O elemento jurídico das relações sociais, atuante no seio do todo social, é um aspecto inerente e indispensável de toda a corrente de reprodução das determinantes essenciais do controle capitalista. Por Diego Polese
Somente quando tivermos estudado a fundo o ritmo e a forma da supressão das relações de valor na economia e ao mesmo tempo o desaparecimento dos momentos jurídicos privados na estrutura jurídica e finalmente a dissolução progressiva da própria superestrutura jurídica condicionada por estes processos fundamentais, é que poderemos dizer que explicamos pelo menos um aspecto do processo de edificação da cultura sem classes do futuro. (E. B. PACHUKANIS)
O sistema do capital é uma estrutura totalizadora e controladora dos processos de produção e reprodução das relações sociais exploratórias por ele erigidas organicamente, que por meio de seus mecanismos de recuperação/assimilação da ação do trabalho consubstancia o processo de sujeição da humanidade aos seus ditames, estabelecendo a divisão da sociedade em classes sociais abrangentes e irreconciliavelmente opostas entre si em bases objetivas.
O elemento jurídico das relações sociais, atuante no seio do todo social, situando-se na estrutura material e, sobretudo, na superestrutura cunhada especificamente pelo capital (a jurídica-política) é um aspecto inerente e indispensável de toda a corrente de reprodução das determinantes essenciais do controle capitalista, configurando-se como: 1) constituinte necessário das relações sociais de produção e circulação; 2) expressão da luta de classes; 3) categoria que se confunde com a forma mercantil; 4) constituinte da superestrutura jurídica e política formada pelo Estado; 5) esfera que, longe de ser neutra, é posta a serviço dos ditames exploratórios do capital; 6) conformador/assimilador das lutas sociais.
Espero com essa curta coletânea de artigos contribuir com a adequada interpretação do complexo jurídico enquanto esfera que não pode ser devidamente explicada sem que se estabeleça sua intrínseca relação com a totalidade social. Ademais, fomentar o debate das condições objetivas necessárias para que se possa ir para além do capital, do Estado e do direito, ou seja, além do modo de controle do sociometabolismo que impõe sua “vontade” (seus imperativos estruturais de expansão e acumulação de capital), expulsando o trabalhador do poder de controle da produção/reprodução de sua vida material e espiritual.
Sabemos que as problemáticas a serem levantadas requerem respostas por demais complexas para que ao menos em parte possamos resolvê-las, mas nos daremos por satisfeitos se ao menos estabelecermos princípios norteadores para um debate adequado acerca de seu papel durante a transição socialista e seu potencial fenecimento, já que se torna cada vez mais urgente a necessidade de se elaborar uma teoria transicional abrangente visando a superação da lógica autodestrutiva do modo de produção da vida material comandado pelos ditames do capital. E uma discussão acerca do Jurídico, a qual também aparece como um ponto problemático na teoria transicional socialista, é parte fundamental desse processo.
Inicialmente, a fim de arquitetar o chão teórico que permitirá assentar os pilares do debate, é necessário explicitar os determinantes fundamentais do sistema contraditório do capital que terão relação determinante para com o Direito.
A toalidade orgânica da formação social do capital
As Formações Sociais Históricas são totalidades organicamente imbuídas de conexões e diferenciações, cujo fundamento ontológico é a objetividade trans-histórica de que os processos sociais encontram-se enraizados no metabolismo entre os homens e a natureza, ou seja, na objetividade do trabalho. O trabalho, assim, é o fundamento das diversas formas de sociabilidade pelas quais os homens organizam a produção e a distribuição da riqueza social. Nas sociedades formadas por classes, as interações de produção materialmente estabelecidas dão-se de forma essencialmente alienada, configurando-se como um complexo dialeticamente estruturado recheado de contradições.
Por conta desses fatores, para que possamos apreender corretamente as formas, bem como o conteúdo, que as relações sociais fundamentais (dentro do capitalismo) tomam para se desenrolar, das quais o Direito é constituinte inextrincável, devemos trazer à baila suas conexões objetivas internas ao mesmo tempo em que traçamos as linhas necessárias de demarcação entre uma e as outras ‘peças constituintes’ dessa estrutura social histórica em incessante movimento e transformação.
