A devoção transforma-se num regime de exaustão e de submissão, em que o esgotamento físico e mental impedem o ensaio de qualquer auto-organização e de espírito crítico. Por Passa Palavra

Na noite do dia 05 de agosto de 2013, a participação de Pablo Capilé e Bruno Torturra no programa Roda Viva, “idealizadores” da Mídia NINJA (Narrativas Integradas de Jornalismo e Ação), disparou um intenso debate nas redes sociais e demais fóruns da internet. Então veio à tona questões para as quais desde há dois anos o Passa Palavra chamava a atenção: o caráter empresarial do coletivo por trás da Mídia NINJA, o Fora do Eixo, sua relação com os financiamentos públicos e privados, aspectos hierárquicos de seu funcionamento interno e a prática exploratória sobre a produção artística, cultural e simbólica de agentes mais ou menos ligados ao circuito.

1. Velhos truques

A inserção do Fora do Eixo nos movimentos sociais não é um fato novo. Em 2011, sua participação na Marcha da Liberdade gerou também um intenso debate no Passa Palavra sobre os perigos da proximidade entre os chamados novos gestores culturais e os movimentos sociais. Neste sentido, uma nova tentativa de capitalização e difusão de sua marca nas jornadas de lutas contra o aumento das tarifas do transporte coletivo e o que se seguiu nas ruas de todo o Brasil não deveria parecer novidade. A diferença entre a aproximação do FdE na Marcha da Liberdade e nessas últimas manifestações é que, dessa vez, o coletivo-empresa não era desconhecido nos meios militantes e, talvez por isso, não chegou oferecendo sua carta de serviços para compor a organização dos atos, como tentou fazer dois anos atrás. Durante a jornada recente, o FdE procurou se implantar nos movimentos sociais diretamente com sua estrutura, por uma via que não levantasse suspeitas sobre o seu caráter militante.  Como quem não quer nada, os FdE apresentaram-se como algo diferente, como uma equipe de comunicação supostamente independente e, mais importante, aparentemente descolada da marca Fora do Eixo. Isso possibilitaria que a empresa não criasse atritos com os meios militantes autônomos (ou pelo menos mais à esquerda) ao mesmo tempo que angariava jovens ativistas voluntários ao novo empreendimento (afinal, era quase impossível contabilizar o número de pessoas nas manifestações tirando fotos ou filmando os atos com seus celulares).

Um exemplo dessa tentativa de descolamento do FdE foi uma reunião realizada com a Frente de Luta contra o Aumento de Goiânia, em meados de julho, com o objetivo de formar um coletivo Ninja naquela capital. Questionada a esse respeito, Fernanda Costa, que se apresentou como uma “agente da Mídia Ninja”, afirmou vagamente que havia apenas uma “parceria” com o Fora do Eixo, não mais que isso, como tantas outras parcerias realizadas pelo país. Para ilustrar a situação, a representante dos Ninjas chegou a equivaler a “parceria” com o FdE a uma outra supostamente feita com o movimento Mães de Maio, de São Paulo – o que talvez na sua avaliação comprovasse o caráter ativista da empreitada. Hoje é mais do que sabido que a Mídia NINJA não mantém relação com o FdE, simplesmente porque ela é o FdE, um novo ramo de negócio do nosso já conhecido  coletivo-empresa.

A estrutura da Mídia NINJA funciona com um núcleo central em São Paulo, com mais ou menos 8 pessoas, e com um número flutuante de colaboradores em outros estados, principalmente em capitais como Belo Horizonte, Porto Alegre, Belém do Pará, Brasília, Rio de Janeiro e Salvador. Para montar uma nova sucursal dos ninjas, os novos voluntários são instruídos a aderir ao projeto através do preenchimento de um cadastro. Nele, a pessoa indica a sua disposição em ajudar, em qual área ela pretende atuar e o quê ela tem a oferecer em termos de auxílios materiais. Esta seria a forma de financiamento colaborativo apontada por Fernanda Costa. Haveria ainda, segundo a representante, a possibilidade de disponibilização de materiais e instrumentos para a utilização nos núcleos ainda em fase de formação. E aqui entraria a vaga parceria com o FdE, fornecendo parte da estrutura acumulada em seus anos de existência, através da exploração de trabalho não pago de artistas e colaboradores da empresa.

No projeto exposto por Bruno Torturra, na entrevista do Roda Viva, o objetivo do Fora do Eixo com seu braço jornalístico, a Mídia NINJA, seria o de se contrapor aos grandes conglomerados dos meios de comunicação do Brasil. Com a centralização em site único da captação das imagens das sucursais existentes em algumas cidades, o Fora do Eixo poderia controlar o que se vem chamando de “cobertura alternativa” das manifestações organizadas por diversos movimentos sociais. Ainda de acordo com Fernanda Costa, não haveria uma linha editorial a nortear os trabalhos, senão um critério de seleção que seguiria um “padrão estético” e a correção ortográfica, realizada pelas pessoas responsáveis pela página que hoje existe. O funcionamento desta estrutura passaria, desta forma, da produção do conteúdo pelas pessoas dispersas e inseridas nas manifestações para esta equipe central, que cumpriria o papel de selecioná-los e corrigi-los.

