Por Legume Lucas
Um dos dilemas da esquerda brasileira atual é o de saber qual é a sua base, como organizá-la, que tipos de trabalhos podemos fazer. A frase “o importante é retomar o trabalho de base” foi tantas vezes repetida que já se encontra esvaziada de grande parte do seu conteúdo político. Longe de pretender estabelecer uma receita ou um guia, pretendo apresentar nestes artigos algumas experiências realizadas dentro do Movimento Passe Livre São Paulo.
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O espaço do cursinho popular é marcado por contradições. Ao mesmo tempo que pretende-se corrigir um défice educacional histórico das classes populares brasileiras, intenciona-se estabelecer uma crítica ao vestibular como método de seleção. Contradição ainda maior é a tensão entre pretender atingir os mais pobres e por isto cobrar baixas mensalidades, e pagar os professores de forma a mantê-los dando aulas. Dar aulas nestes cursinhos torna-se então um projeto de militância política para os professores; porém, para os alunos é uma tentativa de entrar na faculdade. Neste texto relatarei a nossa experiência em dois cursinhos diferentes.
Em abril deste ano fomos convidados pelos professores do Cursinho da Psicologia da Universidade de São Paulo (USP) a participar do Projeto Arena, um espaço de diálogo dos alunos com os movimentos sociais. A ideia deste projeto é preparar o aluno não apenas para o vestibular mas para a inserção crítica na vida universitária; ao mesmo tempo permite a construção de relações horizontais de diálogo entre professores, alunos e militantes de movimentos sociais. O projeto é considerado prioritário pelo corpo pedagógico do cursinho e por isto tem um espaço regular na grade de aulas, o que permitiu o planejamento de três atividades para discutir os problemas do transporte na cidade de São Paulo e as possibilidades de ação para transformar esta realidade.
Na primeira atividade separamos os alunos em grupos para a leitura e discussão de reportagens que abordavam diversos problemas encontrados no cotidiano dos usuários do transporte coletivo. Os alunos puderam analisar as reportagens relacionando-as tanto com os problemas enfrentados em sua vida cotidiana quanto com as questões estruturais do transporte. Consideramos que assim era possível partir da reflexão dos estudantes tendo como base sua experiência direta para analisar as condições de transporte na cidade. Estas discussões feitas em pequenos grupos foram socializadas para toda a sala, possibilitando a construção de um panorama amplo dos problemas de transporte coletivo em São Paulo e levantando também a necessidade de construir mobilizações dos usuários para transformar estas condições. Foi interessante que neste momento surgiu por parte dos alunos a experiência da população de Florianópolis em 2005, que se mobilizou e barrou o aumento de tarifas.
Para nós não estava em questão impor uma prática política pré-determinada para o engajamento daqueles jovens, mas ao mesmo tempo existia uma demanda – por parte deles e dos professores – de apresentação do Movimento e suas formas de luta. Neste sentido, contamos um pouco sobre as mobilizações de Salvador e Florianópolis, a formação do MPL, as experiências em São Paulo de 2005 a 2010 e, por fim, sobre luta contra o aumento de tarifa em 2011, relatando as ações tomadas ao longo dos meses de mobilização. Socializamos com os alunos a avaliação interna do MPL de que precisávamos sair da prática reativa em relação aos transportes, pois mesmo que conseguíssemos impedir o aumento de tarifa outros viriam, ao mesmo tempo que considerávamos que a força social do movimento em 2011 permitia propor um projeto de lei de Tarifa Zero. Procuramos também deixar claro que este projeto, ou qualquer mudança nos transportes, dependeria da mobilização popular. Embora o tempo de uma aula fosse curto, conseguimos ainda ter um espaço para que os alunos apresentassem suas dúvidas e discordâncias com o movimento.
A terceira atividade foi reservada para uma avaliação das discussões feitas nas duas atividades anteriores e para refletir sobre as possíveis práticas políticas em relação ao transporte. Foi levantada a possibilidade de se mobilizar pela ampliação do Bilhete USP para os estudantes de cursinhos populares e a integração na luta pela Tarifa Zero.