Karl Marx, em seu conhecido “Prefácio de 1859”, apontou para o caráter inerentemente dialético da complicada rede de relações entre os homens e assinalou a importância vital das determinações e interações recíprocas:
Minha investigação desembocou no seguinte resultado: relações jurídicas, tais como formas de Estado, não podem ser compreendidas nem a partir de si mesmas, nem a partir do assim chamado desenvolvimento geral do espírito humano, mas, pelo contrário, elas se enraízam nas relações materiais de vida […] O resultado geral a que cheguei e que, uma vez obtido, serviu-me de fio condutor aos meus estudos, pode ser formulado em poucas palavras: na produção social da própria vida, os homens contraem relações determinadas, necessárias e independentes de sua vontade, relações de produção estas que correspondem a uma etapa determinada de desenvolvimento das suas forças produtivas materiais. A totalidade dessas relações de produção forma a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se levanta uma superestrutura jurídica e política, e à qual correspondem formas sociais determinadas de consciência. O modo de produção de produção da vida material condiciona o processo em geral de vida, social, política e espiritual. Não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas, ao contrário, é o seu ser social que determina sua consciência. […] Com a transformação da base econômica, toda a enorme superestrutura se transforma com maior ou menor rapidez. (1982, p. 25 – Nossos grifos)
Analisando o referido quadro categorial marxiano, o qual remete a condições sócio-históricas específicas, percebe-se ser ele formado por uma reciprocidade entre o que se denominou: base e superestrutura. Isso quer dizer que a estrutura da sociedade capitalista é constituída por “instâncias” complexamente articuladas: a base material (unidade de forças produtivas e relações de produção) e as superestruturas legal-política e ideológica (as distintas ideologias, moral, política, religiosa, jurídica, etc.).
O complexo social configura-se, assim, como um todo complexamente estruturado com continuidades, descontinuidades e intricadas intersecções entre as instâncias do todo social, mas um todo que tem na esfera do trabalho, ou seja, na esfera material, sua base ineliminável. Deste modo, tendo em vista a objetividade imposta pela totalidade orgânica do capital, situar-se-á o Direito na medida em que ele for surgindo como constituinte das relações sociais desenvolvidas historicamente.
Pois bem. As relações entre os homens em determinada época histórica se expressam por meio de formas de sociabilidade (formas sociais) – que partem ou não de formas embrionárias historicamente criadas por outros modos de produção – desenvolvidas em seu interior e que definitivamente tendem a se cristalizar para proporcionar estabilidade para sua reprodução contínua. Na atual época histórica, em que predomina a forma de subordinação do trabalho ao capital, a sociabilidade engendrada pelo sistema sociometabólico, por meio de suas engrenagens fundamentais, gera formas sociais necessárias à sua reprodução contínua, realizando-se no seio e por intermédio de estruturas cunhadas pela práxis humana alienada. Durante a explicação remeter-se-á às formas de sociabilidade fundamentais concebidas pelo capital, tais como: forma-mercadoria, forma-valor, forma jurídica concreta, forma jurídica abstrata ou legal, etc.
A base econômica de um determinado modo de produção da vida material é formada, basicamente, pela articulação entre as forças produtivas e as relações de produção.
As forças produtivas constituem-se, em síntese, pelos meios de trabalho (instrumentos, ferramentas, terra), dos objetos de trabalho (matérias-primas brutas e modificadas) e da força de trabalho (dispêndio de força humana que transforma e cria objetos que satisfazem as necessidades que possui). Elas operam no marco de determinadas relações técnicas e sociais, que se denominam: relações de produção. Esta por sua vez é determinada pelo regime de propriedade dos meios de produção basilares, os quais no capital são baseados na propriedade privada e na divisão social do trabalho.
No terreno da base material, temos que as relações travadas seriam puramente econômicas. O que é rigorosamente falso. As relações sociais de produção – mediadas pelas classes que a compõem e disputam sua hegemonia nas mesmas – na verdade estão inexoravelmente mergulhadas em aspectos políticos e jurídicos. Ellen Wood, em seu livro “Democracia contra Capitalismo”, explica isso precisamente:
Existem então pelo menos dois sentidos em que a ‘esfera’ jurídico-política se confunde com a ‘base’ produtiva. Primeiro, um sistema de produção sempre existe na forma de determinações sociais específicas, os modos particulares de organização e dominação e as formas de propriedade em que se incorporam as relações de produção – que podem ser chamados de ‘básicos’ para distingui-los dos atributos jurídico-políticos ‘superestruturais’ do sistema produtivo. Segundo, do ponto de vista histórico, até mesmo as instituições políticas como a aldeia e o Estado entram diretamente na constituição das relações de produção e são de certa forma anteriores a elas (mesmo quando essas instituições não significam instrumentos diretos de apropriação de mais-valia), porque as relações de produção são historicamente constituídas pelas configuração do poder que determina o resultado do conflito de classes. (2011, p. 34 – grifos nossos)
E, logo em seguida, em trecho esclarecedor, conclui:
Ademais, a esfera econômica tem em si uma dimensão jurídica e política. Num sentido, a diferenciação da esfera econômica propriamente dita quer dizer apenas que a economia tem suas próprias formas jurídicas e políticas, cujo propósito é puramente ‘econômico’. Propriedade absoluta, relações contratuais e o aparelho jurídico que as sustenta são condições jurídicas das relações de produção capitalista; e constituem a base de uma nova relação de autoridade, dominação e subjugação entre apropriador e produtor. (WOOD, 2011, p. 35 – grifos nossos)
Pois bem. Já que o processo de produção da vida humana corporifica-se em formas econômicas e relações jurídico-políticas e ideológicas, as quais emanam da base material e não são em um primeiro momento relegadas a uma determinada superestrutura, teceremos algumas explicações acerca de sua face econômica e política, uma vez que somente assim poder-se-á explicar o fenômeno jurídico pormenorizadamente, estabelecendo suas ligações, continuidades e descontinuidades com as esferas da vida social em que se encontra imbricado.
