Chacina do Borel: como a Justiça demora quando as vítimas são negras e pobres (Manifestação no julgamento, 29/09)

 

No próximo dia 29/09 irá a julgamento o  policial militar Paulo Marco da Silva Emilio, acusado pelo assassinato, em 16/04/2003, de quatro jovens na favela do Borel, na Tijuca, no episódio que gerou grande mobilização popular e ficou conhecido como Chacina do Borel.

A luta dos familiares das vítimas, da comunidade e de movimentos em defesa dos direitos humanos conseguiu o que na época ainda era raro: levar policiais envolvidos em execuções sumárias a responderem por seus crimes. Cinco PMs foram denunciados por homicídio e tentativa de homicídio. Entretanto, receberam um apoio muito suspeito, e contrataram para sua defesa Clóvis Sahione, um dos mais caros e polêmicos advogados do Rio de Janeiro, acostumado a usar todo tipo de manobras e subterfúgios legais e ilegais para defender acusados em casos graves de assassinatos e corrupção, como o general Newton Cruz, o médico Hosmany Ramos, a atriz Dorinha Duval e o fiscal de renda Rodrigo Silveirinha, principal acusado no escândalo do propinoduto. Mais tarde, os policiais contrataram outro advogado muito caro, Amaury Jorio.

Contando com essa “equipe de defesa” e com o preconceito social contra a favela, os negros e os pobres, que se reflete na opinião dos jurados, os policiais conseguiram inicialmente se livrar da justiça. Dois PMs (Sidnei Pereira Barreto e Rodrigo Lavandeira Pereira) foram absolvidos nos primeiros julgamentos, outros dois (Washington Luís de Oliveira Avelino e Paulo Marco da Silva Emilio) conseguiram adiar diversas vezes  o julgamento. Somente em 18/10/2006 veio a primeira condenação, do cabo PM Marcos Duarte Ramalho, sentença confirmada em segundo julgamento, mas que recentemente, em março de 2009, foi anulada por decisão da 5a Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio, contrariando o parecer da relatora, a desembargadora Maria Helena Salcedo. O novo julgamento de Ramalho ainda não foi marcado.

Os policiais que executaram os quatro jovens e quase mataram um quinto, dispararam com armas de grosso calibre (fuzis) a pouca distância, o que é uma técnica habitualmente utilizada nas execuções sumárias, pois desta maneira os projéteis atravessam os corpos e não ficam alojados como prova. Mesmo assim, os exames cadavéricos e os laudos balísticos executados pela perícia conseguiram recuperar pequenos fragmentos nos ossos das vítimas e provar que os tiros partiram das armas de alguns dos policiais. Uma das armas cujo exame balístico foi positivo foi usada no crime pelo PM Emilio, que será julgado no dia 29. Todas as provas e evidências apontam para sua condenação, a não ser que mais uma vez as manobras dos advogados e o preconceito levem a melhor.

Apesar de tudo, a luta por justiça no caso do Borel marcou época na mobilização das favelas contra a violência policial, o preconceito e a segregação. Junto com a luta de outras mães e familiares, mudou o quadro de impunidade de crimes do Estado no Rio de Janeiro, e hoje acontecem em média dois ou três julgamentos e audiências por mês de policiais acusados de homicídio, algo impensável há sete anos atrás. A mobilização para a manifestação que lembrou um ano da chacina, em 2004, reuniu vítimas e lutadores, e permitiu o nascimento da Rede contra a Violência, movimento social que hoje é referência na luta contra a violência estatal contra as comunidades pobres, no Rio e no Brasil. Independentemente do resultado do próximo julgamento, essa é uma conquista que nenhum advogado caro ou nenhum júri preconceituoso poderá diminuir.

Nossa luta é a uma demonstração de que contra o preconceito, muitas vezes estimulado pelos grandes meios de comunicação, e contra os esquemas corruptos que protegem agentes do Estado e seus superiores, apenas a solidariedade e a mobilização social podem conseguir vitórias.

Por isso convidamos todas e todos a estarem mais uma vez presentes ao julgamento, e à manifestação que realizaremos antes, às 10h, em frente ao Fórum do Rio (Av. Pres. Antônio Carlos). O julgamento será às 13h no 2o Tribunal do Júri.

Mais informações:

Dalva (mãe de Thiago da Costa Correia da Silva, uma das quatro vítimas da chacina) – tel. 9966-4028

Rede contra a Violência – tel. 2210-2906

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