A história tem a pachorra de recolocar a mesma questão para os mesmos atores mais de uma vez, como um aparente retorno. Por Daniel Lage e Rodrigo Massatelli [1]
Muitas vezes julgamos ver a aurora
e sua rosa de fogo à nossa frente.
Era apenas, na noite, uma fogueira.
Voltava a noite, mais noite, mais completa.
Carlos Drummond de Andrade [2]
Esse texto pretende, antes de apontar certezas, contribuir para o conjunto de reflexões que determinado campo dentro do autonomismo iniciou no início de 2014. O ponto de partida é a crítica à centralidade da tática como forma política de atuação, seus limites e dilemas; o ponto de chegada são questionamentos sobre as respostas práticas que os setores consequentes com essas críticas deram, e ainda podem dar, sobretudo considerando o saldo da vitoriosa luta contra a reestruturação das escolas da rede de ensino do Estado de São Paulo.
Sobre essa luta, não é demais lembrar, ela não ocorreu espontaneamente, houve um grupo que projetou, planejou e organizou o movimento, antes e durante as ações que desembocaram na suspensão da reestruturação. Os manuais não surgiram do nada, tampouco as músicas e vídeos de agitação e propaganda, assim como os primeiros secundaristas que ocuparam as primeiras escolas. A tática de ocupar escolas que “viralizou” tem respaldo histórico nas lutas estudantis do Chile e da Argentina, aliás, como consta no manual elaborado pelo “O Mal Educado”, antes das primeiras ocupações. Destacamos esse aspecto fundamental de direção dos processos, pois, diferente do que aparece no resultado final, tais ocupações tratam-se de processo político que foi idealizado e realizado de forma refletida por um grupo que se insere no campo autonomista e que, portanto, está sujeito aos acúmulos correspondentes a esse campo.
Que horas são?
É sabido que a história tem a pachorra de recolocar a mesma questão para os mesmos atores mais de uma vez, como um aparente retorno, por mais que a qualidade da conjuntura seja diversa. Em texto publicado em meados de 2014 (A revolta popular: os limites da tática [3]), dois militantes, na época dentro do MPL-SP, intensamente envolvidos na direção das manifestações contra o aumento da tarifa em 2013, apresentaram uma lúcida e penetrante análise sobre a forma política pela qual foram conduzidas tais manifestações. Essa análise, apesar de ter como objeto a luta contra o aumento da tarifa, está repleta de atualidade e recoloca as mesmas questões para os desfechos da luta dos secundaristas no início de 2016. Resumidamente, a equação elaborada foi a seguinte:
“A tática histórica das lutas contra o aumento, que aqui chamaremos de ‘revolta popular’, aposta para seu sucesso nessa ameaça [a de um imenso salto organizativo dos trabalhadores] e, no entanto depende, ao mesmo tempo, de que ela não se realize. Para conquistar a reivindicação central, a revolta deflagra um processo explosivo, que é necessariamente freado no momento em que se atinge a conquista. Se a tática é eficiente, o salto organizativo já nasce castrado e vai existir apenas como vislumbre.”
Na análise dos autores, o salto organizativo dos trabalhadores estava impedido por, no mínimo, dois problemas. O primeiro é que o PT, principal força inserida na classe trabalhadora, ao alçar ao poder do Estado passa ao papel de gestor dos conflitos sociais e utiliza suas organizações de base para essa gestão; o segundo é que a organização que protagonizou o processo de revolta, o MPL- SP, não possuía inserção de base na classe trabalhadora e, portanto, pôde apenas mobilizar um espetáculo de rua com aspectos de “revolta popular”, que no entanto, depois da vitória, não teria coerência e levaria o próprio MPL-SP, agora sem condições de direção, a tornar-se espectador atônito do processo que iniciou.