Em reportagem veiculada por O Globo é relatado um debate ocorrido no Rio de Janeiro sobre a tentativa de se buscar recursos públicos para o financiamento do site da Mídia NINJA a partir de editais públicos da cultura. Apesar de esta ser uma das práticas comuns de captação financeira do Fora do Eixo, a reportagem evidencia a existência de uma polêmica sobre a aceitação ou não deste tipo de financiamento entre os membros do coletivo. Frente à desconfiança em se aceitar este tipo de recurso para a estruturação do projeto, Pablo Capilé afirmou não ver problema nesta prática, argumentando ainda que “Só no Rio, já existem 200 grupos que gostariam de ter mais estrutura. Sem recursos, dificilmente conseguiremos dar a eles mais suporte. Temos que disputar políticas públicas, como faz a grande imprensa, que cria formas de receber esse dinheiro”.

Fazer como a grande imprensa na captação de financiamento público é o que propõe Capilé para que o Fora do Eixo e a Mídia NINJA possa conseguir dar “suporte” aos grupos interessados na nova prática midiática. Mas será que a semelhança entre o Fora do Eixo e as demais corporações de comunicação brasileira ocorre apenas no âmbito da captação dos recursos? Ou a semelhança vai além desta disputa financeira, se revelando também na organização interna do Fora do Eixo?

2. A empresa Fora do Eixo e o “núcleo durável”

A já famosa entrevista dos dois ninjas ao Roda Viva acabou sendo também um tiro pela culatra. Apesar da primeira onda de comentários ter sido caracterizada por uma grande quantidade de elogios que surgiram nos meios virtuais sobre o embate com os representantes da mídia corporativa e como os ninjas conseguiram quebrar os argumentos dos velhos jornalistas, começaram a aparecer, logo em seguida, relatos de experiências concretas de artistas e colaboradores internos do Fora do Eixo, os quais contradizem frontalmente o argumento de uma organização horizontal e participativa.

No primeiro relato, que alçou notoriedade no Facebook, Beatriz Seigner expôs como o Fora do Eixo utilizou de sua produção artística para conseguir financiamento público e organizar eventos com a distribuição de seu filme.

Em seguida, Lais Bellini narrou detalhadamente as relações de trabalho que vigoram na Casa Fora do Eixo em São Paulo, quartel general da empresa, confirmando aspectos que o Passa Palavra já havia desenvolvido aqui. Primeiramente, as noções de horizontalidade, participação igualitária e existência comunitária – sempre aludidas pelas grandes figuras e demais intelectuais ligadas à empresa – caem por terra quando a ex-integrante relata a existência de um “núcleo duro” que controla a organização interna dos espaços e das pessoas que lá laboram. Ainda segundo Laís Bellini, o núcleo duro “é o grupo que está mais envolvido com a rede, dentro de um ponto (numa cidade) da rede e, por conseqüência, tem mais poder de fala, mais poder de decisão, mais poder, enfim, ou melhor, como eles dizem mais ‘lastro’”. Para ela o “lastro” é a mesma coisa e carrega o mesmo sentido da “prepotência que [se] assiste nos poderes públicos do país. Lastro é sim poder” dentro da organização Fora do Eixo. E ela exemplifica como o “lastro” garante o exercício do poder aos mais experientes da empresa e que estão há mais tempo construindo-a.

Você vive dentro da Casa Fora do Eixo São Paulo e isso é a sua vida. Se você quer visitar seus pais no interior… olha sinceramente, que você tenha um bom motivo… e que não venha “pedir” 2 meses seguidos. Sim, porque ali o verbo era esse. “Posso ir visitar minha mãe essa semana?”, coisas do tipo. Tá afim de encontrar uma pessoa que não faz parte da rede?! Vai inventar a maior mentira pra conseguir sair dali uma noite se quer[sic], e no dia seguinte se demorar pra voltar, não tem cara bonita te dizendo bom não. Ali, é cobrança 24h por dia. Agora, ai de você perguntar porque o Pablo tá saindo. Porque a Lenissa vai passar 3 dias fora. Você não tem que perguntar. Ela vai sair, vai usar o dinheiro do caixa coletivo, não vai pedir a ninguém o quanto vai usar. Mas claro, veja bem, ela tem “mais lastro que você”. O Pablo resolveu dormir até mais tarde e perdeu o vôo. Não importa, ele nem se deu a obrigação de cancelar o vôo. “Você vai ligar lá Laís, vai dar um jeito de trocar a passagem.” “Mas já passou a hora do checkin” “não importa, troca, ou compra outra, tem que comprar outra, rápido Laís, já resolveu (o gtalk bombando!!!) vai Laís, vai logo, menina, tá lerda hoje, você é lerda mesmo né, parece retardada”. Sim, você fica na função de comprar 70 passagens aéreas e não para durante 4 dias fazendo todas as cotações possíveis e impossíveis. Ai de você comprar um horário que seja errado. Ligue para ela, pergunte que horas ela vai chegar. Tem que ter um vôo pra ela. Laís, você é retardada, NÃO TÁ OUVINDO O QUE EU TO FALANDO?”

