Por Denisson Palumbo
Há muitos anos sem um restaurante universitário (RU), local onde os estudantes garantiam a baixo custo pelo menos uma das refeições diárias, já virou pauta permanente de luta na UFBA (Universidade Federal da Bahia) a exigência que esta política de permanência seja efetivada. Mas recentemente foi construído na Universidade o espaço que abrigaria o novo restaurante universitário, já que o espaço do antigo RU foi transformado em unidade acadêmica, os novos equipamentos chegaram a ser adquiridos, mas por questões políticas e burocráticas a área virou um “elefante branco”. Agora, com o programa de expansão das universidades (REUNI), cuja UFBA é a universidade pioneira na implantação, aliado à política de cotas já implementada em tempos anteriores, programas que juntos provocam o aumento do número de estudantes e a mudança do perfil sócio-econômico dos mesmos, a pressão pela reabertura imediata do restaurante aumentou, assim como a exigência da efetivação de tantas outras políticas de permanência (transporte, bolsas, residências, etc.). Mas é que às vésperas da consulta à comunidade acadêmica para a escolha do futuro reitor (ou reitoria), uma surpresa: o RU é reaberto! Seria uma boa surpresa, entretanto, se não fosse o preço cobrado por prato… R$5,50 enquanto nas outras universidades do país não se chega a R$2,00! Ficou indigesto para os estudantes… Por isso, e imediatamente, uma parte do corpo discente iniciou um processo de mobilização (veja aqui: http://passapalavra.info/?p=22620), com a seguinte palavra de ordem: “RU a R$1,00!”.
Dos materiais produzidos (consultar o blog: http://www.umrealja.blogspot.com/) um dos mais interessantes foi um cordel e, a partir dele, este vídeo que reproduzimos agora, com o cordel já musicado. Por Passa Palavra
Um Cordel de Denisson Palumbo colocado em vídeo por Movimento “RU a Um Real Já”.
Letra:
Era uma vez na Bahia
Na salvador, capital
Um grande elefante branco
Um belíssimo animal
Ele era meu e era seu
Patrimônio federal
Esse elefante anormal
Habita campus de lama
Savana ele não conhece
Repare na sua trama
Nunca saiu da Bahia
Mas é grande a sua fama
Foi falado paratodos
Cientistas de pouca idade
De boca a boca, evidente
Ele sem notoriedade
Pelo meio midiático
Ninguém soube a raridade
E na Universidade
Ele passou anos parado
Para o estudo aos espanhóis
E a um grupo politizado
Porém isso se acabou
Quando o bicho foi matado
Foi de uma morte matada
Institucionalizada
Para matarem a fome
De uma futura manada
Que será também defunta
Pra outra ser alimentada
Agora essa rara carne
Compram a cinco e cinqüenta
A preço de certas praças
Mas a gente não agüenta
Ou faz uma nova venda
Ou a gente arrebenta
Tá caro, tá caro, tá…
Tá salgada a refeição
R.U destemperado
Praça de Alimentação
Agora comer no shopping
É a melhor opção
Piadas aparte verão
Na salvador, capital
Camaradas bem unidos
Pelo o mesmo ideal
R.U bem temperado
Prato bom por um real
Pode vir senhor reitor
Para ver minha marmita
Para escutar o meu ronco
Duma barriga já aflita
Do caruru tu não come
Vai passar fome maldita
Tem pimenta nestes versos
Pois baiano sou bastante
E nessa tal Federal
Se o que falta é o picante
Então sinta mais o gosto
Dessa língua chamuscante
Ultrajante o restaurante
Neste estado, neste espaço
Já usado e reusado
E o pratinho a este preço
Sozinho, aqui me pergunto:
Será isso o que mereço?
Mas o piauiense
Paga, saibam só oitenta
O estudante lá da USP
Paga só um e noventa
E o de Feira de Santana?
O que a gente aqui só tenta
Prato bom por um real
Com saladas, grãos e soja
Macarrão, feijão e arroz
Pois não sou da sua corja
Um prato a cinco e cinqüenta
O aroma até me enoja
Vou comprar lá na baiana
Feliz, par de abarás
Abastecer de dendê
Meu organismo eficaz
Que precisa de comida
Mas não da cara demais
Faço rir o satanás
E sinceramente minto
Eu não como muitos livros
Eu ando lerdo, faminto
Onde é a aula de hoje?
Desesperado me sinto
Sento na minha cadeira
Confuso do meu lugar
Logo essa aula se acaba
E amanhã outra terá
E talvez não possa vir
Quando que vou me formar?
A fome me faz pensar
Com a barriga vazia
Vejo as cores da vertigem
Era uma vez na Bahia
Um seco universitário
Que fazia poesia
E o aberto elefante branco
Um belíssimo animal
Do qual não comeste nada
Nem um pedaço sem sal
Assim fica desnutrido
Morre pedindo um real
Havia um restaurante universitário na UFBA onde hoje é a FACOM. Nos anos 1970/1980, era o principal ponto de encontro do movimento estudantil – e palco de discursos inflamadíssimos por gente do quilate de Lídice da Mata e Javier Alfaya.
A FACOM funcionava onde hoje fica o Instituto de Saúde Coletiva inventado por Naomar Almeida. Como o instituto precisava de um prédio e a FACOM queria um prédio maior, fecharam o restaurante, que estava plenamente funcional, sob o argumento de que ele… não funcionava! Todos os equipamentos foram deixados à míngua, para enferrujar e apodrecer, e assim dar motivo para dizer que o restaurante não funcionava, que os equipamentos estavam gastos e não havia verba para repô-los etc.
Dito e feito: o RU foi fechado, a FACOM migrou para seu antigo prédio e o ISC ficou com o prédio que era da FACOM. E adeus restaurante universitário – até aparecer o AeroUFBA, o tal “elefante branco” de que se fala aqui.