A face política
A estrutura social do capital produz a inescapável – e falsa – consciência de que política e economia estariam estruturalmente separadas, consistindo as relações econômicas numa esfera fundamentalmente pura e livre de interferências daquele escalão. Por conta disso, aliás, é que a reprodução sociometabólica do capital se mantém como “ordem natural” das coisas: é o seu mecanismo de defesa fundamental. Mas como isso se sucede? Como algo essencialmente político como a disposição do poder de transformar e controlar a produção e a apropriação do excedente, bem como manejar a alocação dos insumos sociais e da força produtiva do trabalho, mantém ocultadas as relações de poder que ensejam, aparecendo somente como uma relação de caráter simplesmente econômico?
Vale lembrar que o processo histórico de isolar o produtor direto dos meios de produção da vida material (um ato essencialmente político), como o próprio Marx ressalta no capítulo da Acumulação Primitiva do Capital, n’O Capital, constituiu o ponto de partida fundamental para a instauração dessa nova forma de exploração do homem pelo homem. Significou – e mantém-se, diga-se – portanto, como um processo incessante de luta entre as classes, a qual fora – e continua sendo – decidida a favor da classe exploradora, com o apoio indispensável do Estado: o aparelho político por excelência do capital.
As relações de produção são relações econômicas. Não há dúvidas quanto a isso. No entanto, são concomitantemente relações entre as classes e, portanto, com conteúdo político. Dessa forma, acompanhando o pensamento de Ellen Wood:
A própria estrutura do argumento sugere que, para Marx, o segredo último da produção capitalista é político. O que radicalmente distingue sua análise da economia política clássica é que ele não cria descontinuidades nítidas entre as esferas econômicas e política; e ele é capaz de identificar as continuidades porque trata a própria economia não como uma rede de forças incorpóreas, mas, assim como a esfera política, como um conjunto de relações sociais. (2011, p. 28)
Com tais informações e reformulando a questão anteriormente levantada, indaga-se: quais são os mecanismos constantemente reproduzidos pelo sistema exploratório comandado pelo capital que conseguem separar – a ponto de torná-las aparentemente incompatíveis – a política do âmbito da economia? A resposta encontra-se na determinação histórica de que as relações sociais tomam a forma-mercadoria e a forma-jurídica.
A forma-mercadoria
A ação das leis econômicas independe – em grande medida – da consciência e da vontade dos indivíduos. Em outras palavras, o mundo objetivo da produção determina – mas não mecanicamente – a consciência dos indivíduos, sejam eles produtores diretos ou não. Tal fenômeno ocorre, sobretudo, por dois motivos. Primeiro, porque as relações estabelecidas se dão de forma fundamentalmente alienada, ou seja, sem possuir a capacidade de criar nos homens a consciência de como e por que a respectiva forma de sociabilidade se estabelece entre eles próprios e das leis que regem o desenvolvimento dos respectivos vínculos. Segundo, porque as relações se repetem com tamanha constância entre os elementos do processo econômico que se cria nas respectivas consciências a falsa percepção de que o processo se desenvolve de forma natural e reflete indiscutivelmente a única forma de seu desenrolar.
A particularidade específica da economia mercantil, organizada pelos imperativos da acumulação expansiva incontrolável de capital, reside no fato de que os administradores e organizadores da produção, bem como os produtores, são portadores e portanto, vendedores, independentes de suas mercadorias[1]. Por conta disso, o vínculo estabelecido entre eles somente pode se dar por meio de uma relação propriamente transitória: a troca. Através da troca, ou seja, através do mercado, cria-se a aparência de que o intercâmbio ocorre entre equivalentes. Isaak Illich Rubin sintetiza esse processo em seu livro “Teoria Marxista do Valor”:
Podemos ver que a relação de produção básica, na qual determinados produtores de mercadorias são diretamente vinculados, e através deles, portanto, estabelece-se a conexão entre sua atividade produtiva e a atividade produtiva de todos os membros da sociedade, ou seja, a compra e venda, realiza-se regularmente. Este tipo de relação de produção difere das relações de produção de tipo organizado nos seguintes aspectos: 1) é estabelecida entre determinadas pessoas voluntariamente, dependendo das vantagens para os participantes; a relação social assume a forma de uma transação privada; 2) ela vincula os participantes por um curto período de tempo, não criando vínculos permanentes entre eles; mas essas transações momentâneas e descontínuas devem manter a constância e continuidade do processo social de produção; e 3) une indivíduos particulares no momento da transferência das coisas entre eles, e limita-se a esta transferência de coisas; as relações entre as pessoas adquirem a forma de igualação de coisas. Relações de produção diretas entre os indivíduos particulares são estabelecidas pelo movimento das coisas entre eles; este movimento deve corresponder às necessidades do processo de reprodução material. (1980, p. 30)
No modo de produção capitalista, então, a mercadoria como portadora material de valor e, portanto, produto do trabalho humano abstrato detém a potencialidade de ser trocada por qualquer outra mercadoria e, claro, pela mercadoria universal: o dinheiro. Dessa forma, o valor de uso da mercadoria, as propriedades que as tornam úteis, torna-se componente praticamente descartável[2] para que a troca efetivamente ocorra. O importante é que o resultado do processo de trabalho alienado materialize valor na mercadoria, o que ocorre pelas próprias características do processo de valorização em sua unidade com o processo de trabalho. Ao assim proceder, ou seja, ao adentrar o processo de circulação, a mercadoria adquire valor de troca, ou seja, torna-se equivalente a outra mercadoria. Contudo, para que a mercadoria possa realizar sua potencialidade, deve haver a intervenção de outra ‘coisa’ na relação, o homem, o qual simplesmente deve interpor sua ‘vontade’ no processo de troca: o momento mediador entre a produção e a distribuição determinada por ela e o consumo.
