Por Camille Boudjak
Enquanto os operários da PSA Aulnay estão em greve desde 16 de Janeiro contra os despedimentos [demissões], a administração trama uma imensa campanha, retomada pela imprensa e por burocratas sindicais mais próximos de Varin [1] do que das oficinas. A violência na PSA consiste não apenas nos despedimentos e na exploração, mas também na criminalização dos grevistas: lock-out, seguranças à porta da fábrica, convocação de seis trabalhadores pela Segurança Territorial[uma das várias polícias], convocação de quatro trabalhadores para um encontro prévio com o fim de despedimento e com afastamento preventivo da empresa de efeito imediato, etc. – eis os métodos de Varin e da família Peugeot.
Em 31 de Janeiro, a administração da Goodyear anunciou ao Comité Central da Empresa [2] a sua vontade de fechar a fábrica de Amiens-norte, ameaçando assim o emprego dos 1.250 operários, sem contar os 4.000 empregos indirectos.
Nas indústrias do automóvel
De uma crónica de Bernard Jullien, director do GERPISA, rede internacional de investigação sobre a indústria automóvel e conselheiro científico da cadeira de Gestão de Grupos das Redes do Grupo ESSCA:
Marchionne [presidente da Fiat e da Chrysler], que não se cansa de repetir que há demasiadas fábricas na Europa, decidiu produzir o seu novo Fiat 500L na fábrica de Kragujevac, na Sérvia. A Fiat comprometeu-se a investir 700 milhões de euros (dos quais 500 que lhe foram dados pelo Banco Europeu de Investimentos) para que a fábrica esteja em condições de vir a produzir 200.000 veículos. A fábrica e os seus terrenos foram-lhe fornecidos gratuitamente, instalaram-lhe zonas francas para importar mercadorias sem gastos aduaneiros, a FAS [a Fiat-Sérvia] – possuída 67% pela Fiat e 33% pelo Estado sérvio) está isenta de impostos locais durante dez anos, foram-lhe também fornecidos gratuitamente terrenos para 14 outras empresas do grupo Fiat e o Estado sérvio comprometeu-se a concluir uma ligação à autostrada E-75 para facilitar as exportações da FAS.Mesmo tendo os trabalhadores sérvios conseguido este mês um aumento de 13% dos salários que andam pelos 300 euros por mês , esta dinâmica e o eco que ela tem nas negociações dos acordos de competitividade dos grupos franceses em França estão no cerne das interrogações suscitadas pela conjuntura de 2013 e o modo de a enfrentar na Europa. Convidado nesta semana a dar uma perspectiva geral pela IndustriAll (antiga FEM) [Confederação sindical transeuropeia no sector das grandes empresas de manufacturas, mineração e energia] para o seu congresso do automóvel, pude dar conta de como os sindicatos sofrem na Europa para resistir à guerra de todos contra todos que esta Europa promove com um real voluntarismo político. Na verdade, o caso sérvio mostra que não estamos apenas enfrentando o simple jogo de forças do mercado numa Europa aberta: a deslocalização das produções e a abertura à concorrência sistemática das unidades fabris são apoiadas e subvencionadas por uma União Europeia que deixa de detestar as subvenções e as ajudas públicas quando se trata de ir mais longe na senda da desvalorização do discurso social.
Há cinco anos que a empresa tenta fechar a fábrica de Amiens-norte e há cinco anos que os trabalhadores do estabelecimento resistem, lutam e conseguem fazer recuar a administração. Se a fábrica ainda existe, se os trabalhadores ainda conservam o seu emprego, é graças a anos de mobilização. Todavia, após o anúncio do projecto da administração, o novo secretário-geral da CFDT Laurent Berger denunciou, não os patrões que despedem, mas os trabalhadores da Goodyear e a sua secção CGT [3] por andarem a lutar há anos por manterem os seus empregos. Resumindo, se a direcção da Goodyear hoje ameaça fechar a fábrica e despedir os trabalhadores, seria por estes últimos não terem aceitado nem os precedentes planos de despedimentos nem a degradação das condições de trabalho! Para continuarmos na Picardia [4], a verdade é que toda a gente se lembra de como acabou a fábrica Continental de Clairoix, onde a direcção tinha imposto “trabalhar mais para ganhar menos” assim prometendo “salvar os empregos”.
