Dificilmente, o velho discurso petista de oposição ao “privatismo” tucano conseguiria reconduzir o partido ao poder na atual conjuntura.
Ciro Gomes, sem qualquer histórico de vinculação efetiva com as esquerdas e com os movimentos sociais, tenta se projetar como a alternativa “verdadeiramente de esquerda”, diferenciando-se do PT e propondo um Estado new keinesiano. Poderia ter colado, mas se chocou com o carisma do Lula e com sua capacidade de vender a alma para se manter no poder. Ciro ficou isolado e parece incapaz de continuar a crescer.
O que mais me preocupa e com o que concordo integralmente com o autor refere-se à sua conclusão: enquanto os militantes partidários, para não dizer militantes de indivíduos (Lula/Haddad, Ciro etc.) vêem na aliança democrática do segundo turno a possibilidade de se derrotar a barbárie, eu vejo apenas uma possibilidade de adiar a tomada do poder por uma figura tão obtusa e, pior, como um intervalo que poderá resultar na grave ascensão de uma liderança fascista mais qualificada que o inominável.
Infelizmente, meu pessimismo nato me impede de compartilhar do otimismo de vislumbrar num curto espaço a possibilidade de ascensão de um projeto radical de luta anticapitalista.
Essas eleições marcam um momento chave de publicização do ódio e da negação do outro, que estão sendo gestados ao longo dos últimos anos.
Muito bom, o texto, reflexão excelente.
Infelizmente, o fisiologismo do petismo se sobrepôs à necessidade estratégica de ganhar uma eleição e estabelecer um governo que consiga apagar as chamas do ódio que hoje ardem, pois ele realizou a sabotagem e o isolamento desse Ciro Gomes que se colocou como um new-keynesiano, como disse o amigo Rezende. Um professor disse-me que isto foi feito para a manutenção do PT, caso perca, como pólo dominante da esquerda e a manutenção da narrativa do golpe, pois, afinal, disse o professor, “como Lula poderia ser um preso político de Ciro Gomes?”. Reflexão instigante, nesse mundo em que lutamos pelas palavras, porém, a qual eu preciso refletir mais.
Mas, comento aqui pois penso em duas máximas que gostaria de compartilhar:
Haddad se ganhar, não assume. Se assume, não governa. Se governa será derrubado.
Um governo bolsona vai ser um desastre, o tiraremos facilmente.
Frases com que me deparei nesses últimos dias. Começando da segunda, digo que ela é fruto da estratégia geral da esquerda e da direita moderada de dizer que o Bolso é burro, tentando desqualificá-lo, esquerda essa que sempre foi atacada por ter seu candidato metalúrgico. Esta reflexão, com que chamo Rezende e Caribé para conversar, é de um elitismo e de uma ingenuidade sem tamanho, provavelmente surgida de círculos universitários que, caso fosse possível mapear, veríamos que é de onde surgiu esta tese sem fundamento nem antes, nem agora da desidratação. Bolsono já é esta liderança qualificada este é o ponto, Rezende (não que não possa surgir outra). A cama foi preparada para alguém, ele veio e deitou: pelos guias politicamente incorrets (assim como centenas de youtubers), passando pelos think tanks liberais (que financiam toda sujeira), assim como o desenvolvimento dos misticismo religioso(com seus pastores poderosos e milionários) de massa, sem esquecer o ponto extremamente bem colocado por Caribé do caos violento das cidades. Ele tem uma força tarefa familiar, além de adoradores espalhados pelos quatro cantos. Voltando ao assunto, acredito que não cairá, caso eleito, nem que a vaca tussa, porque ele é o candidato do mercado, apoiado numa massa que o idolatra, veríamos até uma piora na qualidade de vida dos grupos sociais subalternos devido as medidas tomadas, mas um aumento no pib, por exemplo, o que ele utilizará como argumento servirá como justificativa. Se reinar o caos, greves e manifestações, vestirá sua farda de Pinochet, com uma multidão aplaudindo. Em resumo, quero dizer que se, por um lado, a esquerda ganhar pode até não matar a serpente, mas se a serpente ganhar se tornará um dragão, ou seja, o bols no poder será avassalador. Uma outa possibilidade que se avizinha, caso ele seja eleito, é que ele seguirá o exemplo da ditadura Argentina(guerra das malvinas), mobilizar a população à unidade nacional através da guerra. Contra quem? Por causas humanitárias e pela liberdade poderá se concretizar uma guerra contra a Venezul. “Essas eleições marcam um momento chave” para toda a américa latina. Aos que acham que isso é delírio, vejam as declarações vindas da Colômbia da “necessidade de uma intervenção militar”.
