Será a tendência, como um agrupamento de setores populares com afinidades determinadas, que aumentará as chances de promover aquilo que se acredita no seio das lutas. A tendência aumentará a capacidade deste determinado setor popular de promover suas idéias e de influenciar, e isso será determinante. Por Felipe Corrêa

Felizmente estamos numa fase em que podemos e devemos experimentar várias formas organizativas, com paciência e generosidade, mas com persistência e espírito crítico. As formas organizativas deverão ajudar e serem facilitadoras na implementação dos objetivos principais. O fazer imediato deve estar profundamente vinculado ao que se quer no futuro.
Gilmar Mauro

A Estratégia

Antes de tratar do assunto do agrupamento de tendência, é importante retomar a estratégia de transformação que defendo. Ela baseia-se em três premissas fundamentais:

1. O capitalismo é uma sociedade de classes e, portanto, a luta de classes um de seus aspectos centrais.

2. As mobilizações dos mais diversos setores de explorados, dominados e oprimidos, ou seja, as lutas populares de massas, são imprescindíveis e, baseando-se no tripé necessidade, vontade e organização, expõem as contradições deste sistema de classes.

3. A transformação desta sociedade deve basear-se no protagonismo destes movimentos, ou seja, no protagonismo do povo organizado, o que diferencia esta estratégia de outras que concebem a transformação feita pelo partido de vanguarda, ou pela ação de minorias descoladas da base (como no caso do insurreicionalismo da “propaganda pelo fato” ou do foquismo, por exemplo).

Desta forma, minha posição é que se deve operar a transformação por meio dos movimentos populares. Onde não há movimentos, o objetivo é organizá-los; onde há movimentos, participar deles e promover uma determinada visão metodológica e programática. Finalmente promover alianças permanentes entre os movimentos, integrando suas lutas e aumentando sua força social. É somente com o acúmulo significativo de força social que é possível aplicar a violência necessária para uma transformação revolucionária.

poder_popularAcumular permanentemente força social, organizando, mobilizando e lutando desde hoje. Aprendendo e ensinando, construindo a nova sociedade dentro desta. Esta construção permanente deve apontar para objetivos de tipo finalista: um processo revolucionário e a construção de uma nova sociedade baseada na igualdade e na liberdade. Ao começar a realizar este processo, alguns dizem que estão construindo a organização popular, outros o poder popular.

A Força Social

A partir desta estratégia, é possível questionar: qual então é a função de um agrupamento de tendência? Se o objetivo é uma transformação pelos movimentos populares, não seria simplesmente o caso de criar e participar destes movimentos?

Acontece que não se pode ignorar a questão da força social. Para se operar uma transformação que aponte para o fim da exploração e da dominação, são necessários movimentos populares muito fortes e que desenvolvam em seu seio as sementes da sociedade futura, assim como foi o caso do sindicalismo revolucionário brasileiro do início do século XX. E sabemos que a maior parte dos setores populares não está organizada e, desta forma, não conseguirá dar conta dos objetivos a serem realizados. Além disso, atualmente, os setores organizados em movimentos não estão, na grande maioria, sendo usados para promover os interesses coletivos e operar uma transformação da sociedade da maneira colocada. Os movimentos estão sendo utilizados para fornecer dinheiro para burocratas não terem que trabalhar; para oferecer recursos para um determinado partido político ou mesmo para promovê-lo; para ser uma fonte de votos para um ou outro político; para constituir base para propostas autoritárias de poder, com lideranças descoladas da base que não a representam; entre tantos outros fatos que constituem problemas para a implementação do projeto de transformação mencionado.

Neste sentido, há dois problemas fundamentais: a desorganização da maioria dos setores populares e, dentro dos setores organizados, a promoção de formas de organização e de programas que não conduzem a uma proposta libertadora de transformação.

