Por Professores Independentes

 

A greve dos professores do estado de São Paulo foi encerrada no último dia 10 de maio por uma manobra de toda a burocracia sindical. Esse texto procura levantar algumas questões sobre esse processo, que culminou num intenso enfrentamento entre os professores independentes e a diretoria do sindicato.

Em primeiro lugar, é preciso situar a Associação dos Professores de Ensino Oficial do Estado de São Paulo – APEOESP. Com 180 mil sócios e representação em 93 regiões (subsedes) do estado, é hoje um dos maiores sindicatos da América Latina, com arrecadação na casa dos milhões de reais. Não há novidade alguma em afirmar que os sindicatos estão engolidos pelo Estado e pelo capitalismo – no Brasil, sabemos que desde Vargas isso é uma realidade. A APEOESP não é uma exceção. Uma notícia veiculada pelo próprio Sindicato registra que a presidenta Maria Izabel Noronha tomou posse como Vice-presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação – CNE [1]. Ou seja, a representante dos trabalhadores faz parte da máquina estatal, da qual deveria exigir e cobrar. Estamos em um cenário em que a inter-relação entre governos, patrões e sindicatos ganha cada vez mais espaço, assim como o processo de judiciarização das lutas [2]. Os trabalhadores são conclamados a… confiar na burocracia, que está sempre entrando com providências jurídicas, movendo ações, fazendo tudo que é necessário para garantir direitos e conquistas. (E, no entanto, os direitos não são garantidos, muito menos as conquistas.)

Temos, então, a greve que a categoria acaba de protagonizar. Ela é encaminhada, desde o início, de cima para baixo: proposta pela direção majoritária (Artsind – CUT/ PT) e aprovada na V Conferência Estadual da Educação, em novembro de 2012 [3]. A Conferência é controlada pelo PT, que traz a maior parte dos delegados. Uma greve é marcada, portanto, meses antes, por iniciativa da direção majoritária, em uma instância não-deliberativa (uma Conferência), passando por cima de toda a base da categoria. Os setores da Oposição Alternativa (PSTU, Conspiração Socialista e outros), Unidos pra Lutar, Trabalhadores na Luta Socialista (TLS) e Na Escola e na Luta (os dois últimos como braços sindicais do PSOL) buscam denunciar esta manobra, sendo acusados espertamente pela direção de “não quererem construir a mobilização”. A greve aconteceria de qualquer jeito – e fica nítido desde o início o objetivo eleitoreiro do PT, que deveria desgastar o governo do PSDB em São Paulo, seu principal concorrente nas eleições estaduais de 2014.

Em 15 de março, então, é realizada uma assembleia para referendar a “decisão” da Conferência, aprovando um “indicativo” de greve. Marca-se uma assembleia para 19 de abril, mas a data do início da greve não é consensual, devido à incompatibilidade das agendas partidárias em disputa: o PT defende o início da greve para 22 de abril (já no dia letivo posterior à assembleia de 19), visando estrategicamente o desgaste dos tucanos. Já o PSTU, grupo majoritário da Oposição Alternativa/ CSP-Conlutas, tinha uma manifestação de sua central sindical marcada para o dia 24 de abril, em Brasília [4], e fica em um mato sem cachorro: como construir, ao mesmo tempo, o início da greve e a manifestação de seu grupo político? Sustentam, assim, uma falsa preocupação em adiar a paralisação alguns dias para fazer “um maior trabalho de base” e defendem o início da greve junto com sua ida a Brasília. Perdem a votação, e conta-se que em muitas subsedes da APEOESP a principal preocupação da oposição era chamar para o ato em Brasília, “esquecendo” de convocar o conjunto da categoria à assembleia para decidir sobre a greve.

Em 19 de abril, finalmente (e apesar dos interesses partidários), a greve da categoria é aprovada, em uma assembleia com cerca de 20 mil professores [5].

É um resto de toco, é um pouco sozinho

As principais reivindicações são de reposição das enormes perdas salariais, aumento real de salário e estabilidade para toda a categoria. Este último ponto merece destaque. Uma vez estabelecida a divisão da categoria em efetivos, “F” e “O”, além do eventual (“V”), o governo intensificou a precarização do trabalho docente. Os professores efetivos são aqueles aprovados em um dos poucos concursos realizados. Os professores categoria “F” são aqueles que eram “OFAs” (Ocupantes de Função-Atividade) antes de 2007 e agora gozam de certos benefícios dos efetivos, como o direito a 6 abonos por ano, estabilidade estatutária de funcionário público e a garantia de ter 10 aulas semanais no início do ano, sendo o restante da jornada atribuído depois dos efetivos. Já o professor de categoria “O” vive numa situação de extrema precariedade, uma vez que seu contrato é válido somente até o último dia letivo de dezembro, possuindo o direito a apenas 2 abonos de ponto por contrato. Sendo demitidos em dezembro e recontratados em fevereiro, não têm direito às férias, recebendo o 1° salário novamente apenas em março ou abril. Ou seja, passam meses sem receber (recebem em média 10 salários por ano). Não são estatutários nem celetistas e não possuem sequer os direitos de um trabalhador terceirizado, sendo regidos pela Lei Complementar 1093/09, sancionada pelo governador José Serra. Ao contrário dos demais servidores, não têm direito a assistência médica pelo IAMSPE e precisam se submeter a um processo seletivo todos os anos – ou seja, precisam “passar no concurso” todos os anos. Se não passarem, também “pegarão” aulas (pois há falta de professores), mas serão taxados de “reprovados”. A vida de um professor de categoria “O” é feita de humilhações cotidianas.

Esta forma absolutamente precarizada de contratação já alcança hoje mais de 48 mil professores, o que constitui quase 1/4 da categoria. A situação em si é ilegal, contradizendo a própria Constituição Federal, que estabelece em seu art. 37 que as contratações temporárias apenas atenderão à necessidade “de excepcional interesse público”, ficando claro o seu caráter de exceção. Estes professores, em sua maioria jovens, marcaram presença na mobilização, ao contrário das expectativas da burocracia.