O resultado do processo de troca consubstancia-se, portanto, na transportação do véu equalizador da mercadoria às relações sociais. Assim, pelo fato de as mercadorias requererem a intervenção do momento “troca” para realização de sua metamorfose em valor de troca para o capitalista e em valores de uso para outros, aprisiona-se o trabalhador à lógica sistêmica de exploração, deixando-o à mercê do capital, pois necessita do salário para ter acesso aos bens de consumo que a fragmentação e divisão funcional e hierárquica do trabalho não mais lhe permite produzir autonomamente. Portanto, a característica central da forma-mercadoria para a reprodução do sistema sociometabólico do capital consiste na homogeneização econômica desumanizadora de todos os membros da sociedade e das ações por eles realizadas. Deste modo, a lógica da forma-mercadoria estende-se em todo o tecido social, constituindo-se assim em condição absoluta para a manutenção do sistema como um todo.
O Direito, por meio de sua Forma Jurídica Concreta, como se demonstrará no próximo artigo, não foge a tais imperativos: ele segue expressamente a mesma lógica da forma-mercadoria, homogeneizando os indivíduos que se imbricam em sujeitos de direitos e obrigações.
Notas
[1] Livre troca de mercadorias no mercado, concorrência e liberdade formal dos assalariados para vender a sua força de trabalho só podem ser garantidas caso a classe economicamente dominante renuncie à aplicação direta dos meios de força, tanto frente aos assalariados como em seu próprio interior. (HIRSCH; 2009, p. 28-29)
[2] No caso da mercadoria força de trabalho a situação aparece de modo diferente, já que o valor de uso da força de trabalho é valorizar o valor e, portanto, todo o interesse da capitalista reside no consumo produtivo desse valor de uso.
Bibliografia
MARX, K. O Capital. Crítica da economia política. 3 vols. SP: Abril Cultural, 1983.
_. Para a Crítica da economia política. In: Os Economistas. SP: Abril Cultural, 1982.
MÉSZÁROS, I. Para além do capital. SP: Boitempo, 2002.
. Estrutura Social e Formas de Consciência II. SP: Boitempo, 2012.
PACHUKANIS, Evgeny. Teoria Geral do Direito e Marxismo. Rio de Janeiro: Renovar, 1989.
POLESE, P. Apropriação do poder político e superação do Estado na transição socialista. 8 partes disponíveis em (http://passapalavra.info/2014/01/88965)
RUBIN, I. I. A teoria Marxista do valor. São Paulo: Braziliense, 1980.
WOOD, E. M. Democracia contra capitalismo. São Paulo: Boitempo, 2003.
A série Direito e transição socialista é composta por 5 partes e cada uma delas sairá às terças-feiras.
Oi Diego, tudo bem? Gostei muito do texto. Tenho uma dúvida, e peço desculpas caso ela não tenha pertinência ou deixe muito exposto um pobre entendimento do texto ou de sua proposta:
É natural pensar que uma transição socialista aconteceria através de pequenas mudanças, principalmente políticas (advindas, em especial, de partidos políticos de esquerda), certo? É também natural imaginar que tal transição só seria possível se tais medidas enfraquecessem todo o sistema do capital (trouxessem algo como uma social-democracia), sistema esse pautado em (ou, pelo menos, um tanto fortalecido com) liberalismo nas relações econômicas e enfraquecimento (ou diminuição da participação) do Estado, certo? Mas vc afirma que o Estado é o aparelho político maior do capital. Sendo assim (e aqui está a minha dúvida), como, ao mesmo tempo, seria possível o fortalecimento do Estado com intenções transicionais? O próprio fortalecimento do Estado, ainda que com amplas políticas de bem-estar social é o fortalecimento do capital? Se sim, como (ou por quê)?
Desde já, agradeço!
