Suas mãos que outrora eram seu instrumento de trabalho agora estão inchadas. Seus olhos lacrimejam o tempo todo… Mas, quem se importa? Por Joelma do Couto [*]
Sentado, prostrado no meio-fio de uma avenida da zona sul da cidade de São Paulo está Seu Adelino.
O olhar está longe, mas não muito. Na verdade Seu Adelino olha um condomínio em construção.
A avenida é a Av. Alceu Mainardy de Araújo. O condomínio é mais um dos condomínios de classe média que estão sendo construídos na região.
Nesta avenida, um dia, Seu Adelino trabalhou como catador de recicláveis. Até que, em uma noite de dezembro, enquanto dormia, a cooperativa onde Seu Adelino trabalhava virou cinzas.
De lá para cá, Seu Adelino, o catador, lutou até onde teve forças para reabrir a cooperativa onde trabalhava. Mas, forças ocultas lutaram com mais força e, como são ocultas, Seu Adelino e os seus companheiros não sabiam contra quem ou contra o que lutavam.
Muitas foram as promessas, dezenas as reuniões, até que um dia Seu Adelino não quis mais participar de mais nada. Hoje, sentado, olha para os prédios e se pergunta: “Eles têm tanto, porque fazem isso com a gente? Pedimos tão pouco”.
Seu Adelino chora, chora e chora tanto. “Vocês não pensam na gente, eu preciso trabalhar”.
Mas seu lamento não é ouvido pelas autoridades. Quase um ano sem trabalho. Humilhado, Seu Adelino sobrevive graças a uma boa samaritana e seu bom samaritano. Mas não é isto que ele quer.
Quer pagar por sua comida, quer uma cama, quer uma vida.
Seu Adelino perdeu as forças, cansou-se. Percebeu que o inimigo é implacável.
Seu Adelino agoniza. Suas mãos que outrora eram seu instrumento de trabalho agora estão inchadas. Seus olhos lacrimejam o tempo todo.
Até da cama onde dormia, dentro da cooperativa, foi expulso, não pode mais sequer chegar perto do portão.
Deixou de freqüentar as reuniões. Deixou de perguntar quando vai abrir, parou de perguntar se vai mesmo abrir.
Seu Adelino, o catador, agoniza.
Seu Adelino, o catador, é o espelho de um país onde quem pode manda, quem não pode…
Seu Adelino, o catador, agoniza.
Seu Adelino talvez não sobreviva até a prometida reabertura da cooperativa.
Mas, quem se importa?
[*] Joelma do Couto é estudante de jornalismo
Trabalhamos muito,Lutamos ainda mais,mas como sabemos, as forças “ocultas”forças que nós conhecemos bem; O capital a ganância,a falta de solidariedade e de escrúpulos dos governantes e de quem contratam para gerenciar os projetos, não se importam com os Adelinos da vida,mas existem pessoas que mesmo não tendo forças para vencer lutam,e continuaram lutando.