É possível dizer, portanto, que se deverá lidar com dois tipos de espaço que estão em permanente disputa. Um espaço social amplo, de trabalhadores (formais, precários, desempregados), moradores de bairros periféricos, e outros setores populares que estão desorganizados e não se mobilizam por uma série de razões. E um espaço social mais restrito, já organizado, dos movimentos mais diversos: sindicais, comunitário, de sem-teto, sem-terra, desempregados etc. E para atuar nestes espaços, que são de disputa – já que esta constitui uma regra em qualquer espaço em que haja conflito de interesses –, é necessária força social. São de disputa, pois entendo que não há “vácuo de poder” em qualquer relação social.

elaopaA idéia da força social é que todos têm uma determinada capacidade de realização, mas que, se ela não for colocada em prática, não vale de nada. Por exemplo: potencialmente a força do povo é maior que a força da classe dominante, mas, como ela não está sendo colocada completamente em prática, não consegue derrotar os dominadores. Então, é necessário colocar esta capacidade, ou seja, esta possibilidade de agir, em prática, transformando esta força potencial em uma força social real. E neste processo, a organização é uma ferramenta imprescindível. A organização proporciona uma conta em que 1 + 1 é mais de 2. Por exemplo: se for necessário carregar uma grande caixa de 200 quilos, quatro pessoas juntas poderão carregá-la, mas se cada uma dessas quatro pessoas for lá, individualmente, e tentar carregá-la, uma depois da outra, não vai conseguir. Isso porque quando as quatro pessoas estão juntas, sua força é maior do que a soma individual da força das pessoas separadas. Outro exemplo: se algumas pessoas querem fazer um protesto em frente a uma prefeitura, podem ir todas juntas, ou uma de cada vez. Qual alternativa terá maior força? Claramente se forem todas juntas.

Então a conclusão neste caso é que, se o objetivo é organizar e participar dos movimentos populares, sempre promovendo determinadas concepções metodológicas e programáticas, é necessário estar organizado. Quanto mais se estiver organizado, maior será a força social e, portanto, mais fácil será para conseguir chegar aos objetivos propostos.

Ter força social não significa impor nada aos outros de maneira autoritária, mas conseguir defender determinadas posições, metodologias, determinados pontos de vista e programas. Ter capacidade de influenciar os movimentos populares e não ser usado por outros setores ou mesmo afastado ou isolado.

A Tendência

Dito isso, é possível explicar o que é um agrupamento de tendência.

levantateTendência é uma organização que poderíamos chamar de político-social, ou seja, é uma organização que agrupa setores populares que possuem afinidade em relação a questões metodológicas e programáticas, mas que não necessariamente possuem afinidades em relação a uma ideologia determinada (marxismo, anarquismo, autonomismo etc.). A tendência, portanto, não é nem uma organização política (partido) e nem uma organização de massas (movimento popular); se dá em um nível que poderíamos chamar de intermediário, entre o político e o social. A tendência reúne militantes que atuam em um ou mais movimentos populares e nos setores desorganizados da população tendo por objetivo promover dentro dos movimentos em que atuam uma metodologia de trabalho e um programa determinado, além de organizar estes movimentos nos mais diversos setores do povo que ainda estão desorganizados. Além disso, ela proporciona um espaço de interação entre os diversos militantes que compartilham visões semelhantes e serve para aumentar a força social de sua incidência nos campos populares, aumentando seu poder de influenciar estes campos e impedindo que outras pessoas ou agrupamentos, que possuem concepções contrárias, possam fazer prevalecer suas visões ou usar outros militantes para atingir seu próprio objetivo. A tendência dá coerência operacional aos militantes que atuam com objetivos claros e bem definidos e constitui a “cara” da militância no dia-a-dia do trabalho social. Diferente de aspirar ser a vanguarda dos movimentos, ela tem a função de fermento e de motor; deve estimular os movimentos populares, garantindo que eles possuam a capacidade de promover suas próprias lutas, tanto reivindicativas (curto prazo), como transformadoras (longo prazo). Os militantes da tendência constituem parte do povo e promovem o protagonismo popular, ou seja, têm por objetivo criar um povo forte.

Portanto, a tendência atua a partir de uma proposta metodológica e programática. Mas afinal de contas, o que é esta “proposta metodológica e programática” que já mencionei diversas vezes?

Uma Proposta Metodológica e Programática

Quando falo que se deve defender uma proposta metodológica e programática, estou dizendo que no atuar, quando se está realizando o trabalho social, deve-se promover uma determinada metodologia e um determinado programa. Mas que metodologia e que programa?

