Em tempo de intensificação da repressão como é o atual, me vem à mente a chacota de um companheiro que passou por algumas ditaduras em países diferentes, que diz correr solta a fama dos comunistas brasileiros de serem relapsos com a própria segurança. Se no passado até Prestes, o mais famoso de todos entre nós, anotava tudo nos seus cadernos pessoais, com nomes verdadeiros e endereços, provocando o indiciamento de mais de 70 camaradas do próprio partido e entre eles Carlos Marighella, por que logo agora iríamos romper com esta tradição? Passa Palavra

4 COMENTÁRIOS

  1. Hoje toda a comunicação é feita via e-mail, telefone, mensagens, redes sociais e assemelhados. Tudo isso deixa uma série de registros tanto das redes de contatos, dos conteúdos quanto das localizações. Como se mantém segurança nesse mundo em que toda comunicação é fiscalizada?

  2. A comunicação feita via e-mail, telefone, redes sociais… é controlada, vigiada, monitorizada. ESCREVAMOS, FALEMOS E PENSEMOS, pois, em braille…

  3. O problema não é a comunicação ser monitorada. São as organizações de esquerda que precisam aprender a usar a internet e o telefone de modo a não disponibilizar informações capazes de comprometer a segurança dos militantes e o próprio prosseguimento da luta. E existem também formas de comunicação via internet (até mesmo redes sociais) mais seguras, feitas de militantes para militantes. Cada organização precisa pensar uma política e técnicas de segurança próprias, adequadas ao seu projeto político ou à luta social que ela pretende levar adiante. O problema é não disponibilizar informações capazes de comprometer a eficácia do movimento.

  4. E, na verdade, o famoso episódio das cadernetas evocado no Flagrante Delito acima, eu acho que, nesse caso em particular, tratou-se mais de um problema referente à forma de organização do partido e à própria personalidade de Luís Carlos Prestes. Afinal, alguém chegou a censurar O Velho pela sua prática de registro cuidadoso de informações que não poderiam, como hoje se sabe, ser registradas? Não posso afirmar com certeza, mas eu imagino que não, ou pelo menos não abertamente. Quem é que ousaria criticar abertamente o “Cavaleiro da Esperança” (e Secretário-Geral do PCB)? Jacob Gorender, no seu livro “Combate nas Trevas” (aqui: http://pt.scribd.com/doc/112188089/Combate-Nas-Trevas-de-Jacob-Gorender), escreveu o seguinte: “por enquanto, a racionalidade marxista tem sido impotente para refrear essa tendência ideológica milenar [o mito da liderança carismática ou o culto à personalidade], cuja força espontânea impregna a consciência das massas trabalhadoras. O pior tem sido o estímulo sistemático de partidos comunistas e Estados socialistas à funcionalidade dos mitos. Porque, se facilita a condução das massas, o mito as deseduca do ponto de vista da formação da ideologia socialista e dificulta a correção dos erros das direções. A educação ideológica socialista é inseparável da vida democrática nas organizações revolucionárias. Se a democracia não suprime os mitos, ao menos oferece condições para sua crítica (p. 27).” Noutro trecho, lê-se: “Prestes comparecia às reuniões munido de uma caderneta folhuda, de doze por dez centímetros, de capas cartolinadas presas por espiral. Enquanto os outros falavam, sua grossa caneta-tinteiro deslizava incansavelmente pelo papel. Identificava oradores pelo nome verdadeiro, pois ninguém usava nomes de guerra. A caprichada caligrafia do anotador torna a legibilidade perfeita. Durante cerca de três anos, a partir de meados de 1961, as cadernetas registraram centenas de reuniões, encontros e informações diversas. Para os órgãos de repressão policial, elementos de primeira ordem sobre a intimidade de uma organização fora da lei. Volto à indagação da razão que levou Prestes a guardar consigo tão indiscreta coleção de cadernetas, cheias de anotações circunstanciais descartáveis para fins práticos. Não sou o primeiro a observar sua vocação para arquivista. Conserva tudo o que se refere a ele, pois tem sempre viva a transcendência de sua personalidade histórica. Despreocupa-se das consequências que informações confidenciais podem provocar em poder do inimigo. As cadernetas e pastas de documentos da residência da Vila Mariana foram o terceiro arquivo que acumulou por vaidade e por negligência deixou cair em mãos da Polícia. Dessa vocação para arquivista tiraram proveito policiais, procuradores e juízes de tribunais políticos (p. 86).”

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