Logo na primeira semana o secretário de educação, Herman Voordwald, chamou a direção do sindicato para negociação. Aquilo que parecia acenar a um acordo foi somente um jogo para o governo dizer que abriu negociações, onde na verdade nada foi negociado [6].

A segunda assembleia, realizada em 26 de abril, demonstra um amplo apoio do professorado, com uma mobilização de mais de 20 mil manifestantes que ocupam a Av. Paulista, descendo pela Av. Consolação e chegando à Secretaria de Educação do estado, na Praça da República. Até então, o discurso levado pelas diversas forças políticas nas escolas é o de fortalecimento da greve e do Sindicato. Neste sentido, situação e oposição estão unidas, lutando contra os desmandos do governo estadual. Porém, este cenário começa a mudar com o estouro da luta dos professores municipais de São Paulo.

O mês de maio começa com 2 assembleias realizadas simultaneamente. No centro estão os professores do município de São Paulo, que declaram greve contra o governo municipal após o absurdo anúncio de 0% de reajuste para o ano de 2013. Apenas alguns quilômetros adiante, na Av. Paulista, estão os professores estaduais também paralisados, realizando sua 3ª assembleia.

A assembleia dos servidores municipais decide pela unificação das lutas, e os professores caminham em direção à Praça da República, esperando pelos colegas da rede estadual. Na Paulista, os professores enfrentam uma assembleia atrasada em mais de 2 horas em seu início, com dezenas de falas inscritas pela Articulação, que se repetem e repetem. Vaias estrondosas começam a ser ouvidas, além de um grande coro pela unificação. Os professores exigem que a assembleia se encerre e que se caminhe ao encontro dos professores municipais. O objetivo de todos os trabalhadores da base é o mesmo: fortalecerem-se mutuamente.

É o vento ventando, é a chuva chovendo

A direção da APEOESP está em pânico diante da possibilidade de unificação – professores estaduais e municipais lutando juntos contra a política de precarização da educação pública. A greve está saindo do controle da burocracia. Ao invés de fortalecer o PT, os professores estaduais fortaleceriam uma luta contra o PT. O feitiço viraria contra o feiticeiro.

O desespero da burocracia é tão grande que se apela a argumentos divisionistas: tentam convencer as bases de que os professores da rede estadual “têm pautas específicas”; que quem quer a unificação são aqueles que acumulam cargos (no estado e na Prefeitura, que aliás são muitos); que ir ao encontro dos professores municipais seria um desrespeito para com as subsedes que vieram do interior. Cada argumento faz menos sentido que o anterior e é recusado pelos professores com vaias cada vez maiores.

Perdendo uma votação sobre a mudança do local da próxima assembleia (pois um grande número de professores consegue impor sua vontade, decidindo pela manutenção da Av. Paulista, em uma recusa da política de recuo da greve), a burocracia finalmente encerra a assembleia e os manifestantes saem em passeata. Um grande contingente de policiais vai à frente, formando um cordão diante dos manifestantes. O cerco estava fechado e a arapuca armada.

Enquanto a base se propunha a caminhar decisivamente ao encontro dos colegas da rede municipal, através de outro golpe a direção majoritária desvia o itinerário (não votado na Assembleia), causando o princípio de uma confusão [7]. A polícia, que dirigia a passeata e estava previamente orientada, se posiciona para impedir a continuação da caminhada pela Av. Paulista, forçando o desvio de rota. Depois de cerca de 30 minutos nesse impasse, o clima se acirra cada vez mais até que João Zafalão, representante da Oposição Alternativa na direção, resolve se pronunciar no carro de som. Seu discurso não destoa da direção majoritária, destacando a importância da não divisão da categoria naquele momento de conflito e sugerindo o prosseguimento do ato de acordo com o itinerário traçado pelos dirigentes petistas. Em um momento decisivo, a Oposição Alternativa recua, “ajudando” a burocracia, apoiando-se na velha máxima de acumular forças nas bases para uma posterior ampliação e radicalização da ação – uma ação que nunca sai do futuro. Também é marcante a ausência do conjunto dos setores da oposição neste momento delicado: o que se via era um grande número de professores independentes na linha de frente do enfrentamento. A unificação das lutas, defendida pela oposição, só apareceu no carro de som, não se concretizando na prática, quando acataram mais uma manobra da diretoria. Enquanto estes grupos esperam pacientemente pelas condições subjetivas necessárias para uma forte mobilização, os professores independentes seguem seus caminhos.

Essas contradições são, em grande parte, compreendidas a partir de uma deliberação do Congresso da APEOESP de 2000. Ali, além de outras propostas, foi votado o direito à proporcionalidade na direção sindical, o que foi recebido com grande festa por toda a oposição. Até então só fazia parte da direção o grupo que vencesse as eleições. No entanto, ainda que a proporcionalidade seja um princípio do sindicalismo classista e revolucionário, entendemos que este princípio aplicado a uma estrutura sindical viciada, burocrática e atrelada ao Estado tem suas implicações adversas. É como fazer remendos novos em uma roupa velha. O que vemos hoje é um racha na oposição e uma incessante disputa por um lugar ao sol na diretoria. Todos acabam querendo mamar um pouquinho nas tetas do sindicato, mais ou menos presos às engrenagens dessa máquina.

É a lenha, é o dia, é o fim da picada

A greve inicia sua terceira semana com as orientações bem demarcadas de cada grupo. Se por um lado a situação age com todas as forças pela desmobilização da categoria, por outro, a oposição já sente que a mobilização não duraria muito tempo. Afirmar que a greve não teve continuidade devido ao enfraquecimento da categoria impede a realização de uma análise mais profunda, que busque as reais motivações do movimento e das forças políticas envolvidas – foi essa estratégia utilizada pela atual direção para defender o fim da greve. Prestaram-se a esse papel os representantes do PT, PCdoB e PSOL, que se empenharam em terminar a greve na assembleia de 10 de maio.