A primeira máxima é a que ecoa na minha mente. Novembro e dezembro serão meses quentes, com o dito cujo não aceitando o resultado. Acredito que vocês sabem no mar de ódio (pessoas ligadas umbilicalmente aos novos meios de comunicação fascistas) pulsante em que estamos inseridos, talvez o receio me seja maior por estar no interior de São Paulo, sinto-me, em alguns momentos, cercado de camisas negras, sobretudo durante a greve dos caminhoneiros. Por ser de família de caminhoneiros, sabendo da complexidade do movimento, não posso deixar de dizer que o grosso do que vi e acompanhei me despertou essa visão chemise noir. Em resumo, um governo Haddad terá uma oposição forte, coesa e treinada contra o petismo, enquanto seu partido não tem nem a militância nem a estrutura (político/sindical) em bom estado. Será uma surra, sem contar a oposição que poderá sofrer do mercado, locautes, e etc. A peja de “um partido dirigido da cadeia”, por exemplo, cairá como uma pá de cal contra o frágil governo. Digo com todas as letras: Haddad cairá!
Eu sempre defendi o voto nulo, tirando talvez pela minha adolescência em que era próximo ao petismo. Hoje botei o coração na sola do pé e comecei a fazer campanha para o Ciro, sabendo que ele não é socialista e entendendo que será difícil ele fazer medidas keynesianas, pois acredito que conseguirá nos (e para a Venezul) dar algo importante, hoje: “tempo e estabilidade”. Não tendo contra si o ódio sincero dos setores que viram o petismo se tornar uma quadrilha e apostando que talvez seu governo consiga estabelecer um crescimento à economia, pode ser que ele consiga diminuir o incêndio. Caso o incêndio diminua, podemos nos aproximar, fazer lutas, disputar a ideologia. Além do que, o candidato é o único, seja por politicagem ou não, falando com todas as letras na necessidade de destruir o fascismo, isso aponta que, caso suba ao planalto seu inimigo lhe é claro.
Enquanto isso, vamos vendo no que vai dar, dia 7 de outubro está aí, batendo as portas (será que é o choque?)
abraços.
Errata:
onde se lê
Esta reflexão, com que chamo Rezende e Caribé para conversar, é de um elitismo…
leia-se:
Esta estratégia, chamo os amigos Rezende e Caribé para conversar sobre, é de um elitismo…
Na verdade, se esperava que fossem as candidaturas de Alckmin e de Amoedo que desidratariam a de Bolsonaro. Apenas uma parcela pequena da esquerda levantou a possibilidade de Ciro ser o responsável pela eliminação de Bolsonaro do pleito. Citei essa possibilidade pois aqui é um site da esquerda, né? Queria mesmo chamar a atenção para o absurdo que seria esse cenário: o de um candidato de parcela da esquerda recebendo votos que antes eram de um protofascista.
Esse cenário acaba de se tornar ainda mais curioso, pois Ciro acabou desidratando outra candidatura, a de PSOL. Migaram para Ciro os votos da esquerda ao PT que antes escolhia o PSOL, projetando para o partido a menor votação da sua recente história. É verdade, Ciro apontou para a esquerda para muito além do que eu esperava, mesmo com a ruralista Kátia Abreu de vice, mas daí terem abandonado por completo o PSOL… Essa foi, para mim, até agora, a grande surpresa dessas eleições.
Mas Ciro não desidratou a candidatura de Bolsonaro, pior: é o próprio Bolsonaro que desidrata a candidatura de Ciro. Os votos de Ciro não migrarão para Bolsonaro, isso é óbvio, mas graças ao crescimento do candidato protofascista, o medo de sua vitória levará muitos que antes votariam em Ciro a votarem no candidato petista. E assim, nesse roteiro surreal que é a escolha do futuro presidente, teremos um segundo turno com dois zumbis inviáveis: um quase-morto por uma facada e o segundo doando o seu espírito para um terceiro, que anda pelo país até imitando a voz do obsessor.