A esse diagnóstico seguiu-se uma proposição coerente: se os principais problemas são os limites da tática e a ausência de organização de base autônoma, então “é preciso formular uma perspectiva estratégica mais ampla, a perspectiva de uma recusa mais potente, enraizada no cotidiano”. Daí a priorização do trabalho de base em contraposição às manifestações de rua chamadas por frentes amplas; daí a organização da classe trabalhadora como condição necessária para a superação das “reivindicações imediatas”. Que pese que trabalho de base e classe trabalhadora sejam termos, no mínimo, controversos dentro do campo autonomista, o diagnóstico e a proposição foram convincentes. Em texto do início de 2015 (Democracia de Base sem trabalho de base?) [4], militantes do MPL-SP, que aderiram a essa perspectiva formularam:
“Contra essa tendência sempre latente em qualquer forma de mobilização [a burocratização pela base], o que podemos fazer é atuar em favor do erguimento de estruturas decisórias enraizadas no dia a dia dos trabalhadores. São tarefas que exigirão de todos nós compromissos de longo prazo, serenidade e discrição, e nenhuma traz garantia de glória, algo bem diferente do imediatismo, da visibilidade e dos breves momentos de heroísmo que as grandes manifestações no centro nos proporcionam.”
Posta essa proposição, a pergunta a ser respondida na prática foi: seria possível operacionalizar uma curva que partisse de uma organização autonomista marcada pela centralidade da tática e ausência de organização de base (sobretudo que concebesse classe trabalhadora), rumo a uma organização que, sem abandonar o autonomismo, fizesse uma ampla reflexão estratégica e se enraizasse no cotidiano da classe trabalhadora através de trabalho de base?
A ironia da história é que hoje, como se o relógio estivesse tresloucado, essa mesma questão está inteiramente recolocada para o movimento secundarista que surgiu sob influência do autonomismo já requalificado por essa perspectiva. E para além disso, no início do ano de 2016 a luta contra o aumento da tarifa se coloca para os estudantes mobilizados como uma perspectiva imediata, tática, sem reflexão estratégica, sem o trabalho de base exigido pela análise anterior e sob direção do MPL-SP. Que horas são?
Bem, o fio condutor necessário para traçar uma narrativa que dê conta de todos os pormenores que levaram a esse momento de recolocação das mesmas questões identificadas em 2014 está para além da capacidade desse texto. Portanto, a reflexão aqui está limitada a alguns pontos que podem jogar nova luz aos repetidos problemas.
Tática e Estratégia
Diz um velho militante voltado ao movimento operário que elaborar uma estratégia sem ter um exército é jogar palavras ao vento. Essa afirmação é fundamental para os tempos em que vivemos, pois, não raro, o acalorado debate estratégico passa longe das mediações com a realidade imediata e se perde em rixas sobre avaliações descontextualizadas de processos históricos passados. Infelizmente, a esquerda acostumou-se a produzir enunciados muito maiores que seus conteúdos. Portanto, cabe aqui o bom esforço para que o enunciado, “temos uma estratégia revolucionária”, e o conteúdo do enunciado, “compartilhado por milhares de trabalhadores socialistas organizados em setores chaves da economia”, estejam sempre em alta sintonia.
Para não cair no erro grosseiro da autoproclamação revolucionária, é preciso ter em conta que, na luta de classes, uma estratégia se constrói junto com o próprio exército – é um processo coletivo e não fruto da vontade individual. Em outras palavras, é andar junto com a classe trabalhadora e não falar em nome dela que garante a fina sintonia almejada entre o enunciado e a realidade das forças políticas. Por isso, o debate estratégico passa, sobretudo, pela identificação e crítica da estratégia determinante de nosso tempo. De forma geral, sem a realização da crítica estratégica de nossos predecessores estamos fadados a repetir erros do passado e, pior do que isso, apresentá-los como novos.
O diagnóstico elaborado em 2014 pelos então militantes do MPL-SP tinha como proposição principal: formular uma perspectiva estratégica mais ampla. Ao que parece, ao colocar diretamente a questão “é preciso formular uma estratégia”, correu-se o risco de não realizar a crítica à estratégia incorporada pelas próprias ações do movimento e que correspondem às estratégias que compõem os ciclos históricos da classe trabalhadora atualmente.