Por outro lado, os diversos setores de oposição, percebendo as dificuldades na manutenção da greve, passam a ter posicionamentos diversos sobre a continuidade da mesma. Uma parte defende o fim imediato da greve, nesta assembleia; outro setor, liderado pelo PSTU, aposta no seu adiamento para a próxima terça-feira, 14 de maio, quando haveria a assembleia dos professores municipais em greve e a oportunidade, portanto, de encerrar a greve dos professores estaduais em um possível ato unificado.

A assembleia de 10 de maio tem início com essas posições já definidas pelas diversas correntes do sindicato – bastava levá-las a votação e seguir a decisão do conjunto da categoria. No entanto, não é bem isso que acontece. A maioria dos professores presentes decide por não acabar com a greve e é favorável a uma próxima assembleia em 14 de abril, unificando com os professores municipais em greve. A Articulação, que precisava a todo custo de impedir a unificação com os professores municipais e o desgaste da Prefeitura do PT, se utiliza de um antigo recurso da burocracia sindical: não fazer valer a assembleia e atropelar, sem cerimônia, a decisão dos professores. Em uma votação relâmpago, que mal pode ser registrada pela imprensa (como das outras vezes), a presidenta Maria Izabel declara a greve encerrada e se esconde na parte de baixo do caminhão.

É o carro enguiçado, é a lama, é a lama

Neste momento de manobra da direção do sindicato, a oposição se cala. Nenhum representante ensaia pegar o microfone e denunciar esse abuso. Os professores então, revoltados, decidem expressar seu descontentamento com um Sindicato que ignora as decisões tomadas pela base. Muitos se aglutinam ao redor do caminhão, de modo que a direção fica acuada do lado de dentro. Alguns apoiadores da situação fazem um bloqueio na porta que dá acesso ao local onde se encontram os dirigentes. A tensão entre os guardiões da burocracia sindical e o restante do professorado dura cerca de meia hora, até que a polícia chega e toma conta da situação, fazendo um cordão de isolamento em todo o caminhão. Alguns professores haviam subido em cima do caminhão e são retirados pela polícia, com seus métodos habituais.

Finalmente o cenário condiz com as políticas adotadas. A situação acuada no caminhão, ao lado de uma oposição que não teve uma política de enfrentamento adequada no momento necessário. Tudo isso com a proteção policial – afinal, o Estado tem que defender os seus negociadores diante de uma classe insurrecta.

Essa crescente indignação que tomou conta dos professores independentes é fruto de uma intensa mobilização, realizada no decorrer da greve principalmente pelos professores mais precarizados, os chamados categoria “O”. Isso desmonta a argumentação de que essa havia sido uma greve de vanguarda. Na realidade, a pouca quantidade de comandos de greve em algumas subsedes só aponta para o enfraquecimento dessa vanguarda diante de tantas greves sem vitórias significativas para a categoria.

Depois que a polícia sitia o caminhão de som, alguns líderes da oposição resolvem sair da toca. João Zafalão convoca uma pequena assembleia, pronuncia algumas palavras no megafone sobre a manobra da Articulação e faz um chamado para que todos sigam em marcha até a Secretaria de Educação de São Paulo, na Praça da República, para demonstrar a insatisfação com a situação. O chamado foi retardatário. Muitos professores, de forma independente, já tinham saído em marcha em direção à sede central do sindicato, também na Praça da República, com o intuito de ocupar este espaço. Neste meio tempo, a polícia consegue fazer com que o caminhão siga no fluxo contrário da Av. Paulista, assegurando a revoada da burocracia sindical. Cerca de 3 mil pessoas participam dessa marcha, acompanhada de um helicóptero e várias motos da polícia, que intimidam os manifestantes em todo o trajeto. As correntes de oposição participam da caminhada, mesmo após suas repetidas ausências nos momentos de enfrentamento. Chegando à Praça da República, a Oposição Alternativa e outros grupos que compõem a oposição vão para a Secretaria de Educação, que já estava fechada e onde nada havia a fazer, recusando-se a ocupar o Sindicato junto com os demais manifestantes. É compreensível, já que estão presentes em cargos na diretoria, como já discutimos. Para o grupo que chega finalmente à sede do Sindicato, nenhuma surpresa: dezenas de policiais os esperam. Traídos pela direção, fragmentados pela oposição, acuados pela polícia – em uma palavra, exaustos, aos poucos os professores se dispersam. Mas o sentimento de revolta permanece no ar e não há corporativismo que cale o grito daqueles que continuam explorados pelo Estado com o consentimento do Sindicato. Fica muito claro para essa nova camada de professores altamente precarizada, que fazem sua experiência política com as direções sindicais, que esses gestores tem como objetivos apenas os seus próprios ganhos na corrida eleitoral – e não as conquistas econômicas dos trabalhadores, o melhoramento das condições de trabalho, a valorização da carreira docente, o enfrentamento da questão da violência e, finalmente, a defesa da educação pública e a reflexão sobre o papel da escola na sociedade.

Notas

[1] http://www.apeoesp.org.br/noticias/noticias/presidenta-da-apeoesp-e-a-nova-vice-presidenta-da-camara-de-educacao-basica-do-cne/

[2] http://www.apeoesp.org.br/publicacoes/apeoesp-urgente/n-17-agora-vamos-para-brasilia/

[3] http://www.apeoesp.org.br/publicacoes/apeoesp-urgente/n-86-cer-aprova-encaminhamentos-para-a-greve/

[4] http://cspconlutas.org.br/2013/04/rumo-a-brasilia-ultimos-preparativos-para-a-marcha-de-24-de-abril/

[5] http://passapalavra.info/2013/04/76223

[6] http://www.apeoesp.org.br/publicacoes/apeoesp-urgente/n-19-o-governo-quer-derrotar-os-professores-isto-nao-vamos-permitir-a-greve-continua/

[7] http://www.youtube.com/watch?v=rvj3R-EY6qM

Os leitores encontrarão aqui um glossário de gíria e de expressões idiomáticas,
tanto do Brasil como de Portugal.