Quanto a Bolsonaro: quanto mais o vejo, mais ignorante ele me parece. Ele é realmente uma toupeira, uma anta, um jumento. A dúvida com que fico é: se fosse um candidato mais preparado, estaríamos definitivamente lascados e, portanto, temos que agradecer aos céus por ter nos enviado esse coiso? Ou somente esse coiso se conectaria à onda conservadora e ressentida que tomou parte do país, sendo Bolsonaro momentaneamente o seu melhor espelho?
Ora, nenhuma das duas alternativas nos aliviaria, porque nem essa onda hidrófoba, nem um fascismo mais sofisticado seria um cenário “menos pior”. Qual dos dois lados nos será apresentado pós-eleições? Provavelmente uma articulação dos dois eixos, porque é da articulação de eixos que se forma um fascismo.
Por último, há algo que está sendo pouco comentado. Provavelmente desde a campanha do PT de 1989 que não se via no país uma militância tão aguerrida, cúmplice e apaixonada quanto a de Bolsonaro em 2018. Eles estão fazendo a campanha praticamente de forma artesanal e têm uma coesão assustadora. Hoje são inábeis, ignorantes, limitados, toscos, etc. Mas quem de nós não era quando começou a militar? Pois, esses garotos de masculinidade afetada crescerão, os trabalhadores que apoiam Bolsonaro também amadurecerão, muitos entre eles irão sofisticar os seus argumentos para além das fakes news e aprenderão a se organizar para além das redes sociais. Quem pensa que o embate findará com as eleições ou perpassará somente os próximos quatro anos é de um otimismo comovente.
Meus caros Marcelo Mazzoni e Daniel Caribé,
diversas questões têm me tirado o sono há algum tempo, entre elas o crescimento do fascismo na nossa geração.
E é justamente isso que considero mais relevante destacar em nosso debate: concordamos que a luta antifascista não se reduz a essa disputa eleitoral de 2018 e tampouco se esgotará com uma possível vitória de uma candidatura autodenominada progressista.
Nisso, estou inteiramente de acordo com as afirmações do Daniel. Essa militância fascista vem sendo gestada há algum tempo e continuará a crescer independentemente do resultado dessas eleições: com a vitória do coiso ou com a derrota do mesmo, eles darão continuidade à caça aos tais “comunistas bolivarianos” que enxergam em qualquer pessoa de esquerda e às minorias “empoderadas”.
Eis aí nosso desafio: como combatê-los?
Para muitos progressistas, a disputa parece se dar de quatro em quatro anos. Ao menos foi assim nos últimos anos: elegeram governos petistas e dormiram tranquilamente. O resultado se vê nas ruas e nas redes sociais, por meio do ódio.
Marcelo, a respeito das suas colocações: concordo que é extremamente ingênuo imaginar que se derrubará facilmente um governo do coiso. Há pessoas que possuem um otimismo infundado. Começaram achando que era só uma piada, depois disseram que era só fingir que não existia, agora acham que é só derrotá-lo nas urnas e que se isso falhar que será fácil derrubá-lo. Ingenuidade.
Há alguns meses, em conversa com amigos, e antes mesmo do coiso se lançar candidato, eu apontei que ele representaria uma séria ameaça. Meus interlocutores riram e mesclaram espanto com incredulidade. Provavelmente, acharam que eu havia bebido muito vinho e estava exagerando. Porém, eu venho há tempos estudando o fascismo dos anos 1920-30 e identificava na sociedade brasileira as condições para o crescimento dessa ameaça.
Se ele é ou não a liderança qualificada? Concordo que é um sujeito de inteligência extremamente limitada, sem capacidade de debater, facilmente colocado em situações constrangedoras diante de questões técnicas e objetivas. Mas será isso uma característica necessária para cativar aqueles que clamam pela “revolta dentro da ordem”?