Na PSA como na Goodyear assiste-se à odiosa campanha contra quem levanta a cabeça, contra as trabalhadoras e os trabalhadores que lutam e as suas organizações sindicais. Certa imprensa ao serviço do MEDEF [5] dá eco a esta campanha e prefere denunciar os operários em luta do que os patrões que despedem para aumentar os lucros, mas isso não é novidade. A vergonha é que haja responsáveis sindicais que, pretendendo-se representantes dos trabalhadores, deem voz a essa campanha! Há que reparar, entre os ataques contra os operários da PSA e da Goodyear, na filiação política (Lutte Ouvrière e PCF) de militantes dessas fábricas… É preciso lata [cara de pau] para denunciar o compromisso político de militantes operários combativos e dar a entender que a complacência com o patronato seria “apolítica”, quando o antigo líder da CFDT acaba de receber do governo uma sinecura paga de 7.257,55 euros líquidos por mês!
No seguimento das declarações do líder da CFDT, Luc Bérille, secretário-geral da UNSA [6], denunciou por sua vez uma “estratégia de luta de classes” que pretende fazer “convergir” as lutas dos trabalhadores das diferentes empresas. Exactamente! Não apenas a luta de classes é mesmo uma realidade – e o MEDEF mostra-o todos os dias na sua guerra social contra a classe operária -, como a unidade dos trabalhadores contra os despedimentos e os ataques patronais, pelos salários e a melhoria das condições de trabalho, é uma necessidade. É o que bem sabem quantos hoje, sindicalizados ou não, se batem na Ancelor Mittal, na PSA, na Sapofi, na Goodyear, na Virgin ou noutras empresas.
Vários sindicatos assinam com a empresa um “acordo de mobilidade”, deixando isolados os grevistas da CGT
Actualização em 3 de Março de 2013Reunido em 15 de Fevereiro, o Comité de Empresa votou a favor de um “acordo de mobilidade” proposto pelos patrões, por 18 votos a favor (CFE-CGC, FO, CFDT, SIA, CFTC) e 2 votos contra (CGT). Esse acordo visa afectar à fábrica de Poissy [cerca de 50 km a oeste de Aulnay] trabalhadores não-grevistas da fábrica de Aulnay. Os dirigentes da empresa insistem agora no estafado argumento de que “uma minoria de trabalhadores impede os outros de trabalhar, cerceando a liberdade de trabalho”. Denis Martin, director de produção da PSA, afirma que, para a empresa “a negociação está terminada, e não voltaremos ao assunto”. O plano de restruturação da empresa prevê, a partir de abril, o fecho da fábrica de Aulnay e o despedimento de 1.400 trabalhadores em Rennes.
Notas
[1] Philippe Varin, actual presidente da administração do grupo PSA-Peugeot-Citroen.
[2] Comité Central d’Entreprise, cuja existência é obrigatória em empresas com estabelecimentos múltiplos. É presidido pelo presidente da empresa, ou um seu representante, que pode fazer-se assistir por dois colaboradores, e por representantes dos assalariados eleitos nas várias empresas ou filiais do grupo. Nele também participam, mas sem voto deliberativo, representantes dos sindicatos com filiados na empresa.
[3] A CGT (Confédération Générale du Travail), ligada ao Partido Comunista Francês, é a maior central sindical francesa. A CFDT (Confédération Française Démocratique du Travail) é a segunda maior e tem origem em sectores cristãos e social-democratas moderados.
[4] Região administrativa francesa onde se encontra a cidade de Amiens, a norte de Paris.
[5] Mouvement des Entreprises de France, principal organização de empresas francesa, que agrupa os seus dirigentes.
[6] Union Nationale des Syndicats Autonomes, que agrupa boa parte dos sindicatos de funcionários do Estado e dos serviços públicos, incluindo a educação. Resultou de cisões na CGT em 1948.
Tradução e notas do Passa Palavra.