Em produção recente, Mauro Iasi [5] defende que a estratégia determinante de nosso tempo é a estratégia democrática e popular. Tal estratégia tem no Partido dos Trabalhadores sua principal força política, mas está presente com tonalidades diferentes em todas organizações do campo da esquerda, inclusive em movimento sociais – daí sua designação como determinante. O debate sobre o tema é amplo e ultrapassa os objetivos desse texto. Todavia, uma das características fundamentais de tal estratégia, apontada por Iasi, parece fundamental para a reflexão nesse momento. Diz Iasi que um dos fundamentos da estratégia democrática e popular é colar no conteúdo das ações de reivindicações populares um desfecho necessariamente socialista ou revolucionário. Esse desfecho seria revolucionário pois o Estado brasileiro seria incapaz de atender as demandas populares, o que forçaria tais lutas a avançar para além da simples reivindicação – o que em última instância, exigiria um conteúdo socialista às lutas. As agitações do tipo “as reivindicações dos trabalhadores só podem ser atendidas em um mundo sem exploração, por isso as lutas imediatas carregam em si os passos da revolução”, são marcas dessa estratégia. Embebidos em um intenso ativismo, a militância do campo democrático e popular coloca todo o peso no caráter formativo imediato das reivindicações populares, as quais seriam a mola propulsora de uma revolta, não por acaso, popular.
Ação direta e reivindicações populares
A ação direta tem conteúdos formativos diferentes a depender do contexto e da qualidade como ocorrem. A ação direta no momento revolucionário é de combate e destruição do Estado – seu conteúdo é de destruição de uma ordem e construção de uma nova ordem e, portanto, tem potencial de formar imediatamente quadros revolucionários. Já a ação direta no momento em que vivemos, e da forma como temos visto, está sob o signo da democracia, da cidadania e, no limite, de uma luta econômica que pode ser absorvida pela institucionalidade.
Não raro os movimentos de reivindicação atuam como “educadores” dos caminhos institucionais para se conseguir uma conquista. O movimento aponta a forma de divulgar publicamente o problema (página no Facebook, produção de vídeos), de organizar uma marcha (produzir faixas, cartazes, palavras de ordem), indica para qual instituição estatal essa marcha deve se dirigir e, finalmente, como negociar com os gestores. É preciso ter claro que esse processo, mesmo quando ultrapassa momentaneamente a ordem, não é em si revolucionário, pelo contrário, ele é em si reformista. E, apesar dos conflitos com a polícia mostrarem, eventualmente, o lugar do Estado na defesa da ordem burguesa, o conflito termina geralmente com um amplo debate sobre a criminalização dos movimentos sociais e um apelo na chave dos direitos civis.
De outro modo, a tática, por mais acertada para determinada conjuntura concreta, não traz em si um conteúdo estratégico, ela está sujeita às determinações mais amplas do processo político, e por muito que contribua para o avanço da consciência, desvinculado de uma perspectiva organizativa para conquista dos objetivos históricos, ela tende a se dissolver naquilo que predomina na realidade concreta na qual se desenvolve: a adequação às formas políticas da democracia burguesa.
No texto Reorganizar para Gerir: o ensino público como indústria [6], a avaliação de que os governos do PT foram mais eficientes para implementar a reestruturação das escolas é correta, pois eles dialogaram antes de implementar. No entanto, o texto ignora que a reivindicação pública das ocupações foi justamente o modelo de diálogo petista. E ignora também que, apesar dos aspectos subversivos das ocupações e o momentâneo empoderamento dos estudantes, foi a própria justiça que legitimou as ocupações enquanto forma de reivindicação legal de diálogo institucional. Evidentemente, a justiça apenas reconheceu a legitimidade que a pauta havia alcançado no debate público – o destaque aqui vai para os trâmites institucionais que absorvem institucionalmente os aspectos subversivos das reivindicações. Não é a toa que, diferente de 2013, entre os principais apoiadores que conseguiram falar publicamente pelo movimento, estavam organizações ligadas fortemente ao PT.
Esse balanço é fundamental, pois como uma exceção à regra, as ocupações de escola em São Paulo deram fôlego à burocracia petista, sobretudo para a Associação dos Professores do Estado de São Paulo (APEOESP), em contexto de imensa fragilidade dessas forças. Estudantes secundaristas alinhados com o PT estiveram presentes em eventos da Central Única dos Trabalhadores (CUT), e do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC como representação da luta contra o autoritarismo do governador tucano. A própria presidente da APEOESP, a Bebel, figura símbolo da burocracia sindical, foi a público mais de uma vez responder pelas ocupações.