Militantes petistas afirmam que o PT foi a esquerda viável que o Brasil foi capaz de formar. Não vou entrar nos méritos dessa afirmação que visa justificar a política conciliatória do PT, mas tomo a colocação para indagar: será que a figura patética do coiso representaria aquilo que o protofascismo em terras brasileiras foi capaz de forjar?
Seus seguidores não se incomodam com sua incapacidade técnica e com a ausência de um projeto coerente. O que lhes interessa é que ele representa a revolta para restabelecer a ordem, acreditando que varrerá do poder as velhas elites corruptas e metralhando os petralhas e as minorias. Claro, se ele fosse um pouquinho menos destituído de inteligência, seria ainda pior. Não precisaria ter fugido dos debates, por exemplo, já que conseguiria somar 2 + 2 em público sem precisar de cola na mão.
A respeito do Haddad, se eleito, não assumir; se assumir não governar e ser derrubado. Disseram exatamente o mesmo sobre a Dilma e ela acabou derrubada. Passaríamos pelo mesmo novamente?
Tenho dúvidas. Vivemos sob uma economia globalizada e cada vez mais baseada na exploração da força de trabalho por meio de uma complexa combinação da extração da mais-valia relativa (uso intensivo da tecnologia) com a extração da mais-valia absoluta (precarização das condições de trabalho, supressão de direitos trabalhistas e sociais etc.). Alguns autores falam em precariado, outros combinam esse conceito com a idéia de contrarevolução do capital em escala global.
O lulismo representou a tentativa, relativamente bem sucedida durante algum tempo, de promover uma conciliação de classes por meio do ganha-ganha. Mas me parece essencialmente anacrônico frente ao atual ciclo de extração da mais-valia. Baseia-se em preceitos fordistas. Fez uma reforma da previdência tímida e, por conta de suas bases, não teve coragem de fazer a reforma trabalhista que se demanda nessa conjuntura de precarização do trabalho. Temer apontou a “pinguela para o futuro” como alternativa e colheu o poder.
Pois bem, minha dúvida em relação à derrubada de um possível governo Haddad se baseia no seguinte: os capitalistas estariam dispostos a sabotar novamente o governo? Óbvio, que as maiores vítimas são os trabalhadores, que os especuladores continuam lucrando etc., mas lockout, “terrorismo discursivo”, aprofundamento da recessão etc. não me parece o melhor dos mundos para o conjunto dos capitalistas. Posso estar totalmente equivocado.
Mas se eu não estiver totalmente equivocado, creio que o Haddad teria alguma chance de se manter no poder. Ele não foi assertivo a respeito de reverter a reforma trabalhista, flerta com economistas neoliberais, fala em “Brasil feliz de novo”. Taxar lucros e dividendos? Alguém acredita nisso?
Então, mesmo que o lulismo seja anacrônico e tenha se esgotado, será que os capitalistas não estariam dispostos a agüentar mais quatro anos de um remendo de lulismo já que Alckmin (o plano A) falhou? Se o Haddad não mexer na terceirização e na reforma trabalhista, o que duvido que esteja realmente disposto a fazer, talvez a FIESP e a grande mpidia o aceitem. Não sei.
Sem dúvidas, os bolsominions fariam de tudo para derrubá-lo, mas se a FIESP e a grande mídia não embarcarem em nova onda desestabilizadora, terão as cadelas no cio força para derrubar um governo sem o Exército assumir o protagonismo? E golpes nos antigos moldes tiram grau de investimento.
Bom dia caros Rezende e Caribé,
Caribé, chega até ser um pouco embaraçoso, pois concordo com tudo que você colocou. Só pontuaria que, se não ficou claro, eu havia entendido o que coloca no primeiro parágrafo, mas foi bom você reafirmar. Sobre o último parágrafo, vale ressaltar duas coisas: 1º o brilhantismo da atual direita que se coloca a si mesmo como representante da contestação da ordem, 2º como diria Walter Benjamin: o fascismo nasce de uma revolução morta. Isto é, que havia ali um potencial revolucionário que não foi levado a cabo, essa pulsão retornando com sua face mais obscena.
Rezende, fiquei pensando em sua frase de encerramento, sobre a qual tenho algumas reflexões que gostaria de compartilhar.
“E golpes nos antigos moldes tiram grau de investimento.”
