Por Omar Vázquez Heredia

Traduzido do ESPANHOL.

Milhões de venezuelanos e venezuelanas compareceram às urnas para exercer seu direito de voto no domingo, 28 de julho. Desde as primeiras horas do dia, as seções eleitorais tinham longas filas de pessoas aguardando sua vez de votar e, nesse contexto, já havia uma grande redução na abstenção, que era um dos fatores em que se baseava qualquer possibilidade de vitória de Nicolás Maduro. Além disso, pelo menos na seção eleitoral onde votei, as pessoas gritavam slogans que mostravam seu apoio ao principal candidato da oposição, Edmundo González. Lá, ouvimos “todo mundo ed… mundo sabe em quem votar”, “todo mundo ed… mundo veio votar”, “todo mundo ed… mundo quer que essa merda acabe”.

No final da tarde, os resultados de diferentes seções eleitorais que já haviam sido fechadas começaram a ser conhecidos e eram amplamente favoráveis a Edmundo González. Por exemplo, na seção eleitoral em que votei, localizada em um setor popular, na YMCA de El Cementerio, em Caracas, Edmundo González obteve 354 votos e Nicolás Maduro recebeu apenas 119 votos.

No mesmo sentido, fora das seções eleitorais, a maioria da oposição começou a comemorar sua vitória sobre Nicolás Maduro. No entanto, o governo de Maduro começou a forjar sua fraude eleitoral. Primeiro, deixou de entregar as atas das diferentes mesas das seções eleitorais para inviabilizar a contagem dos votos pelo comando da oposição, liderado pela neoliberal María Corina Machado. Em segundo lugar, os principais líderes chavistas, como Diosdado Cabello e Jorge Rodríguez, foram ao palácio do governo, em Miraflores, para comemorar a vitória. Em terceiro lugar, as três principais autoridades militares do país vieram ratificar seu apoio ao futuro resultado anunciado pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE): o Ministro da Defesa, General Chefe Vladimir Padrino López, o Ministro do Interior e Justiça, Almirante Chefe Remigio Ceballos, e o chefe do Comando Operacional das Forças Armadas Nacionais Bolivarianas (FANB), General Chefe Domingo Hernández Lárez. Em quarto lugar, o ministro das Relações Exteriores, Iván Gil, emitiu uma declaração rejeitando a interferência nos assuntos eleitorais da Venezuela. Em quinto lugar, o presidente do CNE, o líder chavista e ex-deputado do PSUV, Elvis Amoroso, anunciou Nicolás Maduro como vencedor da eleição presidencial.

A resposta imediata de María Corina Machado e Edmundo González foi rejeitar os resultados anunciados pelo CNE e afirmar que eles tinham as atas eleitorais para provar a fraude. Na Venezuela, o sistema eleitoral é automatizado e, em cada seção eleitoral, os votos são depositados em uma máquina que, no final do dia, emite um relatório que reflete a distribuição de votos para os diferentes candidatos e uma cópia oficial deve ser entregue às várias testemunhas. Nesse sentido, as testemunhas da oposição tinham em seu poder um grande número de atas, que foram centralizadas pelo comando de María Corina Machado, que as escaneou e digitalizou em um site, onde até agora 80,85% das atas podem ser vistas; com as assinaturas das testemunhas eleitorais, código QR e número específico. A soma desses relatórios eleitorais dá Edmundo González como vencedor com 7.173.152 votos, enquanto Nicolás Maduro obteve apenas 3.250.424 votos.

Por outro lado, o CNE, controlado pelo governo, em um ato precipitado, concedeu a vitória a Nicolás Maduro, mas ainda não publicou as atas eleitorais e os resultados eleitorais que anunciou desagregados nos níveis nacional, estadual, municipal, central e de seção eleitoral. Nesse contexto, desde segunda-feira, 29 de julho, houve uma série de protestos de setores populares e pronunciamentos internacionais e nacionais, rejeitando a fraude eleitoral de Maduro ou, pelo menos, exigindo uma contagem verificada dos registros eleitorais. Por exemplo, da oposição de esquerda e do chavismo crítico, o Partido Comunista da Venezuela (PCV) e o Partido Socialismo e Liberdade (PSL) denunciam a fraude. Além disso, organizações sindicais e intersindicais, como o Comitê Nacional de Conflito de Trabalhadores em Luta (CNCTL).