O relato não deixa dúvidas de que aquilo que é chamado de “lastro” consiste em um mecanismo de legitimidade que garante aos mais bem posicionados na hierarquia da empresa o controle sobre o tempo de trabalho alheio. Mostra os maiores gestores da Fora do Eixo, Pablo Capilé e Lenissa Lenza, exercendo sua função de comando no caso das compras de passagens. A cobrança intensa do resultado do trabalho e a pressão psicológica para que a trabalhadora cumpra com sua tarefa no prazo estipulado pelos que têm mais “lastro” dentro da organização demonstra uma situação que não difere em quase nada das relações sociais de produção existentes em qualquer empresa capitalista, em que há atribuições hierárquicas de decisões a serem executadas por trabalhadores que não têm “lastro”. O fato de Capilé ou Lenissa não se reportarem aos demais sobre os motivos de saída da Casa Fora do Eixo mostra o grau de controle que detêm sobre seu próprio tempo de permanência no local de trabalho, controlando sua jornada de trabalho e decidindo sobre a saída ou não dos demais moradores.

A entrega à construção do mundo alternativo propalado pelos líderes do Fora do Eixo leva os moradores da Casa a terem uma jornada de trabalho que lhes ocupa todo o tempo da vida, com o agravante de mesmo o tempo de descanso ser realizado dentro da própria empresa.

Curiosamente, são estas relações laborais que uma das ideólogas de plantão do Fora do Eixo, Ivana Bentes, classifica como “um dos mais potentes laboratórios de experimentações das novas dinâmicas do trabalho e das subjetividades. Que tem como base: autonomia, liberdade e um novo ‘comunismo’ (construção de Comum, comunidade, caixas coletivos, moedas coletivas, redes integradas, economia viva e mercados solidários)” (ver aqui).

O “salto” de organização em relação às empresas tradicionais, se é que assim pode ser considerado, reside no fato de o núcleo duro passar a dispor de larga margem de controle inclusive sobre as relações interpessoais dos moradores, indicando-lhes os limites das relações afetivas e quais as pessoas com quem podem ou não se relacionar. Ao mesmo tempo que se endurece o caráter totalitário das relações trabalhistas internas ao FdE, para fora, sua rede de parceiros jogam com a imagem da felicidade plena no local de trabalho; no melhor estilo da propaganda do regime stalinista.

Ainda a respeito da organização interna do Fora do Eixo é importante destacar como o argumento do “lastro” esconde o óbvio: sempre será Capilé e os que iniciaram a empresa em Cuiabá quem terá maior lastro, afinal, possuem dedicação integral há muito mais tempo, pois foram eles os próprios fundadores. A ascensão interna possui uma barreira hierárquica intransponível, consolidando assim uma cúpula dirigente cristalizada. Não houve até o momento um relato sequer que dissesse o contrário a respeito da hierarquia interna.

Se a crítica libertária do último século não poupou linhas a respeito dos partidos leninistas, já não é aqui o que se está analisando e engana-se quem o faz. Num típico partido leninista há, por assim dizer, momentos de democracia interna, seguidos por decisão e definição de linhas, o que se denominou centralismo-democrático. No caso do Fora do Eixo, o mecanismo do “lastro” impede justamente o aparecimento do “democrático”: há apenas o centralismo irradiado por seu “núcleo durável”.

Por regra, onde há política, há oposição. Um caso extremo são os partidos trotskistas, em que há forte rigidez doutrinária e ideológica, e onde os rachas e fragmentações são recorrentes. Como se explica o fato de uma Casa Fora do Eixo não se opor à outra ou, ainda, não haver disputas internas acirradas? É certo que a ideologia deles é muitíssimo fraca, baseada em ideólogos como Claudio Prado e Ivana Bentes, que há pouco tempo atrás falavam em “pós-rancor”. Porém, não estamos mais discutindo a partir de regimes internos democráticos, onde é um expediente recorrente os expurgos de dissidentes.

Conforme você sobe na pirâmide de poder, mais transparência é cobrada pelos que estão acima de você. Você deve compartilhar tudo que está acontecendo, o que está sentindo, com quem está conversando, tudo. Porém a prática não funciona no caminho contrário, as decisões de fato, e tudo que permeia a alta cúpula fica limitada a ela mesmo, inclusive com uma escala de poder interno, onde imagino, mesmo entre eles não é tudo compartilhado.

A transparência de sentido único entre os “de baixo” para com os “de cima” reforça o caráter autoritário da organização. Através do slogan “trabalho é vida”, o Fora do Eixo consegue tecer elementos da sua ideologia com outras dimensões da vida fazendo disso uma “experiência”. O resultado é achatar todas as dimensões da vida numa só: a própria empresa Fora do Eixo.

A devoção transforma-se num regime de exaustão e de submissão, com longas jornadas de trabalho, em que o esgotamento físico e mental impedem o ensaio de qualquer auto-organização e de espírito crítico. Se no interior da empresa Fora do Eixo a coletividade “só funciona nos níveis mais baixos”, isso permite uma situação em que a cúpula sempre terá mais tempo e dedicação para pensar e planejar enquanto para os outros as tarefas não terminam. Dessa forma, “os de cima” sempre apresentarão e terão domínio de melhores propostas, suscitando nos “de baixo” um sentimento individual de satisfação e orgulho em trabalhar para pessoas “tão inteligentes”, convertendo a cúpula em líderes “naturais”. Na verdade, trata-se tão somente da posição central ocupada pelos “lastreados” na estrutura de poder e no fluxo informacional. É assim que se nasce e forma um líder e também uma base de seguidores fanáticos.

Será o leitor tão desatento que não percebe aonde queremos chegar?