No início do mês de agosto fomos chamados por um antigo apoiador para fazer uma atividade no cursinho popular Salvador Allende, ligado à Rede Emancipa, que funciona aos sábados na escola municipal Derville Alegreti. A atividade se inseriu em uma proposta de debates sobre urbanização e direito à cidade, inspirados nos círculos de cultura preconizados por Paulo Freire como um espaço para relacionar o conhecimento e a política. Dada a periodicidade das aulas no cursinho, tivemos um tempo menor de inserção, com apenas uma aula reservada para a atividade. Isto requereu que tratássemos a discussão de uma maneira mais direta, ainda assim não poderíamos desconsiderar a experiência de vida dos alunos na discussão. Optamos por partir da pergunta “o que você considera fundamental para a vida na cidade?”; conforme os alunos iam elencando suas necessidades, como cultura, educação, saúde, trabalho, moradia, íamos anotando espalhadas pela lousa estas palavras. Perguntamos então como fazíamos para acessar todas aquelas necessidades, levando a reflexão sobre o transporte como algo fundamental para acessar as vantagens possibilitadas pela vida em cidades. O raciocínio seguinte pretendeu problematizar a exclusão gerada pela cobrança de tarifa no transporte coletivo, apresentando como possibilidade de mudança a mobilização popular em torno do projeto Tarifa Zero. Neste momento abrimos espaço para que os alunos questionassem a ideia de Tarifa Zero, explicitando sua viabilidade e as mudanças promovidas na cidade a partir da possibilidade de circular por ela. É curioso observar que, quando criamos esta atividade, há cerca de 6 anos, e a aplicávamos em escolas era comum, nos consideraram malucos por propor isto; na experiência vivenciada em agosto, não apenas não fomos considerados malucos, como parte da defesa da proposta foi encampada pelos próprios alunos.
Encerrada nossa parte da atividade, uma das coordenadoras do cursinho fez um levantamento do tempo e dos gastos dos alunos com transportes para ir ao cursinho, convidando-os para engajarem-se na audiência pública em torno da meia passagem para estudantes de cursinho popular, projeto de um deputado estadual do PSoL. Informou-os, e também a nós, que os outros cursinhos da rede também estavam fazendo os círculos de cultura, inspirados em Paulo Freire, para discutir transporte e cidade. Neste momento, foi interrompida pela indagação de quem seria Paulo Freire. Feita a explicação, retornou para a necessidade de comparecer à audiência com o referido deputado e se mobilizar pela meia passagem, apesar de não discordar da Tarifa Zero defendida por nós.
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Certamente o trabalho em um cursinho não garante para nós a realização de atividades em sequência ou a formação de um núcleo de mobilização como fazemos, ou tentamos fazer, em escolas. Contudo, tentamos nestas atividades propiciar um espaço de discussão crítica, objetivando não apresentar o MPL como o engajamento necessário para a transformação da sociedade, mas permitir um espaço reflexivo para a reinterpretação política do mundo. Como estas pessoas serão participantes das mobilizações sociais em torno do transporte coletivo ou se engajarão em ações pela Tarifa Zero não nos é possível afirmar agora, mas em alguma medida elas compõem conosco uma tentativa de transformação da sociedade.
Depois comentarei outras coisas porque também trabalhei um ano como professor voluntário em cursinho ligado à Educafro.
Sem querer ser indelicado, acho que o alvo central ficou de fora. Os cursinhos populares servem sobretudo de aprendizado para os militantes. A maioria dos críticos ou o são apenas verbalmente, ou tiveram apenas a oportunidade de lutar contra alguém, algum órgão, alguma gestão. Quando se assume um cursinho surge a oportunidade de apresentar algo, ser propositivo e, o que clareia as coisas, ver se a indignação contra o sistema é duradoura, capaz de fazer com que a pessoa perca algo em prol do coletivo, assuma algum compromisso. Pode ser uma bela festa que se deixa de ir, pode ser a namorada que tenta proibir o namorado de trabalhar quando deveria estar com ela.
Se tem uma coisa excelente que ví nos cursinhos foi isso. Fazer os militantes testarem as suas teorias. Verem se são realmente capazes de convívio democrático, de abandonar alguma coisa pelo coletivo, de doar tempo, às vezes algum dinheiro, enfim. E não são poucos os que, lá pelo meio de caminho ou menos, reconhecem as próprias limitações, descobrem que certas projeções eram somente projeções.
Os cursinhos populares serviram e servem de base para a formação de muitos militantes, dão experiência de organização, de compromisso, de autonomia, e também para que outros que achavam que seriam descobrissem que não são. O aprendizado maior, como tantas vezes, fica para quem acha que estava a ensinar.
Já os alunos eles foram lá porque queriam passar no vestibular. Não estão mentindo para ninguém e, sobretudo, não estão mentindo para sí mesmos. Alguns aderem à causa, a maioria não, mas fica a experiência de ter passado por algo que não é empresarial nem estatal.