Obviamente, tudo isso é uma construção coletiva, mas já há algumas noções. Primeiramente, sobre uma leitura da sociedade presente, sabendo que uma sociedade de exploração e dominação, como é o caso da sociedade capitalista e de tudo que a envolve, não é desejada. Depois, sabendo que o objetivo é a construção de uma nova sociedade que seja livre e igualitária, onde seja possível viver sem exploração e dominação. Para isso, será necessária uma estratégia que será refletida em um programa, e que responderá como será possível operar esta transformação radical da sociedade.

A estratégia é o caminho que será escolhido para esta transformação, ou seja, uma estrada. E se há um destino definido, é bom que se pegue a estrada correta, pois uma estrada errada levará a um destino diferente. Por este motivo, devemos nos preocupar com os meios que conduzirão aos fins desejados: são os meios que escolhermos (as táticas e estratégias) que conduzirão aos objetivos. Assim, a tática está subordinada à estratégia e ambas estão subordinadas aos objetivos estratégicos. A máxima “os fins justificam os meios” não é verdadeira; são os meios que se escolher que determinarão os fins aonde se chegará. Uma visão programática deve ser construída coletivamente, apontando para uma leitura do presente, os objetivos finalistas e um caminho em grandes linhas para a transformação e é esta linha programática que deverá ser defendida dentro das organizações de massas pelos militantes da tendência.

grito_mtd-rjEm relação às questões metodológicas, podemos dizer que quando se cria movimentos ou se participa deles, é necessário promover uma forma de funcionamento, características determinadas, um estilo de trabalho militante que, no conjunto, constituem meios para atingir os fins desejados. Em linhas gerais, qual é esta metodologia?

– A defesa da força dos movimentos, acreditando que eles não devem ser “ideologizados”, ou seja, não podem permitir a entrada somente de militantes de uma ou outra ideologia ou estar subordinado a uma delas. Ele deve agregar todos que estiverem dispostos a lutar utilizando com critério a necessidade.

– A defesa da ação direta, que acontece quando se faz a política por conta própria, quando se realizam as ações contra a dominação e a exploração, protagonizando as próprias lutas, sem confiar em políticos, representantes ou sem ter quem fale em seu nome.

– A defesa da solidariedade entre as classes exploradas para a luta, sem prevalecer um ou outro setor ou grupo. Neste caso, é importante que se promova uma perspectiva classista que apontará para a crença na luta de classes e para a necessidade de um processo revolucionário protagonizado pelos setores explorados, dominados e oprimidos.

– A defesa da autonomia, ou da independência de classe, desvinculando as lutas do Estado, dos partidos políticos e dos sindicatos burocratizados, entre outros, que querem usar os movimentos para seus próprios fins. Os movimentos não devem ser correias de transmissão de indivíduos, grupos ou organizações.

– A defesa da democracia direta, ou democracia de base, proporcionando a todos e estimulando as tomadas de decisão coletivas, nas assembléias. Nestas, as decisões devem ser tomadas com participação igualitária e sem hierarquia, promovendo objetivos de autogestão das lutas e de articulações pelo federalismo, que ao mesmo tempo em que dão organização e coerência às lutas, respeitam sua autonomia.

– Finalmente, buscar o permanente aumento de força social neste processo da luta de classes, fazendo com que os movimentos populares encarem a proposta dupla das lutas: garantir conquistas para melhorar sua situação e lutar por uma transformação revolucionária de longo prazo, uma construção permanente de organização e poder popular.

A Função da Tendência

Sei que estas propostas diferem muito de outros setores da esquerda que trabalham com os movimentos populares. Por isso, creio ser de suma importância a organização em uma tendência para a promoção destes objetivos programáticos e metodológicos, dando força a esta proposta e agregando permanentemente militantes dos movimentos populares que concordam com estas propostas ou mesmo militantes que têm vontade de realizar trabalho social e que também estão de acordo.

Será a tendência, como um agrupamento de setores populares com afinidades determinadas, que aumentará as chances de promover aquilo que se acredita no seio das lutas, dificultando o atropelamento, as expulsões, os boicotes, isolamentos etc. que são bastante comuns nestes meios. A tendência aumentará a capacidade deste determinado setor popular de promover suas idéias e de influenciar, e isso será determinante.


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8 COMENTÁRIOS

  1. Olá! Já que está etiquetado por reflexões, e eu gosto de reflexões, indagações, interrogações… Vamos começar!

    Eu não tenho costume de citar, mas vou quebrar o protocolo e fazer isso.