23 COMENTÁRIOS

  1. Apesar da pertinente denúncia, autoproclamatório demais para um texto cujos autores não conhecemos o nome e nem o rosto. E nem as intenções. E uma necessidade meio patológica de ficar cutucando a oposição toda hora, com trechos graves como todo mundo querendo “mamar nas tetas do sindicato”.

    Parece texto de movimento estudantil da USP, onde a ultraesquerda se preocupa mais em “denunciar” as outras correntes do que de fato mobilizar os estudantes.

  2. É impressionante. Sempre que um grupo independente faz uma denúncia contra o sindicato e/ou grupos políticos com prática semelhante, vem alguém dizer que, “apesar de pertinente a denúncia”, os argumentos não têm valor por não saber “nome e rosto”. Fica fácil assim, pois com isso, nega-se a discussão.

    Mas este não é o ponto que quero tratar. O texto levanta inúmeras reflexões, mas uma das coisas que chamou minha atenção é para além da questão da “traição” do sindicato, que já é velha conhecida.
    Muitas vezes os grupos que se opõe ao sindicato não estão negando a forma com que ele se estrutura e atua, mas sim, aquele determinado grupo que ocupa a direção. Em diversas situações me deparei com grupos de professores que afirmavam que este ou aquele sindicato não os representava, que era preciso derrubá-los, estabelecer uma oposição. O texto aborda que a Apeoesp estabelece um sistema de proporcionalidade na direção sindical, mas isto não ajudou em nada a base dos professores, já que a oposição nada fez quando viu que também estava a perder o controle da situação. Pois bem, pra mim este é um exemplo de que sem uma mudança estrutural na forma de organização os professores e demais trabalhadores da educação serão sempre “traídos”, derrotados. De nada adianta criar novas chapas ou associações “independentes” se a receita seguida for a mesma.

  3. Leandro, por definição, o Passa Palavra procura pensar as lutas sociais. Se não queres crítica, vá para outro site. Sua fala, sem base, quer defender a indefensável atitude do PSTU.

  4. É impossível criticar a ação burocrática da direção majoritária da APEOESP (PT e PCdoB) sem criticar a oposição (PSTU e PSOL), que não se opõe de fato à situação! Até neste sentido o PCO classifica estes quatro partidos em um único saco, o “bando dos quatro”. No entanto acho um erro esta classificação porque apesar de em muitos momentos estas correntes fecharem com uma mesma política (vide greves anteriores) há diferenças consideráveis entre elas…
    A APEOESP, pelo que vejo, apesar dos pesares, é o sindicato mais democrático do Brasil (o que não quer dizer muita coisa, admito!). Acompanho há tempos o movimento dos professores e percebo muitos grupelhos (no bom sentido do termo) atuando nele (independentes, LBI, LER, POR, PCO, etc.), o que acaba imprimindo uma dinâmica mais democrática, apesar dos pesares e das últimas mudanças do Estatuto do Sindicado nos últimos Congressos controlados pela Articulação (maior espaço entre eleições, caderno de teses menores, etc.).
    Também considero a proporcionalidade como um princípio do sindicalismo classista e combativo (ponto). Mas este não garante em nada que a “oposição” de fato de oponha à situação, justo o que ocorre na APEOESP. A Oposição Alternativa possue (se não me engano) quase 40% da direção do sindicato. Na Capital eles recebem muito mais votos e possuem mais militantes do que a situação. No entanto a atuação em zigue-zague faz com que ora estejam na oposição de fato ora junto ou subordinado à situação. Na Assembleia do dia 10, p.e., o João Zafalão se opôs a proposta do Governo porque este não colocou por escrito… Além do que os dirigentes da APEOESP da oposição (lato senso) também recebem alguns benefícios do sindicato (telefone, auxílio gasolina, refeição, etc.) e se recusam a divulgar tais fatos e a colocar para aprovação da categoria em Assembleia, como deveria ser!
    Por fim, os professores que participaram da Assembleia ou estão acompanhando este processo, podem agora analisar com maior clareza o que se passa no movimento sindical, o interesse e a prática de cada organização, etc e assim se organizar para superar o atual estado das coisas!

  5. Diante do fortalecimento de antigas estratégias do capital e das mudanças na dinâmica de exploração acredito que precisamos reinventar nossas formas de resistência. O que a APEOESP fez na sexta-feira foi o mesmo que o SINPEEM fez na greve municipal do ano passado (e talvez possa repetir na assembléia de amanhã).
    A briga entre situação e oposição, aos olhos da base, configura-se como mera encenação. Ao ler este texto me veio à mente flash’s da greve municipal de 2012. Também ficamos transtornados. No entanto não é possível acreditar que tenha havido traição, pois é certo que não há compromisso de ambos os sindicatos com sua base.
    Como vimos em um texto anterior não precisamos de caminhão de som e o comando da luta deve estar no chão, distribuído entre todos nós. Mas convocar essa luta apenas com megafones e em frente ao caminhão de som não vai ajudar. Precisamos nos organizar em nossos locais de trabalho, durante nosso cotidiano. Assim, em nossas greves, não precisaremos de caminhões de som ou megafones.