Fique claro! Isso não quer dizer que não se deve estar nas lutas reivindicativas imediatas. O que se quer dizer é que colar conteúdo revolucionário, ou mesmo de “revolta popular”, nas reivindicações democráticas é uma das marcas principais da estratégia democrática e popular.
É certo que aqui podemos cair em um exagero, mas, no caso, a ausência de debate sobre os limites formativos da ação direta e uma forte ilusão de ótica com o que se chamou de “revolta popular” merece destaque. A agitação revolucionária com bandeiras democráticas tem precedentes históricos na socialdemocracia. Em passagem do 18 Brumário [7], Marx narra que com a unidade entre a pequena-burguesia e o proletariado derrotado nas jornadas de Junho de 1848:
“Quebrou-se o aspecto revolucionário das reivindicações sociais do proletariado e deu-se a elas uma feição democrática; [ao mesmo tempo] despiu-se a firma puramente política das reivindicações democráticas da pequena burguesia e ressaltou-se seu aspecto socialista. Assim surgiu a social democracia.”
Eis o ponto chave do debate estratégico que é preciso se atentar: os limites da tática estão dentro dos limites da estratégia socialdemocrata de nosso tempo. E, para além do PT, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) é um ótimo exemplo de como se operacionalizou essa estratégia com tonalidades radicais. Foi o MST que mais claramente forjou um “exército popular”, como sujeito revolucionário para uma reivindicação dentro da ordem burguesa, a “reforma agrária”. Seu infeliz desfecho reformista já é conhecido por todos.
A classe trabalhadora e o exército popular
É fato que dentro do campo autonomista, entre aqueles que compartilham alguma concepção de classe trabalhadora, ela é no mínimo vaga e controversa. Dentro dessa amplitude de concepções uma tem se fortalecido, a de que antes de tudo é preciso “forjar um exército” através das lutas de ação direta. Desse exército sairão os generais que dirigirão as lutas da classe trabalhadora. Essa concepção é em parte correta, mas é preciso analisar com mais cuidado o caráter e conteúdo dessas lutas bem como a sua relação com o contexto mais amplo das lutas de classe.
Se está claro que é da luta concreta, por demandas imediatas da classe trabalhadora que é possível o surgimento desses “generais”, ao menos duas condições tem que ser cumpridas. Por um lado, essas lutas devem estar inseridas no seio da classe trabalhadora, e nesse sentido, é impossível ignorar os locais de trabalho e as determinações econômicas que configuram a subjetividade do proletariado e suas diferentes frações. Por outro, é preciso um plano de longo prazo que torne possível a formação de grupos coerentes, cujo “impulso de recusa” da ordem inviabilize a captação passiva ou ativa desses grupos para as práticas que somente reforçam a democracia burguesa.
De outra forma, para além de generais para um exército, é necessário um plano estratégico. As táticas da luta concreta são elementos importantes e com certeza os generais são forjados através da experiência nessas mediações da tática. A capacidade desses setores em movimento contribuírem para um processo de ruptura está decisivamente ligada à existência da crítica à estratégia determinante de nosso tempo, e à construção do novo através de sua negação junto à classe trabalhadora.
É nesse ponto que é preciso muito cuidado para não deixar o enunciado extrapolar o conteúdo real do que se enuncia. A ação direta de ocupação das escolas “forjou um exército”, entretanto um exército nos marcos do movimento estudantil, isto é, um coletivo de estudantes secundaristas que deu novo fôlego a esse setor em São Paulo. Saber desses limites é condição necessária para avançar. Além disso, é preciso reconhecer que nessas lutas a classe trabalhadora apareceu apenas como figurante, tanto nos momentos mais belos de solidariedade, quanto nas manifestações de rua. Essa constatação não quer tirar o brilho e a excepcionalidade que foi derrubar um secretário da educação e suspender a reestruturação, mas é preciso dimensioná-la e ver o seu significado para além da imediaticidade.