Não sou versado em economia, vou entrar numa seara que não domino, mas conheço um pouquinho de história e sei que a defesa de Kautsky era que o desenvolvimento do capitalismo tornaria as guerras algo anacrônico, sei que não é isso que os camaradas defendem, mas vou tentar usar esse exemplo como ponto de apoio. Kautsky defende que o desenvolvimento econômico levaria a algo como um “ultra-imperialismo”, que, nas palavras dele:
“Como a concorrência desenfreada de empresas gigantes, os grandes bancos e multimilionários, abrigando os grandes grupos financeiros que foram absorvendo os pequenos, é necessário para pensar a noção do cartel. Da mesma forma, o resultado da Primeira Guerra Mundial entre as grandes potências imperialistas pode ser a formação de uma federação forte que renunciem a sua corrida armamentista. https://www.marxists.org/portugues/kautsky/1914/09/11-1.htm ”
O século vinte deu grandes provas de que Kautsky estava errado. Rosa Luxemburgo, por sua vez, tenta articular uma análise do sistema capitalista na qual a acumulação primitiva não é somente uma fase anterior ao capitalismo contemporâneo, mas parte substancial do modo de produção. Naomi Klein, em seu livro Doutrina de Choque, parece defender algo muito similar, com um jargão menos marxista, pois Doutrina de choque é uma filosofia que sustenta que a melhor maneira, a melhor oportunidade para impor as idéias radicais do livre-mercado é no período subseqüente ao de um grande choque. Esse choque poder ser uma catástrofe econômica. Pode ser um desastre natural. Pode ser um ataque terrorista. Pode ser uma guerra. Mas, a idéia é que essas crises, esses desastres, esses choques abrandam a sociedades inteiras. Deslocam-nas. Desorientam as pessoas. E abre-se uma ‘janela’ e a partir dessa janela se pode introduzir o que os economistas chamam de ‘terapia do choque econômico’.
Existem, grosso modo, duas tradições aqui, uma mais próxima kautsky e outra próxima a Rosa. Lembrando que não quero taxar ninguém de katskyquista, só estou utilizando-lo como ponto de apoio reflexivo. Se Rosa e Klein estiverem corretas, o ultra-imperialismo não é o fim das guerras mas o estabelecimento de um “choque perpétuo”, percebendo que a poeira começa a baixar no Oriente Médio e que as coisas se acalmaram na península coreana, será que não deveríamos nos perguntar: “Qual será o próximo alvo da américa?” (https://www.youtube.com/watch?v=mJSKkttt3kQ). Digo a América pois sua indústria bélica, me parece, exige um contingente de cadáveres todos os anos, entendendo que não é só de USA que se faz uma devastação. Assim eu devolvo com uma pergunta, será que transformar a américa latina num cemitério não faria aumentar o comércio de caixões? Pois a Venezuela já é um dos alvos visados, a iminência de um conflito ali bate às portas. Mas e o Brasil? Um governo Bolsonaro, com sua já enunciada idéia de auto-golpe, não seria o prelúdio disso? A derruba de um governo Haddad e as ondas mais ou menos fratricidas que podem se seguir, também não o seriam?
Abraços e obrigado pela conversa muito instigante.
O comentário de Marcelo me parece importante.
Primeiro, a “queda dos investimentos” não foi um problema para destroçar a Síria. Também não o foi há 50 anos atrás para instaurar regimes militares sangrentos, alguns mais nacionalistas que outros, na América Latina inteira.
Não sei se alcançaremos com o tempo, mas não é má ideia reservar um tiquinho de nossas reflexões para um cenário de conflito armado interno no Brasil que ultrapasse o controle territorial dos presídios e a circulação das drogas ilícitas – coisa que já vem ocorrendo sempre a conta-gotas, na destruição de templos religiosos afro-brasileiros, no assassinato de ativistas e lideranças políticas, etc. A diferença seria, ao meu ver, uma questão de escala: passar de pequenas micro-milícias para corpos militares mais abrangentes e conectados no território brasileiro.
Inventar estas tropas do nada custa muito caro para qualquer investidor estrangeiro – os verdadeiros financistas de qualquer guerra – mas encontrar um terreno já fértil e cheio de predisposição faz com que os conflitos armados sejam mais baratos (comparemos, por exemplo, o recrutamento feito pelo ISIS e aquele feito pelos fascistas ucranianos). Faltaria analisar quais jogadores no tabuleiro mundial estariam interessados em financiar um tal conflito no Brasil.
