Por Passa Palavra

img_texto3688Passados 5 dias desde que a Polícia Militar e estudantes se confrontaram no estacionamento da prédio da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP), acirram-se os ânimos em torno da questão da presença das forças policias na Cidade Universitária.

Logo em seguida à ação de resistência, na noite do dia 27 de outubro, e após uma assembleia geral emergencial, os estudantes ocuparam o prédio da administração da FFLCH, tendo como reivindicação principal a revogação do convênio que a universidade firmou recentemente com a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo.  Na noite de ontem, 1º de novembro, porém, após reavaliarem em assembleia as novas condições, os alunos decidiram ocupar o prédio da reitoria da universidade.

Desde que a polêmica tomou lugar, sobretudo após o assassinato do estudante da Faculdade de Economia e Administração (FEA) Felipe Ramos de Paiva, os grandes veículos de comunicação procuraram conduzir a discussão de forma que se estabelecesse uma polarização entre uma suposta minoria de “maconheiros baderneiros”  contrária a uma suposta maioria de “gente do bem”. Quem andar pelo campus nestes dias, no entanto, verá que o debate não é tão simples, e que ele está instaurado em qualquer canto por que se passe. A esse respeito, alguns professores, cujos textos podem ser lidos aqui, têm se manifestado publicamente repudiando a atitude da polícia e a política de segurança adota pela gestão do Reitor João Grandino Rodas.

Na segunda-feira, dia 31, a Congregação da FFLCH expressou o seu posicionamente sobre o caso após realizar sessão extraordinária. O documento, entre outras coisas, anunciava a criação de uma Comissão, com três professores e dois funcionários, que teriam por missão negociar com o movimento dos estudantes a desocupação do prédio.

img_3673Na tarde de ontem, a Comissão, formada pelos professores Ruy Braga, André Singer e Roberto Bolzani Filho, e os funcionários Samuel e Marie, esteve na portaria da ocupação apresentando oficialmente o pronunciamento da instituição e procurando inaugurar um primeiro canal de diálogo. Nesta conversa, os membros da Comissão Mediadora destacaram dois aspectos do posicionamento apresentado pela Congregração da FFLCH: a decisão do órgão em se esforçar no sentido de rever os termos do convênio, levando em consideração antigas reivindicações dos estudantes (como melhorias na iluminação e no sistema de transportes internos do campus) e comprometendo-se a pressionar a Reitoria; e a disposição em rever com urgência a legislação interna da universidade que regulamenta a sua estrutura de poder.

Membros da ocupação levantaram a objeção de que o documento não apresentava uma posição claramente contrária a presença da polícia na Cidade Universitária e não se referia aos processos administrativos que têm sido levantados contra estudantes e funcionários que participam de mobilizações. Outros ainda lembraram que as medidas de segurança tomadas pela USP não serão efetivas se continuarem a excluir a moradores dos bairros de seu entorno – algo que se verifica pelo déficit dos projetos de extensão que deveriam fazer chegar o conhecimento gerado na instituição à população mais pobre da cidade.

Sobre o acontecido da última quinta-feira, vários estudantes testemunham que, desde as primeiras horas do dia, a polícia havia intensificado suas abordagens a estudantes, chegando inclusive a revistar pessoas na biblioteca e intimidar alunas que filmavam um outro grupo de alunos ser averiguado pelos policias. “A polícia estava procurando” – resumiu um dos estudantes.

img_3679Às 17h de ontem, houve também um ato dos alunos que defendem a presença da PM no campus universitário. Nesta ocasião, escusado dizer, não faltaram manifestações das mais reacionárias, como exaltação à ordem, às “pessoas de bem”, à propriedade, à pátria e até ao estado de São Paulo.
Assim que acabava o ato dos alunos pró-PM, iniciava-se a assembleia geral dos estudantes, da qual, vale ressaltar, os participantes do ato das 17h, apesar de inúmeras vezes convidados, recusaram-se sistematicamente a participar.  Do final desta última assembleia, que contou com a presença de mais de mil estudantes e se encerrou pouco depois da meia-noite, resultou a transferência da ocupação do prédio da FFLCH para o da reitoria.

Até as últimas informações que obtivemos,  não havia guardas ou policiais no local e os grupos de trabalho e comissões já começavam a se estruturar.