    “Felizmente estamos numa fase em que podemos e devemos experimentar várias formas organizativas, com paciência e generosidade, mas com persistência e espírito crítico.

    As formas organizativas deverão ajudar e serem facilitadoras na implementação dos objetivos principais. O fazer imediato deve estar profundamente vinculado ao que se quer no futuro.”

    [Gilmar Mauro]

    Eu pressuponho que quem diz isso tenha uma simpatia por esta proposta, ou pelo menos sinaliza. Mas vamos direto ao ponto:
    gostaria que me apontasse alguma experiência relevante acerca
    deste modelo de organização. Achei interessante, mas do pouco que conheço, e conheço pouco, nunca vi nada igual.

    Para não me estender muito, só dizer que me interessa essa discussão de estratégia e agente poderia prozear neste rumo.

    Até a resposta!

    J. Karpov

  2. Olá,

    Excelente texto, Felipe!

    Repassei suas reflexões para outras listas de email – no qual existem pessoas que atuam em diferentes lutas sociais – e, até aqui, o comentário geral ressalta a riqueza do debate e das contribuições que seu escrito permite.

    Outro ponto destacado, em geral, é a importância de perceber que esse debate não é apenas a expressão de um “ponto de vista isolado” – mas sim fruto de uma rica experiência de atuação e discussão crítica coletiva.

    Existiriam outros pontos a se comentar – mas, por ora, encerro por aqui. E fica o convite de continuarmos esse debate.

    Abraços.

  3. Não ficou claro para mim por que a tendência não é uma organização política (partido) se ela possui uma metodologia e um programa.

  4. Para acrescentar à minha dúvida exposta no comentário acima, escrevo mais um pouco aqui.

    Concordo com as funções, por assim dizer, que a ‘tendência’ viria suprir, em termos de organização, entre outras. Porém se é dito que ela não é “A” organização política (partido), resta a dúvida então de qual seria a função e a necessidade do partido (ou dessa organização política que não seria a tendência). E digo função em termos dos objetivos de transformação social evidentemente.

  5. Neste texto Felipe conseguiu sintetizar muito bem o “conceito de tendencia”, feito que veio em tempo ideal, quando diversas ocorrencias nos setores sociais apontam para urgentes mudanças nos formatos organizativos experimentados até agora pelas correntes de esquerda. Concordando com Gilmar, “devemos experimentar varias formas organizativas” e é tempo de experimentar novas formas organizativas e o “Agrupamento de Tendencia” (ou simplemente “tendencia)” é, ao meu ver, a forma que mais contempla as necessidades organizativas do povo.

    Acredito que um dos maiores beneficios de se organizar em tendencia é a possibilidade de previnir possiveis investidas de partidos (ou qualquer organização ideológica) em aparelhar o movimento social (ou movimentos sociais), forçando-o ao seu programa eleitoral ou até mesmo, quando estes nao disputam eleições, ao seu programa politico, que muita vez caminha em sentido oposto aos anseios populares (leia-se do povo pobre/oprimido/dominado). Outro benificio que o texto aponta é a possibilidade da tendencia “dá coerência operacional aos militantes que atuam com objetivos claros e bem definidos e constitui a “cara” da militância no dia-a-dia do trabalho social”, assim a tendencia atua pontencializando os movimentos já constituídos e fomentando a organização daqueles que se encontram “à deriva” nas reivindicações imediatas (moradia, saúde, trabalho/emprego, educação/cultura, etc).

    É hora de amadurecermos este debate e ainda, conhecermos as atuais experiencias das tendencias em solo brasileiro.

  6. Agradeço aos companheiros pelos comentários e tentarei tratar nesta resposta de todas as questões que foram colocadas.

    Antes de tudo, como colocou Xavier, é importante ressaltar que esta reflexão sobre a necessidade da tendência surge a partir da prática. Na realidade, no Brasil, nossa geração (que atua há pelo menos 10 anos nos movimentos populares) que possui uma concepção determinada de transformação (que, a nosso ver, deve se dar a partir dos movimentos de massa organizados) vem experimentando erros e acertos e esta reflexão da tendência se insere neste contexto de crítica e de autocrítica do que vem acontecendo. Muitos de nós, ao atuar nos movimentos populares, não conseguiram exercer a influência necessária, acabando arrastados pelas lógicas dos movimentos. Então todo o raciocínio da tendência tem por objetivo pensar em um modelo antiautoritário de conceber uma força social capaz de sustentar nossas posições dentro dos movimentos, lidando com as outras forças lá presentes.

