Por Guilherme Riscali
Não, os protestos que acontecem por todo o país e, agora, por todo o mundo, não são contra a corrupção. Não, os protestos não são consequência do mensalão, tampouco fruto das inúmeras hashtags de protesto. #acordabrasil #sqn
Os protestos são, sim, por 20 centavos. Esses mesmos centavos que, no final do mês, no bolso de uma grande parcela da população, significam a diferença entre uma ou duas refeições, entre poder ou não poder se deslocar até o local de trabalho.
É claro que, em uma grande mobilização popular como a que estamos vivendo, diversas questões entram, e devem entrar, em pauta. O poder reivindicatório de dezenas de milhares de pessoas nas ruas é imenso e, por si só, levanta fagulhas de indignação. É imprescindível aproveitarmos a mobilização para evidenciar os problemas da violência policial e da própria situação da nossa polícia, militarizada. É essencial escancararmos o cinismo dos gestores da cidade ou do estado que, atados com a especulação imobiliária e os setores mais fortes da indústria, estão longe de priorizar a pressão popular ao tomarem decisões ditas “administrativas”. É ineludível discutirmos a suposta liberdade de imprensa e manifestação no país, quando ativistas e jornalistas são presos sob acusações estapafúrdias e condenados por formação de quadrilha. Tudo isso faz parte do jogo e é nosso papel nos levantarmos contra cada uma dessas questões. Também vale ressaltar que a experiência de luta coletiva é, em si, transformadora, e caminho para a abertura de novas possibilidades de atuação no espaço público. O resultado é inesperado e pode ser maior do que o que qualquer um tenha previsto.
Certas considerações são importantes, entretanto, diante da rápida ampliação do alcance da luta. É preciso analisarmos de que tipo é a virada quando alguns setores que, tradicionalmente, se posicionam a favor do massacre em Pinheirinho, da perseguição da população indígena, do extermínio policial nas periferias e, vejam, até da repressão policial contra estudantes da Universidade de São Paulo (USP) de repente se voltam a apoiar as recentes manifestações.
Vitória política a se comemorar? Capacidade de diálogo e expansão das nossas pautas? Talvez. Muito provavelmente. Mas é preciso lembrar que este suporte tem que vir acompanhado do reconhecimento daquilo pelo que se está lutando. Em outras palavras, a ampliação da luta não pode vir seguida por uma diluição irrestrita de suas pautas.
Se é verdade que o apoio à Revolta da Tarifa (ou do Vinagre, como for) tem crescido, desponta também, aqui e ali, algo semelhante à velha estratégia: se não consegue vencê-los, junte-se a eles e torne-os triviais. Ora, se criminalizar não é mais possível, há uma saída mais simples – e mais perigosa, porque mais sutil – para esvaziar a discussão política. Dizer que protestamos contra tudo é dizer que protestamos contra nada.
E com a diluição da pauta inicial no meio de tantas bandeiras e outras tantas denúncias fica cada vez mais difícil conquistar, de fato, aquilo pelo que lutávamos desde o começo: a reversão do aumento e, no limite, a tarifa zero. Ou talvez, dirão alguns: conforme eles se dispersam, fica cada vez mais fácil ignorar o cerne do problema.
Não podemos esquecer que há uma questão material que é reivindicada, antes de mais nada. Desprezar que há um problema concreto, anterior às bandeiras abstratas ou problemas generalizados (cuja discussão, ainda assim, é importantíssima) é abrir mão daquilo que primeiro motivou a indignação. E ignorar que a conquista de um objetivo, de um direito que nos foi expropriado, é combustível para o fortalecimento da revolta.
Há, por fim, nessa operação, uma manobra – consciente ou não – de deslocar a organização do protesto, que acontece em torno da convocatória do Movimento Passe Livre. Afinal, esses badernistas são muito radicais, não? E que toda a organização, assim, se dê pelo Facebook (desse jeito, quem sabe, aquela “gente diferenciada” nem aparece). Aliás, o objetivo de muita gente parece ser deixar claro que o movimento não se trata mais de transporte, mas sim uma espécie de #Cansei2.0: é que 20 centavos são apenas detalhe para a classe média. Ah, e, claro, sempre vestidos de branco. Sem vandalizar a Bastilha, né, pessoal?
Todos às ruas por 20 centavos!
Todos às ruas pelo fim da tarifa!
O texto toca num ponto fundamental, que eu já pensava em levantar, assistindo as coisas relativamente de longe.