ISTO NÃO É UM EVENTO, É UMA CAMPANHA DE ARRECADAÇÃO
POR FAVOR, LEIA ATÉ O FINAL
AJUDE O CURSINHO A CONTINUAR EXISTINDO!
Desde 1998, por iniciativa de alunos do curso de Psicologia da USP, funciona no bloco B da faculdade de Psicologia o Cursinho da Psico, um projeto autogestionário voltado à população principalmente negra e pobre de São Paulo.
Nesses 14 anos, com muito trabalho e diversas parcerias (como as realizadas com o Centro de Atenção Psico-Social, CAPS, e a Secretaria de Administração Penitenciária, SAP, pra receber pessoas por eles encaminhadas), concretizamos um espaço de formação política e educacional importante. Dentro do Cursinho, na grade de aulas, existe o ARENA (As Revoluções Existem No Agora), uma aula-debate sobre política e vida cotidiana que serve como ferramenta pra que o Cursinho realize sua meta: ser pré-universitário, formar pessoas para a universidade e a sociedade, e não apenas para a prova do vestibular. Há também saídas de campo, como a realizada no centro de São Paulo, com visitas à ocupações e a lugares históricos e atuais importantes política e socialmente para a cidade, e semanas específicas de discussão e debate como a Semana Zero, de apresentação do projeto aos novos alunos.
Pelas nossas salas de aula passaram diversas pessoas que hoje cursam uma universidade pública. Muitas delas retornaram ao Cursinho como professoras, educadoras, organizadoras. O Cursinho da Psico constrói ano a ano uma relação de comunidade em torno da luta por uma educação democrática e igualitária.
* Infelizmente esse trabalho todo fez seu preço: temos uma dívida trabalhista de R$ 15.000,00 para saldar até o dia 15 de janeiro, sob a pena de DEIXAR DE EXISTIR.
Por conta disso escrevemos pedindo ajuda em forma de doações ou de promoção de eventos com verba destinada ao Cursinho. Se você pode ajudar e acredita que projetos como esse, autogeridos, democráticos e horizontais, voltados para a educação, a formação política e a inclusão de pessoas pobres na universidade pública não podem acabar por falta de grana, doe qualquer valor na conta abaixo:
Informações da conta
Banco Itaú
Agencia: 6470
Conta Poupança: 03866-9/500
Fernando Soares Horta de Lima
Coordenador Geral do Cursinho da Psico
* Abaixo um breve histórico da dívida.
Desde sua origem, o cursinho depende unicamente da contribuição mensal de seus estudantes. Nunca fomos financiados por outras instituições. No entanto, nos últimos anos, a procura pelo cursinho diminuiu e a evasão aumentou. Além disso, o cursinho sofre com uma alta taxa de inadimplência.
Apesar da diminuição do número de alunos e, consequentemente, da arrecadação, mantivemos a mesma estrutura e seus gastos. Essa estrutura conta aproximadamente com 70 funcionários, dos quais 2 são contratados em regime de CLT. Como é característico desse tipo de contrato, são recolhidos os tributos INSS e FGTS. No período de 2010 a 2012, o cursinho não conseguiu arcar com 13 parcelas de cada um desses tributos para esses 2 funcionários. Esses tributos, somados aos juros por atraso, geraram uma dívida de aproximadamente R$20.000,00.
Como primeiras medidas para tentar livrar-se dessa dívida, o cursinho recentemente pagou a quantia atrasada referente ao FGTS, bem como rescindiu os contratos dos seus 2 funcionários com CLT, totalizando um gasto de aproximadamente R$ 10.000. Sobra ainda a dívida referente ao INSS dos contratados que soma aproximadamente R$15.000.
Nesse quadro, fica expressa a nossa dificuldade de arcar com as exigências financeiras.
(caso precise de outras informações mande email para [email protected])
Semanalmente, às sextas-feiras, divulgaremos o extrato da conta com a arrecadação parcial nesta página da campanha-evento e site do cursinho!!
Ajude-nos a continuar existindo também divulgando este pedido!
a) Copiando e encaminhando o texto dessa campanha por email para seus contatos;
b) Compartilhando e convidando para essa campanha-evento seus contatos no facebook!
Se quiser maiores informações, conhecer o Cursinho, participar do projeto:
Website: http://www.cursinhodapsico.org
Facebook: http://www.facebook.com/cursinho.psico
Email: [email protected]
Telefone: (11) 98932-1414
Pelo fim dos vestibulares e de todas as barreiras sociais!
Desde já,
Agradecido
Cursinho da Psico
Instituto de Cultura e Apoio à Pesquisa em Psicologia e Educação – ICAPPE
CNPJ: 10594601/0001-23