    Levando isso em conta, a questão que se coloca é: qual é a melhor forma de organização que tenha por objetivo “criar um povo forte”, que possa ser protagonista de sua própria emancipação, conseguindo a coerência operacional necessária?

    Neste caso, acredito que este modelo de organização deve basear-se em três esferas distintas: movimentos populares, tendências e organizações políticas. Vale ressaltar que neste artigo trato somente do nível da tendência, que é o que estamos promovendo em São Paulo neste momento, com a criação de uma organização deste tipo.

    Esta organização em três esferas/níveis possui como característica uma concepção de organização por círculos concêntricos. Neste caso, os movimentos populares são organizações de massa, que agrupam setores organizados da sociedade, em bases classistas, sob necessidades determinadas (terra, moradia, emprego, etc.), possuem filiação aberta e não necessariamente possuem um programa. A tendência, como nível intermediário, agrupa um setor afim do movimento popular independente da ideologia dos militantes. Neste caso, vale apontar que uma tendência pode atuar em um movimento somente, por exemplo, no movimento sindical ou no movimento sem-terra, ou pode agregar setores afins de diversos movimentos (que é a posição que eu defendo no texto, de uma tendência inter-movimentos). Na tendência estão os militantes que concordam com aquilo que ela propõe – pode, por exemplo, agregar um setor revolucionário dentro do sindicalismo, um setor autônomo dentro de um movimento sem-teto e assim por diante. Portanto, a tendência agrega um setor do movimento; ela pode fazer isso por exclusões mais gerais (excluindo setores reformistas, por exemplo) ou tendo uma metodologia e um programa mais definidos (posição que defendo no texto).

    Respondendo ao Leo, posso dizer em relação à organização política, devemos refletir que hoje, elas me parecem as grandes responsáveis pelo estado em que se encontra a maioria dos movimentos populares. A maioria dessas organizações, ao invés de terem este objetivo de criar um povo protagonista da transformação social, colocam-se acima desses movimentos e utilizam-no como correia de transmissão – para fontes de votos, captação de quadros, estímulo ao reformismo, ao colaboracionismo de classe, e muitas vezes fazendo com que o partido substitua a classe e estimulando a subserviência – um povo fraco e incapaz de promover a transformação.

    Assim, para este projeto de transformação que defendo, a meu ver, só se pode pensar em uma organização política que não tenha caráter de vanguarda, e que não enfraqueça o povo organizado nos movimentos populares. Uma organização política que queira criar um povo forte só pode ter função de motor e fermento das lutas populares, tendo por objetivo criar protagonismo popular e não protagonismo de sua própria organização ou alienação popular.

    Se assim concebida, a organização política pode trabalhar junto com a tendência, diferenciando-se dela por exigir maior disciplina dos militantes e organizar-se como partido de quadros e não de massas – ainda que de maneira antiautoritária. No caso da tendência estar somente em um movimento, a organização política pode ajudar nesta conexão dos movimentos e lutas; no caso da tendência ter um programa mínimo, por exemplo, agrupando revolucionários dentro de um movimento, a organização política pode estimular que se aprofundem a metodologia e o programa. A organização política deve ter um programa completo e metodologias a serem aplicadas no nível social (massas) e pode ainda auxiliar em análises de cojuntura, método de análise, concepção/aplicação de violência, no acúmulo das experiências de luta, na formação política (educação), no estímulo a uma cultura classista, impulsionando os objetivos revolucionários, e em caso de uma revolução auxiliando na defesa da revolução, e também na implantação do socialismo libertário. Essa me parece uma questão importantíssima, visto que a revolução não será feita somente pelos libertários e, neste contexto, é importante que a organização política consiga fazer com que a sociedade futura tenha a coletivização dos meios de produção, que se organize debaixo para cima e que a autogestão e o federalismo sejam plenamente implementados.