3. O Banco Fora do Eixo e a transformação da mais-valia em crédito

A captação de recursos públicos através de editais, a captação financeira proveniente de patrocínios, o recebimento de bilheterias, as vendas de bebidas e outros rendimentos provenientes em reais possibilitam ao Fora do Eixo sustentar uma rede financeira que integra as diversas unidades da empresa. O instrumento desta integração financeira é uma moeda própria, o Fora do Eixo Card. O objetivo da moeda seria o de possibilitar “a sistematização do capital intangível praticado em processos econômicos envolvendo entre vários produtores, gestores e artistas culturais, valorizando o seu próprio trabalho e promovendo o estímulo desses agentes em prol de projetos autorais que desenvolveram cenários culturais locais.” (Diário Oficial FdE) Como um dos “simulacros das frentes mediadoras responsável pela criação e fomento de alternativas que gerem o desenvolvimento sustentável da rede”, o Banco Fora do Eixo garantiria as transações financeiras entre as diversas unidades e o financiamento dos eventos e atividades da empresa, ou seja, ele apenas unifica um sistema econômico que transforma a mais-valia em crédito. O lastro monetário em reais serviria de base para a conversão em cards, o que garantiria a circulação do numerário para o financiamento das várias unidades, além do eventual pagamento de artistas e demais produtores dos eventos do Fora do Eixo.

Esta proposta em nada diferenciaria o Banco Fora do Eixo da atuação realizada pelas instituições financeiras dos Estados nacionais. Levando em consideração ainda que as grandes corporações transnacionais passaram a ocupar funções e espaços dos Estados nacionais, como a constituição de instituições financeiras, educacionais, jornalísticas e políticas com dinâmicas internas próprias, levantamos a questão: em linhas gerais, em que o Fora do Eixo se diferencia de uma corporação capitalista? E há ainda aqueles que conseguem vislumbrar e conceituar essas mesmas relações descritas como “pós-capitalismo”…

4. Mágica e ética: uma discussão não religiosa, mas sobretudo econômica

Ainda no programa do Roda Viva, Pablo Capilé mais uma vez comentou que o Fora do Eixo transformava “um real em 15” [reais] através do seu caixa coletivo e da sua inovação da gestão organizacional e econômica. Como quem apresenta seu projeto a um possível patrocinador, Capilé tomou como exemplo a casa Fora do Eixo em São Paulo. Explicou que lá moram 30 pessoas e que cada uma custa cerca de R$ 900 reais por mês, e continuou, revelando que cada uma delas, prestando consultoria para 300 festivais no período, produziria R$ 150 mil. Ora, não existem mágicas de valorização num câmbio fixo com paridade entre real e cards. A mágica que aqui faz R$1 (investido) multiplicar-se em muitos outros não é outra coisa senão o esforço combinado de trabalhos braçais, cognitivos ou simbólicos não-pagos, ou sub-remunerados, pelo circuito: chama-se mais-valia – processo que também já fora demonstrado nessas séries de artigos (aqui e aqui).

Como exemplo de “socialismo imanente” apresentam o fato de morarem em beliches e compartilharem um armário coletivo – e até as próprias roupas de baixo -, mas ora, essa é a consolidação do mais puro tipo ideal weberiano do capitalista, definido num clássico da literatura sociológica, A ética protestante e o espírito do capitalismo. Ao acumular ao máximo as riquezas do trabalho, investe-se tudo em mais capacidade para expandir a própria estrutura e gerar mais capital num movimento circular. O “caixa coletivo” é, na verdade, a reafirmação deste tipo ideal, uma vez que se trata de uma racionalização dos gastos com produtos não ligados à reprodução do ciclo da mais-valia. E, em parte, a carência material é suprida pela apropriação e gestão dos pertences pessoais dos membros. Como já apontamos, engana-se redondamente quem acha que o bom capitalista é aquele que destina o seu rendimento em consumo de supérfluos ou mercadorias de mera ostentação.

Os que afirmam tratar-se de uma experiência pós-capitalista deveriam debruçar-se mais sobre as formas de enriquecimentos pré-capitalistas. Nomeadamente a Igreja Católica que, através da doação voluntária de bens materiais e da crença no “trabalho é vida” de monges e frades, conseguiu acumulações de capital colossais nos conventos e mosteiros, bem como nos cabidos das sés, transformando-os em grandes proprietários. Foi através da dedicação daqueles que acreditavam no projeto que o Vaticano conseguiu ser o que é hoje nos planos empresarial e financeiro, algo que em tempos de rancor chamávamos de acumulação primitiva de capital.

Com a primeira parte deste artigo chamamos a atenção para o que escrevemos há dois anos, quando insistimos no caráter empresarial do Fora do Eixo, perante muitos leitores céticos ou mesmo indignados conosco. Hoje esse caráter empresarial está latente aos olhos de todos e só não o vê quem precisa não o ver. Mas não nos limitamos a reafirmar o que já havíamos escrito, porque pretendemos aprofundar a análise. Tentamos mostrar que o Fora do Eixo conjuga uma vertente econômica tradicional, com mais duas vertentes: uma vertente gângster, ou seja, uma economia do submundo, onde as pressões físicas e psicológicas se somam às fraudes e aos calotes; e uma vertente que imita as técnicas religiosas de acumulação do capital, em que os crentes — que no caso do Fora do Eixo se intitulam “membros” — são confinados em espaços clausurados e em que todos dão o que têm para um patrimônio comum, queremos dizer, em que a doação é comum, mas o patrimônio é aproveitado por poucos, pelos detentores de “lastro”. É com base nessas três vertentes econômicas que se lança a Mídia NINJA, objeto do nosso próximo artigo.

