Polêmicas inúteis e a crença cega do PCO

Por Shirley Almada

 

“Os partidos políticos são organizações burocráticas que visam à conquista do Estado e buscam legitimar esta luta pelo poder através da ideologia da representação e expressam os interesses de uma ou outra classe ou fração de classe existentes. Assim, os quatro elementos principais que caracterizam os partidos políticos são: a) organização burocrática; b) objetivo de conquistar o poder do Estado; c) ideologia da representação como base de sua busca de legitimação; e d) expressão dos interesses de classe ou fração de classe. Uma organização burocrática se caracteriza por funcionar através da relação dirigentes-dirigidos. Aqueles que dirigem, os burocratas, tomam as decisões e controlam os dirigidos.” Nildo Viana – O que são partidos políticos

A denúncia contra Guilherme Boulos produzida pelo PCO (Partido da Causa Operária) trouxe à tona um caminhão de podridão que envolve o conhecido dirigente do MTST. Se o MBL (Movimento Brasil Livre) é cria de think tanks [1], Boulos também é. O que estes setores aparentemente divergentes têm em comum? Em última instância, o apreço e a defesa do capitalismo e da democracia representativa burguesa como únicas formas de organização e sociabilidade possíveis. Seria de fato um assombro admitir que Boulos tenha forte ligação com think tanks ou outros aparatos da burguesia para disputar a hegemonia na sociedade civil? Seria uma descoberta inédita? Surpreendeu alguém de fato além dos incautos militantes do partido? Essa estratégia, na verdade, faz parte de mais um capítulo da novela eleitoral de 2022 que só acabou de começar. Muito chorume ainda vem por aí…

Guilherme Boulos é notadamente um sujeito que defende pautas e um projeto de sociedade claramente recuados frente às principais contradições e necessidades históricas da classe trabalhadora. Seria bastante ingênuo de nossa parte pensar que Boulos tem algum comprometimento com a emancipação dos trabalhadores. Ele é tão somente mais uma peça importante do capitalismo que facilita e (sobretudo) reforça a dominação de classe, por ser uma espécie de ponte entre a burguesia e o proletariado. Boulos, como qualquer político profissional, funciona mais como uma correia de transmissão da dominação de classe. Em suma, é um pelego [2] comprometido com a política institucional burguesa e com todo tipo de maracutaia golpista. Não há novidade alguma nas análises promovidas pelo PCO; aliás é mais um chover no molhado. É claro que o fato parece chocante e gera uma revolta. O espetáculo produzido em torno dessa polêmica gera um sentimento consternador, que é o que se quer para convencer o eleitorado de que a alternativa não está em Boulos, mas em Lula, como se os dois representassem alguma diferença no cenário político eleitoral.

Polêmicas inúteis e a crença cega do PCO

Seria Lula um político diferenciado nesse sentido? Estaria Lula comprometido com um rompimento com a burguesia e seus aparatos? Definitivamente não. Think tank é peixe pequeno para Lula. O ex-presidente está comprometido com o capital financeiro e especulativo e com as diversas ordens de capital como o bancário, industrial, tendo sempre como função primordial ganhar as atenções desses setores, convencendo a burguesia de que é o melhor administrador dessa lógica econômica e de poder; que é possível equilibrar esse ordenamento perverso com as necessidades da classe trabalhadora. Nesse sentido, Lula estaria ainda mais abissalmente submerso em todo lixo da pior espécie possível, tendo como agravante a função primordial de promover a conciliação de classes. O incrível é que mesmo diante de tanta corrupção (termo que utilizamos aqui não com a conotação empregada pela extrema-direita), crimes, compromisso com o capital, repressão contra trabalhadores, ainda se tenha como alternativa a via eleitoral com a insistência nesse tipo de política conciliatória, reformista, neoliberal e contrarrevolucionária. Se há esforços e investimentos maciços de partidos políticos na via eleitoral, estamos ainda falando de estruturas organizadas para atuar com força no interior da máquina estatal burguesa, ainda que com isso se defenda uma ideia revolucionária.

