O movimento contra o aumento da tarifa de ônibus se acorrenta para exigir uma negociação, a  Prefeitura responde com bombas, mas o movimento não se dispersa. Por Passa Palavra

Bombas de efeito moral, balas de borracha, cassetetes e spray de pimenta. Esses são os principais ingredientes que recheam as reportagens publicadas na grande imprensa sobre o Sexto Ato Contra o Aumento das Tarifas em São Paulo. De fato, a manifestação foi mesmo dura e violentamente reprimida pela Polícia Militar do Governo do estado. Mas, para além dessas imagens de brutalidade e agressão, é possível assegurar que esse ato representou para o movimento que luta pela redução das tarifas de ônibus na capital mais um passo decisivo na sua mobilização contra o aumento.

Antes disso, no entanto, é importante retomar um pouco dos acontecimentos daquela quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011.

A luta se expande para outras espécies
A luta se expande para outras espécies

Foi um dia bem agitado. A negociação com o Executivo para discutir a revogação da tarifa, conquistada após a Audiência Pública, estava marcada para as 10h30 da manhã no Museu dos Transportes. No entanto, apenas os representantes do movimento e os vereadores compareceram ao encontro. A Prefeitura e a Secretaria de Transportes de São Paulo  simplesmente não compareceram – mesmo depois do Presidente da Câmara dos Vereadores garantir o estabelecimento de uma agenda de negociações entre o Poder Executivo e os manifestantes.

Diante dessa negativa, os manifestantes não se deram por satisfeitos – e, assim, decidiram se deslocar até a Secretaria Municipal dos Transportes. Nesse local, exigiram a presença do representante em exercício e foram recebidos pelo Secretário-Adjunto Pedro Luiz Machado. O Secretário-Adjunto alegou que não havia sido informado sobre aquela reunião marcada com os vereadores e manifestantes. Além disso, Machado assegurou que não poderia solucionar a questão do aumento da tarifa – já que essa medida seria de competência exclusiva do Prefeito Gilberto Kassab. Mais uma vez, o diálogo com os manifestantes foi negado por parte do poder público.

Mesmo com todas essas tentativas de enfraquecer a mobilização, o movimento contra o aumento das tarifas decidiu surpreender com uma ação direta ousada e bem sucedida. Às 12h30, seis manifestantes ocupam a Prefeitura de São Paulo e se acorrentam nas catracas de seu saguão principal. Os guardas não conseguiram evitar o acorrentamento e decidiram fechar imediatamente as portas principais do recinto. Dessa forma, integrantes do movimento, e mesmo vereadores, foram inicialmente impedidos de conversar e se aproximar das pessoas que estavam acorrentadas no interior da Prefeitura Municipal. Os manifestantes avisavam que, diante das tentativas frustadas de diálogo e negociação com o poder público, o acorrentamento tinha como função justamente conseguir de fato uma reunião com o prefeito Gilberto Kassab.

Com esse impasse instaurado pela ação, Antonio Carlos Maluf – Secretário de Relações Institucionais da Prefeitura – decidiu conversar com alguns dos manifestantes que estavam presentes naquele local. Para surpresa geral, Maluf disse também não ter conhecimento de qualquer reunião marcada com o Executivo para a presente data, apesar da garantia do vereador Police Neto. Como tentativa de encerrar aquela movimentação intensa na Prefeitura, o Secretário de Relações Institucionais pediu ao movimento que saísse da Prefeitura para que as conversas pudessem se reiniciar. Ele disse, literalmente, para que tudo “começasse do zero” – tratando assim o acorrentamento como um caso isolado. Os integrantes do movimento não aceitaram sua proposta – já que aquela ação era parte de uma mobilização muito mais ampla, de um mês, que vem crescendo nessas últimas semanas e conquistando várias vitórias. Ou seja, o movimento pela revogação da tarifa estava longe de começar do zero.

Acorrentados
Acorrentados

O tempo passava – e, do lado de fora, vários manifestantes informavam a população sobre o acorrentamento que estava acontecendo naquele instante. O ato começaria só às cinco da tarde, mas já bem antes do horário o número pessoas em frente à Prefeitura não parava de aumentar. Todos queriam prestar solidariedade e divulgar a luta – que estava se radicalizando ainda mais com essa ação. Após um certo período de espera, Malufe informa que é possível sim uma reunião entre o Executivo e os manifestantes. Os detalhes sobre esse encontro seriam passados por ele mesmo, uma hora depois.