Leia também: 

Mais um relato: quais os problemas do Fora do Eixo? 

A esquerda fora do eixo

Domingo na Marcha 1ª parte

Domingo na Marcha 2ª parte

Domingo na Marcha 3ª parte

Domingo na Marcha 4ª parte

Domingo na Marcha 5ª parte

Existe consenso em SP? Reflexões sobre a questão da cultura (1ª parte)

Existe consenso em SP? Reflexões sobre a questão da cultura (2ª parte)

Comentando o “Existe consenso em SP?”

Leia a 2ª parte deste artigo.

16 COMENTÁRIOS

  1. Até o Emicida meteu a boca no Twitter:

    emicida ‏@emicida

    Se vc quando fala sobre música independente no Brasil, não consegue ver nada além de bandas de rock/FdE/editais, vc é café c/ leite na rua.

  2. Boa matéria da CartaCapital acrescentando e reforçando dados sobre as relações internas do FdE: http://www.cartacapital.com.br/sociedade/fora-do-eixo-6321.html

    Aqui um bom relato: http://nobrefarsa.blogspot.com.br/2013/08/pablo-capile-e-verdade-sobre-sua.html

    Aqui uma das gestoras com mais “lastro” (Lenissa Lenza) expõe de forma mais clara que o FdE é uma empresa e as relações de trabalho constituídas: https://www.facebook.com/lenissalenza/posts/572621649465432

    “Outra polêmica que acho vazia é dizer que trabalhamos demais, além da “jornada de trabalho”. Primeiro, a visão que temos de trabalho é muito diferente da visão padrão. Não medimos um tempo X pra atingir um objetivo que queremos. Se o queremos, vamos seguir adiante nele o tempo que for preciso, o tempo que queremos. Os trabalhos são contínuos e estão sempre em fluxo. Pra gente ler um livro, assistir a um filme, bater papo, assistir um show, estudar, comer e etc, também fazem parte do “trabalho” e vice versa. A gente trabalha estudando, estuda trabalhando, se diverte estudando, estuda se divertindo, trabalha se divertindo, se diverte trabalhando. Tudo faz parte da mesma VIDA. Por isso o lema: trabalho é VIDA. E poderíamos dizer: Estudo é vida. Lazer é vida e assim por diante. Não se dissocia trabalho, lazer, estudo pro fora do eixo. Segundo, não somos “assalariados”, somos empreendedores. Empreendedores não tem salários, muito menos hora de trabalho. É o tempo que precisar pra fazer seu empreendimento acontecer. Assalariados tem uma carga horária X de trabalho, depois, tem o “tempo livre”. Na vida padrão, muitas pessoas utilizam o “tempo livre” pra trabalharem em projetos próprios, ou seja, elas trabalham o tempo todo. Qual é o problema mesmo?”

  3. Depois de tudo o que o Passa Palavra tem escrito sobre o sistema de exploração praticado pelo Fora do Eixo e depois desse extracto de Lenissa Lenza transcrito por Leo Vinicius, talvez fique mais claro o motivo que levou o Fora do Eixo a aproximar-se do MST, para além da defesa dos interesses governistas. Numa entrevista publicada no Brasil de Fato em Abril do ano passado (http://www.brasildefato.com.br/node/9444 ), o economista Jean Marc Von Der Weid, coordenador de Políticas Públicas da ONG Agricultura Familiar e Agroecologia e membro da Articulação Nacional de Agroecologia, deixou claro que a agroecologia «não é um sistema que opere bem com mão de obra assalariada, pois esta só funciona com tarefas simples» e acrescentou: «Se você vai pedir uma tarefa extremamente complexa ele [o assalariado] não tem interesse, porque vai ganhar igual por hora de trabalho». Por isso Von Der Weid concluiu que «há uma simbiose perfeita entre a agroecologia levada a seu limite máximo e a agricultura familiar» e que «no futuro precisa de muito mais agricultura familiar do que você tem hoje». O mais interessante de tudo é que, depois de constatar que os assalariados se esforçam por reduzir o tempo de trabalho que lhes é extorquido, aquele economista considerou que o trabalho dos agricultores familiares «é o trabalho não alienado». É elucidativo ler num órgão que serve de porta-voz ao MST esta inversão de conceitos, que classifica como «alienado» o trabalho de quem tem a noção de que está a ser explorado. É exactamente a mesma noção que preside às declarações de Lenissa Lenza. Em ambos os casos se trata de uma apologia do trabalho gratuito.

  4. (*texto escrito coletivamente por ocasião do encontro cultura livre e capitalismo, em 2007)

    cuidado, trabalho!

    Sentimos na pele a urgência de organizar certas ideias, expressar algumas angústias relacionadas a projetos de vida política/pessoal sustentáveis no tempo… pensar na nossa relação trabalhista com o capital, em que contribuimos, mesmo sem querer, para o funcionamento de esquemas contra os quais lutamos?

