Por Passa Palavra

 

Os assentados do Milton Santos e seus apoiadores iniciaram uma nova etapa na luta para evitar o despejo de suas terras e suas casas. Além de manterem ocupado há uma semana o prédio do Incra-SP, os manifestantes ocuparam também o prédio do Instituto Lula, no bairro do Ipiranga, zona sul de São Paulo, com o intuito de exigir que o ex-presidente, responsável por assentar as famílias em 2006, intervenha junto ao governo federal para que seja assinado o decreto de desapropriação por interesse social da área.

A ampulheta das desculpas jurídicas usada pelo governo está se esvaindo, na mesma velocidade em que corre o tempo para que aconteça o despejo das famílias assentadas, marcado para a partir do dia 30 de janeiro. Convém notar que o pedido de suspensão da medida de reintegração de posse, uma das possibilidades de protelar a situação, foi negado ontem, dia 22, pela juíza responsável pelo caso.

O assentamento Milton Santos foi criado durante o mandato de Lula (que havia afirmado que faria a Reforma Agrária com uma canetada), e com esta ação os assentados esperam que o ex-presidente, dado o seu peso político, possa favorecer uma negociação direta com a presidenta Dilma Rousseff.

A decisão de ocupar o Instituto Lula se insere numa perspectiva de ação que visa sensibilizar e pressionar os reais atores que podem solucionar o problema das famílias, chamando a responsabilidade para a presidente Dilma, o governo federal e o Partido dos Trabalhadores.

Por volta das 8h desta manhã do dia 23, o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, compareceu ao local, foi recebido pelos assentados e conversaram sobre sua situação.

***

Os assentados do Milton Santos e seus apoiadores mantêm, portanto, a ocupação do prédio do Incra-SP e a ocupação do Instituto Lula. Ainda, um grupo independente e solidário à situação das famílias se acorrentou em frente ao prédio da Secretaria da Presidência, na Avenida Paulista, em São Paulo, exigindo a desapropriação do terreno por interesse social.

Atualização

Por volta das 16h, o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, retornou ao local e foi novamente recebido para apresentar sua posição. De concreto, ele trouxe uma nota do Ministério do Desenvolvimento Agrário que não acrescentou nada de substancial. Ao contrário, a nota coloca como condição que os assentados se retirem das ocupações para ter uma audiência com o Presidente do Incra. Não avança muito o quadro que já estava colocado ontem, quando o próprio MST compareceu à ocupação do Incra com esta proposta, procurando naturalmente dissuadir os assentados de executarem o ato de ocupação do Instituto que estava projetado para o dia seguinte.

Mas o mais interessante foi mesmo o que Okamotto tentou transmitir aos assentados nas entrelinhas de suas falas na negociação. De um modo bem velhaco, ele ameaçou o movimento de ser reprimido pela polícia, já que o Instituto é uma entidade privada, que zelaria pela integridade de seus bens, etc. Disse também que, no caso de os ocupantes não saírem, “notas públicas” poderiam começar a pulular por aí, contrárias ao movimento — notas da Cut e outras entidades que, na opinião dele, estariam a favor da causa dos assentados.

O mais grave de tudo o que foi colocado por Okamotto, entretanto, foi a ameaça de que a tentativa mais enérgica de resolver o problema poderia, na verdade, complicar. Mais especificamente, ele sugeriu o quanto desagradável seria que enquanto os ocupantes se mantivessem no Instituto Lula, a juíza, por exemplo, reduzisse o prazo para o despejo e pegasse de surpresa todas as famílias assentadas.

É curioso, porém, que um dos mais influentes diretores do Instituto, o ex-ministro Luiz Dulci, tenha declarado para a imprensa: “O instituto não interfere em decisões de governo. Não só nessa área, como em nenhuma outra”. Se é assim, como pode o Instituto não intervir nas decisões do executivo mas influenciar numa decisão do Poder Judiciário?

Combinadas, estas declarações evidenciam que a ONG do ex-presidente Lula, verdadeiro quartel-general das negociações políticas nacionais e internacionais do campo governista, pode, sim, interceder a favor dos assentados, desde que sejam colocadas as condições políticas para isso.

A ocupação do Instituto conversou brevemente e pediu, então, que Okamotto retornasse amanhã ao meio-dia, já que esta frente de luta teria de consultar a posição dos assentados que se mantêm no Incra e dos que permaneceram em Americana. Esse pedido foi feito e aceito.

Assim, hoje à noite será feita uma avaliação geral entre os assentados tanto das ocupações quanto do assentamento e amanhã, ao meio-dia, o movimento dirá se aceita ou não a proposta de Okamotto.

 

O presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, compareceu no local

Fotografias: Passa Palavra

9 COMENTÁRIOS

  1. “sensibilizar e pressionar os reais atores que podem solucionar o problema das famílias, chamando a responsabilidade para a presidente Dilma, o governo federal e o Partido dos Trabalhadores.”