A irresistível centralidade da tática e o dilema autonomista
A realidade tem mostrado que para o campo autonomista a centralidade da tática é irresistível. E o dilema posto em 2014 (e quantas outras vezes antes disso?) se recoloca para o movimento secundarista: seria possível operacionalizar uma curva que partisse de uma organização autonomista marcada pela centralidade da tática e ausência de organização de base (sobretudo que concebesse classe trabalhadora), rumo a uma organização que, sem abandonar o autonomismo, fizesse uma ampla reflexão estratégica e se enraizasse no cotidiano da classe trabalhadora através de trabalho de base? A primeira opção é não fazer a curva, e seguir o destino de agitar como novo o que de dentro da estratégia democrática e popular já se mostrou reformista. A segunda opção é fazê-la, ao preço de ter de abandonar a centralidade da tática e, portanto, o que configura o campo autonomista nos dias de hoje.
Durante as ocupações das escolas muito se falou sobre a necessária organicidade e o necessário debate estratégico que precisaria ser feito com os militantes que surgiram desse processo. “A grupalização está frágil, as concepções estão frágeis, muitos acham que a história começou justamente agora, é preciso no mínimo formação…”. Essa avaliação levou muitos a apostar que o desfecho dessa luta iria ser diferente dos anteriores, pois havia desde o início uma preocupação organizativa. Mas aí… Resolveram aumentar a tarifa.
E como quem surge dos mortos, num espiral esfumaçado, o MPL-SP veio à cena e criou um evento no Facebook: “dia de luta contra o aumento da tarifa”. Reanimados pelo chamado, os aspirantes a generais recém-saídos das escolas de luta disseram à tropa: uma luta é uma luta, e um soldado não foge do front… Sob luz baixa e olhos arregalados, a tática que já ensaiava os passos de sua saída do centro da cena parou de se mover. Virando-se para o público, ela sorri, olha para a estratégia entre as coxias, risca um fósforo e novamente incendeia o cenário de forma espetacular.
A luz se dirige para o alto das labaredas, onde panelas novas, dependuradas em cabos de aço, requentam velhas questões. Elas fervem um caldo grosso e viscoso que escorre sobre as chamas e as cortinas se fecham. Quem sabe um dia, esse angu não seja nosso prato principal.
Notas
[1] Apesar de estar assinado, é preciso dizer que esse texto contou com leituras prévias de diversos militantes cujas contribuições em grande medida estão aqui incorporadas. O trabalho de “botar no papel” é apenas um momento do grande conjunto de trabalhos para elaborações políticas. Evidentemente, o texto não é de cunho organizacional.
[2] Trecho do poema “Mas, Viveremos” em A Rosa do Povo.
[3] MARTINS, Caio; CORDEIRO, Leonardo. Revolta Popular: o limite da tática. Passa Palavra, 27 de maio de 2014. Disponível aqui.
[4] CAIO; SIMONE. Democracia de base sem trabalho de base? Passa Palavra, 02 de fevereiro de 2015. Disponível aqui.
[5] IASI, Mauro Luis. Democracia de cooptação e o apassivamento da classe trabalhadora. Partido Comunista Brasileiro, 18 de março de 2013. Disponível aqui.
[6] CORRÊA, Ana Elisa; CORDEIRO, Leonardo. Reorganizar para gerir: o ensino público como indústria. Passa Palavra, 08 de dezembro de 2015. Disponível aqui.
[7] MARX, Karl. O 18 Brumário de Luís Bonaparte. São Paulo: Nova Cultura, 1988.
As ilustrações no artigo são telas de Gustave Courbet.
“seria possível operacionalizar uma curva que partisse de uma organização autonomista marcada pela centralidade da tática e ausência de organização de base (sobretudo que concebesse classe trabalhadora), rumo a uma organização que, sem abandonar o autonomismo, fizesse uma ampla reflexão estratégica e se enraizasse no cotidiano da classe trabalhadora através de trabalho de base?”
Primeiro, saúdo a síntese do debate que o texto se propoe fazer, é uma etapa necessária a de “botar no papel”, longe de ser menor, que deve ser incentivada e praticada por todos os militantes.
O texto aponta bem os impasses recentes, e de repente salta até um tal exército popular, impossível nao gerar um estranhamento pela distância entre os temas, mas por outro lado, creio que aponta à seriedade do pensamento e a intencao de ser consequente com a tradicao revolucionária.