    Essa é uma discussão infinita e talvez podiamos pensar em coisas mais práticas que envolvam trabalho livre/voluntário, miliância e meios de sobevivência material mesmo. Até onde vale a separação entre vida e trabalho, prazer (no tempo livre) e tortura (na maior parte do tempo, 8 horas)? também é frustrante pensar maneiras de ganhar dinheiro das duas formas (separadas ou juntas), seja com trabalho militante (em ong por exemplo) ou com trabalhos palhas, obrigatórios, involuntários, super exploradores… (uma empresa capitalista, funcionlismo público, um estágio tosco, o comércio da família, uma bolsa de pós-graduação) e é revelador pensar que enquanto podemos empenhar nosso tempo pensando nesse tipo de coisa, quem é que está fazendo os trabalhos palhas pra nos sustentar? quem é que sustenta nossos sonhos? essa discussão é menos absurda e distante do que parece, o que acontece é que, muitas vezes, existe mesmo alguém de quem estamos tirando alguma(s) coisa(s) (notadamente, material)… e pensamos agora em vários relatos do tipo:

    “e aí fui fazer um trabalho na casa de uma pessoa x, que é legal e compartilha várias preocupações comigo, até que às 11 da noite a pessoa grita, na porta da cozinha: ‘ôu, dá pra fazer um café pra gente?’’

    ou

    “estou tentando ensinar matemática ao filho da empregada da minha casa, mas ele acha que é muito burro e que nunca vai conseguir chegar na universidade como eu, e se contenta com a possibilidade de fazer um curso técnico”

    enfim, pensamos em quais são os desejos e frustrações materiais e imateriais que sustentam nosso conforto, a possibilidade temporal de poder ficar pensando. é óbvio que há diversas pessoas que têm rotinas sufocantes, com enorme escassez de tempo pra lazer-descanso ou dedicação “intelectual” ou distração mesmo, que estão pensando cotidianamente nos motivos desse sufocamento, pensando no imperativo do capital sobre nossas vidas e todas as obrigações que ele impõe, mas agora estou falando de “nós” e não um nós universalizante, mas formado a partir de uma experiência de classe média com conforto material. e também formado com pessoas que estão, mais cedo ou mais tarde, se deparando com necessidades materiais muito específicas e que são regidaspor aquele mesmo imperativo do capital. temos tentado pensar soluções possíveis, não conformadas e isso leva a pensar em outras coisas, como a insustentabilidade mesmo dos sistemas urbanos como os conhecemos. não sei se é esse um espaço (físico) pra essa discussão (que é também infinita e longa) mas onde fica a porta de saída (voluntária)?

    A separação entre trabalho (produção que envolve transformação, valor qualquer agregado) e emprego (venda da força de trabalho em troca de um salário) parece sustentar a separação entre quem trabalha e quem possui os instrumentos… e atualmente essas duas dimensões andam se confundindo…

    O capitalismo contemporâneo incorporou algumas coisas que eram utilizadas para criticar a fatalidade de seu funcionamento:

    A produção de mercadorias costumava ser seriada e homogênea para pessoas que tinham gostos e desejos diferentes, isso era o que dinamizava a produção; mas hoje os mercados se organizam em nichos (engraçado como essa palavra parece, foneticamente, com fetiche) e as coisas produzidas são feitas tendo em vista a individualidade consumidora, efeito: desarticulação do sistema de produção seriada clássico e investimento em desejos, e marketing, desvio de valor agora agregado às especificidades. esse foi um dos maiores saltos do capitalismo, que se no começo precisou convencer a/o consumidor/a de que era mais um/a num grande berço “humano” (e aí está dissimulada uma noção de que, mesmo sendo perverso, não é tão ruim fazer parte disso – todo o resto do mundo faz), agora pode convencer às pessoas de que elas são únicas e especiais (e comprar tal produto é precisamente o que vai fazer você diferente).

    O conflito de classes era palpável e hoje as figuras clássicas aparecem dissolvidas, ou melhor, não aparecem, muitas vezes. A mais-valia parece mais distribuída; pessoas supostamente podem fazer parte da gestão da empresa, as máquinas são alugadas, os serviços terceirizados, o trabalho é estimulado pela vontade “própria” dxs trabalhadorxs e não por vigias de produtividade, as pessoas trabalham felizes e contentes como formigas, voltam satisfeitas para casa (claro, estamos falando aqui de trabalhos valorizados, como numa multinacional que trabalha com produção imaterial, embora em um supermercado comum existam figuras intermediárias entre o dono da rede e os trabalhos mais precarizados; em uma livraria as vendedoras se sentem partem de uma família, socializam ganhos e perdas, enfim, em várias funções empregadas se percebe a diluição entre capitalistas e operárias, de uma maneira que o inimigo parece intocável.

    Esse mecanismo é parecido com o que faz o sistema de trabalho doméstico no brasil tão peculiar: a diluição artificial de um abismo patrão x empregada; o mito da doméstica que “faz parte da família”, além de uma das maiores e persistentes heranças do sistema de escravização-assassinato-estupro- epistemicídio-… negra e indígena, é o que permite essa dupla-conduta que, enquanto nega às empregadas direitos trabalhistas porque “elas são parte da família” (muitas não têm horário de início e término do expediente, por exemplo), nega a elas o pertencimento efetivo àquela família, já que elas não têm acesso a todos os cômodos das casas o tempo todo, embora o patrão tenha acesso aos cubículos em que muitas delas moram (carinhosamente apelidados de “dependência de empregada” – é muito legal pensar no funcionamento ambíguo do termo dependência aí: quem depende de quem?) (e esse acesso não é só aos cômodos mas também a seus corpos), elas não estão nos álbuns de festas porque ficam o tempo todo na cozinha, elas não fazem parte dos processos decisórios oficiais por mais que sirvam, muitas vezes, como oráculos e conselheiras (quando conveniente)…;

    Parênteses: as desigualdades continuam existindo em parte decorrente da precarização do trabalho, trabalho informal e flexibilização das CLT; o que acontece em certas regioes (uma geopolítica da exploração
    no trabalho…), é fácil perceber como xs trabalhadorxs estão sendo esmagadxs pela globalização e pelo capitalismo triunfante e tardio, com a flexibilização das leis trabalhistas e a institucionalização de relações de trabalho precárias em muitos países, o que faz de cada um(a) seja um(a) desempregadx em potencial.