    “os reais atores que podem solucionar”… complicado isso. Dilma só vai assinar se houver pressão popular suficiente. Então quem são os “reais atores”?

  2. Leio aqui
    http://www.redebrasilatual.com.br/temas/cidadania/2013/01/para-mst-ocupacao-do-instituto-lula-e-inocua
    as seguintes declarações do MST: «”Não queremos julgar essa atitude de invasão do Instituto Lula, mas a consideramos inócua, ineficaz. Lula não está no poder, não é mais presidente. O problema não está com ele, nem ele pode resolvê-lo”, afirmou o assessor de comunicação do MST, Igor Felippe, ao Brasil 247».
    Da parte de um Movimento que até ontem afirmava o apoio aos assentados do Milton Santos, esta lamentável declaração é preocupante. A solidariedade é retirada quando é mais necessária.

  3. já estão começando a nomear os partidos e organizações de extrema esquerda que participam da ocupação como método de descontruir a pressão ao Lula, transformando em “politicagem” a luta dos assentados.
    Me parece muito acertada a tática de colocar o Lula no meio, obrigar uma politização por parte dele (ou apoio ou descaso). A luta destes assentados acabou de subir ao nível da politicagem institucional, não por vontade própria, e espero que essa experiência traga muitos frutos para os movimentos análogos que pensam ter no governo “popular” um aliado.

  4. Manu, realmente os “reais atores” são as famílias assentadas e os apoiadores (pessoas, coletivos, partidos, etc.). Interessante notar que os três movimentos que atualmente mais têm ganhado repercussão na mídia burguesa (isso significa que os movimentos estão “fortes”, caso contrários valeria o silêncio), a saber, Assentamento Milton Santos, Luta contra a demissão na GM de São José dos Campos e Aldeia Maracanã (ocupação indígena do antigo Museu do Índio), todos estes têm como bandeira de luta a apelação ao Governo Federal, na pessoa da DILMA. Mas sabendo que os “reais atores” são os próprios envolvidos diretamente e apoiadores, não caberia ao menos uma outra bandeira chamando uma frente única com outros movimentos, sindicatos e partidos?

    João Bernardo, a declaração é mesmo lamentável e procupante, mas não podemos dizer que seja surpreendente. A postura do MST durante todo o processo de acirramento da luta no assentamento foi de afastamento. Afinal de contas é preciso mostrar para os chefes do governo que não tem nada a ver com isso, e que estão tentando desmobilizar o movimento. Ora, ir na ocupação do Incra e dizer para que se retirem das ocupações para ter uma audiência com o Presidente do Incra é o cúmulo da burocracia! Parem a luta para que possam negociar. Mas a luta sendo o peso na balança, os “reais atores”, a frase significa: parem com a luta para que a ordem possa voltar ao normal…

  5. Há tempos, o MST vem atuando como desmobilizador.
    “Quando o machado entrou na floresta, as árvores disseram: o cabo é dos nossos.” provérbio turco

  6. Realmente estranho um movimento que sempre teve a ação direta como parte importante de sua política, e que sempre se referiu a “ocupações” e não a “invasões”, ao contrário do que sempre fez a imprensa burguesa, agora tenha o mesmo discurso e use as mesmas palavras criminalizadoras dessa imprensa.

  7. Taiguara,
    O seu comentário fez-me reflectir. O assessor de comunicação do MST, Igor Felippe, declarou a respeito da ocupação do Instituto Lula pelos assentados do Milton Santos: «Não queremos julgar essa atitude de invasão do Instituto Lula, mas a consideramos inócua, ineficaz. Lula não está no poder, não é mais presidente. O problema não está com ele, nem ele pode resolvê-lo» (http://www.redebrasilatual.com.br/temas/cidadania/2013/01/para-mst-ocupacao-do-instituto-lula-e-inocua ).
    Já o artigo publicado no site do Exército Brasileiro afirma sobre a ocupação do Incra, apoiada pelo MST: «Em Brasília, as autoridades reagiram com ar blasé à invasão do edifício público». Sobre a ocupação do Instituto Lula, porém, o referido artigo divulgado pelo Exército Brasileiro afirma que «o fato provocou comoção e correria em Brasília», e, depois de relatar as diligências que o presidente do Incra, Carlos Guedes, empreendeu apressadamente só depois da ocupação do Instituto Lula, o artigo conclui que aquela «atitude […] poderia ter sido tomada dez dias antes».
    São pontos de vista diametralmente opostos. Mas será que os dirigentes do MST atingiram um tal grau de proximidade relativamente ao governo que estão ao corrente de segredos que escapam ao Exército Brasileiro?

  8. Para esclarecer, artigo linkado pelo Taiguara saiu originalmente no Estadão. Ele foi apenas ‘clipado’ pelo Exército.

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