    Dessa forma a idéia é que a organização política estimule a tendência e que esta estimule os movimentos populares, em um movimento concêntrico que tem por objetivo fazer do povo o principal ator de suas lutas, conquistas, de curto e longo prazo.

    Em termos de experiência prática, respondendo ao Karpov, poderíamos citar algumas. Primeiramente, a que mais nos inspirou, desenvolvida no seio do movimento sindical uruguaio dos anos 1960 e que foi a partir de 1968 animada pela Resistencia Obrero-Estudantil (ROE). O que se chamou “Tendência Combativa” reunia o setor revolucionário e mais combativo do sindicalismo com o objetivo de estimular a ação direta popular e promover a participação das pessoas no sindicato e em suas lutas. Havia participação de militantes sindicais diversos tais como indústria da borracha, gráficos, bancários, gás, porto, indústria metalúrgica, têxteis, indústria química, refinarias de petróleo, transporte, sanidade, indústria alimentícia, ferrovias, entre outros.

    No Brasil, creio que alguns exemplos podem ser citados, mas me parece bastante interessante o caso da Resistência Popular – em especial sua atuação no RS – com participações significativas nos movimentos de catadores, comunitários, estudantis e mais recentemente, no sindicalismo. Tivemos uma experiência interessante no RJ no movimento sem-teto com a Frente Internacionalista dos Sem-Teto (FIST) que funcionou alguns anos como uma tendência. Mas enfim, podemos dizer que é algo que está sendo experimentado e cujos resultados estão ainda sendo observados, mas as poucas experiências parecem caminhar para algo interessante.

    Finalmente, concordo com o Sassá. A tendência, a meu ver, dará coerência operacional aos militantes, e possibilitará a promoção desta concepção de luta que estou defendendo.

  7. “Se assim concebida, a organização política pode trabalhar junto com a tendência, diferenciando-se dela por exigir maior disciplina dos militantes e organizar-se como partido de quadros e não de massas – ainda que de maneira antiautoritária. No caso da tendência estar somente em um movimento, a organização política pode ajudar nesta conexão dos movimentos e lutas; no caso da tendência ter um programa mínimo, por exemplo, agrupando revolucionários dentro de um movimento, a organização política pode estimular que se aprofundem a metodologia e o programa. ”

    Felipe, tenho a intenção de polemizar mesmo. Pela sua resposta, que destaco acima, sou levado mais uma vez a crer na falta de necessidade da ‘organização política (partido)’, já que vc aborda no que ela poderia eventualmente ajudar em algumas hipóteses, mas não aponta nada que justifique sua existência como necessidade. Ao contrário, o texto trabalha as necessidades de organização para transformação social que levam à necessidade de um agrupamento que vc chamou ‘tendência’. Em suma, não há fundamentação análoga para a necessidade de um partido, ou de partidos (como organização política exterior à ‘tendência’).

    É preciso que as pesosas que comunguem metodologias, objetivos e programa estejam organizadas. Disso decorre a necessidade de um agrupamento, posso entender. Mas continuo sem estar convencido do que dissso decorreria a necessidade de duas organizações (que vc chama de tendência e de partido).

  8. Não lembro agora o nome do partido (sentido amplo), mas identifico na discussão uma relação com a AIT, que convergia xs trabalhadorxs porém Bakunin estava organizado em um partido que tinha por proograma a internacional de maneira aprofundada, ele diz que o Ateismo, por exemplo, nao havia sentido de estar na internacional, já que iria provocar rupturas, o que não era interesante. E nao te-lo no programa da internacional era aceitavel já que congregava xs trabalhadorxe cristão revolucionarios, que nao tinham porque estar fora desta. No partido o programa era desenvolvido e aí estava o Ateismo, por exemplo.

    Outra questão é a violência, esta pode exigir uma atividade secreta da organização, o que nao pode acontecer na tendencia e sim no partido (sentido amplo).

    A questão do sigilo do partido é imprescindivel para mim, o que não se aplica aos partidos burgueses já que estes tem por meta a auto-promoção.

    Em recentes discussoes no ME o tema da organização de vanguarda foi extremamente relevada. Este é um carater central nos partidos políticos e que, para mim, faz total diferença entres estes e a este tipo organização política discutida pelo Felipe.

    Creio…ehhe

    abraços anarquicos!

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