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11 COMENTÁRIOS

  1. Eu não pude participar da assembléia ontem, mas alguns estudantes me disseram que a decisão de ocupar a reitoria foi tomada no final da assembléia, com ela esvaziada, por uma minoria descontente com a decisão de desocupar a administração. Até aonde isso confere?

  2. Eu respeito e admiro muito o trabalho de vocês. Várias vezes vim aqui me informar tanto nos textos quanto nos comentários. Só que o texto esquece de mencionar justamente o fato de que a assembléia rachou e uma parte da galera – que tumultuou bastante o andamento da assembléia, diga-se de passage – ficou até tarde e com a assembléia esvaziada votou pela ocupação da reitoria. Acho que o espaço aqui, justamente por sua seriedade, pode (e deve!) ser usado para criticar este tipo de prática. Lamentável que a ânsia de ocupar tenha destruído a possibilidade de uma construção coletiva.

    Que fica bem claro, que eu também não tenho acordo com o outro lado que se negava a discutir a ocupação da Admnistração da FFLCH ou da REItoria por princípio.

    Política se faz com diálogo e com cessão. É isso que os grupos políticos da USP precisam aprender.

  3. Caros Eduardo e Ricardo,
    Se não mencionamos estes fatos é porque, até o momento da publicação, que
    ocorreu no início da madrugada, não dispunhamos de informação o suficiente
    para tal. Simplesmente por isso.
    Fica aqui o convite para que, através de artigos e/ou comentários,
    outros pontos de vistas sejam apresentados.

    Cordialmente,
    Coletivo Passa Palavra

  4. É preciso ter em conta que o esvaziamento citado não se deu apenas porque os grupos políticos mais radicalizados estavam dispostos a “tumultuar” o plenário, mas também por causa da tentativa mal fadada dos setores conservadores presentes (atual gestão do DCE-USP e militantes do PSTU)de encerrar a assembleia após a votação que deu vitória à desocupação do prédio da Administração da FFLCH. Por mais “esvaziada” que estivesse, a assembleia ainda estava em curso. Os grupos que preferiram abandoná-la com a pretensão de deslegitimar decisões posteriores o fizeram por oportunismo e clara tentativa de golpe.

    Ademais, é impossível discutir política com a calma, a civilidade, e a sensatez tão apregoadas e impostas pelos debatedores, comunicadores, administradores, emissores e autores que só possuem coragem para expor suas reflexões à distância dos espaços onde a realidade é gestada e (re)produzida.

  5. Eu entendo a preocupação do Bruno, e realmente não tenho dúvidas de que os partidos tenham feito isso para deslegitimar a continuidade da assembleia. Por outro lado, me pergunto: para obtermos vitória política basta termos ao nossa lado a razão moral?

    Digo isso porque, geralmente estes debates sobre os procedimentos assembleários restringem-se a acusar a corrente, o partido ou grupo de opinião divergente de serem desleais. Ora, não há dúvidas de que tenham sido desleais, mas isso não confere -automaticamente – aos que ficaram força política. Pode dar sustento moral, mas não efetividade política.

    Em outras palavra, a pergunta é: do que vale tomar a decisão de um ato tão grandioso, que vai exigir enorme esforço e dedicação de todas as correntes políticas de esquerda, num espaço esvaziado, ainda que moralmente legítimo? É como roubar e não poder levar. Em política, tão importante quanto ter a consciência limpa é forjar uma base de ação que permita intervir na realidade.

    Enfim, são apenas algumas reflexões que acho que podem contribuir com algum debate.

  6. Achei uma palhaçada a Assembléia.
    Eles fizeram a votação várias vezes até que o resultado fosse pela ocupação.

  7. quem esconde a cara e destrói o bem publico não merece nem meu desprezo. quem faz isso não merecia estar estudando numa Universidade.

    Protesto é bom e eu gosto, mas vamos combinar, com cara limpa e honestidade!

  8. Eu estive na Assembleia. O que eu vi foi muito diferente do que relato pela Vivian.
    Estava em votação duas propostas: a 1. se continuaria a assembleia e discussão de organização de um calendário de atividades. A 2. contemplava o mesmo mais a possibilidade de se haveria votação de ocupação ou não. A votação foi repetida várias vezes (com o argumento de que não se sabia se havia contraste ou não). Num dado momento, no meio da votação, onde só foi votado a primeira proposta, a assembleia foi destituída.
    Houve tumuldo e alguns minutos ela continuou. Uma parte dos alunos foi embora (mas a assembleia não ficou esvaziada).
    Achei que a repetição de votação pelas propostas foi um jeito de evitar que a pauta sobre ocupação ou não fosse trazida a assembleia.