Fiz uma pergunta muito semelhante à de Lucas à historiadora Wendy Goldman. No belo livro “Mulher, Estado e Capital” ela aponta a necessidade de superação do Estado, em termos semelhantes aos que o Diego coloca (e que são, afinal de contas, os termos do “marxismo” e mesmo do “anarquismo”, girando a polêmica mais no que diz respeito à mediação e à temporalidade de tal fim do Estado), mas ao mesmo tempo Wendy defende a ampliação de instituições públicas estatais voltadas para a transição socialista no longo prazo: refeitórios e creches públicas que liberem o trabalho doméstico (em geral feminino) voltado à alimentação e ao cuidado das crianças, ampliação da legislação (e portanto de órgãos jurídicos estatais voltados para a elaboração e aplicação das leis) regulando direitos das mulheres, etc. Ela me respondeu que a questão era “dialética”, com a mesma autoridade (e superficialidade) que um lukacsiano responderia que é “ontológica”. Ainda assim, no caso de Wendy há uma adoção parcialmente crítica do legado bolchevique, o que dá alguma coerência à sua defesa simultanea do fim do Estado e do aumento de funções em um “Estado transitório”. Eu sinceramente não compro essa ideia, por mais bem construída que ela seja em Lenin. A prática dos bolcheviques mostrou que a teoria não resulta. Uma boa leitura, aliás, é o livro de Maurice Brinton “Os bolcheviques e o controle operário”, o que me leva a finalizar esse comentário dizendo que na minha opinião a resposta é não, não é possível o fortalecimento do Estado com intenções transicionais. Aliás, com intenções é possível, mas ficarão sendo intenções para sempre irrealizadas. E sim para a outra pergunta de Lucas: o fortalecimento do Estado é fortalecimento do capital, não importa se o nome do Estado é “Ditadura do Proletariado” e sua direção está a cargo do Partido bolchevique. Isso posto, vem a pergunta não feita pelo Lucas, mas que sei que ele tem na cabeça: então fazer a transição por qual meio? Para mim a resposta já foi dada nos “ensaios” das tentativas de transição via conselhos (sovietes) e demais órgãos de luta autogestionários, não-estatais. Claro que dizer isso não resolve nada, até porque essas tentativas não conseguiram se generalizar e ir além do capital, mas enquanto essas formas políticas de luta revolucionária apresentaram limites que podemos conceber não se repetirem num futuro, a “outra via” bolchevique mostrou que traz em sua essência um defeito estrutural, que é justamente estar ancorada na forma-partido e no Estado enquanto veículo da transição. Tanto a forma Partido quanto a forma Estado transitório necessariamente negam (vide todas as experiências de tentativa de transição nesse modelo) a autonomia da classe trabalhadora, e por isso não são adequadas para ir além do capital e sim para reconfigurar a exploração e dominação de classe, substituindo a disciplina capitalista pela disciplina também hierárquica imposta pelos gestores estatais bolcheviques. A forma autogestionária de tentativa de transição pode errar tanto quanto aquelas formas bolcheviques, a diferença é que num caso o erro parte dos próprios trabalhadores autonomamente organizados, e portanto traz potencial de autocrítica e de aprendizagem com os erros, enquanto na forma bolchevique os erros partem de uma direção, muitas vezes descolada da “base”, e que por ser direção buscará se manter como direção, o que limita a capacidade de autocrítica do movimento revolucionário, e pior, a restringe a uma autocrítica “da direção”, como se a questão fosse uma “boa” ou uma “má” direção, uma direção “conforme” ou “descolada” dos interesses da massa. Nesse modelo a direção se julga “encarregada” de uma tarefa que só pode se realizar pela ação direta da classe, na retomada do controle da produção e na reconstituição das relações sociais em moldes alternativos ao modelo capitalista. Com exceção dos momentos iniciais da revolução, quando ela tem que se haver com as ofensivas militares contra-revolucionárias, uma direção partidária e um Estado sob seu poder só atrapalham, até porque chamam pra si algumas tarefas que tem que ser feitas de modo autônomo pela classe. Ainda assim, experiências de comitês de defesa (militar) (penso especialmente na Espanha) mostram que mesmo nessa luta mais encarniçada é possível pensar alternativas ao modelo estatal, no caso, especificamente quanto à forma exército, que implica estruturas de comando hierárquico etc.