Ao mesmo tempo, outros candidatos às recentes eleições presidenciais exigiram a apresentação dos registros eleitorais e sua verificação, como Enrique Márquez, Antonio Ecarri, Luis Eduardo Martínez, Benjamín Rausseo, Claudio Fermín e Javier Bertucci. O mesmo foi feito por diferentes governos latino-americanos, incluindo aliados históricos do chavismo, como Gustavo Petro e Luiz Inácio Lula da Silva em uma carta conjunta com Joe Biden e o Ministério das Relações Exteriores do México de Andrés Manuel López Obrador. Por fim, o Carter Center, um observador internacional autorizado pelo próprio CNE, afirmou que “a eleição presidencial de 2024 da Venezuela não atendeu aos parâmetros e padrões internacionais de integridade eleitoral e não pode ser considerada democrática”.

Os protestos populares contra a fraude foram massivos na segunda-feira, 29 de julho, mas começaram a ser dispersados após a brutal repressão do aparato militar e policial do Estado e dos grupos paramilitares do governo. Até o momento, de acordo com a organização de direitos humanos Foro Penal, o resultado da repressão para impor a fraude eleitoral foi a morte de 11 pessoas e a prisão de 711. Ao mesmo tempo, em bairros populares, a polícia e as forças paramilitares estão patrulhando para intimidar até mesmo aqueles que estão batendo suas panelas em sinal de rejeição à fraude. Além disso, em algumas partes do país, líderes da oposição de direita e testemunhas das eleições foram presos.

O plano repressivo implementado por Maduro também inclui um conjunto de medidas acordadas no chamado Conselho de Estado, que foram anunciadas pelo governador pró-Chávez do estado de Miranda, Héctor Rodríguez. Essas medidas incluem, essencialmente, a perseguição às redes sociais e a implementação territorial de uma política de segurança contra as manifestações populares.

Simultaneamente, diante das críticas internacionais até mesmo de antigos aliados do chavismo, Maduro fez uma manobra política com seu pedido ao Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) para verificar os resultados eleitorais anunciados pelo CNE. No entanto, o TSJ é uma instituição controlada pelo governo chavista, e suas decisões já apoiaram o fechamento de fato da Assembleia Nacional eleita em 2015, a imposição da Assembleia Nacional Constituinte de 2017 e a intervenção de diferentes partidos de oposição.

Por outro lado, María Corina Machado evita convocar mobilizações de protesto e se compromete a demonstrar a fraude eleitoral, o que tem feito, para abrir negociações com setores do governo, a partir da mediação e pressão dos governos do Brasil, Colômbia e México. Por outras vias, apesar da repressão estatal e paraestatal, especialmente em cidades e vilas do interior da Venezuela, continuam ocorrendo protestos espontâneos contra a fraude de Maduro.

Do nosso ponto de vista, somente uma mobilização democrática que se transforme em rebelião será capaz de dividir o bloco governamental chavista e fazer com que os setores militares e civis do chavismo renunciem à autoridade da ditadura de Maduro.

17 COMENTÁRIOS

  1. “Do nosso ponto de vista, somente uma mobilização democrática que se transforme em rebelião será capaz de dividir o bloco governamental chavista e fazer com que os setores militares e civis do chavismo renunciem à autoridade da ditadura de Maduro”. Golpe militar? revolução socialista?

  2. quase duas semanas de uma eleição, sem que um único boletim de urna fosse publicado, e a esquerda brasileira segue defendendo…

    basta olhar os canais do Breno Altman, as notas do MST, do PT e o silêncio eloquente da tal esquerda libertária, pra ver o tipo de sociedade que a extrema esquerda defende.

    Menção honrosa ao pstu que não entrou nesse engodo surreal de Maduro.

  3. Ao menos não ficaram ao lado de fraude e roubalheira, como a maioria da esquerda.

  4. Diante de tudo que a acontecendo na Venezuela aos olhos de todos, ainda sobra para o relevante PSTU brasileiro. De trotsquista por trotsquista, vale acompanhar as notícias do Esquerda Diário venezuelano, que aliás está em campanha pela libertação de jovens socialistas presos nos últimos protestos…

  5. De comunista por comunista, vale acompanhar o que diz o Partido Comunista Venezuelano. Vejam o artigo assinado Passa Palavra.

    Preferem falar da geopolítica do que da situação dos trabalhadores, diz ele. Exactamente.

  6. SOLIPSISMO AUTOTÉLICO
    de trotskista por trotskista e de comunista por comunista
    ou seja: de trotskista para trotskista e de comunista para comunista

  7. Na eleição de 2018, o CNE – diante da vitória de Maduro – publicou as atas por local de votação no dia seguinte ao escrutínio. A votação ocorreu no dia 20 de maio e no dia 21 as atas lá estavam no site todas elas:

    Conforme noticiado pelo próprio CNE, aqui: https://web.archive.org/web/20190204085613/http://www.cne.gov.ve/web/sala_prensa/noticia_detallada.php?id=3715

    Aliás, aqui está a votação por local da eleição de 2018: https://web.archive.org/web/20190419212051/http://www.cne.gob.ve/ResultadosElecciones2018/ Atualizaram tudo 8 dias após as eleições de maio de 2018.