Gostaria entao de apontar uns aspectos muito básicos que me parecem ser os nós que deverao ser destravados para poder dar seguimento ao debate:
“sem abandonar o autonomismo”: afinal, de que autonomia estamos falando aqui? É a autonomia das organizacoes de classe ou das organizacoes políticas? Acaso os partidos reformistas ou leninistas nao sao em si autonomos como organizao? Uma diferenca que deve ser precisada é a questao da autonomia “portas adentro” e a autonomia “portas afora”, que se refere a relacao entre organizacao política e organizacoes da classe (sindicatos, movimentos, soviets…). Essa é a problemática geral a respeito da horizontalidade e seus limites, nessa questao do portas adentro e portas afora.
“trabalho de base”: que me corrijam, mas essa terminologia parece estar associada à democracia crista. Se tratando hoje em dia quase de um arcaismo, seria necessário explicar melhor do que se trata. “Organizar as bases” como um pastor organiza as ovelhas? Porque raios se trata de um “trabalho”? Organizar-nos em nossos próprios espacos de base seria um “trabalho”? Nao é exatamente o que os próprios trabalhadores sempre fizeram para resistir a exploracao?
“classe trabalhadora”: como nao estar enraizado no cotidiano da classe trabalhadora? Alguém ainda acha que no Brasil os jovens intelectuais escapam à proletarizacao e aos regimes de exploracao do resto da classe? Talvez, digo talvez, o desafio nao seja enraizar-se no cotidiano da classe, mas sim no cotidiano das organizacoes de classe, sem burocratizar-se.
Muito boa e necessária reflexão. Uma pergunta que fica é, se nesse momento em que não temos um projeto estratégico que ultrapasse os limites do Projeto Democrático Popular (PDP), por que manter a atuação política nos locais de trabalho e moradia? Talvez um novo projeto formado na critica ao PDP pode exigir uma atuação diferente desta, não?
Os locais de trabalho são o que vão pautar a forma de produzir a vida na sociedade (ainda mais o capitalismo tendo uma tendencia, diferente dos outros modos de produção, de socialização da produção) e onde se apresenta de forma mais central a contradição mais importante do capitalismo que é entre capital-trabalho
Dentro de todos os projetos de esquerda revolucionaria que conseguiram desafiar a estrutura capitalista até hoje feitos, quase todos tinham como pré-requisito a consolidação em locais de trabalho. Isso não é o que caracterizou, geralmente, a diferença entre as estrategias (os locais de trabalho mais importantes podiam ser parte da divergencia entre as estrategias, qual era o papel que essa organização ia ter no processo de ruptura, o papel dessas organziações na construção do socialismo) mas quase todas partiam de um ponto anterior que era necessidade de organização nesses lugares porque a contradição central do capitalismo é a entre capital-trabalho e essa contradição esta dada de forma mais aprofundada nos locais de trabalho (o que eu conheço de estrategia que passou fora de organização de locais de trabalho como pré-requisito pra começar a discussão são os partido-exercito como na china, mas só sei de experiencias que isso conseguiu impactar em lugares em que os traços de desenvolvimento capitalista eram bastante pequenos e nenhum em lugares capitalistas bem desenvolvidos)
Sobre locais de moradia, a conversa é mais complicada e ai acho que passa por um debate estrategico de fato, mas sobre locais de trabalho, pra mim pelo menos, ta dado como um pré-requisito pra qualquer estrategia seria de ruptura dentro do capitalismo
“É fato que dentro do campo autonomista, entre aqueles que compartilham alguma concepção de classe trabalhadora, ela é no mínimo vaga e controversa. Dentro dessa amplitude de concepções uma tem se fortalecido, a de que antes de tudo é preciso “forjar um exército” através das lutas de ação direta. Desse exército sairão os generais que dirigirão as lutas da classe trabalhadora.”
Indo ao encontro dos questionamentos feitos por Lucas. Será que os autores, todos envolvidos na produção, não estão “caindo” no “erro” do bolchevismo? Pois por que organizações de classe e militantes do “campo autonomista” precisam de “generais que dirigiram a luta”?
Salvo “Generais” enquanto metáfora, assim como “dirigir”. O “campo autonomista” está esperando uma série de lideres carismáticos que governam os militantes (soldados) dentro de um rígida hierarquia?
ESTOCANDO PEIDO
Kim III ou trikim, o flatulento bambi norte-coreano disse a que veio: bomba de enxofre (sorry, Disney H-bomb).
Já o “campo autonomista”, saporra continua ao aguardo de melhores dias…