Me parece que é a própria noção de transição socialista que deve ser alvo de questionamentos. Num livro muito interessante – que tenho me empenhado em estudar a fundo e refletir sobre – é possível ler o seguinte: “[…] ambas as totalidades, a do sistema de exploração e a da ruptura da sociedade e reorganização da esfera das instituições, se conjugam desde já na existência contraditória da classe explorada. Resulta daí que a reorganização completa da esfera das instituições não é mediada por qualquer fase de transição e define um tempo histórico mínimo. A revolução global só pode ocorrer num tempo-zero (João Bernardo, ‘Dialéctica da Prática e da Ideologia’, Porto, Afrontamento, 1991, p. 32)”. Propor o “fortalecimento do Estado com intenções transicionais” me parece ingenuidade ou mesmo um contra-senso, pois não é de boas intenções que se faz a história. Ou negamos o Estado e generalizamos globalmente um novo modo de produção ou deixamos que o Estado cumpra o seu papel e negue – a começar pela esfera da produção, visto que o Estado não deve ser pensado como elemento superestrutural separado da infraestrutura (cf. João Bernardo, ‘Estado: a silenciosa multiplicação do poder’, São Paulo, Escrituras, 1998, p. 29) – a nova modalidade de relações sociais gerada nas lutas; isto é, deixamos que as instituições capitalistas neutralizem o elemento “ruptura da sociedade e reorganização da esfera das instituições”, afirmando o elemento “sistema de exploração”, ambos contidos desde já na existência contraditória da classe trabalhadora. A questão central parece localizar-se na necessidade de substituir um modelo de produtividade por outro (cf. id., ibid., pp. 17-25), mas para isso é preciso substituir uma modalidade de mercado por outra (cf. João Bernardo, ‘Economia dos conflitos sociais’, 2. ed., São Paulo: Expressão Popular, pp. 356-357; aqui: http://www.afoiceeomartelo.com.br/posfsa/Autores/Bernardo,%20Jo%C3%A3o/Economia%20dos%20Conflitos%20Sociais.pdf), desenvolvendo-a em escala global; e mais: sem que isto se dê ao longo de uma dinâmica temporal que possa ser percebida enquanto processo. Atribuir ao Estado uma tarefa “transicional” me parece ser admitir que o Estado não participa ativamente da produção, como se sua existência fosse exterior à esfera da produção e como se ele, enquanto entidade superestrutural, pudesse remodelar a produção “de fora” num sentido anticapitalista.
Olá Lucas, desculpe pela demora a responder seu comentário. Mas vejo que não fez falta, já que o Pablo e o Fagner o responderam rápida e devidamente. Haha.
Todas as suas indagações são bastante pertinentes para o tema em questão, no sentido de que o pensamento dominante na esquerda é que o Estado seria o aparelho transicional indiscutível (e único) para ‘construir’, ‘conduzir-nos’ a uma sociedade assentada em bases substancialmente igualitárias, mesmo diante das evidências históricas de sua inerente inadequação (vide as experiências da socialdemocracia na Europa e a URSS).
Primeiramente, acho que você está pensando a transição como um progresso gradual – respeitando a ordem estabelecida – em direção a transformações estruturais (pensando que as reformas se cumulariam e se constituiriam em etapas) e não como ruptura radical dos fundamentos da ordem vigente. Manter a estrutura estatal (adjetivando-a de proletária) como forma de organização da Classe Trabalhadora para ir além do capital é como almejar eliminar os males sociais, mantendo simultaneamente um dos seus maiores fundamentos. É óbvio que em qualquer revolução social teremos que lidar com as coisas como estão e remediar as mazelas mais gritantes com os recursos disponíveis. Mas isso não quer dizer que o faremos por meio das formas sociais alienadas e alienantes cunhadas para assegurar a reprodução de desigualdades e das relações sociais correspondentes.
Quanto à pergunta sobre como seria possível o fortalecimento do Estado com intenções transicionais, complementando o que já foi dito, remeto-o à coletânea de 08 textos escritos pelo Pablo (http://passapalavra.info/2014/01/88965) e ao livro ‘Para Além do Capital’ de Mészáros, especialmente o capítulo 23 e 24 (https://nupese.fe.ufg.br/up/208/o/para-alem-do-capital.pdf?1350933922), os quais explicitam sua impossibilidade.
Quanto à indagação de como amplas políticas de bem-estar social torna-se a fortalecer o capital, acho que fala por si só a prática histórica da socialdemocracia, a qual buscou o avanço do socialismo no interior das instituições existentes na sociedade capitalistas, utilizando-se exatamente da forma política ‘democrática’ como estratégia e programa com caráter instrumental e prefigurativo, aplicando – por meio do Estado – medidas pautadas pela teoria do bem-estar, as quais serviram para atenuar os efeitos distributivos do funcionamento do mercado, sem contestar as formas sociais fundamentais do capital.
O Capitulo 5 (interesses materiais, compromisso de classe e Estado) do livro Capitalismo e Social-Democracia, de Adam Przeworski, demonstra que um compromisso que implique a perpetuação de formas capitalistas de propriedade é, em algumas circunstâncias, preferível para os trabalhadores que procuram maximizar seu bem-estar material. Isso porque, segundo o Autor, mesmo que o socialismo fosse superior em termos de satisfação das necessidades materiais, a ameaça do desinvestimento poderia impedir que os trabalhadores apoiassem uma estratégia de transição. Acontece que tais ações foram (e são) assimiladas e recuperadas pelo capitalismo em seu favor para a constituição de um novo ciclo de reprodução ampliada do capital, ao mesmo tempo em que mantém as lutas contestatórias dos trabalhadores em condições aceitáveis.