Tive a mesma percepção da mídia e dos setores conservadores contra os protestos tentarem transformar as manifestações em algo como manifestações de ‘descontentamento geral’, ou contra o ‘custo de vida’, como já tem sido até noticiado. (Ou mesmo as tentativas ingênuas da Veja de fazer os manifestantes protestarem contra a ‘criminalidade’ e a ‘corrupção’).
Quando as manifestações ganham essas proporções, deve-se esperar tentativas desse tipo, de manipulação política, capitalização política etc.
Se tornarem uma manifestação contra ‘descontentamento’, ‘custo de vida’, ela acaba não tendo resultado prático, pois não tem foco, e é isso que eles querem. Eles não querem a discussão sobre o transporte, muito menos que as pessoas podem ter influência prática nos rumos das políticas públicas através de ações diretas.
Nessa tentativa eles tentam jogar as manifestações que ocorrem em São Paulo como parte da ‘onda de grandes manifestações pelo mundo’.
É preciso estar atento quanto a isso, e marcar muito bem marcado que trata-se de reduzir as tarifas do transporte e discutir a tarifa zero.
Nesse mesmo sentido, apesar de ter sido interessante o nome Revolta do Vinagre, ele não serve para marcar o propósito das manifestações.
Valeu, pessoal!
Tava querendo escrever isso e ainda não tinha achado o tempo e as palavras.
A propósito do alerta pertinente lançado neste artigo, comunicaram-me que a militância do PT e do PcdoB foi orientada a comparecer em peso na manifestação de hoje, para desviar a pauta. Mas como estou muito longe de São Paulo não pude confirmar. O certo é que Pablo Capilé, o gestor da empresa Fora do Eixo, publicou as seguintes declarações que não deixam dúvidas quanto à intenção:
«Bom dia a todos os que são um dos mais de 140 mil que confirmaram presença na manifestação histórica de segunda-feira. O novo mundo possível já chegou! =))))»
«O Prefeito Haddad entrou em contato, disse que recebeu a carta do Existe AMOR em SP e que está aberto para o dialogo com todos os movimentos! Agora é hora de mostrar isso na prática, vir pra rua e debater cara a cara com todo mundo. A Situação tá insustentável, tem que assumir a responsabilidade de liberar a cidade! Estamos de olho e vamos cobrar!»
«Já são mais de 150 mil confirmados para o quinto grande ato contra o aumento das passagens, que acontece segunda feira a partir das 17 horas. Sensacional! Vai ser histórico! Todos precisam ir pra rua, levar todos os temas, as lutas, as causas e fortalecer o habito de estarmos juntos e cada vez mais fortes!»
«Hoje tem reunião do Existe Amor em SP na Praça Roosevelt às 19h. Vamos conversar sobre o ato de segunda, e como fortalecer a luta dos Movimentos todos, ta todo mundo convidado! Vamo que vamo!»
«É um absurdo o secretário de segurança do estado de SP dizer que vai manter a estratégia de ação da PM para as próximas manifestações. Tem que prender um cara desse! A prefeitura tem que agir rápido, se Haddad de fato quer dialogar com os movimentos e liberar a cidade é fundamental ir pra cima do Governo do Estado e da PM! É inadmissivel que aconteça novamente nas ruas da cidade o que aconteceu quarta-feira!»
O que está acontecendo é uma demonstração de vitória por parte do movimento. Vitória essa trazida pela ação direta e pela força das mobilizações. Num primeiro momento, Haddad apoiou-se no conservadorismo tipicamente do eleitorado PSDBista para legitimar a ação da polícia chamando o MPL de “badernista” e “vândalos”, a mesma manifestação que agora o JPT, UNE, MST e toda a base governista está integrando. Mas não só a esquerda governista está dentro como também o próprio eleitorado conservador.
A pressão passa agora a ser no próprio interior da mobilização e não mais de fora para dentro através da mídia e da repressão policial. Vai ser preciso habilidade política para não ter a mobilização sequestrada pela direita ou pela base governista.
E para colaborar mais com o excelente texto e os oportunos comentários:
http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/sp/2013-06-17/comandante-geral-da-pm-sugere-politizacao-de-protestos-em-sao-paulo.html
Se a tarifa vai baixar ou não em São Paulo é difícil prever… jogo de xadrez cujas peças mudam de posição a cada dia, como em todos os lugares.