A expectativa crescia. O horário da manifestação se aproximava e as pessoas já começaram a se aglomerar na frente da Prefeitura. As pessoas acorrentadas demonstravam cansaço e perseverança entre elas – e resistiam ao forte calor e represálias da Guarda Civil Metropolitana, que não queria deixar utilizarem sequer o balde como banheiro. Duas horas se passaram, desde que o Secretário afirmou que a reunião seria marcada. E, como sempre, nada de resposta alguma. Nesse instante, os vereadores informaram que o diálogo com o Executivo havia sido cortado. Não existiam alternativas, ao que parece. O horizonte das negociações futuras estava, naquele exato momento, tão fechado quanto a própria entrada da Prefeitura.

Do lado de fora, a animação corria solta. O ato começava a crescer e as pessoas estavam animadas – panfletando nos transportes coletivos e espalhando a notícia do acorrentamento. A Bateria do Movimento Passe Livre São Paulo se atrasa um pouco dessa vez. Mas, quando chega, é aplaudida com entusiasmo pelos manifestantes, que gritavam palavras de ordem para pressionar o Executivo por negociações. As pessoas não conseguiam se aproximar da Prefeitura – e o cordão policial começava a ficar de prontidão.

Celebrando o dia nacional de luta contra o aumento, uma catraca foi queimada do lado de fora da Prefeitura. As pessoas se aproximam das grades do prédio exigindo que se abra negociação. A proteção das grades não resiste e cai. Alguns manifestantes avançam, outros não. Nesse momento, a Guarda Municipal começa a despejar spray de pimenta e a dar borrachadas nas pessoas, que ainda assim se mantinham na frente da Prefeitura.

Atingiu a bateria
Atingiu a bateria

A partir de então, a Polícia Militar entra em ação. Lança bombas de gás e de efeito moral. Avança com escudos e tenta dispersar completamente a manifestação. A repressão foi democrática, atingiu homens, mulheres, adolescentes, adultos, idosos, vereadores, todos que lá estavam foram alvos.

Conseguimos, no entanto, surpreender o poder público e as forças repressivas; reorganizando várias vezes o ato e  voltando para frente da Prefeitura. Foi um momento de muita emoção quando o ato retornou para prestar solidariedade aos que continuavam acorrentados.

Depois de uma conturbada assembléia em frente à Prefeitura Municipal, e de horas de negociação para a saída dos militantes, a Guarda Civil Metropolitana cortou as correntes. Os militantes saíram pela entrada principal e foram recebidos com festa pelos que continuaram na porta até às 23h30. O sentimento coletivo era de que a luta continua e será maior.

O ato demonstrou a capacidade de organização do movimento, ao conseguir retomar a manifestação mesmo depois da repressão inicial. Ainda, nesse mesmo sentido, pode-se destacar a persistência dos manifestantes – do lado de dentro da Prefeitura e de fora, nas ruas –, que aguentaram com muita festa e perseverança um dia longo de luta e ações.

Como destacou o MPL em sua nota sobre o dia, a disposição do movimento foi a de diálogo, quem fechou as portas da negociação e iniciou a repressão foi o Poder Público.

Bala de Borracha
Bala de Borracha

Mesmo diante dessas tentativas de calar as manifestações, o movimento segue forte. Ao mesmo tempo em que lamenta as sucessivas negativas ao diálogo, o Movimento Passe Livre avisa que é somente “com pressão que as conquistas se fazem, esta continuará nas ruas, e será cada dia maior, uma vez que cresce a indignação popular com a forma pela qual estamos sendo tratados”. Por esse motivo, uma nova manifestação está marcada para o dia 24 de fevereiro, quinta-feira – com concentração a partir das 17 horas. Dessa forma, o movimento segue – na sua obstinada e incansável luta pela revogação do aumento da tarifa em São Paulo.

Fotos: Douglas Belome e Luiza Mandetta

4 COMENTÁRIOS

  1. Bravo ! MPL…gênial, Amanhã vai ser MAIOR…assim como o transporte há várias coisas que são muito injustas para o povo neste País, espero que os que estejam vendo e participando do movimento tenha um ideal parecido para lutar por seus direitos e assim avançar contra a corja de corruptos que estão na Administração deste manipulado País…

  2. Que as manifestações não pare por aí! Aqui em goiânia está começando um tímido movimento, mas ainda falta muito. A indignação é espontânea, mas as pessoas ainda não tomaram consciência de protestar para transformar a realidade

    Mas que o MPL não pare por aí, para que possa reverberar mais e mais, ser exemplo para outras regiões.

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