  6. Caro Diego,
    Você disse: “acredito que precisamos reinventar nossas formas de resistência”. Gostaria que você explicasse melhor esta frase. Coloco isso porque é muito comum ouvir de algumas pessoas (que se colocam sempre contra a greve, o que não é o seu caso) que a greve é uma forma antiga, que é preciso inventar “novas formas” de atuação, etc… É engraçado que estas pessoas quando perguntadas que formas seriam estas… desconversam, dizem não saber, ou pior, apontam para abaixo-assinados, pressão em parlamentares… Negam assim o método da ação direta e coletivo e reafirmam o parlamentarismo, o individualismo, etc.
    O problema não é o caminhão em si. O problema é como é administrada as falas (quem pode falar, por quanto tempo, etc…). Em uma Assembleia com 20.000 pessoas é necessário um caminhão de som, caso contrário não seria uma Assembleia, mas um encontro na praça entre professores para conversas uns com os outros. Como é preciso debater e deliberar em conjunto, é necessário um meio adequado, um caminhão de som.
    Quando o movimento se movimenta e se radicaliza que aparece, na marra, a democracia operária. Lembro-me de um relato que li (“Paris: MAIO DE 68”, escrito por Maurice Brinton sobre as Assembleias estudantis de Maio de 68. Dizia que durante as Assembleias a plenária decidia se a pessoa com o microfone deveria continuar falando ou passar a palavra. Inclusive negavam o direito de fala aos pelegos do Partido Comunista e outros. Nos momentos de maior radicalidade as questões formais “diretor”, “presidente” perdem valor e as questões reais “radicalidade”, “coerência”, etc. ganham importância!

  7. Mas e a conjuntura da mobilização nas escolas. As únicas duas que fui como estagiário, não tinham mobilização e os informes não eram dos melhores. Vi muita gente ou criticando ou com medo de mobilização, afinal uma greve deve ter uma situação no que seria o “chão” dela que é nas escolas e não necessariamente nos atos, nem nas assembleias, caso contrário não estaríamos trocando a mobilização pela instância que seria a de decisão? Ou isso já não faz diferença?
    ACho muito bom quando rolam assembleias boas, mas com as pessoas votando o que for ali sem conseguir colocar em movimento as escolas isso pode com o tempo isolar as pessoas mais mobilizadas em relação à totalidade da categoria ou aqueles que não possuem direitos e em geral se ferram nas mobilizaçoes como a categoria O, que funciona como um fura-greve que pode a qualquer momento ter seu contrato cancelado e que, em breve, talvez tenha de me juntar a eles por não ter terminado a licenciatura, só não comecei agora para não furar a greve.

  8. Giancarlo,
    talvez eu seja mais um que não saiba de pronto qual seria uma nova forma de resistência. No entanto, como você bem observa, não sou daqueles que se posicionam contra as greves, sempre participo delas.
    Hoje fizemos uma reunião com os pais e mães de nossos alunos para falar algumas verdades omitidas pela mídia televisiva e distorcidas pelo governo, sobretudo. Nesta reunião nós os convidamos para irem à assembléia de amanhã em frente a prefeitura de São Paulo (e aproveito para te convidar também), porém aproveitei a oportunidade de falar com tantos pais e mães para convidá-los a organizarem-se por conta própria, ainda que não possam comparecer amanhã. Acredito que novamente uma proposta de reajuste pode por fim à greve, apesar de termos uma pauta extensa. Também acredito que enquanto as comunidades não se organizarem e contestarem as características da educação que é oferecida, questões tão importantes como a redução do número de alunos por sala não serão atendidas, já que basta um reajuste para que a mesma mídia que citei, articulada com o Estado, logo passe a agir contra nossa movimentação. A comunidade também deve ser protagonista da luta e não expectadora.
    Atendendo ao seu pedido, digo que seria no cotidiano de nossas contestações, em momentos de greve ou não, que podemos formular novas formas de resistência. Não acredito que o caminhão seja necessário se antes de nos encontrarmos no centro tivermos discutido em nossos grupos e socializado nossas discussões, algo que demanda grande organização e coletividade. Se cada contradição de nossa luta tiver a oportunidade de ser discutida é possível que retiremos o poder que nos é roubado pelo “líder” sindical, ou gestor.
    Aproveito a oportunidade para convidá-lo a refletir sobre nossas decisões frente às palavras que mal conseguimos ouvir tamanha a potência do espetacular caminhão de som: como podemos decidir sobre continuidade ou não de uma greve quando só é divulgado o tratamento de uma ou duas pautas em meio a 300?
    Novamente, Giancarlo, não tenho as novas formas que quero, mas estou procurando, contribuindo todos os dias para que elas sejam criadas. Nossos sindicatos estão nas mãos dos gestores, esta nossa forma de luta parece ter sido recuperada pelo capital e nessa hora prefiro matar a esperança que tenho nela e me dedicar a outra estratégia, mesmo que não saiba ainda qual é.

  9. Parabéns pelo artigo, muito bem redigido e que deixa muito claro o papel dos professores independentes, bem como a oposição “teatralizada”, pouco efetiva nos momentos mais necessários, e excessivamente discursiva, omitindo-se na prática como realmente é possível constatar!

  10. Douglas e Diego,

    Concordo com o que vocês disseram: a luta e a resistência se dão também no dia a dia, nas escolas! É muito importante o debate com os alunos sobre a situação da educação pública, da situação em que as escolas se encontram, da importância da organização dos grêmios nas escolas, etc. Aqui em Manaus sempre acompanho as greves dos docentes e percebo que quando os estudantes se juntam para fortalecê-la a luta ganha uma outra dimensão. Igualmente importante é o diálogo com os pais dos alunos e a comunidade no geral, embora esta tarefa seja cada vez mais difícil pelo nível geral de despolitização/desmobilização da sociedade, bem como pela força conservadora do governo e da mídia.
    Ora, a rede pública estadual de SP tem quase 250.000 professores. Sendo uma categoria tão grande, dispersa por todo o Estado, e com “níveis” diferentes de politização, a greve nunca atingirá 100.000 professores (número arbitrário). No entanto este setor que se mobiliza precisa buscar o apoio dos demais. Para isto não há outra maneira que não a radicalização do movimento. 99% dos que não pararam na greve têm acordo com as bandeiras do movimento (alguém será contra a recomposição salarial, a jornada da Lei do Piso, e o fim da precarização dos contratados ??).