Acho que o papel que as forças armadas têm em Cuba e na Venezuela vão num sentido muito parecido com alguns dos elementos do Bolsonarismo. Não seria bom ignorar este fenômeno.
Lucas, mais um motivo para ficar de olhos abertos:
http://clubemilitar.com.br/para-um-brasil-melhor/
Abraços
O grupo Iniciativa Revolução Universal publicou uma análise bastante detalhada do bolsonarismo que pode contribuir a esse debate:
Motivos pelos quais o sistema precisa de Bolsonaro https://libcom.org/news/motivos-pelos-quais-o-sistema-precisa-de-bolsonaro-iniciativa-revolu-o-universal-03102018
Caro Marcelo Mazzoni,
inicio me desculpando pela enorme demora em retomar nosso diálogo. Eu estava fora do país realizando pesquisa e voltei essa semana. Então, passei os últimos dias com acesso muito precário à internet.
Por falar em retorno ao Brasil, que situação é essa? Estava acompanhando as notícias pela internet e sempre em diálogo com amigos, porém o que tenho visto nas ruas é ainda mais desesperador do que eu imaginava. A ameaça fascista parece já ter ultrapassado a própria capacidade de controle por parte do Boçal.
A respeito da minha colocação final no comentário, meu principal objetivo foi destacar que eu acredito ser mais factível uma nova aliança entre o PT e parte dos capitalistas do que mais quatro anos de instabilidade e crise econômica agravadas pelo boicote deliberado a um possível governo Haddad. Foi nesse sentido que escrevi considerar improvável um Golpe Militar nos moldes daqueles dos anos 1960 e 1970 na América Latina.
Essa continua a ser minha hipótese: acredito que seja mais provável um novo pacto do PT com a FIESP, por exemplo, do que o Villas Bôas comandando as tropas para derrubarem o governo, fechar o congresso ou coisas do tipo.
Para tanto, talvez baste que o PT não mexa no que o governo Temer fez a respeito da legislação trabalhista. Se fizer mais reformas, como a da previdência, melhor ainda. E não tenho dúvidas de que o PT está disposto a fazer o que for necessário para voltar ao poder e nele se manter.
Nova Constituição? Reforma política? Reforma tributária…? Não vejo o PT efetivando nada disso, mas vislumbro facilmente uma nova versão da “Carta ao povo brasileiro”. Funcionaria?
O tal “exército” dos seguidores do Bolsonaro certamente não aceitaria a derrota e tem dado demonstrações cada vez mais explícitas das ações diretas de vazão ao seu ódio (atirar pedra em homossexual, agredir mulheres que lideraram os protestos #elenão, denunciar/demitir professores e professoras que se posicionam contra o Bolsonaro, ameaçar demitir funcionários etc.). Até onde esses seguidores mais exaltados estariam dispostos a ir eu não tenho certeza, mas certamente não estão propensos a engolir o ódio. Teriam eles força suficiente para derrubar um governo Haddad? Com quem contariam? Como a bancada da “bala, boi e bíblia” atuaria num governo Haddad?…
Veja, são tantas incertezas e questionamentos frente a essa onda fascista em que vivemos, não é mesmo?
Minhas ponderações parecem não necessariamente se chocar com suas colocações a respeito das guerras na contemporaneidade. Reafirmo minha hipótese: se a eleição não for decidida amanhã (graças ao “efeito manada” que está ocorrendo) e se tivermos um segundo turno entre o Boçal e o Haddad, o PT terá sua única chance de voltar ao poder. E isso poderá levar a um novo pacto com as elites. Não duvido, mas custo a crer que a FIESP e as organizações Globo encampariam uma nova ação coordenada de desestabilização do governo. Mas confesso que não estou nem um pouco seguro sobre isso.
Sobre a possível vitória do Boçal, sem dúvidas a indústria bélica se beneficiará. Bastou sua consolidação em primeiro lugar nas pesquisas para as ações da Taurus dispararem, por exemplo.