Os governos sempre ‘pagam pra ver’, respirando fundo e esperando o tempo passar e as mobilizações possivelmente diminuírem.
Brilhante. É preciso reconquistar o sentido original.
“É fato, o reajuste do preço transporte só provocou a revolta necessária para que o paulistano percebesse o óbvio: política se faz nas ruas. No entanto, a recusa ao modelo de sociedade atual tem de ser deixada clara. Isso porque os perigos da apropriação do movimento são reais.”
“O grito dos jovens está longe de bradar contra os “mensaleiros”, contra a inflação, contra as políticas sociais de transferência de renda. O movimento é progressista por natureza e agora tem de saber lidar com uma ameaça feroz: a direitizacão.”
O que queremos – Paulo Motoryn no link http://revistavaidape.wordpress.com/2013/06/17/o-que-queremos/
A luta coletiva é sempre fruto de conquista da sociedade civil organizada. Manter o foco da mobilização em torno do abuso no reajuste das tarifas, neste momento, é de fundamental importância, a fim de que não se esvazie o movimento coletivo em torno de pautas difusas, genéricas, e que acabam sendo abraçadas por setores governistas e conservadores.
Além disso, é importante elaborar-se um esboço teórico acerca do movimento “Passe Livre”, detalhando seus fundamentos, o contexto histórico e político em que surgiu, a resistência dos setores ligados às empresas de transporte, que fazem do transporte público na maior cidade da América Latina, uma fonte incalculável de lucros, sem que haja a respectiva contrapartida no investimento do serviço público.
O questionamento acerca da política de concessão atualmente praticada pela Prefeitura é outra questão que deve entrar na pauta. Que modelo adotar? o atual atende à necessidade da população ou apenas satisfaz alguns empresários do setor, que apenas pensam no lucro?
Enfim, o questionamento acerca do papel do Estado (no, caso, Estado no cunho local= Município) na questão da mobilidade urbana é outra questão de fundamental importância.
Assim, o movimento tem tudo para continuar, independentemente de eventuais reduções da tarifa, com a proposta de uma agenda com conteúdo e definida, de modo a tornar este movimento ainda incipiente, um novo marco para a construção da cidadania, surgimento de novas lideranças, etc.
Quem foi no ato de hoje viu uma presença esmagadora da classe média e de como tudo corre risco de virar um movimento de classe média contra a corrupção e etc. Partidos de esquerda foram hostilizados, o hino nacional foi cantado várias vezes, bandeiras de SP e do Brasil abundavam, roupas brancas e óculos escuros. Há o risco de o movimento todo ficar externo às demandas dos setores mais precarizados.
Nacionalista e antiparlamentar (sob o pretexto de apartidário). São as duas palavras que mais fortemente caracterizam as manifestações no Rio dia 17.
Ass. Marcus (com ‘u’)
E isso ai a segunda revolução tem que começar precisamos revindicar nossos direitos, mais lembrando que sempre sem violençia, BRASIL VAMOS LÁ E A NOSSA VEZ!!
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O comentário do MarcOs poderia perfeitamente referir-se ao ato de hoje do Rio… Muitos burgueses, homofóbicos, nacionalistas, “antis”-tudo que seja mais de esquerda, ou partidário, ou com alguma pretensão organizativa. Muitos deles, na minha opinião, protofascistas, absolutamente intransigentes com qualquer manifestação que fugisse ao protocolo preestabelecido em suas cabeças comportadas travestidas de um radicalismo… liberal-democrata. Hostilizaram todos os partidos e partidários, e até mesmo quem subia em alguns lugares que de acordo com a ideia preconcebida, não deveria ser ocupado, como por exemplo o telhado de pontos de ônibus e alguns prédios! O ato deixou muita gente deprimida e vários camaradas voltaram pra casa desolados, antes mesmo do ato chegar na Cinelândia. Depois da Cinelândia, para a Alerj, houve um pouco de filtragem, pq muitos correram pros bares pra ver tv e se apareceram ou nao nas filmagens, ou então ficaram nas escadarias, conversando. Claro que não estou dizendo que todos os que ficaram eram dessa laia burguesa. Já na Alerj, finalmente deu pra sentir que o ombro ao lado não era inimigo, e quando o pau comeu, aí sim aquele clima de solidariedade e camaradagem reinou, apagando aquela sensação de merda (de “que caralho estou fazendo no meio desses caras”) que o ato em seu começo deixou. É galera, se não tomarmos cuidado