  11. Giancarlo,
    também acredito na radicalização, mas a própria luta pela coletivização do movimento é algo que podemos considerar radical, diante do atual cenário. A participação de pais e alunos é fundamental. Mas estes precisam também descobrir de que forma esta educação os incomoda e, a partir disso, se organizar em suas comunidades, dialogando com outras e com os próprios profissionais da educação, apoiando ou não as pautas salariais. É claro que prefiro nossa luta conjunta, nas bases, no questionamento do cotidiano. Esta coletivização pode fazer com que as pautas discutidas não sejam apenas salariais, apesar destas serem de grande importância.
    De fato muitos que não aderiram à greve não são contrários a estas pautas, mas por que não param? Talvez por que não alteramos o conteúdo de nossas relações após a movimentação. Muitos pais dos meus alunos tem questionado, indignados, por que todos os professores não pararam, por que não vão às manifestações? Espero que esta indignação permaneça após a greve e que novos questionamentos venham. Aí talvez possam se formar novas relações.

  12. Pergunto isso porque horas, que adianta sair em greve sozinho, sem a adesão dos colegas? A mobilização nas escolas municipais seguiu mais essa linha, pois se as pautas são discutidas na escola e não só com os alunos, mas os demais professores, sabe-se de tipos de pressão que eles sofrem, por exemplo, ou nota-se o quanto há ainda de apoio ou de força na greve. Eu vi muitos professores que não aderiram com medo de terem dias descontados e de se encerrrar a greve repentinamente.

  13. Não estou de acordo com a forma com que nosso sindicato vem sendo conduzido, muito menos com a forma com que trataram a greve, tampouco aprovo a partidarização e a tentativa de explorar politicamente a luta justa de uma categoria que vem sofrendo todo tipo de adversidade. Parabéns aos autores do texto este é o momento de refletir e avaliar e o mais importante de nos prepararmos para enfrentar essa “burrrrrocracia!”

  14. Meu camarada, este foi o maior e melhor balanço sobre a greve que eu vi até o momento, análise sucinta de todas as situações. Estou contigo em qualquer momento… Caso o Sr. faça parte de algum grupo de análise social em geral, por favor me indique. Seria um grande prazer!

    Professor categoria OVNI.

  15. Alexandre,

    Muito obrigada pelos elogios ao texto, que ajudei a escrever. Você supõe que sou homem (se refere ao “sr.”…), mas veja, sou mulher! ;)

    Fazemos parte das várias lutas da nossa classe, somos professores, atuantes por aí e também temos encontrado aqui no coletivo Passapalavra um espaço de interlocução e ação.

    Vamos nos organizar para que nenhum professor(a) mais seja “OVNI”, mas respeitado, bem pago e tenha condições de exercer sua profissão com dignidade, respondendo à altura dos desafios que se colocam para os educadores. E para isso precisamos superar não só essa direção, mas também essa estrutura de sindicato, que nos liga (nos prende!) ao Estado, nosso patrão. Direções burocráticas, oportunistas e sem independência de classe nunca faltarão num sindicato que é um rio de dinheiro, jorrando facinho para os bolsos dos negociadores de plantão.

    Abraços!

  16. 1- Não houve uma greve dos professores, mas uma luta dos setores mais precarizados dentre o professorado. Os professores não são uma categoria homogênea. É necessário começar a dividir as coisas.

    2- Onde trabalho, tem professora casada com pequeno empresário, policial federal, comerciantes. Uma parcela significativa da categoria é formada por professoras de classe média. Com a renda dos maridos mais as heranças elas conseguem ser classe média, embora o baixo salário. Essas professoras são o peso mais conservador na educação, inclusive discriminam os alunos e os professores pobres. Para elas não existe mobilização.

    3- A educação possui uns 30 mil cargos de confiança. Se somarmos quem ocupa cargos de chefia com quem pretende ocupar cargos de chefia, de saída vamos ter quase uns 50 mil que não vão participar de greve. Se junto esse número com o das professoras madames, tenho mais de 100 mil que não vai participar de movimento nunca. O governo tem uma base sólida nas professoras madames e nos ocupantes e pretendentes a cargo de chefia.

    4- Dos professores que sobram – nem madames, nem chefes – que são os mobilizáveis, há o problema da imensidão do Estado. Tanto é que o Orkut e o Facebook têm servido como principal espaço de discussão dos professores. Não há encontros ou assembleias regionais, não há fóruns, não há espaços de discussão.

    5- Reclamar dos chefes sindicais não dá em nada. Seria necessário construir esses encontros, espaços de discussão, para se criar força com o tempo. Entretanto, nada surgiu até agora. Ou seja, vai continuar como está.

    6- Existe um erro tático de se começar toda luta pela greve, o que gera de imediato grandes prejuízos aos professores. Boa parte dos independentes e dos mais aguerridos acham que declarar greve a todo momento é ser de luta e não param pra pensar no equívoco tático. As lutas deveriam começar com atos, paralisações pontuais e chegar na greve somente quando se tivesse um acúmulo de forças.

  17. Embora, como Santiago mesmo reconhece, suas avaliações quantitativas sejam estimativas e não dados concretos, acho os pontos levantados por ele bastante precisos. E podem ser extrapolados, com os devidos ajustes, para os trabalhadores da educação em outros estados.

    Só gostaria de acrescentar uma coisa, com base numa experiência junto a professoras da rede municipal de Salvador acontecida anos atrás (antes de Orkut e Facebook). Uma vez que durante um dia da semana as professoras tinham que fazer o “plantão pedagógico” (não lembro o nome exato), uma delas, velha militante, resolveu propor-lhes que no período anterior às assembleias da campanha salarial os “plantões pedagógicos” fossem dedicados à discussão das condições de trabalho e ao estabelecimento de uma pauta própria, vinda desta discussão, a ser apresentada na assembleia. Como ela achava necessário um “elemento externo” para ajudar a mobilizar, me chamou para facilitar o debate.