América Latina como o próximo cemitério da indústria da morte? Não sei, mas Trump acabou de reafirmar a ameaça de intervenção militar na Venezuela. Ter um cachorrinho de estimação como o Boçal no governo da maior economia latino americana não seria má idéia, não é mesmo?
Você citou importantes autores. Me fez lembrar da tese de Thompson sobre o exterminismo.
Abraço.
Saudações Rezende,
Sinto muito por ter voltado a ter acesso a internet, meus pêsames. Quanto ao Brasil, meu caro amigo, eu não quero provocar, nem atiçar suas saudades, mas acontece que não posso me furtar de lhe contar as novidades.Aqui na terra o Bolsonismo já ganhou, mas os petistas ainda não sacaram.
Rezende, aproveito esse dia em que muitos estão muito tristes para aumentar a depressão. As forças progressivas brasileiras padecem pelo seguinte: os mortos devoram os vivos. O que se aplica as sedimentações de classes arcaicas, passa a valer no cenário político progressista, também. Precisamos por fim a greve de 1979, para começar um novo ciclo de mobilização operária. Concomitante a isso, o identitarismo, já largamente debatido aqui nesse jornal, aparece como a influência direta do imperialismo na ideologia dos grupos sociais subalternos, como pensamento desagregador e desmobilizador.
Fora isso, no campo externo, temos o misticismo religioso amalgamado com neoliberalismo, gerando uma ideologia fascista moderníssima, adaptada a situação da uberização da sociedade. Essa ideologia que coloca a si mesma como revoltosa, articulada através do que estou pensando em chamar de “negacionismo de novo tipo”, difundido, sobretudo, nos guias politicamente incorretos (cuja idéia central é que os brancos do atlântico norte nunca fizeram nenhuma atrocidade na história do brasil, nem do mundo. Pelo contrário, são os únicos sujeitos de progresso na história), como é proibido negar o holocausto, por exemplo, eles deram dois passos para trás e negam qualquer ação violenta do homem branco, este como o difusor da racionalidade.
O que fazer? A revolução não é para depois de amanhã, precisamos traçar uma política séria de disputa, entendendo quais são nossos inimigos.
abraços
ps: não conheço a tese de Thompson sobre o extermismo, onde ele debate isso?
Saudações Marcelo!
Instigante sua colocação a respeito da necessidade de superarmos 1979.
Ao que tudo indica, essa eleição deverá ter um papel crucial para tal superação, apesar de o PT tentar sobreviver reafirmando seu projeto já esgotado.
O estrago, inegavelmente é imenso. A truculência dos bolsonaristas exaltados cresce exponencialmente e parte da esquerda pensa em debandar quando a resistência nem bem começou a se articular.
Em outro artigo, o João Bernardo comentou que estamos numa conjuntura de fragmentação extrema da classe trabalhadora frente aos capitalistas num alto grau de organização.
O que fazer?
Tenho me perguntado diariamente.
Os petistas já conseguiram o que queriam: mobilizar as esquerdas em defesa da democracia. Nas redes, Haddad já é vendido por alguns como a salvação da democracia e não como o candidato do PT.
Amigos anarquistas já relataram que nunca tinham visto tantos camaradas tirando a poeira de seus títulos de eleitores. Eu mesmo não estou disposto a apostar no quanto pior melhor.
Se tal mobilização conseguirá virar as eleições é difícil saber, mas certamente mesmo que consiga o bolsonismo não irá adormecer em silêncio.
Se falhar, não me parece catastrofismo imaginar o pior. O primeiro assassinato já ocorreu em Salvador.
É desalentador acompanhar certas discussões entre pessoas que deveriam ter clareza sobre a tormenta que se forma no horizonte.
Porém, a extrema direita pode estar negligenciando o potencial explosivo das periferias. É inegável que as igrejas evangélicas conseguiram uma penetração há décadas nessas áreas e têm tido papel determinante na difusão da ideologia fascista, como você destacou.
Porém há um enorme potencial de explosão entre setores da juventude. Mais cedo ou mais tarde isso poderá estourar.
PS: sobre o Thompson, há uma coletânea “Exterminismo e Guerra Fria”. Eu uso em aulas um artigo dele, principalmente como um documento de época.