O dossiê sobre o bolsa-família (http://www.passapalavra.info/2010/04/21593), em especial esse artigo: http://passapalavra.info/2010/04/21281, explicita melhor ainda como uma política de bem-estar social fortalece o capitalismo assentando sua reprodução em novas bases, mantendo as condições exploratórias incólumes.
Pablo, Fagner e Diego,
muito obrigado pelas respostas. Foram muito esclarecedores e me deram muito o que ler e pensar. Eu não tenho muitas bases pra discutir o assunto em questão, mas me parece justo o diagnóstico de que o Estado, em qualquer circunstância, mantém a estrutura exploratória, se não com a “permissão” da exploração absolutamente selvagem, com o abrandamento das lutas de classes e do repúdio enérgico ao sistema do capital (uma certa domesticação popular). Digo também, Diego, que vc está certo ao observar que eu pensei a transição como um processo gradual que leve a transformações estruturais, e não como ruptura. Não sei se é necessário dizer, e tenham em mente que eu ainda não li nem msm os textos aqui do site (os do Pablo), mas acho que não existe outra forma (de transição), ou pelo menos não nas circunstâncias com as quais lidamos hoje no Brasil, de uma esquerda pequena e relativamente mal organizada (acho eu), de um povo desinformado das causas dos problemas que enfrenta e, por consequência, desprovido de vontade (e creio eu, secundariamente, também de energia e coragem) de mudança “radical”. O processo teria que ser, assim, primeiro um de educação, informação, e mesmo de motivação, pra que cheguemos num estágio como o da revolução de 1917, por exemplo, no qual existiu vontade massiva de informação (o que parece ter possibilitado a vontade de rompimento). Processo esse que sugere a impossibilidade de um “modus operandi” de fato revolucionário, de ruptura, pelo menos num futuro próximo, certo?
Mais uma vez os agradeço pela atenção.
Caro Lucas,
para a tristeza (ou felicidade) dos professores bem intencionados, as revoluções, as lutas e as mudanças “radicais” não exigem um esclarecimento prévio. Aliás, o esclarecimento se dá conjuntamente à luta em marcha, e inclusive de modo retroativo: o amanhã permitindo entender o que houve ontem. Claro, todo mundo chega no momento da luta já tendo um cérebro com ideias dentro, mas nenhuma luta se coloca como radical graças à clareza de princípios e à vontade e determinação prévia dos revolucionários. A luta não depende prioritariamente de uma vontade política inabalável e bem-resolvida de um indivíduo ou de uma classe para se radicalizar. A vontade política descolada das condições objetivas está condenada a virar puro oportunismo impraticável, fraseologias. A luta não costuma surgir radical, ela é empurrada à radicalidade pelas próprias condições em que se dá, o contexto, o caráter integrável ou não da demanda imediata, a correlação de forças nos conflitos sociais, a forma organizativa posta em prática com vistas a conquistar o objetivo imediato etc. Por tudo isso, o papel do esclarecimento prévio costuma ser bem pequeno ou nenhum. Em geral os revolucionários profissionais, em especial (mas não só) militantes partidários, recusam essa verdade histórica, porque é justamente da suposta necessidade de dirigentes esclarecidos que transmitirão a consciência de classe para a massa trabalhadora que eles tiram sua razão de existir. Não se contentam em ser apenas um a mais a contribuir com o processo coletivo. Arrogam para si o direito de dirigir, por ter “visão mais ampla”, “maior clareza estratégica” etc.
Lhe peço que não leia minha série de artigos. Concordo com o que escrevi, mas a problemática é posta num nível muito abstrato, que tenho a impressão de que não lhe convém ler no momento. Se aceita a sugestão, leia os textos do site que partem de questões concretas e a partir daí tecem apontamentos teóricos mais abrangentes. Vasculhando o site você encontrará material em abundância. Esse site é campeão em abordar os temas assim, e hoje em dia considero essa a melhor forma. Apenas a título ilustrativo, indico os textos assinados Passa Palavra (em especial lhe interessará uma série recente, dedicada à “autonomia”), os textos de Leo Vinicius, Dokonal, Grouxo Marxista, Ex-bancário, Manolo, Caio Martins e Leonardo Cordeiro, João Bernardo. Deste último indico um de fora do site, mas que se encontra facilmente na internet: “A autogestão da sociedade se prepara na autogestão das lutas”.
Abraços e não hesite em comentar os textos para dialogar, tirar dúvidas etc. Esse espaço rende bons debates e sempre se aprende muito passeando por aqui.
ÓBVIO[?]…
Secta Nihilista @SectaNihilista 25 de mai [DIXIT:]
Cuando cambias tus ideas y tu discurso para intentar conquistar algo de poder, es el Poder el que te ha conquistado a ti.