    A partir destes encontros, que juntaram professoras de várias escolas da mesma regional num só lugar (foram se chegando aos poucos, na medida em que souberam da existência deste espaço), em coisa de três semanas havia sido possível não apenas levantar com relativo aprofundamento inúmeros problemas (carga horária excessiva, jornada tripla, falta de material didático básico (giz, cartolina, etc.), inadequação do material didático e pedagógico entregue pela Secretaria de Educação (livros estranhos ao plano pedagógico, etc.), defasagem salarial…) como também começar uma discussão sobre causas desta situação (baixa capacidade de arrecadação da Prefeitura, redirecionamento de verbas da educação (que ficaram por anos abaixo do critério constitucional), esfacelamento da “base aliada” do prefeito, etc.).

    O resultado: tudo isto foi sintetizado numa carta aberta à categoria, lida durante uma das assembleias. Foi esta carta que fez com que a greve, que já havia sido iniciada, durasse mais algumas semanas e conseguisse resultados “um pouco melhores” que a direção da APLB (o sindicato dos professores) havia planejado. Tentou-se manter este ritmo depois da greve, mas foi impossível. A principal razão foi um dos problemas apontados: a sobrecarga de trabalho, agravada pela necessidade de reposição das aulas.

    Com isto, quero dizer que não acho “erro tático” começar qualquer coisa a partir da greve. Ás vezes é meio que uma imposição das condições de trabalho só se ter maior facilidade para mobilizar quando há greve. Se haverá greve ou não, isto, na maioria dos casos na educação, está além do controle dos trabalhadores do setor (infelizmente), e sob controle quase total dos sindicatos. Como a greve é um momento onde as atividades são paralisadas, é exatamente a hora em que há tempo livre para se tentar estabelecer relações que durem para além dela. Nada impede que se faça qualquer coisa antes ou depois dela (reuniões, atos, paralisações pontuais, etc.), mas a greve é um momento a se aproveitar para fazer com maior intensidade tudo o que se faria sem ela.

  18. Manolo,

    O teu relato exemplifica o que afirmei. Seria necessário começar com essas reuniões, esses debates nas escolas, fazer encontros regionais, criar laços, força e acumular discussões. O professorado é basicamente analfabeto político. Entretanto, sabendo de antemão que grossa parcela do professorado é da turma “odeio passeatas”, se vê como classe média e não como trabalhadores. Há ainda os milhares de chefes e as milhares que estão esperando para sê-lo. Ou seja, a bandeira da unidade teria que ser jogada fora e o professorado pobre teria que se assumir como trabalhadores de luta ante o professorado classe média.

    Foi isto que quis dizer. Como você citou, hoje os sindicatos declaram greve e depois os militantes das correntes ou funcionários do sindicato vão avisar os professores que eles estão em greve. Não tem debate, encontro, reunião, acúmulo de discussão, nada. Isso deveria ser invertido e a greve ser o resultado de um acúmulo de forças.

    Isso tudo implicaria romper a atual cultura de individualismo. Hoje, no geral, o que temos é cada professor tentando se virar como pode no caos geral que são as escolas públicas. Cada um toca sua vida e pronto. Mas tenho visto que os professores que estão em condições de ser lideranças, chamar o debate, possuem respeito entre os demais, geralmente fecham com o governo, são politicamente submissos e adeptos de uma pedagogia autoritária. A educação não é um campo fértil para revolucionários, contrariamente ao que pensam os jovens e contrariamente as mentiras contadas nos cursos de humanas.

  19. Complementando o comentário de Santiago, gostaria de lembrar que essa “ausência” de consciência de classe não é algo exclusivo do professorado.

    A subjetividade dos professores ainda é fortemente determinada pela nebulosa divisão entre o trabalho manual e intelectual. Este tipo de inquietude reflete, em diferentes posições, as muitas confusões entre o trabalho produtivo e não-produtivo.

    Ficou evidente a heterogeneidade dos professores nesta greve. Os professores contratados representam um número cada vez maior, visto que as péssimas condições para lecionar fomentam a desistência de muitos profissionais. Esses professores que são categoria “o” trazem consigo novas concepções de luta que, pelo acerto ou pelo erro devem ser analisadas.

    A mobilização dos professores por meio de assembleias regionais, reuniões, fóruns e outros espaços seria bastante interessante. Porém, como levantou Manolo, o tempo é uma variável importante no capital. Além disso, vale lembrar que os membros da diretoria possuem tempo de sobra para realizar o processo de articulação, uma vez que são “liberados” de suas funções na unidade escolar.

    Para além das disputas internas das diversas correntes nas reuniões de Representantes de Escola nas subsedes, pode-se pensar numa discussão que fomente formas de organização que prevaleçam o conjunto da categoria. O fundamental é não nos ausentarmos dos entraves políticos sustentados pelo governo e sindicato.

  20. Santiago,

    Concordo com você. Os professores não são uma categoria homogênea, e há milhares de pretendentes a cargos de confiança e algumas (nem tantas assim, penso!) madames. Constituem, possivelmente, uma camada de “não-mobilizáveis”, pelo menos na atual conjuntura (no Chile, onde a educação pública vem sendo completamente devastada, creio que até esses grupos estão se mexendo, no calor da resistência que se forja por lá).

    No entanto, discordo sobre a necessidade de “dividirmos as coisas”, pois isso o governo já tem feito admiravelmente. Já somos muitos grupos diferentes trabalhando sob o mesmo “chão de escola”. Além disso, o professor e talvez principalmente a professora que se acha “classe média” tem dado com a cara na porta, sofrendo as mesmas mazelas que atormentam os demais colegas (superlotação das salas de aula, violência crescente nas escolas etc). Há um processo, em curso há décadas, de proletarização dos docentes.

    Por último, sobre o erro tático de “se começar toda luta pela greve”, você deve ter percebido no texto a nossa crítica à forma oportunista e burocrática como a greve foi proposta e tocada, desde o início, pela direção do sindicato. Não fazemos parte do grupo que quer “declarar greve a todo momento”, mas sim construir desde baixo uma mobilização (que inclui greve, mas não só!) para se contrapôr ao projeto dos governos, permitido pela burocracia sindical.