    Talvez fosse interessante perceber quais críticas não foram incorporadas:

    dicas: distância entre valor-de-uso e valor-de-troca (produção voltada para necessidades concretas?), trabalho anti- capitalista (que não gera valor/capital) e outras estórias que envolvem valores não mensuráveis…

  5. ótimo texto!

    acho que cabe lembrar que os chefes não precisam estar embolsando dinheiro pra que estejam sendo beneficiados pela exploração que organizam.

    quão maior na hierarquia, mais capital simbólico (político, cultural) eles adquirem. quão mais “capitalizados” mais procurados são pra novos projetos e mais exploram e por aí vai.

    e isso não é exclusividade do fora do eixo: a produção cultural, ainda mais quando tenta capitalizar demandas dos movimentos sociais (cultura popular, sustentabilidade, povos tradicionais e etc) costuma ser um negócio que não remunera a maior parte dos envolvidos e que multiplica o status dos dois ou três patrões, e isso facilita que ganhem novos editais, abram novos caminhos pra captação de recursos, enfim, acumulem capital nesse moto-continuo de exploração!

  6. Boa análise! Mas acredito que o Fora do Eixo não só é uma instituição capitalista, como aprofunda muito os seus mecanismos de dominação. Acho que aí sim residiria o “pós” deles: conseguem realizar de forma muito mais sofisticada a extração da mais-valia, a centralização do poder empresarial e outras formas de exploração, mas através de um viés que simula empoderamento e autonomia. A comparação com o sacerdócio pré-capitalista e o gangsterismo como mecanismos de acumulação é muito boa!

    Um dos poucos textos do Deleuze que aprecio é o post scriptum “Sociedade de controle”. http://www.ufes.br/ppgpsi/files/textos/Deleuze%20-%20Post%20scriptum%20sobre%20sociedades%20de%20controle.pdf Ele exemplifica como o capitalismo hoje se desloca da indústria para as empresas, e da sociedade disciplinar para a sociedade de controle, onde o que existe “são figuras cifradas, deformáveis e transformáveis, de uma mesma
    empresa que só tem gerentes.” Para avançar nos processos de dominação, se torna necessário “dividir o homem de si mesmo” e torná-lo um agente ativo da sua própria dominação. Um dos exemplos usados são os salários por méritos e bonificações. Mas acho que Deleuze se embasbacaria ao conhecer o FDE. Diferente (e muito pior) do que um sistema de “trabalhador-colaborador” via bonificação, o FDE precisa criar formas onde os trabalhadores aceitem se sentir parte do projeto, mas ganhando muito menos em relação ao montante total produzido pela empresa (a mais-valia elevada à enésima potência). Isso se dá realmente das formas expostas no texto: através do sacerdócio e do gansterismo (e esse vídeo sobre “como se tornar um líder de culto é bem ilustrativo http://www.youtube.com/watch?v=Yunq85w1XnQ ). Se o primeiro método é usado para quem está “dentro” das casas e do FDE, o gangsterismo é a forma utilizada em relação aos “de fora”, através de enganação e charlatanismo. Os artistas “caretas” e “fordistas” são importantes para o FDE, pois o dinheiro que geram (sem pagamento) colaboram para o crescimento do negócio. Destas duas formas, ambas explorando o trabalho, eles conseguem a “mágica” de multiplicar dinheiro.

    Minha única crítica ao texto (e à maioria dos textos sobre o FDE) é que eles não conseguem ir além da crítica direta ao grupo. Tenho muitas questões ainda não resolvidas que se relacionam a espectros mais amplos sobre capitalismo, cultura, autonomia, resistência, etc.. Temos que começar a tentar pensar sobre algumas perguntas: – Seriam os movimentos políticos e culturais que adotam o discurso da horizontalidade e autonomia (sendo verdadeiro ou não), típicos da era digital, facetas do estágio atual do capitalismo? – Ou isso seria apenas uma apropriação realizada pelo Capital? – De que formas podemos produzir ações de resistência no capitalismo hoje? -E de que forma podemos pensar o trabalho dentro disso? Se pensarmos no conflito “emprego formal”,( a serviço direto do Capital, com melhores salários e direitos) X trabalho dentro de organizações e iniciativas de resistência, (que são inevitavelmente precarizadas, justamente por elas estarem à margem do poder econômico e da hegemonia dominante).

    Abraços!

    Gabriel

  7. Parabéns pelo artigo.Gostaria de sugerir a vocês uma pesquisa sobre a Corporação Monstro de propriedade de Fabrício Nobre. Essa corporação, está controlando já faz algum tempo a Cena Cultural de Goiás, sendo que durante a atual gestão de Marconi Perillo (atual governador do Estado), o poder deles aumentaram.