Mário Pedrosa certa vez afirmou que:
“Dentro da sociedade burguesa, outra sociedade se forma, nos subterrâneos das minas, nos cortiços e nas aglomerações suburbanas, sob os tetos das grandes usinas, nas cavernas das forjas e das caldeiras, no bojo das máquinas, ao contato dos motores. E ela tem a chave do mundo nas suas mãos grosseiras e escarvoadas. É este o único grupo social nascido com a máquina, despojado por ela, mas o único capaz de entender o seu segredo e que porá a sua grande mão violenta sobre o volante vertiginoso e selvagem do maquinismo […]. Este mundo novo obriga todos os homens que ainda restam de fora a uma determinada posição social (Mário Pedrosa, ‘As Tendências Sociais da Arte e Kaethe Kollwitz’, O Homem Livre, 17 de Julho de 1933, Disponível em: http://bndigital.bn.br/hemeroteca-digital/)”.
Ora, a classe trabalhadora não é mais toda ela de mãos grosseiras e escarvoadas, nem trabalha toda ela nos subterrâneos das minas, sob os tetos das grandes usinas, nas cavernas das forjas e das caldeiras, ao contato com os motores; no entanto, continua ela a ter a chave do mundo em suas mãos, e deverá ainda pôr a sua grande mão violenta sobre o volante vertiginoso e selvagem do maquinismo. Mas como é que se pode fazê-lo num processo? Num processo lento, gradual? Ou nos deparamos com uma ruptura imediata ou a revolução fica em suspenso e o capitalismo triunfa. A questão é: penso que a classe trabalhadora, deparando-se com uma nova modalidade de capitalismo, ainda não desenvolveu por completo uma nova modalidade de luta. E há um descompasso entre a ideologia e a prática, justamente porque a nova prática tem se dado de modo pouco sistemático: a ideologia fica carecendo, portanto, de sistematicidade. Não creio que somos nós – uma vanguarda de esquerda – quem deve educar a classe trabalhadora: o que estamos precisando é que ela que nos eduque pelo exemplo. Por outro lado, talvez sejamos nós que não estejamos prestando atenção às lições do presente que ela nos dá. Avaliar como têm se dado as lutas nos locais de trabalho é realmente necessário. Só daí poderá nascer uma nova ideologia da autogestão social, capaz de expressar novas relações e propor saídas inovadoras para os dilemas das lutas sociais.
Oi Pablo, tudo bem?
Agradeço as sugestões de leitura (já até li algumas delas, inclusive). Como ainda tenho muitos dos textos de vocês pra ler, não vou expor muitas opiniões sobre (pra não ficar questionando muitos pontos possivelmente já tratados nos textos ainda não lidos por mim), mas te pergunto se você discorda do seguinte, dito por mim mesmo no meu outro comentário: as “circunstâncias com as quais lidamos hoje no Brasil” (são) “de uma esquerda pequena e relativamente mal organizada (acho eu), de um povo desinformado das causas dos problemas que enfrenta”. Você acha que essa visão está distorcida, de alguma forma? Aproveito pra colocar mais um ponto: você acha que a situação vivida por nós (o mundo de agora) encontra algum paralelo histórico? E aqui toco especialmente na questão do “tamanho” que tudo tem tomado de sessenta, setenta ou oitenta anos pra cá. Pergunto isso pq tenho também a impressão de que a globalização fortalece e solidifica uma série de realidades imaginárias, o que faz, obviamente, que elas fiquem um tanto mais difíceis de se mudar (ou mesmo de se imaginar que elas possam ser mudadas, na cabeça de muita gnt). E ainda um outro fator, tb fortalecedor das nossas realidades imaginárias e ainda mais complicado pela perversidade dissimulada que pode assumir, é a força da “informação”, a força da grande mídia, que é inegável nas grandes massas aqui do Brasil (e, creio eu, de tantos outros países). Força essa que frequentemente engana sobre os motivos mesmos dos problemas, quando não através da relativização, através de transferências de responsabilidade, de bombardeio de situações, escândalos, novidades e/ou entretenimento.
Parecem ser muitas as cordas que seguram o capital, e mais espessas que nunca, vc não concorda? Sendo assim, esperar que a massa se enerve com as condições precárias (msm com tantos “apaziguadores do sistema do capital”), como parece ser o sugerido nos textos sobre autonomia como algo que, naturalmente, alguma hora acontece, não é esperar por condições de caos humano antes que apareça possibilidade de mudança? Não é aceitar que em sociedades onde a exploração é “humana” (em oposição a “exploração selvagem”) tal transição nunca se dará? Ou, caso exista a transição nesses casos de sociedades com “menor grau de exploração”, tal mudança não seria gradual, com um processo primário (já há muito em curso) de informação e educação da população (o que, naturalmente, motiva)?
Ah, uma última observação: eu não me referia a figuras ‘detentoras da informação e da verdade’ liderando qualquer tipo de movimento, mas apenas à ideia de que pessoas que entendem a/acreditam na falta de liberdade em que vivemos, exploração rotineira, inconsistência e perversidade sistemáticas do capital, que essas pessoas precisam sempre levar isso adiante, por exemplo como vocês fazem com esse site. Esse é, entendo eu, um exemplo dos processos informativos, educativos e motivadores.
Mais uma vez agradeço.