o movimento será engolido por essa camada média e seu caminhão de areia sempre a postos para zoar com qualquer desenvolvimento mais radical da luta. Tal como na Cinelândia, na Alerj havia bastante diversidade, e enquanto conseguimos expulsar a PM para garantir a ocupação das ruas e das escadarias da Alerj (várias vezes retomadas, sendo que ao fim não conseguimos entrar) e depois, quando guerreamos com a tropa que ficou dentro da Alerj atirando de volta nossas pedras, depois de acabar com o estoque de bombas, gases e balas de borracha, ainda havia um pessoal que – pasmem – achava que estávamos “depredando a Alerj” e reclamava a Tropa de choque ter demorado a vir! da série contradições da luta cotidiana…
A luta pelo preço da passagem foi um estopim,a coisa ganhou proporções exatamente porque ampliou o seu tema.É o aumento do valor do cidadão e só ganhou milhares adeptos por isso.Esse movimento não é partidário e é impensável alguém querer toma-lo para si estabelecendo regras e normas mesmo que sinta-se um pioneiro.O que percebo nisso tudo é uma verdadeira avalanche,não há como conter.Ultrapassa e muito o simples desconto na passagem ou o passe livre.Tenho o maior respeito pelos que iniciaram mas deixem ou não deixem agora a coisa não pertence mais a estes e não é possível que alguém queira tirar das pessoas o direito de manifestação diminuindo a sua importância com argumentos descabidos.É possível sim que ao perder o foco perca-se a força, não passe tudo de uma caminhada de zumbis, mas e dai?Importante é ver essa massa toda nas ruas porque esse recado garanto a vocês ficara gravado na mente daqueles que que se julgam acima de tudo,isso só trará força a reivindicações e pode sim, por que não, trazer a diminuição da passagem ou mesmo o passe livre.
Concordo que a ampliação generalizada das bandeiras reivindicativas podem esvaziar a discussão política(como por exemplo “por um Brasil melhor”). Mas, diante dos acontecimentos, da repressão policial absurda que, de fato, aconteceu, acho que o questionamento sobre a criminalização dos movimentos sociais significa garantir a própria sobrevivência da luta reivindicativa pela diminuição da passagem ou passe livre.
Lutei na época da DITADURA, tinhamos um ideal e o que fizeram com a nossa luta pela liberdade de expressão?virou uma libertinagem!! agora é hora de mostrar que podemos mudar um SISTEMA, sem violencia,nas urnas(anulando o voto)pois só assim o mundo irá conhecer do que somos capaz. Espero que todo esse movimento faça o povo entender que destruir uma politica podre, é não colocar partido nenhum no poder,eu sei que parece utopia mas tem que começar de alguma forma,voces podem ter certeza que esses políticos entenderão que o povo está começando a PENSAR.
Maria, a única forma de conseguirmos a não criminalização dos movimentos sociais é seguir em frente na luta contra o aumento. Se garantirmos a vitória ali, vamos legitimar a própria luta e seu método.
Marcos, você acha que os partidos de esquerda foram hostilizados só pelos “classe média”? Será que o buraco não é mais embaixo,esses atos não são de alguma forma contra eles também, contra o modo de fazer política que representam? O outro Marcus fala em antiparlamentar… bingo!
Nunca fui de partido algum, mas por tudo que vi me vejo obrigado a sair em defesa dos partidários e suas bandeiras. A pequeno-burguesia protofascista, e também alguns anarco-liberais mais exaltados, estão confundindo o emparelhamento e apropriação partidária do movimento com a própria presença de partidos nos protestos! Uma coisa é ser contra o aparelhamento da luta por algum partido oportunista, outra coisa totalmente diferente é ser fascista e baixar as bandeiras e !expulsar! militantes partidários das manifestações! E os neonazistas sem bandeira, esses podem ficar? Quando não é um ato pensado da direita, é muita amnésia histórica e burrice política.
esses dias fui pegar o onibus e e faltavam 5 cents… tive que descer!!
Agora sim o Brasil esta conhecendo os verdadeiros responsáveis pelas mudanças que tivemos: Uns dizem que foi governo tal outros dizem que foi outro mas os verdadeiros responsáveis foram o povo que lutou trabalhou e fez o Brasil crescer apesar de tudo.
Conseguimos levantar o Brasil mesmo com o peso morto dos políticos corruptos e com os exploradores que vivem pendurados nas tetas do governo.
Marion
o pais é democratico as manifestações são legitimas da democracia