    Agora, diante da derrota eleitoral, escondem as atas (boletins de urnas).

  8. Aliás, a própria Lei venezuelana exige que a totalização dos votos com dados de todas as atas de escrutínio seja feito em 48h.

    Art. 116, LOPRE.

    Artículo 116. La Junta Nacional Electoral y las Juntas Electorales, éstas últimas bajo la supervisión de la primera, tendrán la obligación de realizar el proceso de
    totalización en el lapso de cuarenta y ocho (48) horas. En caso de que las Juntas Electorales no hubiesen totalizado en el lapso previsto en el artículo anterior, la
    Junta Nacional Electoral podrá realizar la totalización.
    La totalización deberá incluir los resultados de todas las Actas de Escrutinio de la circunscripción respectiva.

    O dispositivo que blogs que orbitam o PT andam alardeando como um prazo de 30 dias que a lei supostamente daria para publicar as atas na verdade é uma espécie de publicação em diário oficial do resultado final da eleição.

    Artículo 125. El Consejo Nacional Electoral ordenará la publicación de los resultados de los procesos electorales en la Gaceta Electoral de la República
    Bolivariana de Venezuela, dentro de los treinta (30) días siguientes a la proclamación de las o los candidatas y candidatos electas o electos.

    Assusta a quantidade de aloprados autoritários na esquerda brasileira distorcendo os fatos, a lei venezuelana e a razão para defender… o regime de Maduro.

  9. Há os que ao menos perderam a vergonha de assumir o que defendem, ao menos nos poupa o trabalho de explicar a sociedade que pretendem construir.
    “O DILEMA PARA A ESQUERDA em todos os países está em realizar separadamente uma disputa que preferencialmente deve ser embalada num único pacote. Ou seja, a luta por soberania e democracia. Na Venezuela, defender soberania implica passar por cima de resultados eleitorais objetivos. E defender a democracia eleitoral hoje significa triturar o país.”
    https://jornalggn.com.br/america-latina/venezuela-precisamos-perder-a-hipocrisia-por-gilberto-maringoni/

  10. Como disse a Dilma Rousseff

    “Eu acho que quem ganhar ou quem perder, nem quem ganhar nem quem perder vão ganhar ou perder. Vai todo mundo perder”

  11. Gosto muito de acompanhar o Maringoni. Ele escreve o que muita gente na esquerda pensa mas ou não consegue expressar em palavras, ou tenta esconder. Mas é de revirar o estômago.

  12. Maduro ainda amadurecerá. Ficará parecido com Kim Jong-un. Será um tempo de resultados eleitorais muito mais confiáveis… Tem gente na esquerda brasileira do capital dizendo que é um absurdo o PSTU ter o mesmo entendimento que a direita e a extrema-direita, dizendo que Maduro é ditador e que houve fraude na eleição… Essa gente diz ainda que a vontade popular não está em questão, que a questão é a soberania nacional, e que o CNE da Venezuela referendou o resultado eleitoral. Bom, é o mesmo argumento que a extrema-direita no Brasil usa para dizer que não houve golpe militar em 64, que o que houve foi uma mudança de governo, referendada pelo Congresso Nacional e STF, por dentro da lei. Quando questionados, ouvindo que tal mudança não passou por uma aprovação eleitoral, que a vontade popular não era aquela e não fora respeitada, a extrema-direita responde dizendo sempre a mesma coisa, que o que estava em jogo na época não era a vontade popular mas sim a soberania nacional, que caso a mudança não tivesse sido feita como fora, a soberania teria sido roubada pelos comunistas soviéticos e cubanos. Não é nada fácil entender o que é que passa na cabeça dessa gente.

  13. A defesa empedernida do regime de Maduro empreendida pelo MST e a consequente aproximação desse movimento com a ditadura venezuela () me deixam com a pulga atrás da orelha.

    O MST estaria preparando-se para vôos políticos mais elevados, sobretudo em contextos de crise, sob o beneplácito de seus padrinhos Venezuela, Rússia e Chiina?

  14. É um dilema, não dá para aceitar a experiencia bolivariana que desgastou-se, não enfrentou a burguesia venezuelana, mas também não dá para aceitar de entregar a vitória a ultradireita, acham que seria melhor para a classe trabalhadora venezuelana e toda a América latina ter esses lacaios do imperialismo no poder?

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