Partidos políticos como o PCO (apesar deste ter certa diferença com relação aos demais, como a formação da militância, a construção e participação de atos populares, etc.) investem toda a sua força e militância na desqualificação de um sujeito já bastante desqualificado e desgastado porque estão muito mais empenhados na política institucional do que com a construção de um processo revolucionário de rompimento com o Estado burguês, pois ainda enxergam nesse Estado e seus representantes (ainda que bastante degenerados) esperanças novas para o futuro, apagando os conflitos das lutas passadas, criando a cama perfeita para o reformismo senil da burocracia partidária. Segundo o PCO, um candidato como Lula pode criar as condições necessárias para a emancipação da classe, o que é uma tese completamente descolada da realidade sócio-histórica, já que Lula sempre se mostrou como um astuto combatente das formas de manifestação e organização dos trabalhadores. Lula sempre atuou por meio de golpismos no interior da classe trabalhadora. Como chefe de Estado jamais contribuiu para o desenvolvimento de aspectos necessários para tal emancipação dos trabalhadores, resumindo-se em chantagens econômicas que arrastam as massas cada vez mais à resignação e dependência política aos partidos, sindicatos e quadros políticos vinculados à perspectiva neorreformista.

Os partidos são estruturas burocráticas que transformam as necessidades partidárias em pautas para toda a classe trabalhadora, transformando a questão de classe na questão do partido. As necessidades dos partidos políticos não são as mesmas da classe trabalhadora. O jogo eleitoral não oferece qualquer possibilidade de mudança social independente da orientação política do governo. Ainda que alguns governos reformistas possam oxigenar as contradições de classe, eles também tentam postergar o inevitável, que é a própria guerra de classes. Os reformistas tentam promover essas ações alienando os trabalhadores num perverso processo, evitando a luta principal assim como combatendo as formas organizativas mais eficazes contra o capital. Boulos e Lula são farinha do mesmo saco. Representam uma mesma perspectiva indefensável.

Polêmicas inúteis e a crença cega do PCO

 

Notas

[1] Think tanks são aparelhos privados de hegemonia burguesa que têm como função primária a legitimação e defesa de um projeto de sociedade pautado nas normas do mercado e no funcionamento geral do capitalismo. Essas organizações também financiam a formação de quadros políticos qualificados para tal disputa. Esses quadros podem ser de ambos espectros políticos: esquerda e direita. Como exemplos de think tanks temos o instituto Millenium, Instituto Von Mises, Instituto Rothbard e IREE (Instituto para Reforma das Relações entre Estado e Empresa).

[2] Pelego é aquele que amortece um certo impacto causado pelo enfrentamento político. É aquele que, por se acovardar, por não dispor de coragem e disposição política, opta por manter-se firme numa relação de submissão àquele que define as diretrizes políticas. O pelego é necessário para manter o estado de coisas. A sua relação política funciona como uma mercadoria, onde se acumula uma parcela ínfima de poder, garantindo o lucro daquele que se obedece. Por isso, negociar com o pelego é uma tarefa da ordem do impossível, pois além de tudo o pelego sempre dispõe do mecanismo da manobra.

 

As artes que ilustram o texto são da autoria de Eduardo Paolozzi (1924-2005).

4 COMENTÁRIOS

  1. Who is PCO?

    O PCO organiza algo relevante? Não
    O PCO está inserido em algum processo ou acontecimento de organização?
    O PCO é referência das amplas massas de vivem do mundo do trabalho? Não
    O PCO é um “influencer” das mídias e meios? Não
    O PCO está enraizado no campo e na cidade? Não

    Who is PCO?

  2. What the fuck is PCO?
    A BULLSHIT epígono neoposadista & bolivarianolulista do trotskismo.

  3. Texto sensacional por aqui. Citando o sociólogo Nildo Viana ainda. 👊👊🔥🔥

  4. PCO, que vergonha, dividindo, ou melhor, fragmentando, desfavorecendo, fragilizando a esquerda. Total desserviço.

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