  8. Arbeit macht Frei (o trabalho liberta) foi escrito pelos nazista no portão de entrada de Auschwitz. O modus operandi e o slogan “Trabalho é vida” da turma Fora do Eixo são de arrepiar!

  9. Concordo com o Guajaman, o FdE é apenas o pior, mas existem muitos grupos por aí capitalizando demandas de movimentos sociais. Podemos recuperar discussões da época da Ocupação Prestes Maia, sobre a atuação de coletivos de artistas na ocupação. O último capítulo desta celeuma se deu na inauguração do MAR, Museu de Arte do Rio, este ano: do lado de fora manifestação das pessoas que foram despejadas para construção do Museu (no “Porto Maravilha”), do lado de dentro os artistas expondo trabalhos sobre a Prestes Maia para “conscientizar a população sobre os problemas de moradia”.

    Concordo também com o Gabriel Barcelos e texto do Korpus Krisis, Precisamos começar a imaginar caminhos para sair do impasse trabalho x ativismo…

  10. Complementando… A discussão sobre mostrar ou não os trabalhos sobre a Prestes Maia no Museu de Arte do Rio se deu em maior parte na lista do Ipê, e pode ser lida aqui:

    http://vazador.wordpress.com/2013/02/26/ipe-na-discussao/

    Fabiana Borges argumenta fortemente a favor da mostra e, assim como o Capilé fala em “esquerda rancorosa”, ela fala em “esquerda que não gosta de piada”:

    “então… Vcs que não gostam de piadas e pensam que humor não é sério… eu entendo… Vcs que estão criticando o museu e a higienização operada no espaço para que ele possa existir, tbm entendo… Alias faremos a exposição apesar dessas críticas já pensadas e avaliadas. Tem uma só coisa que faz com que tenha havido um consenso sobre dizer sim para essa exposição, é que a gente quer fazer esse material circular.”

    Estou insistindo nisso porque essas práticas não estão só no FdE, estão generalizadas. Quem foi na derrubada do Muro da Vergonha, no Moinho, viu o Fernando Sato colando lambe lambe pela favela sem perguntar se quem mora lá curtiu os lambes…

  11. Boa análise ! E acrescentaria algumas palavras sobre a “magica” de se ressignificar. Após, muitas denúncias e alertas o Fora do Eixo estava se ressignificando como Midia Ninja. A participação do Pablo Capilé como responsavel pelo Midia Ninja desmascarou a “ressignificação” de vez.

    Vale lembrar que a própria midia ninja é uma pratica que se apropria de uma cobertura colaborativa e muitas vezes autonoma e conforme ja mapeado: para se utilizar de contrapartida em editais para corporações, governos e bancos, entre outros fins.

    Portanto, estejamos atent@s as proximas “ressignificações”

  12. Muito bom o artigo. Parabéns ao Passa Palavra. Não conhecia. Excelente iniciativa. O debate é muito necessário.
    Minha impressão é que a era Lula, por limitação em seu projeto, às vezes por ausência de políticas consistentes, como nessa área da cultura, acabou criando problemas potencialmente graves. É o caso desse Fde; também pode se tornar o caso do pessoal que gira em torno ao Software Livre e outras áreas de interesse social e econômico…
    Na ausência de um projeto de Nação (não estou falando do nacionalismo clássico – estou pensando em um projeto de Brasil no contexto atual), os aliados ao lulismo têm feito barbaridades à esquerda e à direita. Minha impressão é que urge discutir um projeto capaz de atrair também estas franjas da juventude e retirá-las da influência ideológica a que foram submetidas. Só combater os Ninjas e Fdes não basta. É preciso ser superior a eles na teoria e na prática.
    Como ponto de partida, tenho trabalhado com a ideia de que os norte-americanos são mais espertos do que a gente imagina. Quando viram que o seu sistema de dominação iria entrar numa crise profunda, passaram a investir fortemente na geração que viria a fazer os protestos. Desde 2000 temos assistido à onda de manifestações mundo afora, em geral contra governos autoritários. Agora, estas manifestações chegaram à América do Sul, mas contra governos de esquerda ou centro-esquerda. A mudança de tática dos norte-americanos se articula com a mudança da sua economia (diminuiu o peso da indústria armamentista/automobilística etc, ganhou protagonismo a indústria do software, a indústria criativa), com a mudança na política interna (saíram os republicanos e entrou Obama), e tem como meta estabelecer uma nova ordem internacional. Num certo sentido, os norte-americanos adotaram um velho adágio brasileiro: “vamos fazer a revolução antes que o povo a faça”. E estão fazendo isso com enorme eficiência.
    Para entender o Fde e a Mídia Ninja em profundidade é preciso investigar as suas fontes de financiamento e a sua retaguarda ideológica para além do que eles conseguem chupar do Estado e extrair da juventude como trabalho gratuito.
    Uma pesquisa na rede mostra por exemplo que o Steve Jobs do Fde é membro da Ashoka. Essa organização (e outras como o CANVAS, o Hilos, o Anonymous etc que também precisam ser mapeadas), presente no mundo inteiro, tem propósitos claros, e todos se coadunam com os do Fde. A Ashoka, aliás, também tem grande relação com a candidata Marina. E é por aí que a velha luta de classes parece ser o pano de fundo desse processo.
    Ah, não é rancor. É só lucidez.

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here