    Não que isso seja fácil – mas se fosse, não seria LUTA!

  21. Atualmente, a maioria das greves pode ser originada das decisões dos sindicatos. Não que inexista uma base disposta a lutar, e neste ponto procuro refletir sobre as colocações do Manolo. As condições atuais de trabalho dos professores impedem inúmeras vezes uma organização prévia, cotidiana, no local de trabalho. Somos sufocados com cobranças, número elevado de alunos, trabalhos extra-classe, etc, e muitas vezes o desgaste é tamanho que queremos chegar em casa o mais rápido e ficar isolado em algum canto até conseguir recuperar as forças.

    Acontece que na greve esta rotina extenuante é quebrada, e se não foi a base que a puxou, é seu dever se apropriar dela e procurar construir a partir daí outras relações, impossíveis (ou extremamente difíceis) em situações “normais” do cotidiano do trabalho.

    A última greve dos professores estaduais em Goiás teve neste sentido uma experiência próxima ao que digo que acho importante relatar. Os professores queriam greve e estavam se organizando para isso. O sindicato, por sua vez, não podia permitir que a greve fosse decretada sem sua interferência. Chamou uma assembleia e foi declarada a greve. Alguns professores pararam as atividades, outros não. Não porque discordavam das pautas, mas porque estavam cansados de servirem de massa de manobra ao sindicato.

    O que aconteceu? Aqueles que pararam começaram a organizar reuniões e debates independentes nas escolas em que trabalhavam, após se organizarem e terem claro o porque de lutar, aderiram a greve. Se a escola vizinha ainda não tinha entrado em greve, estes professores iam até ela, faziam reuniões, debates, e mais uma escola entrava em greve. Foi assim em inúmeros pontos da capital e região metropolitana. Estes grupos criaram correntes e conseguiram estabelecer uma dinâmica diferente no início da greve, o sindicato foi menosprezado e até barrado de entrar em muitas escolas e a greve ganhava força. Isso em minha opinião foi o mais importante, a criação de novas relações sociais.

    Infelizmente o desfecho não foi diferente de outras greves de professores, a meu ver, porque esta prática inicial foi abandonada por estes grupos no decorrer do movimento.

  22. Eu nem milito porque tenho dificuldade de adaptação e identificação com aquilo que é o professorado. Uma peãozada trabalhando nas piores condições, em alguns casos no meio de baratas e fezes mas se sentindo a mais digna classe média, portadora da moral e redentora da nação. E gostei muito do que disse o prof independente. A questão de simplesmente fazerem um trabalho intelectual os faz pensarem que são membros de alguma ordem superior aos trabalhadores braçais. Na verdade, minha militância é individual para me manter minimamente livre dos chefes e dos professores mais conservadores. Uma luta árdua!

    Apesar disso, eu acho que qualquer pessoa que venha a falar de autonomia do professorado de luta ante o sindicato deveria pesquisar, entrevistar, fazer um levantamento sobre a experiência daquela turma que mais conseguir levar isso adiante. Me refiro ao pessoal que teve alguns de seus membros exonerados em 2000 e a Resistência Popular. É uma baita experiência que não pode ser descartada. Quem quer realmente militar não pode desprezar a luta heroica deles. Fazer isso implicará em quebrar a cara em muitos pontos nos quais eles possuem algo a dizer.

  23. Encontrei este artigo apenas agora, pois estava procurando “pistas” para as teses do XXIV Congresso da APEOESP. Não milito em nenhuma corrente interna do sindicato, embora seja militante sindical. Participei desta última greve, em comando de greve. Enfim, de “cabo a rabo”. Concordo com boa parte do que é colocado no texto. A “parte” que eu discordo é tornar os “independentes” mocinhos. Os “independentes” que atacaram o caminhão, pelo que observei “in loco”, são militantes do PCO. O Toninho comandava as ações. Os “independentes” que puxaram o coro pela continuidade da greve formavam um bloco coeso na assembléia, organizado, com suas bandeiras. Um bloco coeso e organizado se dá através de um comando, um combinado anterior. Quando digo que estes “independentes” não são “mocinhos”, não estou querendo fazer juízo de valor de sua ação na assembléia. O que quero dizer é que também eles formam um grupo com objetivos político-partidários. É claro que unificar os professores estaduais com os municipais enfraqueceria a Articulação e os seus aliados, e isso fazia parte da estratégia dos “independentes”. Esses interesses partidários, revolucionários ou conservadores, sempre vão existir no “seio” sindical. Isto é tão certo quanto à improbabilidade de um bando de independentes “de verdade” (sem vínculos com correntes organizadas) chegar ao poder no sindicato. O grande problema, a meu ver, é a incapacidade de todos esses grupos oposicionistas. Uma parte desta oposição foi cooptada pelo aparelho burocrático, como está bem explicado no texto. A outra parte, os “independentes”, não conseguem uma inserção maior nas massas. Precisariam sair de seu casulo teórico-revolucionário. Fazerem-se compreendidos pelos professores comuns, que não estão preocupados com a revolução proletária na próxima esquina, mas com o seu cotidiano penoso. Calma, não sou tão alienado a ponto de achar que o cotidiano penoso não tenha haver com o sistema. Eu sei que tem. É que os raios solares, sem filtro, queimam, e afastam as pessoas. Sitiar o caminhão e espancá-lo não me parece uma estratégia que vá conseguir agregar mais do que os militantes do PCO. É o que eu vi lá embaixo do MASP. Os professores “sem-corrente” (aqueles preocupados apenas com o cotidiano) estavam acuados, no fundo do vão, observando tudo aquilo, perplexos, e se movimentando “pra lá” e “pra cá”, fugindo das investidas da polícia. Concluo assim: a APEOESP precisa de uma situação e de uma oposição menos acomodada. A situação e parte da oposição acomodada no aparelho. E outra parte da oposição acomodada em seu isolamento teórico-revolucionário.

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