Uma classe, várias lutas

A subsede da Apeoesp de Mogi das Cruzes-SP reuniu, em um 1º de Maio alternativo, diferentes grupos e pessoas dispostas a trocarem experiências e refletirem sobre os impasses das lutas populares. Por Passa Palavra

Coletivos independentes, refugiados palestinos, militantes sindicais, ativistas de outras nacionalidades, artistas e membros da comunidade local compuseram o sarau de 1º de Maio realizado na subsede regional da Apeoesp de Mogi das Cruzes, na grande São Paulo. Diante do vazio de significado que a data comemorativa representa hoje para a maioria dos trabalhadores, a iniciativa de realizar um evento que conjugue discussão política com intervenções artísticas se apresentou como uma alternativa admirável e que merece ser repetida.

Na roda de discussão, que se seguiu à exibição de um filme sobre a luta do operariado de São Paulo no início do século XX, tiveram voz elementos representativos dos inúmeros segmentos em que se apresenta hoje a classe trabalhadora e suas frentes de lutas cotidianas.

A educadora Simone Maria abriu a conversação, apresentando um pouco das diversas aplicações que o conceito de educação popular tivera ao longo do século XX no Brasil. Aproveitou para reafirmar o compromisso que os atuantes neste setor devem ter com as entidades populares e com a transformação radical da sociedade, a exemplo do que têm feito algumas escolas de movimentos e cursinhos populares. Em seguida, um companheiro mexicano que visita o Brasil contou sobre as últimas experiências políticas que travam as organizações populares de seu país. César, depois de narrar resumidamente a insurgência dos povos de Oaxaca ocorrida em 2006 e a mobilização em curso para libertação dos presos políticos de San Salvador Atenco, destacou o recrudescimento das medidas repressivas dos poderes públicos e privados, manifestas pelo sistemático processo de criminalização das ações populares, deixando-nos a impressão de que nesta matéria há muito mais proximidade do que as distâncias geográficas podem fazer supor.

Aliás, a fala do mexicano serviu de ensejo para que um professor da rede pública estadual chamasse a atenção para o caso de seus quatro colegas de profissão que foram exonerados por terem participado da grande greve e ocupação que a categoria realizou no ano de 2000. Mais do que isso, informou ainda que, através de um novo processo reaberto recentemente, outros 35 docentes estão sendo enquadrados por terem testemunhado a favor de seus companheiros e apelou para que a notícia fosse difundida de modo a fomentar uma rede de solidariedade.

Uma representante da colônia de imigrantes palestinos, que se encontra no município de Mogi das Cruzes, e do Movimento Palestina para Todos (Mopat) também fez seu pronunciamento. Nesta oportunidade, ela denunciou o descaso e a enganação de que são vítimas os refugiados de guerra que embarcam para o Brasil. Segundo suas declarações, apesar de prometer mundos e fundos, o Estado brasileiro não tem dado qualquer tipo de apoio para que estes estrangeiros possam nestas terras se asilarem com mínimas condições de sobrevivência. Na qualidade de imigrantes (não falando o português, desconhecendo as minúcias das leis, desprovidos de serviços de assistência social, etc.), os palestinos encontram inúmeros obstáculos à adaptação e são forçados a se submeterem a regimes de trabalho ainda mais degradantes que o da média da população brasileira.

Ah! Antes que a festa propriamente dita se iniciasse, houve a apresentação e a troca de materiais informativos, entre os quais se contava o primeiro número da edição impressa do Passa Palavra – especial para a grande São Paulo.

Enfim, chegou a hora da confraternização! Apresentação teatral, leitura de poesia, malabarismo e música ao vivo encerraram o sarau de 1º de Maio. Enquanto na cozinha era a comida árabe que comandava, o ambiente – agora mais descontraído e informal – propiciava que os participantes se conhecessem, ou matassem a saudade, restabelecessem contatos e, sobretudo, firmassem a possibilidade de reeditar encontros futuros deste tipo.

Numa época em que as lutas sociais, de uma perspectiva maior, não se encontram em estágios politicamente avançados e ocorrentes em escalas colossais, muito proveitosa pareceu a ocasião. Se os ativistas de nosso tempo não aceitam a idéia de ser dirigentes das massas apáticas e, por outro lado, não têm intenção de ficar com os braços cruzados, têm de assumir a tarefa quase artesanal que hoje lhes compete: reatar o vínculo entre os de baixo, reinventando, incentivando, os espaços próprios de sociabilidade. O que só é possível fazer se, por cima das desavenças quiméricas que nos separam, deixarmos prevalecer o ímpeto de resistência que nos une, mostrando que, por trás das pequenas e pontuais lutas que acontecem aqui e ali, há um elemento comum: uma classe de explorados.