  9. Eduardo e Vivian, foi isso, mesmo, que aconteceu!
    Depois que a grande maioria foi embora, uma pequena minoria “determinou” o que quis.
    Isso é que é “respeito”, hein?

  10. Eu penso, eu faço política, sou cidadã e ninguém nos representa. Segurança é conquistada com igualdade social, distribuição de renda e democracia real. Não aceitaremos a repressão da ditadura. Para conter os movimentos pró-democracia, o governo baixava decretos que davam mais força e poder aos integrantes das forças policiais.

    Em fevereiro de 1969, por exemplo, o governo criou o “Decreto-Lei nº 477, elaborado pelo Conselho de Segurança Nacional especialmente para silenciar estudantes, professores e funcionários das instituições de ensino”, segundo a pesquisadora Flávia de Angelis Santana, em sua tese de mestrado intitulada “Atuação política do movimento estudantil no Brasil: 1964 a 1984”.

    O decreto proibia qualquer manifestação, passeata ou comício no interior de escolas e universidades públicas e particulares, sob pena de desligamento da faculdade no caso dos estudantes e demissão para professores e funcionários.

    Outro fato muito criticado pelo meio acadêmico foi a criação da Assessoria Especial de Segurança e Informações (Aesi). Implantada na USP e em outras instituições de ensino em 1973, essa assessoria tinha como objetivo selecionar os funcionários, colher dados sobre atividades subversivas, levantar informações sobre alunos, entre outros. Ela foi extinta apenas em 1982. Medidas como essas ampliaram o poder das polícias. Invasões de salas de aulas e prisões de professores e alunos, que já eram comuns no período, ganharam força com as medidas.

    Desde então, a PM é uma entidade repressora, que está aqui para acuar, não para proteger. Com a reabertura política, na década de 1980, a perseguição, assim como a presença da corporação no campus foi conquistada, não podemos retroceder!!

  11. “Quem decide o fim de uma assembleia? Centenas de estudantes ou um acordo de correntes pelo alto?

    A verdade, noticiada até por jornais burgueses como o Estadão, é de que a própria desocupação da FFLCH foi decidida por 559 a 458 votos. Isso considerando que DCE, PSOL e PSTU estavam blocados nessa proposta. Fica claro que, se o PSTU estivesse ao lado do combate, e não querendo preservar seus aliados do PSOL a todo custo, a assembleia teria mantido a primeira ocupação. Mas o que pode acontecer quando a direção de um movimento tenta frear uma luta que ainda pode avançar? Acontece o que é chamado de “passar por cima das direções burocráticas”. Portanto as centenas de estudantes que se mantiveram na assembléia não aceitaram a manobra da implosão, seguiram com a pauta e votaram a ocupação da Reitoria. Sendo assim, é um falseamento da realidade o que Ronald Leon publica em seu texto: “Depois do horário máximo marcado pela assembleia e a declaração de seu final, um grupo de estudantes, encabeçado pela LER, resolveu ocupar outro prédio da USP, desta vez a própria reitoria. Esta ocupação, decidida pelas costas das instâncias deliberativas e resolutivas legítimas dos estudantes, não só permaneceu isolada como também dividiu o movimento estudantil”.

    É democrático que uma corrente política decida terminar uma assembleia quando vai ser votada uma proposta que ela não concorda como fizeram o PSTU e o PSOL na assembléia que votou a ocupação da reitoria, retirando-se antes desta votação para evitá-la? Não é a assembléia que deve avaliar um teto de horário que ela própria fixou? Quem realmente “não reconheceu a soberania daquela assembleia”? Quem realmente “dividiu o movimento”? Foi mesmo a LER-QI que se colocou como obstáculo para que “os estudantes da USP possam vencer”?! Esses partidos, supostos defensores da “democracia das assembléias”, depois seguidos neste argumento preciso pela Veja, Estadão, Reitoria e governo do Estado, atuaram na verdade cumprindo o papel de burocracia estudantil para colocar fim à luta dos estudantes. Dizer que a decisão de ocupar a Reitoria foi feita pelas costas dos estudantes, isso sim é uma calúnia.”

    Retirado de http://www.ler-qi.org/spip.php?article3362

    Apesar de não ser da LER e de ter divergências estratégicas com este partido, concordo com a colocação do problema feita por eles.

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