Por Darth Nader
A revolução Síria começou como uma luta pela autodeterminação. O povo sírio exigia determinar seu próprio destino. E, por mais de dois anos, contra todas as probabilidades e enfrentando a repressão massiva do regime de Assad, persistimos.
Ao longo do processo revolucionário vários outros atores entraram também em cena contra a luta pelo direito de autodeterminação. O Irã e suas milícias, com o apoio da Rússia, vieram em ajuda do regime para garantir que o povo sírio não teria esse direito. Os jihads do Estado Islâmico do Iraque e Sham e outros, sob o pretexto de “lutar contra o regime Assad”, lutaram contra esse direito também. Penso o mesmo relativamente a qualquer intervenção ocidental.
Alguns poderiam argumentar que já passamos faz tempo dessa fase, que não se trata mais de autodeterminação, mas simplesmente de parar a matança. Essa é uma posição com que não posso concordar. Se se tratasse simplesmente de parar a matança, então teria apoiado os jihadis quando eles entraram porque, ninguém pode negar, eles eram os melhor armados e equipados para desafiar efetivamente o regime de Assad. Mas não apoiei e vários outros não apoiaram, porque sabíamos que, apesar da sua habilidade para enfrentar o regime, eles não compartilhavam dos objetivos do povo sírio. Eles queriam controlar o povo sírio e diminuir a sua capacidade de determinar seu próprio destino. Por isso, eles eram contra-revolucionários, mesmo que estivessem lutando contra o regime.
E agora, perante uma possível intervenção ocidental na Síria, mantenho a mesma posição. Muitos diriam que estou sendo ideológico e que deveria me focar apenas em impedir a matança; mas essas pessoas estão ignorando que mesmo em termos pragmáticos e na sua própria linha de raciocínio, esse argumento não vai convencer ninguém após a insistência repetida dos EUA de que “esses serão apenas ataques punitivos” e que eles “não pretendem derrubar o regime”. Qual é a indicação de que esses ataques irão fazer qualquer coisa para parar a matança ou “resolver” a crise síria?
Eu não me importo com soberania. A Síria se tornou atualmente uma terra de todos, menos dos sírios. O mito da soberania síria não é o motivo pelo qual me oponho à intervenção ocidental. Nem o é a perspectiva de destruição da Síria, porque ela já foi destruída pelo regime criminoso. Eu me oponho à intervenção ocidental porque ela será contrária à luta pela autodeterminação, que é a revolução síria.
Assad usou armas químicas contra seu próprio povo. Não tenho dúvidas disso. E isto poderia ter sido prevenido se à resistência síria tivessem sido entregue armas que poderiam ter alterado o equilíbrio de forças contra o regime. Mas as potências estrangeiras ficaram passivas, não querendo que Assad vencesse nem que a resistência fosse vitoriosa. Eles não podiam dar armas para que o povo sírio se defendesse, diziam, quem sabe em que mãos essas armas poderiam parar? Elas poderiam acidentalmente parar, digamos, nas mãos de sírios que quisessem determinar seu próprio destino apesar dos interesses estrangeiros!
Então chegamos a um círculo completo. Ninguém armou a resistência síria, então eles foram mortos pelo regime ou forçados a aceitar a infiltração jihad. Então Assad usou armas químicas contra os sírios e o Ocidente pretende responder para ensinar a Assad uma lição, uma resposta que ainda garanta que os sírios não têm voz quanto ao seu futuro coletivo. E o regime provavelmente vai sobreviver a qualquer intervenção “punitiva” ocidental, e a matança provavelmente não vai parar.
Mas apesar disso tudo, a revolução síria e, na sua essência, a luta do povo sírio pela libertação e pela determinação do seu próprio destino vai continuar viva.
Nota sobre o autor
Darth Nader é um jornalista e escritor anarquista, arábe, antifascista, antiorientalista e internacionalista dissidente.
Traduzido daqui http://darthnader.net/2013/08/27/on-interventions-and-the-syrian-revolution/ pelo Passa Palavra.
Nenhum comentário até agora… hummm… interessante.
Sartre, nos anos 1950, quando se regozijava de ser companheiro de viagem do PCF, assim justificou sua omissão cúmplice: “il ne faut pas désespérer Billancourt”.
…ou seja, numa tradução não literal: «Não devemos desanimar os operários dos grandes centros industriais».